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Tipologia: Notas de estudo
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A expressão “participação social” está atualmente em toda parte. Com sentidos e projetos diferentes, é encontrada nas práticas de instituições públicas das várias instâncias governamentais, nos arranjos institucionais de, praticamente, todas as políticas sociais e nos programas de governo de partidos de todos os matizes.
A intensificação da participação social, entendida aqui como a participação da sociedade em espaços públicos de interlocução com o Estado, reflete a configuração de um tecido social que foi se tornando mais denso e diversificado desde meados dos anos 70, período de surgimento dos novos movimentos sociais. A Constituição Federal de 1988, por sua vez, coroou esse processo atribuindo relevância à participação da sociedade na vida do Estado, ao instituir vários dispositivos nas esferas públicas de âmbitos federal e local.
Este texto tem o objetivo de tratar da institucionalização dos espaços de participação social – conselhos e conferências - a partir da Constituição Federal de 1988. Ainda que o presente trabalho não vá fazer uma reconstituição histórica do processo de lutas da sociedade civil com o objetivo de alargar a democracia brasileira, a forma como o presente texto está organizado contempla, na sua primeira parte, um breve olhar histórico sobre participação social na história política brasileira, sobretudo no período de transição democrática, com destaque para o surgimento dos novos movimentos sociais na década de
Participação social ao longo da história política Brasileira
Análises histórico-culturais mostram que a participação social sempre existiu
no Brasil. De acordo com Carvalho (1998), a atitude apática e “ bestializada ” 2 do povo brasileiro frente às arbitrariedades do Estado não corresponde à realidade. Essa visão é, segundo a autora, uma construção discursiva que desqualifica o comportamento e a atitude do povo brasileiro, que incorpora as culturas negras e indígenas na forma de manifestar suas insatisfações. Com efeito, a história política do país é repleta de exemplos de manifestações populares que demonstram a capacidade do povo brasileiro se organizar e lutar por seus direitos. É claro que a forma e a intensidade de luta variam de acordo com os usos e costumes de cada época, com a experiência histórica e política de cada um dos movimentos sociais e com a abertura ao diálogo e à negociação com os governantes da vez.^3 Por exemplo, José Murilo de Carvalho (1996), ao estudar os primeiros anos da República no Brasil e o singular processo de distanciamento entre o mundo político e a sociedade civil, nos mostra que, contrariando a expectativa de renovação política e participação das classes menos favorecidas no Rio de Janeiro – então capital do Brasil –, o entrosamento entre o novo regime político teoricamente democrático e o povo foi mínimo, e, na prática, não houve quase nenhuma interação entre representantes e representados. Analisando esse período, o autor rebate a tese de que o pouco ou nenhum envolvimento das classes menos favorecidas com a política possa ser visto como um alheamento. Trata-se, na verdade, de uma real demonstração de desprezo à elite governante por parte daqueles que foram obrigados a se adaptar a uma forma de governo, a um projeto político sobre o qual sequer foram consultados. Para os que defendem a tese da apatia da população da época à política, José Murilo de Carvalho chama atenção para o episódio da Revolta da Vacina, mostrando que havia, sim, povo no Rio de Janeiro. Quando explodiu a revolta e a população tomou as ruas da cidade, o povo demonstrou suas insatisfações participando do “quebra-quebra”. Por outro lado, do ponto de vista da política “formal” (eleições, voto), é verdade que as classes populares não se interessavam em se envolver, pois para estas a “República” era considerada um elemento estranho à cultura, já que não tinham tomado parte de sua construção e a entendiam como um processo imposto de cima pra baixo. Assim, as manifestações populares não se davam por meio dos canais oficiais, como os mecanismos eleitorais, mas por meio de rituais religiosos e grandes festas populares étnicas que refletiam a cultura local. O que se depreende desse episódio da história brasileira é que os repertórios de ação dos movimentos populares são construídos historicamente e os movimentos sociais desenvolvem, ao longo do tempo, uma diversidade de formas de protestos. Por exemplo: os trabalhadores aprenderam a fazer greve, os camponeses, a invadir terras, os estudantes, a fazer passeatas, e assim por diante. O certo é que a herança histórica exerce um papel preponderante nos repertórios de ação utilizados pelos movimentos populares. Por esse
Entretanto, não obstante a pesada repressão às lutas sociais e às manifestações populares contrárias à política do regime de exceção, o marco mais importante da luta pela maior participação popular na esfera pública teve sua origem no bojo da resistência contra a ditadura militar, a partir dos anos 70 e ao longo dos anos 80, quando os novos movimentos populares e segmentos da classe média se organizaram, “ de costas para o Estado”, em torno das reivindicações urbanas, como educação, saúde, moradia, saneamento e transporte coletivo. Assim, após um período de luta “às escondidas” (entre 1968 e 1977), despontam novas expressões da luta social, como as Comunidades Eclesiais de Base e o vigoroso movimento operário do ABC paulista. Em 1979, acontece o congresso de refundação da UNE, e no início dos anos 80, nascem a CUT e o MST, dando origem a um período de ascensão das lutas populares no Brasil. De acordo com Diniz e Boschi (1989), movimentos que emergiram tanto como manifestações de massa esporádicas e não estruturadas, quanto como formatos mais organizados centrados nos locais de moradia, mobilizados por interesses ligados a serviços urbanos, e bens de consumo coletivo, passando por coletividades aglutinadas ao redor de atributos como sexo e raça, além dos movimentos de cunho religioso e movimentos de defesa do meio ambiente.
Ciconello (2008), em recente artigo publicado pela Oxfam International , destaca a estratégia de articulação e mobilização dos novos movimentos sociais no bojo da ditadura militar, afirmando que “Muito embora a ditadura militar tenha controlado e restringido a liberdade de expressão e de associação de indivíduos e de grupos políticos e sociais que criticassem o regime político autoritário, havia algum espaço de mobilização e de debate na base da sociedade brasileira. Esse espaço foi estrategicamente identificado e utilizado por milhares de organizações – formais e informais -, militantes, religiosos, intelectuais e movimentos sociais inspirados, principalmente, por referenciais teóricos e morais, como a Teologia da Libertação e o movimento pedagógico criado pelo brasileiro Paulo Freire, chamado Educação Popular. A atuação era baseada em processos educativos junto a grupos populares com a finalidade de gerar emancipação e consciência cidadã. Educar a população para a transformação social era o objetivo”. (Ciconello, Alexandre, pág. 02) 7
De acordo com Avritzer (2002)^8 , a ampliação da esfera pública no Brasil na década de 70 relaciona-se com o surgimento de vários outros fatores, tais como: o crescimento das associações civis, em especial das comunitárias; a reavaliação, por parte de segmentos da sociedade, da idéia de direitos; a postura de defesa da autonomia organizacional em relação ao Estado; a prática de apresentação pública de reivindicações, e a tentativa de diálogo com o Estado.
Nesse período, reivindicavam-se, além disso, a criação de espaços de participação, em que a sociedade civil organizada pudesse canalizar suas demandas e influir nos processos
decisórios de políticas públicas. Essa vertente de reivindicações visava a encontrar soluções para o enfrentamento do crescente déficit social das classes urbanas de baixa renda nas áreas de saneamento, urbanização, saúde e habitação.
Constituição Federal de 1988: participação da sociedade no desenho, implementação e controle social das políticas públicas.
A reivindicação por maior participação popular foi encaminhada para a Assembléia Constituinte por meio da proposta de garantia de iniciativa popular no Regimento Interno Constituinte. Esse manifesto foi apresentado e aceito pela Assembléia Constituinte contendo mais de quatrocentas mil assinaturas.
O processo de emendas populares adotado pelo Regimento Interno da Assembléia Constituinte foi uma experiência pioneira no campo da institucionalização da participação da sociedade no âmbito da política nacional. Por meio das emendas populares a sociedade pôde participar ativamente do processo de elaboração da atual Carta Magna, apresentando propostas ao texto constitucional.
O constituinte Ulysses Guimarães – Presidente da Assembléia Nacional Constituinte –, em seu discurso na sessão solene de promulgação da Constituição de 1988, ressaltou que a participação popular na elaboração da atual Carta Magna não se deu somente por meio das emendas, mas também:
“... pela presença, pois diariamente cerca de dez mil postulantes franquearam, livremente, as onze entradas do enorme complexo arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, Comissões, galerias e salões. Há, portanto, representativo e oxigenado sopro de gente, de rua, de praça de favela, de fábrica, de trabalhadores, de cozinheiras, de menores carentes, de índios, de posseiros, de empresários, de estudantes, de aposentados, de servidores civis e militares, atestando a contemporaneidade e autenticidade social do texto que ora passa a vigorar.” (trecho extraído de Discurso de Ulisses Guimarães em 05 de outubro de 1988).
Mais adiante, no mesmo discurso, o constituinte Ulisses Guimarães destacou que a Constituição de 1988 alargou o exercício da democracia brasileira em participativa, além de representativa, assinalando que:
“É o clarim da soberania popular e direta, tocando no umbral da Constituição, para ordenar o avanço no campo das necessidades sociais. O povo passou a ter a iniciativa de leis. Mais do que isso, o povo é o superlegislador, habilitado a rejeitar pelo referendo projetos aprovados pelo parlamento. A vida pública brasileira será
planejamento e a gestão participativa das políticas urbanas.^9
iii. A elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente, como desdobramento do reconhecimento constitucional da criança como um sujeito de direito em situação peculiar de desenvolvimento e da adoção da doutrina da proteção integral.
iv. Promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social, como resultado do reconhecimento constitucional de que a assistência social é um direito, figurando ao lado dos direitos à saúde e à previdência social.
Hoje, após duas décadas dos avanços inseridos na Constituição, quase a totalidade das políticas sociais brasileiras – saúde, educação, assistência social, criança e adolescente, trabalho e renda, turismo, meio ambiente, pesca, etc. - contam com espaços institucionalizados de participação social, denominados conselhos, que se configuram como órgãos administrativos colegiados com representantes da sociedade civil e do poder público. Muitos deles passaram a desenvolver também conferências nacionais, que são consideradas espaços mais amplos de participação, onde representantes do poder público e da sociedade discutem e apresentam propostas para o fortalecimento e a adequação de políticas públicas específicas. Algumas conferências são regulamentadas por lei (conferências nacionais, estaduais e municipais da Saúde e da Assistência Social); outras são regulamentadas por decreto do Poder Executivo, e há ainda aquelas que não possuem nenhum instrumento de institucionalização que obriga a sua realização.
O princípio da gestão democrática e os Conselhos na Seguridade Social
A Constituição Federal de 1988 declara que o Brasil é um Estado Democrático de Direito que tem dentre seus fundamentos a cidadania (art.1°, II). No restante do texto constitucional, um conjunto de mecanismos necessários ao exercício dessa cidadania é instituído, destacando-se, em relação à gestão pública, o chamado direito à participação, a ser regulamentado através de lei (art.37, §3°. “A lei disciplinará as formas de participação do usuário na Administração Pública direta e indireta”). O artigo 193 trata dos princípios gerais da Seguridade Social, define de forma mais explícita a participação, com menção direta aos “trabalhadores, empresários e aposentados”. O artigo 198 trata das ações e dos serviços públicos de saúde; a diretriz geral é “participação da comunidade”. O artigo 204, das ações governamentais na área da assistência social, estabelece a “participação da população por meio de organizações representativas na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis”. A regulamentação desse princípio, por normas infraconstitucionais, privilegiou a criação de várias estruturas, ao estilo de conselhos de
Estado. Cada uma das áreas, em razão das dinâmicas próprias, estruturou seus conselhos de forma particular^10 , assim os conselhos de Seguridade, previdência, saúde e assistência tiveram nas duas últimas décadas diferentes destinos e sucesso variado como instrumentos de participação. Da mesma forma, apesar de partilharem desafios comuns, cada um desses espaços guarda singularidades que só podem ser analisadas em seu próprio contexto de histórico de atuação.
O direito à participação na gestão da saúde
A área da saúde foi a primeira a criar e a institucionalizar os mecanismos de participação popular por meio de conselhos e conferências. O caráter pioneiro da área da saúde deveu-se ao papel desempenhado pelo Movimento pela Reforma Sanitária, cujo marco mais significativo foi a XIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, que impulsionou o processo de descentralização das políticas de saúde, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). Historiadores, militantes e estudiosos da área são unânimes ao creditar ao Movimento Sanitarista à vitória pelo fato de a Constituição Federal de 1988 ter incluído a garantia da saúde como direito de todos os brasileiros e dever do Estado:
“O sistema de saúde do Brasil é uma conquista da população brasileira, que ocorreu meio que ao contrário da história dos países latino-americanos. Em toda a América Latina e também no Caribe, o que foi feito foi uma privatização da atenção à saúde”.^11 (trecho de entrevista concedida por Maria Luíza Jaeger em 2005 para a Radiobrás)
“A Constituição anterior falava em direito à assistência médica e a de 1988 fala em direito à saúde e diz que a saúde tem a ver com educação, lazer, trabalho e com atenção à saúde. O conceito de integralidade da atenção também aparece no texto constitucional. É bom lembrar que, ao mesmo tempo, saúde se torna, na Constituição Federal, a única questão de relevância pública.” 12 .(idem).
A Constituição Federal garante para todos os cidadãos o direito à saúde, por força de vários dispositivos constitucionais que reiteram que é dever do Estado garantir o direito à saúde. Assim, no Brasil, as políticas públicas de saúde orientam-se desde 1988 pelos princípios de universalidade e eqüidade no acesso às ações e aos serviços e pelas diretrizes de descentralização da gestão, de integralidade do atendimento e de participação da comunidade , na organização de um Sistema Único de Saúde no território nacional.
total realizado no país), entre tomografias, sessões de hemodiálise, quimioterapia, etc.^13
O direito à participação na gestão da previdência social
O princípio da participação na gestão previdenciária tem como fonte originária na Constituição de 1988 o artigo 194, que no seu item VI assinala o caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa com a participação da comunidade, em especial dos trabalhadores, dos empresários e dos aposentados, ainda que antes e depois da criação do Conselho Nacional da Previdência Social tenham ocorridas muitas manifestações populares visando à correta aplicação dos direitos da Seguridade Social.
De acordo com os dados do Ministério da Previdência Social, o seguro social atingiu, em junho de 2008, uma quantidade média de 25,4 milhões de benefícios do sistema previdenciário. Desses, 14,7 milhões foram destinados aos beneficiários da área urbana, 7,5 milhões aos beneficiários da área rural e 3,2 milhões aos benefícios assistenciais.^14 De acordo com Delgado et al (2002), um sistema de seguro social de ampla cobertura como o brasileiro, com tal massa de participantes, requer, de fato, um controle público de sua gestão, bem como um permanente intercâmbio com a sociedade sobre os rumos e os limites da política que se realiza na relação da burocracia com a população beneficiária, visando a alcançar os objetivos que a sociedade elege para a proteção social dos grupos vulneráveis no âmbito da previdência social.^15
A regulamentação do princípio da participação na gestão previdenciária deu- se por meio da Lei 8.213/1991, que criou várias estruturas específicas de participação social na gestão pública do sistema previdenciário, destacando-se o Conselho Nacional de Previdência Social e o Conselho Nacional de Seguridade Social, que existiram a partir de 1991 e foram extintos em 1999, no Governo de Fernando Henrique Cardoso.
Ao Conselho Nacional da Previdência Social cabe deliberar sobre a política de previdência social e sobre a gestão do sistema previdenciário. Suas competências são amplas e incluem desde o estabelecimento de diretrizes gerais para a definição da política previdenciária até a aprovação das propostas orçamentárias da previdência social, antes de serem consolidadas no Orçamento da Seguridade Social. É presidido pelo Ministro de Estado da Previdência Social e composto por representantes do Governo Federal, dos trabalhadores aposentados, dos pensionistas, de trabalhadores ativos e de empregadores.
O processo de criação e de construção da participação social na política previdenciária não é, de acordo com Delgado et al (2002), aparentemente precedido por algum movimento social ou ação concertada de atores sociais, razoavelmente organizados, que favorecesse a construção dos Conselhos. Segundo os autores, essa talvez seja a grande diferença em relação, por exemplo, ao Conselho Nacional de Saúde, o qual fora precedido pela ação do Movimento Sanitarista e por toda uma articulação nacional e regional dos atores públicos envolvidos na política de saúde.
Além disso, é importante ressaltar, brevemente, que nos 20 anos que se seguiram à promulgação da Constituição, a previdência social esteve constantemente no centro do debate econômico e político, sendo considerada por muitos atores como uma das principais causas dos problemas econômicos existentes no período. Logo após a promulgação da Constituição Federal, o país viveu uma crise política e atravessou um sofrido processo hiper- inflacionário. Nesse período, os críticos colocavam os avanços previdenciários advindos da atual Carta Magna - como, por exemplo, a equiparação entre benefícios rurais e urbanos
Fatores como o advento do Plano Real, que estabilizou os preços, o baixo crescimento econômico da década de 90, o aumento das despesas previdenciárias pós Constituição Federal de 1988 e as modificações no padrão demográfico da sociedade brasileira transformaram o então superávit das contas da previdência em déficit já no inicio da década. Assim, entre os anos de 1995 a 2002, as críticas ao texto constitucional da previdência social continuaram com muita força, sendo que a política econômica daquele período apresentava como uma de suas principais bandeiras a reforma constitucional da previdência. Tal esforço resultou na famosa Emenda Constitucional nº. 20, bem como em outras medidas que visaram a restringir a cobertura previdenciária, destacando-se a criação do chamado fator previdenciário.
Em 2003, o país continuou apresentando baixo crescimento econômico, sendo que a proposta governamental no período defendia a reforma constitucional no regime previdenciário do setor público, que resultou em alterações que restringiram o seu alcance. No presente, observa-se uma reversão de expectativas, uma vez que o atual crescimento econômico tem permitido reduzir o déficit previdenciário, mesmo considerando os reajustes reais no valor do salário mínimo. Assim, aparentemente, o debate em torno da questão previdenciária tem sido atualmente mais otimista e progressivo, a exemplo da realização do recente Fórum Nacional da Previdência Social.
nos níveis nacional, estadual e municipal, qual seja, a “Conferência” como instância deliberativa máxima, cuja função é avaliar a situação da política de assistência social, propor diretrizes, apreciar e aprovar proposta orçamentária encaminhada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, e determinou a criação do Fundo de Assistência Social. Além disso, determinou que a efetiva instituição de um Conselho de Assistência Social, de composição paritária entre governo e sociedade civil, de um Fundo de Assistência Social, com orientação e controle dos respectivos conselhos, e a elaboração de um Plano de Assistência Social seriam pré-requisitos para os repasses da União aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios. Entretanto, apenas em 1997 instituíram-se a sistemática de repasse de recursos e a Norma Operacional Básica (NOB), criando condições políticas e institucionais para o início efetivo dos processos de descentralização.
Como instâncias componentes do sistema descentralizado, têm-se ainda as comissões intergestoras tripartite e bipartite, que constituem espaços de negociação e pactuação entre os entes federados a respeito dos aspectos operacionais e da gestão da política, incluindo divisão de recursos entre eles. São instâncias que propiciam a participação dos gestores de todos os níveis de governo no processo decisório da política.
Papel do Conselho Nacional de Assistência Social
O Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS - como órgão superior de deliberação colegiada, vinculado à estrutura do órgão da Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência Social, que atualmente é o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. É composto por dezoito membros e respectivos suplentes, sendo nove representantes governamentais e nove representantes da sociedade civil, dentre representantes dos usuários ou de organizações de usuários, das entidades e organizações de assistência social e dos trabalhadores do setor, escolhidos em foro próprio sob fiscalização do Ministério Público Federal.
Dentre as principais competências do CNAS encontram-se: aprovar a Política Nacional de Assistência Social; normatizar as ações e regular a prestação de serviços de natureza pública e privada no campo da assistência social; fixar normas e conceder registro e Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social; zelar pela efetivação do sistema descentralizado e participativo de assistência social; convocar ordinariamente a Conferência Nacional de Assistência Social; apreciar e aprovar a proposta orçamentária da Assistência Social a ser encaminhada pelo órgão da Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência Social; divulgar, no Diário Oficial da União, todas as suas decisões, bem como as contas do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) e os respectivos pareceres emitidos.
O CNAS constitui-se, de fato, em um espaço de negociações reconhecido e legítimo dos setores governamentais e da sociedade. É uma instância importante para o debate e proposições na política mais geral de assistência social, bem como na definição de critérios para o repasse de recursos para entidades de assistência social. Em anos recentes, esse Conselho tem contribuído efetivamente para a implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS -, por meio de suas resoluções. Em 2004, o CNAS aprovou a Política Nacional de Assistência Social – PNAS -, que estabeleceu princípios e diretrizes para a implementação do SUAS, que foi resultado de amplos debates realizados em todos os Estados e no Distrito Federal durante o ano de 2004, a partir de uma proposta preliminar apresentada pela Secretaria Nacional de Assistência Social em cumprimento às deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência Social realizada em 2003. Já em 2006, o CNAS aprovou também a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos, que foi uma das deliberações da 5ª Conferência Nacional de Assistência Social que aconteceu em dezembro de 2005.
No tocante às Conferências Nacionais de Assistência Social - instâncias colegiadas de caráter deliberativo com intensa participação social dos usuários ou organizações de usuários, de entidades e de organizações de assistência social e de trabalhadores do setor -, já foram realizadas seis plenárias nacionais desde 1995 e um sem número de plenárias estaduais e municipais que trataram de questões fundamentais para a política nacional de assistência social, conforme elucidado abaixo:
Participação social nas políticas públicas: avanços e desafios
Os avanços constitucionais no desenho das políticas sociais criaram espaços concretos de participação da sociedade no planejamento e na execução de políticas por meio de conselhos municipais, estaduais e federais. Entretanto, ao lado desses avanços, ao longo da década de 90 e no início dos anos 2000, a relação do Estado com a sociedade sofreu uma inflexão. Isto é, os movimentos sociais que na década de 80 caracterizavam-se por seu caráter reivindicatório, pela ampliação de direitos sociais universais e pela construção de
Conferências Tema principal I CNAS (1995) Assistência Social como um direito do cidadão e dever do Estado
III CNAS (2001) Política de Assistência Social: Uma trajetória de Avanços e Desafios
VI CNAS (2007) Compromissos e Responsabilidades para assegurar a proteção social pelo SUAS
V CNAS (2005)
O Sistema Descentralizado e Participativo da Assistência Social - Construindo a Inclusão II CNAS (1997) Universalizando Direitos
IV CNAS (2003) Assistência Social como Política de Inclusão: Uma Nova Agenda para a Cidadania - LOAS 10 Anos SUAS - PLANO 10: Estratégias e Metas para Implementação da Política Nacional de Assistência Social.
outros países, que fracassaram por não terem conseguido ampliar e aprofundar sua base social. Só neste primeiro ano, a equipe da Secretaria-Geral manteve mais de 700 reuniões com organizações da sociedade. Esse método inovador de governar reflete-se na agenda do próprio Lula. Ele foi o primeiro presidente a visitar a Assembléia da CNBB em Itaici, o Congresso da CUT em São Paulo, a marcha do Fórum Nacional da Reforma Agrária em Brasília. Também foi o primeiro a receber a Associação Brasileira de ONGs. Recebeu a direção da UNE, que havia dez anos não era convidada ao Planalto. Outros governos chegaram a criminalizar movimentos como o MST. O nosso, ao contrário, mantém com eles uma interlocução franca e respeitosa.” (trecho extraído de entrevista concedida pelo Ministro Luís Dulci para Ricardo Azevedo, publicada na Revista Teoria e Debate da Fundação Abramo - ano 17 - nº56 - dez 2003/janeiro 2004).
No tocante aos conselhos nacionais, no período em análise foi colocado em prática pelo Governo Federal um franco processo de abertura de novos espaços dessa natureza. O Quadro 1 aponta que, durante a primeira gestão do Governo do Presidente Lula, onze novos conselhos vinculados às políticas públicas e à defesa de direitos foram criados. Informações do Governo Federal revelam ainda que, em janeiro de 2007, a Administração Pública Federal contabilizava cerca de 40 conselhos nacionais que contemplavam na sua composição representantes de organizações da sociedade civil^19. A mesma fonte de informações destaca também a enorme heterogeneidade de representantes civis que participam desses conselhos. No início de 2007 participavam dos conselhos nacionais um total de cerca de 440 entidades representativas de segmentos da sociedade civil (organizações sindicais, patronais, movimentos urbanos, rurais, ambientalistas, de defesa de direitos, entre outros), sendo que algumas delas estavam presentes em mais de um conselho nacional, ultrapassando o número de 600 participações^20.
Além dos conselhos e das conferências, a realização de consultas públicas foi amplamente utilizada nesse período, destacando-se, principalmente, aquelas vinculadas às temáticas de meio ambiente, presentes no Plano de Construção das BR 163 e BR 364, no Plano Amazônia Sustentável (PAS), no Plano Nacional de Recursos Hídricos, e outros^21.
O ano de 2003 foi também o primeiro em que um Governo Federal realizou um processo de consulta à sociedade para a elaboração do Plano Plurianual no país.^22 Para a definição das prioridades do Plano Plurianual 2004–2007 foram organizados fóruns de discussão nos 26 Estados brasileiros e no Distrito Federal, os quais contaram com a participação de 2.170 organizações variadas, a saber: sindicatos, associações e federações empresariais, organizações não-governamentais, movimentos populares e instituições religiosas e científicas^23.
Pelo exposto, pode-se afirmar que, do ponto de vista quantitativo, houve, no período analisado, uma expansão da participação social na esfera pública social brasileira. No entanto, o principal desafio reside em investir na capacidade de o Estado em responder
Período 2003-2006: Conferências realizadas pela primeira vez
Quadro 1