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A CRIANÇA NA FASE INICIAL DA ESCRITA, Notas de estudo de Ciências da Educação

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NOS ANOS INICIAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Tipologia: Notas de estudo

2020
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Compartilhado em 25/03/2020

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A CRIANÇA NA
FASE INICIAL DA
ESCRITA
A Alfabetização Como
Processo Discursivo
ANA LUIZA BUSTAMANTE SMOLKA
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A CRIANÇA NA

FASE INICIAL DA

ESCRITA

A Alfabetização Como

Processo Discursivo

ANA LUIZA BUSTAMANTE SMOLKA

Alguns pontos de partida

Leitura, livros, alfabetização, escrita, escolarização , quais são, efetivamente, as condições atuais de leitura e escrita no contexto das sociedades letradas onde domina a indústria cultural? E, nessas condições, quem pode possuir e dominar este objeto cultural, instrumental, que é a escrita? Nessas condições, ainda, quem lê? Quem escreve? Para que? E por que?

Estas perguntas se fazem pertinentes quando constatamos que a leitura é uma atividade social cuja funcionalidade se evidencia e se propaga cada vez mais, mas que, contraditoriamente, uma grande parcela da população não aprende seu funcionamento porque a escola, como lugar de ensino, acaba sendo extremamente seletiva.

Se o contexto cultural, sobretudo urbano, é permeado pela escrita, isto é, se existem e se ampliam fora da escola condições que propiciam a leitura, como e o que a escola tem ensinado para que um enorme contingente de crianças não aprenda a "ler e a escrever" na escola? É preciso ir à escola para aprender a ler e a escrever?

Enquanto as autoridades se desgastam e as comissões se debatem em discussões sobre o "ensino da língua e da gramática", sobre a alfabetização, a volta ao tradicional, a disciplina e a informática, o que acontece nas escolas com relação à alfabetização e quais as condições de trabalho e de vida das crianças e dos professores?

programa, virou método. Como método, adquiriu o "estatuto da cientificidade"; e, como ciência, sua utilização passou a ser inquestionável.

Numa surda situação de simulacro - em que os professores desconfiam das crianças e dos pais; os pais não confiam nos próprios filhos nem nos professores; as crianças aprendem a não confiar em si mesmas nem nos adultos -, as relações interpessoais vão sendo camufladas, interrompidas e ninguém parece questionar as condições ou duvidar dos métodos: a escola se mantém enquanto as crianças evadem.

Mesmo no contexto das escolas particulares, a situação não é muito diferente: só que a "evasão" é substituída pela "mudança de escola" devido a insistência dos pais; e/ou a "incapacidade" ou as dificuldades das crianças são corrigidas ou trabalhadas por "profissionais competentes", num sistema paralelo e de "apoio" ã escola, graças às possibilidades financeiras das famílias.

Em suma, falhando na sua tarefa pedagógica, a escola passa a apontar cada vez mais uma série de "patologias" nas crianças. Mas o que é pedagógico e o que é patológico? Como distinguir? Como diagnosticar? Quem faz ou pode fazer este diagnóstico? O patológico é sempre originário na criança? Ou pode ser produzido pelas condições sociais e pela inculcação pedagógica?.

Na época do ingresso na escola, as crianças vivem geralmente sob rígidas e austeras condições de ensino, onde as atividades são as menos variadas possíveis, porque tudo o mais é interrompido e suspenso em prol do ensino da leitura e da escrita. As atenções se concentram na escrita como uma complicada habilidade motora a ser desenvolvida, e as preocupações se encontram voltadas para os "pré-requisitos da alfabetização", apoiando-se nas noções de "maturidade" e na aquisição dos "mecanismos de base" como coordenação motora, lateralidade e outros.

Além disso, em salas desnudas e superpopulosas, a imposição do silêncio, da imobilidade, da esterilidade e da estagnação acaba sendo uma "opção" a que o professor recorre para poder sobreviver, contidamente, disciplinadamente, com quarenta crianças, onde parece não haver as mínimas condições de espaço, de tempo e de ampliação de conhecimentos.

“O livro didático é apresentado para o aluno como uma ‘Fonte de conhecimento do mundo”, ao invés de ser um dos objetos de conhecimento no mundo. E as atividades de leitura e escrita, baseadas no livro didático, são totalmente desprovidas de sentido, e totalmente alheias ao funcionamento da língua, contrastando violentamente com as condições de leitura e escrita das sociedades letradas e da indústria cultural de um final de século XX,nesse contexto, nessa situação contraditória, começam a "surgir" nas crianças as dislexias, os problemas psicomotores, foniátricos, neurológicos; o desinteresse total, a apatia, a falta de motivação...

Em 1980, começou a ser divulgado no Brasil o trabalho pioneiro de Emilia Ferreiro sobre os processos de aquisição da linguagem escrita em crianças pré-escolares argentinas e mexicanas, levantando e difundindo fundadas suspeitas com relação aos métodos de alfabetização.

Apoiada em teorias psicolingüísticas (Chomsky, Goodman, Smith, Read) e assumindo a perspectiva da epistemologia genética piagetiana, Ferreiro desenvolveu uma pesquisa inovadora, pois reveladora de aspectos até então não considerados na relação das crianças com a linguagem escrita.

Com base numa sólida evidência empírica, e demonstrando uma grande honestidade intelectual, o trabalho de Ferreiro e Teberosky (1979)

outros estudos não são válidos, científicos? Qual a concepção de cientificidade que qualifica uma pesquisa?). Pelo enfoque construtivista piagetiano que ganha a dimensão pedagógica e alcança a escola? (É este enfoque, no momento, o único, ou o mais adequado psicológica, pedagógica, política e socialmente? Por que?). Pelo trabalho pioneiro de investigação do processo inicial de aquisição da escrita em crianças latino- americanas? O fato é que o trabalho de Ferreiro está tendo, no Brasil, a maior repercussão.

É interessante, contudo, atentar para o movimento histórico destas pesquisas, no campo da psicologia, da lingüística e da pedagogia, analisando as relações entre as mesmas e as suas implicações sociais e políticas.

Hoje, por exemplo, fala-se muito (num discurso anônimo, difuso) da importância de se "partir da experiência da criança e dar a palavra a ela"; de se levar em conta a variação lingüística e aceitar os "erros" que a criança produz; fala-se da necessidade de se conhecer os processos de aprendizagem, de se reconsiderar os procedimentos de ensino, de se rever os métodos de alfabetização. Fala-se também da falta de condições, de reivindicações..

Mas por que isto começa a ser dito? Nestas colocações. o que é dito? O que não é dito (e é portanto ocultado pelo/no discurso)? O que se quer dizer com esta fala? Ou seja, mais especificamente, quando jornais, livros e revistas lançam a polêmica sobre o ensino da língua, sobre alfabetização, sobre escolarização, o que está realmente em jogo? Quais as condições ou as situações sociais que possibilitam, viabilizam ou produzem este discurso, hoje? E, neste momento histórico, o que se faz ou se tem feito no Brasil?

É com a intenção de analisar os processos de aquisição da escrita nas crianças, nas relações de ensino e no movimento das transformações histórico-sociais que me proponho a comentar e a discutir o trabalho que venho realizando desde 1980, tomando como pontos de partida algumas reflexões e inquietações tanto teóricas quanto práticas.

Um breve percurso do trabalho Desde 1980 comecei a desenvolver um estudo sobre a aquisição da linguagem escrita com o objetivo de: a) "investigar processos e estratégias que crianças na faixa pré-escolar usam para interpretar a escrita no meio em que vivem ; e b) identificar conceitos que o pré-escolar desenvolve a respeito deste tipo de linguagem antes do início de uma instrução formal".

Baseado numa proposta de pesquisa-piloto de Goodman & Cox (1978), este estudo consistia numa série de seis entrevistas com crianças de vários contextos sócio-econômicos, partindo-se, primeiramente, da linguagem escrita interpretada no contexto imediato (por exemplo, produtos num supermercado). A cada etapa, a linguagem escrita ia sendo descontextualizada (fotografia, rótulo, logotipo), até o signo escrito ser apresentado para as crianças sem o apoio de elementos contextuais como desenho, cor ou forma. A última entrevista com cada criança consistia numa conversa sobre tipos, processos e funções da escrita (Smolka, 1980).

A análise dos dados, tendo em vista algumas categorias previamente estabelecidas, mostrou-se muito mais difícil e complexa do que se previa inicialmente. As sutilezas e idiossincrasias de cada criança surpreendiam e indicavam a necessidade de uma revisão do procedimento de trabalho, levantando sérias questões sobre as condições de interação das crianças, não apenas com a escrita, mas fundamentalmente com seus interlocutores

"Pesquisar' sobre a linguagem escrita, naquele contexto, revelou que a escrita praticamente não existia ali para as crianças. Pedagogicamente, então, fazia mais sentido experiências e trabalhar com as crianças as diversas funções e possibilidades de diversos materiais e recursos, inclusive a escrita, além das quatro paredes da instituição.

Assim, o que de fato se evidenciou, foi a inegável influência das condições de vida das crianças no processo de elaboração e construção do conhecimento do mundo. E, nestas condições de vida, o significado da presença ou da ausência de adultos ou pessoas mais experientes, como interlocutores e informantes das crianças.

Dei-me conta de que, possivelmente, minhas preocupações iniciais se limitavam aos aspectos funcionais e configuracionais da escrita. Partia do pressuposto de que, numa sociedade letrada, a escrita "é dada", isto é, devidas às diversas situações de escrita, todas as crianças são "naturalmente' chamadas a interpretar os signos escritos antes mesmo do seu ingresso. na escola. E que, desta forma, conhecendo-se os modos de apreensão interpretação da escrita pela criança, poder-se-ia proceder de modo mais adequado durante o processo de alfabetização.

De fato, as funções e as configurações da escrita são evidentemente apreendidas pela maioria das crianças em idade pré-escolar que interagem com esse objeto cultural. Mas só estes aspectos certamente não dão conta do processo de alfabetização. De repente, evidenciavam-se claramente situações de privilégio, de dominação, de conveniências, de ignorância... e eu não havia considerado, no designa inicial da pesquisa, o aspecto fundamental da interação social, ou melhor, das situações sociais, e mais ainda, movimentos de interlocução nestas situações.

Não encontrava, por exemplo, no procedimento da descontextualização dos signos, elementos adequados para analisar o

processo de apreensão do caráter simbólico da escrita pelas crianças, e isto levantava novas questões. Meu suporte teórico naquela época, não exclusiva, mas marcadamente piagetiano, não me auxiliava, e mesmo me confundia neste aspecto: a apreensão do caráter simbólico da escrita é dependente do pensamento lógico-matemático? Em que medida? A criança só pode ser alfabetizada depois de estar comprovadamente no nível do pensamento operatório concreto? Não era isto que eu observava! E do ponto de vista da elaboração social, como se colocaria o problema?.

Comecei a suspeitar, a duvidar do meu trabalho. Comecei a perceber a amplidão da questão. Vi que pensar o processo de aquisição da escrita nos remete a buscar historicamente, sócio-culturalmente, psicologicamente, raízes e origens desta forma de linguagem. Levanta a questão do signo, da capacidade humana de criar sinais e símbolos. Leva-nos a considerar, na sua gênese, do ponto de vista da nossa cultura ocidental, a relação pensa mentolinguagem no movimento das interações humanas ... Mas falar da relação pensamento linguagem nos remete às teorias do conhecimento, ao aspecto filosófico da questão; e falar no movimento das interações humanas, nos abre à dimensão política ... Na busca de sentido para minhas indagações, procurava na psicologia, na lingüistica e na pedagogia alguns possíveis delineamentos para questões que surgiam das observações e registros do trabalho com as crianças.

Nesse momento conheci a perspectiva da Análise do Discurso; li o trabalho de Emilia Ferreiro e resolvi retomar entre outras, a leitura de Vygotsky [1975), que já conhecia, mas não aprofundara.

Em 1982, atendendo à necessidade de estágio e ao interesse de uma das alunas do curso de pedagogia em observar o comportamento lúdico de crianças pré-escolares, aliados à vontade de prosseguir as investigações sobre aquisição da linguagem escrita num contexto mais espontâneo,

propuseram a ' criação de um grupo de estudos, através do qual se pudesse trabalhar efetivamente, a titulo de estágio, em classes de 1° grau, e, ao mesmo tempo, fazer pesquisa.

Com base em algumas concepções inovadoras (Goodman, 1970; Smith, 1973); Foucambert, 1971) sobre leitura, formalizamos então um projeto que se caracterizou essencialmente pelo "incentivo à leitura", nos seus aspectos mais abrangentes. Nesse projeto, era nosso interesse acompanhar os processos de aquisição da linguagem escrita na criança, seus primórdios, sua evolução no contexto acadêmico, procurando conhecer a variedade de conhecimentos que as crianças traziam para a escola, e procurando entender como elas elaboravam os conhecimentos transmitidos pela escola. Emilia Ferreiro havia apontado pistas interessantes e aspectos fundamentais nesse processo. Mas o que fazer? E como?

Surgiu assim a proposta de trabalhar com as professoras em sala de aula, estudando e buscando com elas novas alternativas de ensino. Nossa proposta pedagógica era fazer isto enquanto brincávamos, líamos, escrevíamos e encorajávamos as crianças a lerem e escreverem de diversas formas, em contato com vários materiais e recursos. Nossos procedimentos incluíam a literatura infantil como uma das alternativas centrais de articulação do trabalho com as crianças.

Era também essencial ir organizando dados do cotidiano para ir tecendo as relações e conversando com as professoras sobre eles. Nesse processo, fui, cada vez mais, mergulhando na questão acadêmica da alfabetização.

Na tentativa de situar e contextualizar os problemas da minha pesquisa, apoiei-me nos estudos psicolingüísticos e nas práticas pedagógicas de vários autores: Emilia Ferreiro (1979 e 1982), Kenneth &

Yetta Goodman (1970 e 1976), Frank Smith (1972) Gibson (1976), Van Allen (1976), Mary Clay (1975 e 1976), Vygotsky (tg7g e 1980), Luria (1983), Foucambert (1976), Lenlin (1978) e Read (1975).

No desenrolar desse processo, começaram a surgir os conflitos e os questionamentos. Surgiram as perguntas que foram delineando melhor os objetos da investigação.

Como vemos as crianças, hoje? O que sabemos delas, dos seus processos de desenvolvimento, da construção de seus conhecimentos, da ampliação de suas visões de mundo? Como essas crianças vêem o mundo em que vivem? Quais as suas condições de vida? O que dizem sobre o mundo? Sobre a vida? Como? O que conhecem sobre a escrita no contexto em que vivem? Como adquirem esses conhecimentos? Como interagem com esse objeto cultural - a escrita - e como interpretam o ato de leitura? Qual a função do adulto nesse processo? Qual a função da escola nesse processo?

Considerando então o contexto acadêmico das primeiras séries do 1° grau, e trabalhando com um grupo de alunas e professoras interessadas, retomei a idéia inicial da descontextualização da escrita (agora muito mais ciente das limitações da primeira proposta de pesquisa) e, como grupo, optamos por ter uma entrevista com cada criança, com o objetivo de conhecer e evidenciar os conhecimentos e as estratégias das crianças ingressantes e repetentes da 1 série, com relação à linguagem escrita.

Com base nos estudos e observações anteriores, colocavam-se então como pressupostos para o nosso trabalho:

A) A escrita está inserida em diversos contextos. Tem vários tipos, formas, tamanhos e cores. Estes "detalhes" ou configurações constituem importantes elementos de leitura, para os quais as crianças atentam e

  1. Que tipo de categorias estabelecer diante da variedade dos dados coletados? Como construir um quadro que revelasse ao mesmo tempo o perfil de cada classe e os conhecimentos e as estratégias individuais de cada criança? Era necessário construir tal quadro?
  2. Com relação ao próprio instrumento na consideração do que é "marca", "produto', "símbolo", etc., surgiram questões que remetem a um estudo muito mais aprofundado de semiologia, hermenêutica, comunicação de massas...
  3. E o problema da interpretação? As características individuais próprias de cada pessoa, o que cada entrevistador percebe e considera relevante no momento, a relação ou interação que se estabelece no momento da entrevista com a criança, a experiência passada do entrevistador e da criança, o que cada criança interpreta como expectativa do adulto entrevistador, são alguns fatores que interferem obviamente nos "resultados" da sondagem.
  4. O número de relações e correlações que se podem estabelecer perante os dados tabulados de uma pesquisa vai depender do ponto de vista do pesquisador; vai variar ou se ampliar de acordo com aquilo que lhe interessa mais especificamente; vai depender daquilo que o pesquisador pode ou quer ver como resultado. Mas uma outra perspectiva se abre se, ao invés de nos centrarmos nos "resultados", explorarmos o conjunto de circunstâncias e procurarmos analisar as múltiplas relações que "produzem" determinados resultados. .. Em se tratando da produção oral e escrita na escola quantas posições e quantas relações deveríamos levar em conta.

Após um longo estudo do material, e considerando a sondagem, realmente, como um dos pontos iniciais do trabalho, optamos por organizar as respostas das crianças em categorias, que evidenciassem seus conhecimentos e indicassem, tentativamente, uma progressão em termos de

desenvolvimento de noções infantis sobre a escrita (Anexo II). O que se evidenciou, claramente, é que, se existe uma progressão neste sentido, ela é absolutamente alterada e transformada em função- dos contextos de interação, informação e ensino nas escola. De qualquer forma, a organização dessas categorias gerou, posteriormente, a elaboração de um roteiro básico de observação, com o objetivo de indicar para as professoras alguns aspectos e detalhes que merecem atenção no processo de alfabetização escolar. Esse roteiro básico tem sido objeto de estudo e discussão de vários grupos de professoras e tem sido complementado, trabalhado e transformado de várias formas (Anexo III).

O trabalho de Ferreiro evidenciava bem as contradições entre os métodos de ensino empregados na escola e os processos de aprendizagem vividos e elaborados pelas crianças. E, de fato, pudemos perceber, nesta sondagem inicial com as crianças, alguns pontos de conflito no contexto escolar da alfabetização (evidenciados depois, no trabalho em sala de aula) nas primeiras séries:

  1. As crianças tem, basicamente, noções das funções da escrita para nomear, identificar, mostrar, indicar, informar, comunicar. Mas esta noção é muitas vezes truncada pela maneira como a escrita é apresentada na escola. (Os objetivos da escrita, na escola, alteram e limitam as noções das funções da escrita.)
  2. As crianças não revelam "conhecimentos metalingüísticos", no sentido de um "distanciamento" da linguagem. Pelo contrário revelam tentativas de aproximação e interpretação, levantando hipóteses e suposições (o que não é considerado pela escola pois essas tentativas implicam ."erros" e a escola não aceita erros). As crianças usam os termos "letra", "sílaba", "palavra", "oração" indistintamente, e indicam não terem esclarecimentos sobre isso: muitas vezes, as letras são apresentadas por

conhecimentos acadêmicos, isto é, serve de justificativa para que "não se ensine nada a elas". Em suma, um tipo de "carência" serve de pretexto para uma "carência" maior.

  1. Apareceu, por exemplo, uma distinção nítida entre crianças que fizeram e crianças que não fizeram a pré-escola. Pode-se concluir que a pré-escola tem transmitido alguma informação sobre letras e números para as crianças. Isso não quer dizer que essas informações sejam sempre "claras e adequadas", no que diz respeito A função e ao mecanismo da leitura. Pelo contrário, vemos crianças com informações ambíguas e inadequadas e já muito preocupadas com o "desempenho acadêmico".
  2. Por outro lado as crianças repetentes revelam o mesmo nível de conhecimento das crianças ingressantes que fizeram pré-escola e, como elas, demonstram desconhecimento metalingüístico, falta de percepção da relação entre dimensão sonora e extensão gráfica, inadequação de várias informações sobre a escrita além de muitos "vícios" devidos aos métodos de alfabetização empregados. Os perfis das classes de crianças ingressantes com pré-escola e crianças repetentes assemelham-se bastante. E este é um dado extremamente preocupante: o que fez a escola durante o ano (ou nestes anos, no caso de mais de um ano de repetência) com relação às crianças e à linguagem escrita? Por que as crianças não se desenvolveram? Como a escrita foi apresentada para elas? E para que servia?
  3. Outro problema que se evidenciou foi com relação a crianças repetentes alfabetizadas, que liam e escreviam tudo no início do ano ,

Mas cometiam vários "erros" de ortografia. Isto indica o desconhecimento, por parte das professoras, dos processos de aquisição da linguagem escrita na criança; a rigidez com relação "ao cumprimento do programa", cujo parâmetro é o "término da cartilha", e a inflexibilidade no processo de avaliação, que levam estas crianças a repetirem a 1 série. Mais

do que isso, indica um padrão de "escrita ideal, correta e adulta", diante da qual as crianças são avaliadas...

Nosso trabalho, como já foi dito, não se limitou à sondagem inicial. Havia, fundamentalmente, uma proposta pedagógica que norteava e articulava este trabalho. Interagindo com as crianças durante o ano, não em situações de leste, mas convivendo com elas e com as professoras, fomos registrando, dentro do possível, dados que considerávamos relevantes e significativos (e que não dizem respeito apenas a leitura e escrita).

Obviamente, isto dependia do que vamos ou podíamos ver no momento. E o que percebamos, observávamos e procurávamos analisar era justamente os complexos contextos de situações que não apenas interferem, mas efetivamente produziam certos resultados ou efeitos no processo escolar da alfabetização das crianças.

Novamente se evidenciava a necessidade de se buscar conhecer e compreender os processos de leitura e escritura no jogo das interações sociais. E isso nos levantava novos problemas.

Salas de aula, relações de ensino

Foi precisamente a necessidade de analisar o contexto, de pensar a alfabetização (ou o desenvolvimento/ensino/aquisição da escrita) em termos de interação e interlocução, que fui evidenciando ao longo destes anos de trabalho - para situar essa tarefa pedagógica no seu 2mbito técnico, prático, mas sobretudo teórico e poético. Embutida nessa necessidade, a procura do que era relevante e significativo. Ou seja, na diversidade dos métodos, na diferença das práticas, na variedade das técnicas, na dificuldade das condições, na dispersão dos interesses, na atribuição de