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A formação do símbolo na criança.pdf, Esquemas de Tradução

regulamentação típica. A FORMAÇÃO DO SÍMBOLO NA CRIANÇA. Imitação, jogo e Sonho Imagem e Representação. JEAN PIAGET. Tradução de ÁLVARO CABRAL.

Tipologia: Esquemas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Este livro foi digitalizado para uso exclusivo de deficientes visuais, conforme a legislação
pertinente de direitos autorais.
Nota do digitalizador:
A tradução das obras de Jean Piaget para a língua portuguesa criaram um erro
sistemático que merece consideração:
O termo jeu, em francês, isoladamente, quer dizer brincadeira e não jogo, como é
costumeiramente traduzido. Quando o autor disser, por exemplo, o jogo do bebê, jogo de
exercício, jogo simbólico, etc, entendam brincadeira do bebê, brincadeira de exercício,
brincadeira simbólica. Em português o termo jogo de regras refere-se ao que denotamos
por jogo, simplesmente. Assim, os jogos de regras, para nós são sempre jogos quaisquer,
pois todos possuem regras, ao contrário das brincadeiras, que são livres daquela
regulamentação típica.
A FORMAÇÃO DO SÍMBOLO NA CRIANÇA
Imitação, jogo e Sonho Imagem e Representação
JEAN PIAGET
Tradução de ÁLVARO CABRAL
e CHRISTIANO MONTEIRO
Terceira Edição
Título original:
La Formation du Sembole chez l'enfant imitation, Jeu et Rêve, image et Représentation
Traduzido da terceira edição, publicada em 1964, por Editions Delachaux et Niestlé,
Neuchâtel, Suíça.
Copiright (c) 1964,
INTRODUÇÃO
Os últimos trabalhos que consagramos ao desenvolvimento do pensamento racional na
criança - A Génese do Número e O Desenvolvimento das Quantidades na Criança. -
focalizaram -a constituição dos diversos sistemas operatórios em jogo na logicização e na
matematização nascentes do real, pelo que o pensamento intuitivo ou representativo
foi abordado, assim, de modo algo negátivo : tratava-se, sobretudo, de mostrar a sua
insuficiência e a intervenção necessária das operações, propriamente ditas, para
completar e corrigir êsse pensamento. Mas a representação imaginada, ou intuitiva,
suscita uma série de problemas que convém examinar por si mesmos, em função da sua
própria gênese e não apenas da sua inserção final no quadro das operações (ou, mais
precisamente, das articulações progressivas que a transformam, pouco a pouco, em
pensamento operatório e reversível). Importa, pois, reconstituir os inícios da
representação e procurar compreender o seu funcionamento específico; então será
possível elucidar as questões das relações entre a intuição e as operações, nos casos
em que a primeira se prolonga nas segundas, e naqueles, também numerosos, sem
dúvida, em que a representação imaginada conserva a sua vida própria, fora das
segundas, como no jogo, na imitação, no pensamento simbólico etc.
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Este livro foi digitalizado para uso exclusivo de deficientes visuais, conforme a legislação pertinente de direitos autorais.

Nota do digitalizador: A tradução das obras de Jean Piaget para a língua portuguesa criaram um erro sistemático que merece consideração: O termo jeu, em francês, isoladamente, quer dizer brincadeira e não jogo, como é costumeiramente traduzido. Quando o autor disser, por exemplo, o jogo do bebê, jogo de exercício, jogo simbólico, etc, entendam brincadeira do bebê, brincadeira de exercício, brincadeira simbólica. Em português o termo jogo de regras refere-se ao que denotamos por jogo, simplesmente. Assim, os jogos de regras, para nós são sempre jogos quaisquer, pois todos possuem regras, ao contrário das brincadeiras, que são livres daquela regulamentação típica.

A FORMAÇÃO DO SÍMBOLO NA CRIANÇA

Imitação, jogo e Sonho Imagem e Representação JEAN PIAGET Tradução de ÁLVARO CABRAL e CHRISTIANO MONTEIRO Terceira Edição Título original: La Formation du Sembole chez l'enfant imitation, Jeu et Rêve, image et Représentation Traduzido da terceira edição, publicada em 1964, por Editions Delachaux et Niestlé, Neuchâtel, Suíça. Copiright (c) 1964,

INTRODUÇÃO

Os últimos trabalhos que consagramos ao desenvolvimento do pensamento racional na criança - A Génese do Número e O Desenvolvimento das Quantidades na Criança. - focalizaram -a constituição dos diversos sistemas operatórios em jogo na logicização e na matematização nascentes do real, pelo que o pensamento intuitivo ou representativo só foi abordado, assim, de modo algo negátivo : tratava-se, sobretudo, de mostrar a sua insuficiência e a intervenção necessária das operações, propriamente ditas, para completar e corrigir êsse pensamento. Mas a representação imaginada, ou intuitiva, suscita uma série de problemas que convém examinar por si mesmos, em função da sua própria gênese e não apenas da sua inserção final no quadro das operações (ou, mais precisamente, das articulações progressivas que a transformam, pouco a pouco, em pensamento operatório e reversível). Importa, pois, reconstituir os inícios da representação e procurar compreender o seu funcionamento específico; só então será possível elucidar as questões das relações entre a intuição e as operações, nos casos em que a primeira se prolonga nas segundas, e naqueles, também numerosos, sem dúvida, em que a representação imaginada conserva a sua vida própria, fora das segundas, como no jogo, na imitação, no pensamento simbólico etc.

E mais. Antes de analisarmos a gênese das operações, tínhamos estudado - em O Nascimento da Inteligência na Criança e em A Construção do Real' na Criança - a inte ligência sensório-motora anterior à linguagem, isto é, a forma de inteligência que prepara, no terreno da ação elementar, o que mais tarde se converterá em operações do pensamento refletido. Portanto, convém agora procurar estabelecer a ponte entre a atividade sensório-motora que precede a representação, de um lado, e as formas opera- 10 tórias do pensamento, do outro lado; e o problema equivale, de nôvo, a reconstituir os primórdios do pensamento representativo e a situar a sua evolução entre as duas fases extremas do sensório-motor e do operatório. É evidente que, tomados em sua mais lata acepção, êsses diversos problemas suscitariam o do papel da linguagem. Mas esta questão já foi abundantemente estudada. Por outra parte, nós também a abordamos em duas de nossas obras - A Linguagem e o Pensamento na Criança e O Juízo e o Raciocínio na, Criança - do ponto de vista da socialização do pensamento. Não voltaremos, pois, a abordá-la aqui, senão a propósito dos primeiros esquemas verbais e dos "pré-conceitos", tão característicos do nível de dois a quatro anos. Esforçar-nos-emos, pelo contrário, em, mostrar que a aquisição da linguagem também está subordinada ao exercício de uma função simbólica, a qual tanto se afirma no desenvolvimento da imitação e do jogo quanto no dos mecanismos verbais. Os domínios em que vamos, sobretudo, estudar os inícios da representação infantil são, portanto, aquêles em que os processos individuais da vida mental predominam sobre os fatores coletivos, e nisso insistiremos mesmo no caso da imitação, que conduz à constituição de relações interindividuais •sem delas derivar univocamente. Mas limitar- nos-emos às questões da gênese da representação em geral, só abordando a descrição das representações particulares na medida em que os fatos convergirem com os que já foram focalizados em nossas obras anteriores, A Representação do Mundo na criança e A Causalidade ~ na Criança. Assim delimitados, os problemas que teremos de examinar no presente volume são ainda muito amplos. Trata-se, em primeiro lugar, e será êsse o objetivo da primeira parte deste livro, de reconstituir a gênese da imitação. 1 Já formulamos a hipótese (em O Nascimento da Inteligência) de que a representação deriva, em parte, da própria imitação. No seu admirável livro De lacte d Ia pensée, que versa os mesmos problemas de que nos vamos ocupar no presente volume, Wallon defendeu um ponto de vista análogo, o que Indicamos em português os títulos das obras de J. PIAGET porque já as traduzimos ou vamos traduzir para esta Editóra. Os demais livros citados pelo Autor vão com os títulos originais. (N. do T.) 1 Tínhamos anunciado um volume especial sóbre êste assunto. Para abreviar, fundimos o seu conteúdo nas páginas seguintes. é mais uma razão para reexaminarmos a mesma questão à luz dos :atos anteriormente reunidos sobre os nossos próprios filhos. Longe de podermos adotar todas as teses de Wallon, seremos levados, aliás, a rebatê-las muitas vêzes. Mas a imitação constitui apenas uma das fontes da representação, à qual fornece, essencialmente, seus "significantes" imaginados. No outro extremo, e do ponto de vista das significações, sobretudo, pode-se considerar o jogo, ou atividade lúdica, como conduzindo igualmente da ação à representação, na medida em que evolui da sua forma inicial de exercício sensório-motor para a sua segunda forma de jogo simbólico ou jôgo

mostrar como o símbolo é preparado pelo esquematismo pré-representativo. Quanto ao espírito, desenvolver-se-á por si mesmo, indubitavelmente. A nossa segunda tese é a da interação das diversas formas de representação. Há representação quando se imita um modelo ausente. Assim acontece no jogo simbólico, na ima ginação e até no sonho. Enfim, o sistema de conceitos e relações lógicas supõe a representação, quer em suas formas operatórias quer nas intuitivas. Quais são, pois, os elementos comuns a essas diversas representações e poder-se-á sustentar que elas comportam mecanismos comparáveis? A psicologia associacionista clássica resolvia facilmente o problema fazendo derivar todas as representações de uma realidade única e simples: a imagem, continuação direta da sensação. Mas a própria imagem cria um problema, visto que, longe de prolongar imediatamente a percepção como tal, não parece intervir na vida mental antes do segundo ano de vida e faz-se mister procurar compreender como. Além disso, é apenas um significante, ou um símbolo, e impõe-se precisamente estudar, a fim de compreender- mos o seu papel, as relações entre os diversos significantes e as diversas significações, em suma, toda a atividade representativa. Uma segunda maneira de resolver todos os problemas consiste em recorrer à vida social. Após tentar explicar as formas elementares da vida mental, da emoção em nível "projetivo" e da "inteligência das situações", pela intervenção, em fases sucessivas, de sistemas fisiológicos integrando cada um os precedentes, mas sem se prepararem mutuamente numa continuidade funcional, Wallon recorreu, para explicar a representação, a fatores sociais como o rito, o mito, a linguagem e as formas superiores de imitação. Mas a questão que se põe, nesse caso, é a de saber por que e como a criança sofreu, em tal ou tal momento exato, a influência de tais ou tais relações sociais: assim é que a linguagem se adquire numa certa idade e não noutra, segundo uma certa ordem e não uma outra, e só se transforma, pois, em pensamento, na medida em que este se encontra apto a se deixar transformar. Por conseqüência, não é a vida social em bloco que a Psicologia deve invocar, mas uma série de relaxes que se estabelecem, segundo todas as combinações possíveis, entre indivíduos de níveis distintos quanto ao desenvolvimento mental e em função de diferentes tipos de interação (pressão, cooperação, imitação, discussão etc.). Em sua última obra, Wallon censura-nos o fato de negligenciarmos o papel da vida social na gênese da representação "Ele reduz aos fatores puramente individuais da motricidade poderes tais como o uso do símboio e a expressão do pensamento, que só podem pertencer a um ser essencialmente social, e restringiu de maneira inadmissível os fundamentos da vida mental" - assim se expressou Wallon a nosso respeito. Ora, essa objeção é tanto mais impressio- De l'acte d la pensée, pág. 45. a Loa. cit., págs. 4b-46. 14 15 nante porquanto, num texto anterior, 4 Wallon nos acusava exatamente do contrário e queria que os progressos do pensamento lógico explicassem os da cooperação social, ao passo que nos atribuía a opinião inversa. Nós lhe havíamos concedido então que os fatores sociais nada explicam por si sós, se bem que a sua intervenção seja necessária ao desabrochar da razão. Fiel ao mesmo ponto de vista, responder-lhe-emos hoje que se a vida social, evidentemente, desempenha um papel essencial na elaboração do conceito e dos esquemas representativos vinculados à expressão verbal, ela não explica por si só,

entretanto, os inícios da imagem ou do símbolo, tal como se observam na imitação diferida ou nos primeiros jogos de imaginação da criança de um ano. E mais: nenhum sociólogo conseguiu ainda demonstrarnos a origem social dos símbolos "anatômicos" inconscientes com que nos deparamos no sonho, nem das imagens do estado transitório de sonolência! O problema que vamos discutir no presente volume é, portanto, o da própria função simbólica, como mecanismo comum aos diferentes sistemas de representações, e como mecanismo individual cuja existência prévia é necessária para tornar possíveis as interações do pensamento entre indivíduos e, por conseqüência, a constituição ou aquisição das significações coletivas. Isso não implica, de modo algum, que contestemos a natureza social daquelas, muito pelo contrário, pois tentamos constantemente demonstrar que a razão supõe a cooperação e a reciprocidade. Mas o fato social é, para nós, um fato a explicar e não a invocar como causa extrapsicológica. É por isso que o estudo da função simbólica nos parece dever abranger todas as formas iniciais de representação, da imitação e do símbolo lúdico ou onírico até ao esquema verbal e às estruturas pré-conceptuais elementares. Só então a unidade funcional do desenvolvimento que conduz da inteligência sensório-motora à inteligência operatória aparecerá através de sucessivas estruturas, individuais ou sociais; o equilíbrio progressivo entre a assimilação das coisas à atividade do sujeito e a acomodação deste àquelas redunda, com efeito, na reversibilidade que caracteriza essas ações interiorizadas, que são as operações

  • Bull. Soc. Franç. de Philos., ano XXVIII (Colin, 1928), n.0 4: Les trois systèmes de la pensée de l'enfant (ver a intervenção de Wallon). da razão: ao passo que o primado da acomodação distingue a imitação e a imagem, o da assimilação explica o jogo e o único símbolo "inconsciente". e Este volume já estava sendo impresso quando recebemos de Wallon o seu belo trabalho sobre Les origines de la pensée chez (enfant. Lamentamos tanto mais não nos ter sido possível tomar em consi deração esse livro porquanto Wallon, reatando no seu novo estudo os métodos de interrogatório de que nos servimos outrora, faz que nos encontremos, no terreno do próprio pensamento, de acordo num grande número de pontos essenciais. PRIMEIRA PARTE Como foi estabelecido por M. P. Guillaume num livro que renovou a questão, a imitação não assenta numa técnica instintiva ou hereditária: a criança aprende a imitar e essa aquisição suscita, tanto quanto as demais, todos os problemas relativos à construção sensório-motora e mental. Esta conclusão continuaria sendo válida mesmo que a tendência para imitar comportasse um componente transmitido por hereditariedade, visto que uma coisa é uma tendência e outra coisa muito diversa é a técnica que lhe permite desenvolver-se. Iremos ainda mais longe e consideraremos a imitação pré-verbal da criança uma das manifestações da sua inteligência. Ao acompanharmos, passo a passo, a formação da imitação durante os dois primeiros anos, somos impressionados, com efeito, pela atividade propriamente dita que ela manifesta; durante esse período, a imitação nada tem de "automática" ou de "involuntária" (na acepção de não-intencional) mas, pelo contrário, denuncia bem depressa a existência de coordenações inteligentes, tanto na aprendizagem dos meios que emprega como nos seus próprios fins. Além disso, existe uma conexão estreita, como veremos, entre as fases da imitação e as seis fases que

precedentes. A esse ponto de vista, natural para o clínico, o psicólogo desejoso de aproveitar os ensinamentos da embriologia experimental só pode opor o de uma 1 De Pacte à la pensée, pág. 157. 20 AUSENCIA DE IMITAÇÃO, ESPORÁDICA E SISTEMÁTICA sonolência, sem dormir propriamente dito, quando um dos outros bebês começa gritando; não tarda que ele não chore também. Aos 0;0 (4) e 0;0 (6), geme primeiro e, depois, chora realmente quando eu tento imitar os seus vagidos entrecortados. Um simples assobio ou quaisquer outros gritos não despertam, em contrapartida, reação alguma. Pode-se interpretar essas observações banais de duas maneiras, embora nenhuma delas nos pareça autorizar ainda a falarmos de imitação. Em primeiro lugar, é pos sível que o choro dos seus vizinhos desperte simplesmente o recém-nascido e o excite desagradavelmente, sem que ele estabeleça uma relação entre os sons ouvidos e os seus próprios, ao passo que um assobio ou um grito deixam-no indiferente. Porém, pode ser também que o choro se engendre pela, sua própria repetição, graças a uma espécie de "exercício reflexo" análogo ao que notamos a propósito da sucção 4 mas com reforço da fonação por intermédio do ouvido (da audição dos sons emitidos em virtude dessa mesma fonação). Neste segundo caso, os gritos dos outros bebês reforçariam o reflexo vocal por confusão com os sons próprios. Num caso e no outro, vê-se que não há imitação, portanto, mas simples deflagrar do reflexo por um excitante externo. Acontece que, se os mecanismos reflexos não en gendram, assim, imitação alguma, o seu funcionamento implica, entretanto, certos processos que tornarão possível a imitação no decurso das fases seguintes. Na medida em que o reflexo conduz a repetições, as quais perduram além da excitação inicial (cf. a sucção em seco etc.), é porque se exerce por assimiliação funcional e esse exercício, sem constituir ainda uma aquisição em função da experiência exterior, torná-la-á possível com os primeiros condicionamentos. A transição opera-se de um modo tão insensível que é muito difícil saber, no caso da obs. 1, se se trata de um início de condicionamento ou não. Mas, se a segunda das duas interpretações for a boa, quer dizer, se o choro escutado reforçar o choro próprio por confusão ou indiferenciação, então vê-se despontar o momento em que o exercício reflexo dará lugar a uma assimilação reprodutora por incorporação de elementos exteriores ao próprio esquema reflexo: nesse caso, as primeiras imitações serão possíveis.

  • N. I., cap. I, §§ 1-2. 21 comparação mais completa entre a psicogênese e a organogênese : as diversas fases que a embriologia distingue na construção do corpo vivo não são apenas, com efeito, caracterizadas por uma seqüência de estruturações distintas e descontínuas, mas também por uma dinâmica cujo funcionamento requer, simultaneamente, a continuidade e uma certa direção, devendo esta ser concebida como uma tendência para o equilíbrio ou estado final do crescimento. Foi por isso que, ao estudarmos o nascimento da inteligência (ver N. L), tivemos de remontar até o reflexo para acompanhar, sem praticarmos cortes arbitrários, a atividade assimiladora que culminou na organização de esquemas adaptados finais, pois só um princípio de continuidade funcional permite interpretar a diversidade infinita das estruturas. Analogamente, portanto, se chamamos imitação ao ato pelo qual um modelo é reproduzido (o que em nada implica a representação desse modelo, porquanto pode ser

simplesmente "percebido"), encontramo-nos também na obrigação de acompanhar passo a passo, segundo as mesmas fases das atividades sensório-motoras em geral, todas as condutas que podem culminar nesse resultado, e isso a partir dos reflexos. §1. A PRIMEIRA FASE: A PREPARAÇÃO REFLEXA. - A reprodução de um modelo parece implicar um elemento de aquisição em função da experiência; iden ticamente, a imitação parece dever ser excluída, de certo modo por definição, do nível dos reflexos puros. Mas tantos espíritos esclarecidos acreditaram numa hereditariedade da imitação (como técnica e não apenas como tendência), que vale a pena examinar a questão. Partamos unicamente dos fatos que pudemos recolher, a tal respeito, da observação dos nossos próprios filhos: s Obs. 1. - T., desde a noite seguinte ao seu nascimento, é despertado pelos recém- nascidos seus vizinhos no berçário e põe-se a chorar em coro com eles. Aos 0;0 (3), encontra-se num estado de 2 Diz, por exemplo, BRACHET: "Em embriologia, deve-se ter sempre presente no espírito o valor real da palavra desenvolvimento; ela significa que todas as formas e todos os órgãos se constroem por uma série lenta e progressiva de complicações, que se encadeiam estreitamente e só param quando o estado adulto é alcançado." La vie créatice des formes, Alcar. (1927), pág. 171. 3 J. = Jacqueline, L. = Lucienne, e T. = Laurent. 22 AUSIÉNCIA DE IMITAQxO, ESPOR,(DICA E SISTEMÁTICA 23 §2. A SEGUNDA FASE: IMITAÇÃO ESPORÁDICA. - A segunda fase é caracterizada, precisamente, pelo fato dos esquemas reflexos começarem assimilando certos elementos exteriores e ampliando-se, assim, em função de uma experiência propriamente adquirida, na forma de reações circulares "diferenciadas". Por exemplo, no domínio da sucção, o esquema reflexo enriquece-se de novos gestos, como o de introduzir sistematicamente o polegar na boca. O mesmo acontece quando os gritos reflexos se diferenciam em vagidos ou em vocalizações reproduzidas com o mero intuito de exercê-las, quando a visão se prolonga em acomodação aos movimentos do objeto, e assim por diante. Ora, é na exata, medida em que os esquemas incorporam elementos novos que a acomodação a esses elementos é suscetível de prolongar-se em imitação, desde que os modelos propostos lhes sejam idênticos; com efeito, a acomodação aos novos dados evolui paralelamente, durante essa segunda fase, à possibilidade de reencontrá-los por assimilação reprodutora. Assim é que, na medida em que a criança acomoda o seu olvido e a sua fonação a um novo som que diferencia os seus vagidos, ela passa a ser capaz de reproduzi-los por reações circulares. Logo, bastará que o sujeito ouça o som em questão, mesmo no caso de não ter sido ele quem acabou de o emitir, para que o som ouvido seja assimilado ao esquema correspondente e a acomodação do esquema a esse dado se prolongue em imitação. Portanto, duas condições são necessárias para que surja a imitação: que os esquemas sejam suscetíveis de diferenciação na presença dos dados da experiência, e que o mo delo seja percebido pela criança como análogo aos resultados a que ela própria chegou; logo, que esse modelo seja assimilado a um esquema circular já adquirido. Essas duas condições são preenchidas, no caso da fonação, a partir, especialmente, do segundo mês

Aos 0;6 (26), pelo contrário, tem início uma fase de imitação muito mais sistemática que caracteriza a terceira fase (J. está atrasada em relação a seu irmão e à sua irmã. Ver N. 1.). Obs. 4. - L. emite espontaneamente o som rrrá a partir de 0;1 (21), mas não reage tão logo eu o reproduzo. Ao 0;1 (24), pelo contrário, quando faço aa, de um modo prolongado, ela emite duas vezes um som análogo, se bem que estivesse calada há mais de um quarto de hora. Ao 0;1 (25), olha para mim quando faço á, asa, asa, rra etc. Observo alguns movimentos de sua boca, não de sucção mas de vocalização. Consegue emitir uma ou duas vezes sons bastante vagos, sem imitação propriamente dita mas com contágio vocal evidente. Ao 0;1 (26), quando faço rrrá, ela responde com uma espécie de rrr Tolados: oito provas positivas contra três negativas. J. nada diz durante os intervalos. - A mesma observação no dia seguinte, aos 0;2 (2) etc. Aos 0;3 (5), observo uma diferenciação no seu riso, sob a forma de certos sons baixos e redondos. Imito-os: ela responde reproduzindo-os com bastante nitidez, mas o fato não se produz quando ela não os emitiu imediatamente antes. Aos 0;3 (24), ela imita acta e, vagamente, arrr, nas mesmas circunstâncias, isto é, quando existe uma imitação mútua. Nada de novo até por volta de 0;5. Três características definem, segundo nos parece, essa imitação vocal nascente, própria da segunda fase: Em primeiro lugar, há contágio vocal nítido a partir do momento em que o sujeito torna-se capaz de reações circulares relativas à fonação. Por outras palavras, a voz de outrem excita a voz da criança, quer se trate de choro ou de quaisquer outros sons. No primeiro caso, o contágio é quase automático, dada, sem dúvida, a emoção concomitante do gesto vocal. No segundo, pelo contrário, o contágio está sujeito a duas espécies de condições restritivas. Para excitar a voz do bebê, a voz de outrem deve, por um lado, reproduzir certos sons familiares, já emitidris pela criança, ou certas entonações etc., sem que o sujeito se restrinja por isso a imitar esses mesmos sons em todas as suas particularidades. Por outro lado, é preciso que a criança se interesse pelos sons ouvidos; logo, o contágio nada tem de automático mas apresenta-se, outrossim, como uma espécie de reação circular com suas características de espontaneidade. Em resumo, o contágio vocal nada mais é do que uma excitação da voz da criança pela voz de outrem, sem imitação precisa dos sons escutados. Em segundo lugar, há imitação mútua, com um arremedo de imitação precisa, quando o experimentador imita a criança no momento em que esta se entrega à repetição de tal ou tal som determinado; neste caso, o sujeito redobra de esforços e, excitado pela voz de outrem, imita por sua vez o som imitado pelo seu parceiro. É evidente que, em tal caso (por exemplo, T. repetindo las e le aos 0;2 (11), após ter emitido esses sons espontaneamente, no início da experiência), a imitação só é precisa na medida em que o experimentador imita a própria criança; portanto, esta não faz esforço para adaptar-se ao som ouvido mas, simplesmente, para conservar aquele que emitira momentos antes e a imitação prolonga diretamente a reação circular. Em terceiro lugar, acontece esporadicamente a criança imitar com relativa precisão um som conhecido (isto é, um som que ela já descobriu espontaneamente), sem que o

tivesse emitido logo antes. Por exemplo, T., aos 0;2 (17), imita o som arrr sem exercício prévio e faz esforço para adaptar-se-lhe. Mas, durante essa fase, um tal comportamento é muito excepcional e episódico. A f ortiori, a criança dessa fase jamais procura imitar um som novo como novo. Que concluir desses fatos? Guillaume, citando observações análogas desde o final do segundo mês (pág. 33), diz que, "nos cinco primeiros meses, não se registra qual quer aparência de imitação, se excetuarmos os fatos de natureza inteiramente excepcional" (pág. 36), como o seguinte: durante duas semanas, de 0;2 (ll) a 0;2 (26), um de seus filhos imita os principais sons que lhe são familiares (gu, pu, re) (pág. 44). Stern assinala um fato análogo aos dois meses, Ferretti aos três meses, dez aos três e quatro meses (pág. 45) etc. Certamente, podemos recusar-nos a chamar imitação à simples excitação da voz pela de outrem, mas a questão que se põe é saber se, como Guillaume parece indicar, há descontinuidade entre essa conduta e a imitação propriamente dita, ou se existe uma relativa continuidade. Na explicação baseada nos mecanismos de transferência, que foi aquela que este autor primeiro cogitou, é legítimo admitir a descontinuidade. Mas se a imitação prolonga, sem mais, a assimilação reprodutora, limitando-se a desenvolver sempre mais o elemento de acomodação inerente às reações circulares, o contágio vocal é, efetivamente, o inico da imitação fônica: pelo menos, parece-nos que todos os intermediários se apresentam entre os fatos precedentes e os das fases ulteriores. 26 27 No que diz respeito agora à visãw, certos fatos parecem constituir, do mesmo modo, a partir dessa fase, um princípio de imitação: referimo-nos às condutas por meio das quais a criança prolonga os seus movimentos de acomodação aos deslocamentos do rosto de outrem Obs. S. - L., ao 0;1 (26), movimenta espontaneamente a cabeça para um lado e para outro. Ao 0;1 (27), ela olha para o. meu rosto quando inclino rapidamente a cabeça da esquerda para a direita: ela reproduz logo esse gesto, três vezes. Recomeço, após uma pausa; ela recomeça também e, coisa a assinalar, reproduz esse movimento com muito maior nitidez quando eu concluí o meu do que durante a percepção. Reato a experiência nos dias seguintes e o resultado é constantemente o mesmo. Aos 0;2 (2), em especial, ela prolonga claramente e de cada vez o movimento percebido. Na tarde do mesmo dia, ela comporia-se identicamente a propósito de um movimento diferente: eu baixo e levanto a cabeça (para trás e para a frente, em vez de faz§-lo lateralmente, como antes) e L. segue-me com os olhos enquanto me mexo e move ligeiramente a cabeça; depois, quando paro, ela reproduz o meu movimento, marcando- oK com muito maior clareza. Tudo ma passa, pois, como se, durante a percepção, ela se limitasse a acomodar os movimentos de seus olhos e de sua cabeça ao movimento percebido e como se, após a percepção, a sua acomodação se prolongasse numa imitação nítida. Mas não se trata de uma pura acomodação perceptivo-motora porque, logo após o fato precedente, L. continua baixando e levantando a cabeça quando eu recomecei abanando-a lateralmente: fica imóvel a olhar para mim, enquanto mexo a cabeça para um lado e para outro e, depois, quando paro, ela balança a cabeça verticalmente.e

Foi a esse mecanismo que V. WEIZSÄCKER passou a chamar depois Der Gestaltkreis (1941). 28 Logo, toda a acomodação aos dados exteriores tende a repetir-se, porquanto indiferenciada da própria assimilação reprodutora; e, tão cedo a acomodação ultrapassa o nível do puro reflexo para passar a ter em conta a experiência, essa repetição de todo o ato constitui a reação circular primária. Nas circunstâncias comuns, isto é, quando a atividade do objeto,não alimenta, por uma convergência especial, a do sujeito, essa tendência para a repetição manifesta-se, simplesmente, sob a forma de uma necessidade de alimentar a percepção, mas esta cessa com ou pouco depois do desaparecimento do objeto ou do espetáculo percebido. Mas quando, por exceção, o próprio objeto responde à atividade assimiladora do sujeito, alimentando-a do exterior, a acomodação ao objeto prolonga-se para além da percepção e é esse fenômeno, precisamente, que constitui o começo da imitação. Assim é que a convergência entre a voz de outrem e a fonação própria do sujeito alimenta a última, como acabamos de verificar. Mas se o exemplo da fonação nos permitiu, simplesmente, constatar o fato, o da visão dos movimentos do rosto de outrem permitiu-nos analisar o seu mecanismo. Neste caso, com efeito, a criança é obrigada, para acompanhar os movimentos da pessoa para quem olha, a fazer exatamente os mesmos movimentos de cabeça que o modelo (e isso muito antes de saber, é claro, que existe uma semelhança entre o rosto de outrem e o seu). Logo, para conservar a sua percepção dos movimentos de outrem (isto é,_ para continuar a ver o rosto de outrem se deslocando), basta à criança reproduzir os seus próprios movimentos de acomodação: logo que sacode a cabeça, verifica que a de outrem também parece abanar de novo. Esta imitação, aliás, nada tem de específico em relação ao rosto de outrem, pois os movimentos da mão, de uma argola etc. desencadeiam a mesma reação; portanto, é o movimento como tal, desde que visualmente percebido, que é imitado e não apenas os movimentos da cabeça. A imitação nascente manifesta-se, pois, num tal exemplo, como um simples prolongamento dos movimentos de acomodação, na medida em que estes, bem entendido, fazem parte de uma reaçãd circular já constituída ou de uma atividade assimiladora global. Ora, no que diz respeito à fonação anteriormente examinada, o fenômeno é exatamente idêntico, salvo no tocante ao conteúdo da percepção a conservar. Quando palra ou emite seus vagidos, a criança percebe um som que deseja manter ou repetir; e, como essa percepção faz parte de um esquema global de assimilação simultaneamente fônico e auditivo (é no momento em que a voz e o ouvido se coordenam que a reação circular primária, devida à experiência, ultrapassa o simples reflexo vocal), o sujeito logra reproduzir sem mais esse som, dependendo, assim, a acomodação auditiva à voz da assimilação vocal reprodutora. Ora, quando a criança ouve em outrem sons análogos aos que ela própria sabe emitir, a acomodação a esses sons torna-se inseparável de um esquema de assimilação já inteiramente preparado e põe sem mais esse esquema em atividade, daí resultando a imitação. No caso da fonação, como no da visão, o modelo a que a criança se acomoda é, portanto, assimilado a um esquema conhecido e é isso que permite à acomodação prolongar-se em imitação. A acomodação e a assimilação são mesmo tão indiferenciadas nessa fase que a imitação poderia muito bem ser conhecida como derivada quer da segunda quer da primeira. Mas, como veremos mais adiante, a imitação de novos modelos desenvolve cada vez mais a própria acomodação. Logo, somente quando a

imitação fica limitada à reprodução de sons ou gestos já executados espontaneamente pela criança é que a distinção s,: torna difícil. Um terceiro exemplo confirmará essas primeiras hipóteses: é o da preensão. Se as interpretações precedentes são válidas, deveremos esperar, com efeito, que toda e qualquer coordenação nova ou reação circular recentemente adquirida dê lugar a uma imitação, na medida em que os movimentos de outrem podem ser assimilados por analogia global aos que são percebidos no próprio corpo da criança. Ora, é precisamente isso o que acontece no domínio da preensão : logo que, durante a terceira das cinco fases que distinguimos na aprendizagem da preensão (N. L, cap. II, §4), a criança passa a ser capaz de coordenar os movimentos de suas mãos com os da sua visão, ela adquire, ao mesmo tempo, o poder de imitar certos movimentos das mãos de outrem, por assimilação destas às suas Obs. 7. - Já vimos (N. I., obs. 74) como T., a partir dos 0;3 (3), se dedicou a agarrar a minha mão, com exclusão de todo e qualquer outro objetivo visual, sem dúvida porque assimilava a minha mão à sua e tinha o hábito de agarrar suas mãos uma na outra, dentro do seu campo de visão (obs. 73). Essa interpretação talvez parecesse arriscada, tal é a desproporção existente entre a aparência visual da mão de outrem e a da mão de uma criança de apenas três meses. 29 30 31 Não obstante, aos 0;3 (4), pude determinar em T. a existência de uma imitação dos deslocamentos da mão. Portanto, é difícil explicar o aparecimento simultâneo dessas duas condutas sem admitir tal assimilação. Aos 0;3 (4), com efeito, basta que eu lhe apresente a minha mão de perto para que T. a agarre e que eu lha mostre de longe para que prenda suas mãos uma na outra, ao passo que não reage dessa maneira na presença de qualquer outro objeto. Uma hora após ter feito essa constatação, coloco-me diante da criança, a uma certa distância e, em vez de apresentar a minha mão imóvel, afasto e acerco alternadamente uma da outra as minhas mãos; T., que está chupando o polegar, retira a mão da boca, sem deixar de olhar atentamente para mim, e reproduz três vezes, nitidamente, esse movimento de afastar e juntar as mãos. Na tarde do mesmo dia, desperta após um longo sono e, ainda muito estonteado, olha para uma senhora que está ao lado do berço e depois examina as minhas mãos, que vão e vêm. Fixa-as sem parar mas, durante um ou dois minutos, não mexe as dele (tem os braços estendidos, pousados no seu travesseiro). Interrompo o meu movimento: nada. Recomeço: olha para mim com atenção ininterrupta, depois mexe as mãos no lugar em que elas se encontram pousadas, aproxima-as lentamente uma da outra e, de súbito, une-as num amplo movimento. Paro de novo: deixa as mãos caírem de novo, uma para cada lado do corpo. Recomeço: dessa vez, ele junta imediatamente as mãos. As mesmas reações uma terceira e quarta vez, após o que deixa de olhar para as minhas mãos a fim de contemplar as suas e chupá-las. Aos 0;3 (6), olha demoradamente para as minhas mãos sem mexer, depois agita as suas, primeiro devagar, depois com maior vivacidade. Acerca-as, então, até b cm uma da outra (sem vê-Ias). Uma hora depois a mesma reação, mas como as minhas mãos estão

bastar-lhe-ia reger-se por certos sinais sem saber como devia agir, acarretando em seguida a convergência involuntária dos seus atos com os de outrem a consciência da assimilação, mas somente a posteriori: Além disso, sempre que a imitação se enxerta numa reação circular já adquirida, o caso é perfeitamente análogo, visto que, segundo GUILLAUME (Imítation, págs. 86-87), a percepção, na reação circular, não seria imediatamente motora mas adquiriria, igualmente, essa característica por, transferência;- a extensão da transferência, com base nos novos sinais, explicaria então a passagem da reação circular (ou imitação de si próprio) à imitação de outrem e, ainda nesse caso, a assimilação não seria necessária à imitação mas, pelo contrário, dela resultaria. Mas duas dificuldades inerentes a esta tese nos impedem de aceita-la sem restrições, a menos que se atribua um papel, como faremos em seguimento às observações de GUILLAUME, à imitação por adestramento, a qual terá de ser distinguida, então, da imitação com assimilação direta. - Primeiramente, no que diz 'respeito à reação circular, como explicar que a percepção se "associe" a um movimento e que adquira uma eficiência motora, se ela não está presente desde o começo? Não pode ser o caso de uma associação passivamente sofrida, pois a atividade da criança estaria então subordinada, incessantemente, ao capricho das coincidências mais variadas: tossiria sempre, por exemplo, diante de uma argola de guizos, pelo fato de ter olhado para esse objeto durante um acesso de tosse etc. A repetição das associações tampouco poderia ser invocada singularmente, dado que ela só atua em ligação com uma sanção; portanto, a associação não é um fato primordial mas, pelo contrário, constitui-se apenas em função de uma totalidade complexa, caracterizada pela perseguição a um determinado fim. Foi isso, aliás, o que GUILLAUME logo reconheceu, pois sabemos que, ulteriormente à sua obra sobre a imitação, ele aderiu à Psicologia da Forma: para dar lugar a um esforço e adquirir, assim, eficácia motora, afirmou ele, desde o começo, que uma percepção deve apresentar uma "significação" ou um "interêsse". Perguntaremos então: Significação relativamente a quê? E interesse em relação a quê? É claro que ambos esses complementos só se concebem em referência a um esquema de ação, em-que a "significação" exprime o aspecto intelectual e o "interesse" o aspecto afetivo. Uma percepção não é primeiramente interessante ou significativa, para adquirir seguidamente uma eficácia motora, mediante a sua associação a um. movimento: ela é interessante ou significativa anquanto intervém no funcionamento de uma ação e é assimilada, dessarte, -a um esquema sensório-motor. O fato primordial não é, portanto, a percepção nem o movimento nem a associação entre ambos mas, outrossim,'a assimilação do objeto percebido a um esquema de ação, o qual é simultumeamcente reprodução motora e reconhecimento perceptivo, quer dizer, assimilação reprodutora e recognitiva. Logo, é a assimilação que confere significações e interesses e que determina, assim, a repetição. Desse ponto de vista, a reação circular é tão-somente uma assimilação que acaba incorporando diretamente os novos objetos aos esquemas anteriores, diferenciando estes últimos (vocalizações, movimentos de cabeça, preensão etc.), ao passo que a "transferência" nada mais é do que uma assimilação indireta ou mediata, dependente da existência de uma sanção extrínseca (e não mais intrínseca, isto é, confundindo-se com o êxito imediato) e, por conseguinte, de um esquema de assimilação, igualmente. ' Quanto à passagem da reação circula_ r ou repetição ativa de um resultado interessante para a imitação do modelo exterior coincidente com os esquemas circulares,

não oferece, pois, dificuldade alguma nos exemplos que acima descrevemos (obs. 2 a 8) : graças à sua convergência objetiva com o gesto ou o som já conhecido, o modelo é diretamente assimilado ao próprio ato, e o caráter circular deste permite a sua repetição imediata. Não há, portanto, imitação nenhuma do novo, pois a acomodação ao modelo, prolongada pela imitação, já está incluída no esquema circular e o caráter motor da percepção do modelo provém diretamente da assimilação deste a um esquema já constituído. Nessa imitação direta, por assimilação e acomodação reunidas, o interesse do modelo é, pois, imanente à sua própria repetição, dado que os objetos interessam à criança na medida em que servem de alimentos a um funcionamento e em que a sua percepção exprime, por assim dizer, a sua capacidade e mesmo a sua exigência de reprodução imediata. Isso é particularmente nítido no caso da fonação, quando o bebê é excitado pelo som conhecido e fica inteiramente insensível aos fonemas vizinhos. Mas, a par dessa imitação que prolonga imediatamente os esquemas circulares, sem diferenciá-los, é perfeitamente legítimo distinguir uma "imitação por adestramento", com 34 35 diferenciação dos esquemas adquiridos e sem assimilação direta do modelo ao gesto do sujeito. GUILLAUME cita, a tal respeito, um excelente exemplo precoce: a criança de Scupin, aos 0;2, aprende a pôr a língua de fora em resposta ao gesto idêntico de sua mãe, quando ele brincava com sua própria língua por reação circular. Pode-se também citar a imitação aparente do sorriso, a partir da quinta ou sexta semana etc. Tudo o que pretendemos afirmar é que se trata de uma "pseudo-imitação", distinta da que descrevemos nas obs. 2 a 8 e que não a explica: com efeito, a pseudo-imitação não é duradoura, salvo no caso de sanções incessantemente renovadas (como no caso do sorriso ou do prazer lúdico), ao passo que a imitação verdadeira, mesmo no estado esporádico da presente fase, dura em virtude da própria assimilação. Veremos mais adiante casos, especialmente estudados como tais, dessa pseudo- imitação aprendida (ver as obs. 17 e 18). Limitemo-nos a assinalar, por agora, que, depois das brilhantes análises de GUILLAUME, tivemos precisamente o maior cuidado, desde o início das nossas observações, em eliminar, na medida do possível, a intervenção do adestramento. Foi por isso que, subtraídos a certas influências adultas (jogos sugeridos etc.) e, em particular, à mania pedagógica das babás, os nossos três modelos apresentaram um progresso na imitação muito mais lento e mais regular do que é o caso dos bebês deformados incessantemente pela influência das pessoas que os cercam. §3. A TERCEIRA FASE: IMITAÇÃO SISTEMÁTICA DE SONS JÁ PERTINENTES A FONAÇÃO DA CRIANÇA E DE MOVIMENTOS EXECUTADOS ANTE RIORMENTE PELOS SUJEITOS DE MANEIRA VISÍVEL PARA ELA. - A partir da coordenação da visão e da preensão, aos 0;4 (5) em média, têm inicio as novas reações circulares que exercem uma ação sobre as próprias coisas; nessas "reações secundárias" (ver N. I., cap. III) integramse pouco a pouco as reações circulares "primárias", próprias da fase precedente. É evidente que um tal progresso é de natureza a repercutir na imitação, dado que novos modelos tornam-se assim suscetíveis de assimilação aos esquemas do sujeito, na medida em que se multiplicam as atividades visíveis para ele próprio. Mas, comparada à das fases seguintes, a imitação da terceira fase, embora se torne assim mais sistemática,

Na tarde do mesmo dia, sempre que eu faço bvtí, J. responde pfs, sem qualquer tentativa de imitar. - Após o que a ougp dizer abu, abu (novo som derivado de bva e que ela exercita hoje). Então eu digo pfs um certo número de vezes: J. sorri e responde regularmente abu. Aos 0;7 (13), digo-lhe has (som familiar) : ela ri e, quando paro, abre a boca como para fazer que eu prossiga; mas" não tenta emitir som algum. Em compensação, quando deixo de dizer haa, é ela quem emite esse som, imitando-o corretamente. Aos 0;7 (lb), ela entoa mam, mam etc. no berço e sem que me veja. Eu digo bvá;, ela cala-se um instante e depois, sempre sem me ver, diz baixinho bvá, bvá, como a título de ensaio. Recomeço: ela faz então bvá mam, bvá mam etc. Tais condutas parecem-nos instrutivas. Manifestamente, a única finalidade do sujeito é fazer continuar o som ouvido. Assim como, durante toda essa fase, a criança procura fazer durar os espetáculos interessantes e emprega, para tal efeito, uma série de processos extraídos de suas reações circulares secundárias, também a criança, no domínio vocal, deseja que continuem os nona escutados e age então da seguinte maneira: ora emprega, para agir sobre outrem, os sons que já serviram à imitação, ou aqueles que acabou de repetir (o que constitui o equivalente vocal dos "processos para fazer durar os espetáculos interessantes"), ora, quer espontaneamente, quer quando o primeiro método fracassa, imita realmente cs sons emitidos por outrem. Nos dois casos, o interesse pela repetição é evidente, e pela repetição de fonemas que, intrinsecamente, nada têm de significativos. Obs. 11. - Aos 0;7 (17), J. imita incontinenti, diferenciando-os e sem que os tivesse produzido antes, os sons pfs, bvá, mam, abu, has e um novo fonema, pff, que ela vem exercitando há alguns dias. Sente prazer em imitar e já não produz um som por outro. Aos 0;7 (20), ouve a trompa de um guardador de cabras, cujo som pode ser aspimilado a um an. Imita logo, mais ou menos na altura pretendida, e emitindo um som único e contínuo. Aos 0;8 (2), 0;8 (9) etc., ela imita de novo todos os fonemas de que dispõe, incluindo oa sons recentes pápá e bábá que, para ela, não têm significação alguma. Aos 0;8 (11), imita também apJ ou apfen e o som de tosse. Aos 0;8 (16), reproduz o conjunto complexo; bate no cobertor do berço dizendo apJ. Aos 0;8 (20), imita cm, assim como o Em contrapartida, aos 0;8 (14), 0;8 procura imitar os novos sons. Desde que dela tenha sido inserto na série de modelos propostos, se o som lhe interessa (sem dúvida por analogia com própria produz), procura fazé-lo continuar emitindo outros a observação precedente). ruído de respiração forte. (19) etc., ela ai-ida não um fonema desconhecido J. cala-se ou, os que ela sons (ver Percebe-se que, durante essa fase, a criança torna-se capaz de imitar quase cada um dos sons que sabe emitir espontaneamente, na condição, entretanto, de que saiba isolar os sons da massa fônica. Como disse GUmLAUMA para ser reproduzido, o som deve constituir uma espécie de objeto reconhecível, independentemente das diferenças de timbre e de altura. Em compensação, é difícil admitir que a criança dessa fase imite os fonemas somente na medida em que eles estiverem impregnados de significação (não

puramente auditiva) e que esse progresso das significações extrínsecas acompanhe de perto o da objetivação dos sons. Sem dúvida, um dos sujeitos nas experiências de GUnr LAUME, L., reage a partir de 0;b às palavras "Adeus", "Dança l Um, dois, três l", "Beija", "Puxa a barba, os cabelos", "Zanga com ele" etc. (pág. 47), e é evidente que uma criança tão desenvolvida pelo seu meio adulto só pode prestar a todos os sons que a cercam alguma significação direta ou indireta. Mas parece-nos difícil extrair desses fatos uma correlação entre a imitabilidade dos fonemas e o seu valor significativo. Em primeiro lugar, essa mesma L., aos 0;6, só imita pápá, tátá, tété e man, isto é, quatro fonemas que aparecem na maior parte das crianças dessa idade, independentemente de todo e qualquer sentido (nas nossas, em todo o caso). Por outra parte, os nossos próprios filhos, que nunca foram adestrados, durante essa fase, para associar palavras ou sons aos atos ou objetos, imitaram muito claramente, todos os três, os fonemas espontâneos, cujo significado permanecia, assim, puramente auditivomotor. Mais do que isso: quando não os imitavam, esses sujeitos procuravam fazer com que outrem os repetisse, a ponto de utilizarem outros fonemas conhecidos a título de "processos" para forçar o adulto (obs. 10). Objetar-se-á, talvez, que, na falta de sinais de ordem verbal, os nossos filhos atribuíram, pois, a esses diversos sons espontâneos, 38 39 alguma significação global inerente a essa repetição; mas, sendo assim, toda a produção vocal estaria no mesmo caso e não mais seria possível caracterizar a imitação pelo desejo de reproduzir os sons significativos, com exclusão dos demais. Quanto ao mecanismo dessa imitação vocal, parece-nos que obedece às leis esboçadas no §2, isto é, que se explica por uma "assimilação" simultaneamente recognitiva e re produtora, mais do que por qualquer jogo de "transferência". Ao que certamente se pode responder que a imitação recíproca (obs. 9) age por "transferência" e que "adestramos" as nossas crianças, tanto quanto qualquer outra, ao habituá-las a essa maneira de proceder. Mas, ainda a esse respeito, a obs. 10 é instrutiva: ela nos mostra que, longe de associar passivamente um sinal a um ato, a criança procura ativamente fazer durar o som ouvido e, com esse intuito, emprega um por um, a título de meios equivalentes, todos os "processos" vocais ao seu dispor ou a própria imitação. Em tais casos, isso nada se parece, pois, a uma associação mas, outrossim, a um processo ativo, isto é, a uma assimilação intencional e real. II. Por outra parte, a criança dessa fase aprende a imitar os movimento de outrem análogos aos seus próprios movimentos conhecidos e visíveis. Imita, assim, todos os gestos, com exclusão dos gestos novos para ela ou dos gestos cujo equivalente próprio permanece fora do campo da sua percepção visual. Por outras palavras, a sua imitação é determinada pelo conteúdo de suas reações circulares primárias ou secundárias, na medida em que os movimentos necessários a tais reações dêem lugar a uma percepção visual. Portanto, é referindo-se ao contexto das reações circulares estudadas anteriormente a propósito dessa fase (N. L, cap. III) que se poderá compreender a significação dos exemplos seguintes. O caso mais simples é o dos movimentos da mão, como agarrar os objetos vistos etc. (esquemas circulares relativos à atividade da mão, exclusivamente, sem englobar ainda os movimentos particulares dos objetos). Orá, os ensaios de imitação que se relacionam com esses movimentos colocamnos imediatamente na presença de um fato fundamental a que reverteremos adiante: somente os esquemas como totalidades fechadas sobre si