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Apostilas de Direito do Centro Universitário de Brasília – UniCEUB sobre o estudo da História do Direito na Formação dos Juristas, Qual a importância da História do Direito.
Tipologia: Notas de estudo
Oferta por tempo limitado
Compartilhado em 11/07/2013
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A História do Direito na Formação dos Juristas
Temos que estudar a História porque é um campo do conhecimento essencial para nós. Não apenas a história jurídica, mas a história como um todo, pois temos que compreender o problema do método e do objeto.
O professor nos indicou um texto que procura fazer o link entre a História e o Direito, que será precisamente o primeiro capítulo do livro Cultura Jurídica Européia – A Síntese de um Milênio , de Antonio Manuel Hespanha. Pode ir à biblioteca, suba as escadas, vá na direção da ala norte, e procure nas primeiras seções, mais precisamente na de História do Direito, que fica embaixo. Antes de ver, você deve passar pela seção de Justiça do Trabalho. A chamada do livro é 34(091) H585c. Os livros talvez estejam emprestados, mas o Panorama Histórico da Cultura Jurídica Européia , de número 34(091) H585p, do mesmo autor, e encontrado no mesmo lugar do primeiro, também serve, pelo menos pelo conteúdo do primeiro capitulo.
Qual a importância da História do Direito? Essa deve ser a primeira pergunta que deve justificar nossa presença nesta disciplina. Dito pelos próprios juristas, a História é fundamental para eles, para sua própria formação como juristas. O historiador logo diz: “que bom que sou importante pra você!”
Em seguida, o historiador pergunta ao jurista: “...mas como, de que maneira você se apropria das minhas ferramentas, dos meus instrumentos de trabalho?”
Essa curiosidade é respondida pelos juristas assim: “A História é uma disciplina formativa, e também porque sem a ela não conseguimos entender o Direito de hoje. A História é muito importante para a compreensão do Direito atual; sem a ela, isso é impossível. Também usamos a História para legitimar o Direito da forma como ele é hoje. E, imanentes ao Direito, há valores jurídicos tão milenares que chamamos de naturais: são aqueles que estão lá desde sempre, e, como nunca desapareceram, provaram sua permanente atualidade e coerência com a nossa sociedade atual.”
Então o historiador logo fica desconfiado. Conhecedor da História e de seu método, ele defende que “ nada no mundo humano e nada do construto humano é natural. Natural é aquilo que se refere à Natureza, na sua estrutura interna, por exemplo o fato de sermos animais. Somos animais e isso não é questionável, em outras palavras, a “animalidade” é algo da nossa própria natureza. Entretanto há produtos que nós mesmo construímos, e que, portanto, não são naturais. A história é algo que nós próprios construímos, ela é um construto humano.”
E não é mesmo? Ou seria a História uma fatalidade? Ao nascermos, já existe história, ou temos que fazê-la? Vejamos nossa infância...
Ser criança é algo que faz parte da natureza? Sim, também é inerente ao ser humano, e nenhum de nós chegou a esta idade sem ter, por exemplo, passado pelos cinco anos de idade. Mas o “ser criança” não é natural na perspectiva da História. Ser criança também é um construto, e depende de como nós definimos o que é ser criança. No séc XVIII, ser criança era o mesmo que "ser um pequeno adulto”, ou seja, poderia possuir as mesmas atribuições do adulto, grosseiramente comparando. Pelos quadros da época, vemos que as vestimentas infantis são iguais às do adulto, em menor tamanho. Hoje em dia temos uma nova concepção do que é “ser criança”, e nossa sociedade concorda com isso: a criança deve ser um ser livre para gozar sua infância, por isso que se criou o ECA
A História é mudança. Nelson Rodrigues disse: o óbvio também precisa ser dito. As idéias do que sejam as coisas também mudam. Quando a Historiador olha para o entendimento dos juristas de tais valores – aqueles que foram denominados “naturais” – ele já o faz enviesado. “Como é que tais valores podem ser da Natureza, se são construções humanas?” – pergunta o historiador. “E como podem ser naturais se mudam o tempo todo? Como podem ser eternos e permanecerem do jeito que estão desde sempre?” Os valores são redefinidos, reinterpretados, então o historiador deixa o sentimento de importância que teve antes e percebe que irá brigar com os juristas. É que muitas vezes os juristas usam a História de forma bem mecânica. Buscam, na verdade, conferir erudição ao discurso. Os historiadores, então, dizem que os juristas usam a História apenas para embelezar o conhecimento jurídico, as sentenças e obras. Pelo menos em um ponto os juristas têm razão, na opinião dos historiadores: a História é mesmo uma disciplina formativa.
Mas, à medida que os historiadores profissionais vão entrando na área do Direito, isso tende a mudar. O professor René, assim como António Hespanha, pensa no campo do Direito não como uma forma de legitimar as estruturas de poder, mas como uma forma de problematizar. A História serve sim para o Direito, e também na formação dos juristas, mas não estudaremos nada sobre legitimação de práticas aqui.
O que significa problematizar? Ser crítico, certo? Mas, aqui, "crítico" significa problematizar pressupostos , aquelas suposições anteriores aos raciocínios, que os fundamentam, e que raramente ou praticamente nunca são questionados. Os fundamentos não são avaliados; eles são quase axiomatizados, como os postulados da Matemática e da Geometria. E como o Direito poderia se renovar,
não é destruir, mas entender os pressupostos do Direito que explicam a legitimidade das normas. Entretanto o Direito precisa dele próprio se legitimar. E como ele se legitima?
A relação entre o Direito e a História parecia ser muito harmoniosa. Depois vimos que esse casamento é conturbado. São áreas do conhecimento diferentes; têm objetos e metodologias diferentes, e não seria difícil imaginar que a relação entre História e Direito não seria a mais amistosa. O texto indicado ontem, então, foi trazido para problematizar essa questão. Uma delas é a de como o Direito deve se apropriar da História, ou melhor, é de como parte dos juristas devem se apropriar dela. Com isso, chegamos à noção de durabilidade das normas.
Temos, assim, a impressão de que as normas jurídicas são boas porque resistiram “à história”. Mas não é bem assim. A história não é esse ente poderoso, que decide os acontecimentos, que dela dependem todos os eventos, que regula o caminhar do mundo; primeiramente, seria mais adequado que se usasse a expressão “resistiram ao tempo” ao invés de “resistiram à história.” Os juristas devem afirmar: “se sobreviveram ao tempo, então é porque mostraram sua permanente atualidade.” Essa é uma das formas como o Direito se apropria da História.
Outra forma é: os valores jurídicos são categorizados como “naturais”, que são imutáveis. E mais forma de apropriação do Direito pela História é a maneira com que ele a usa: como um adereço, um adorno, que embeleza os textos e perfuma as sentenças.
A idéia de durabilidade da norma traz um profundo equívoco: o de que a norma é fruto de um consenso histórico, em que várias gerações de juristas deram seu aval àquela norma. Por isso, elas seriam boas, e deveriam permanecer. Essa idéia de plebiscito, em que os juristas dão aval e legitimação a tais normas, é uma idéia no mínimo muito complicada. A idéia é que uma voz solitária estaria negando toda a tradição de legitimidade que foi sendo dada durante todo esse tempo. Então, aquele que questiona deve estar errado! “Seria fantástico acreditar que apenas eu estou certo e todos eles estão errado, né?” Isso, na verdade, é uma indução à falácia. Esse plebiscito não existe. Estamos falando de coisas diferentes por completo.
Categorias jurídicas que supostamente pertencem à natureza das coisas: liberdade, Estado, idéia de público e privado e de família. “Se perduraram por milênios, então é porque são instituições boas e atuais!” Mas o que não se percebe é que tais instituições não são as mesmas ao longo da história, apenas em palavra. Liberdade, por exemplo, significa algo muito diferente para nós do que significava para os antigos. Bem como a concepção do que é público e o que é privado: o Código Civil atual, apesar de fundado no Direito Romano, trata bem diferentemente o que é público e o que é privado. A família só conserva mesmo o nome: na época do Império Romano, a família incluía parentes, não-parentes,
animais, móveis da casa, ancestrais, escravos... para nós, hoje, esse conceito nada tem a ver. Esse consenso só poderia existir se estivéssemos falando da mesma coisa, mas não é o que de fato acontece: os juristas tentam dizer que, na comparação com a antiguidade, a família de então era semelhante à família típica atual. A História é o estudo das mudanças, e não faria sentido haver História se não houvesse mudança alguma. Por isso o consenso não pode dar aval a uma coisa que não é a mesma.
Portanto, a apropriação da História pelo Direito é apenas visando à legitimação da estrutura de poder. E o Direito é a estrutura de poder que, por sua vez, legitima a obediência. Mas o Direito deve legitimar-se primeiro.
No século XVII, o Estado era “a pessoa do bem”. Não existia o Estado como a estrutura que temos hoje. L’État c’est moi - “O Estado sou eu” era uma frase do rei Luís XIV que refletia o caráter personalista do Estado, que era centralizado num só soberano, durante o tempo do absolutismo. Hoje o Estado não é a personificação por uma pessoa, mas é uma estrutura ocupada por pessoas que se sucedem. Naquele século, havia a linhagem real.
Outro motivo do campo jurídico para se apropriar da História é para atestar a linearidade do progresso. É outra estratégia de poder falaciosa. Cada momento histórico constrói seus significados em torno das necessidades e das demandas que o presente lhes apresenta. Por exemplo: na antiguidade, a liberdade, o Estado, a família e a noção de público e privado estavam articulados de outras formas na época, de acordo com as necessidades do período.
Há cerca de 17 anos, não tínhamos celular. Há uns 19, não tínhamos computador. Mas essas inovações mudam completamente a forma de interação, especialmente no que tange à idéia de público/privado. A intimidade, por exemplo, já mudou radicalmente; hoje é mais fácil entrar na vida das pessoas. As leis escutam às demandas e respondem às necessidades do presente. Se o judiciário de hoje em dia está emitindo pareceres sobre uniões civis de homossexuais, então é porque há uma demanda para isso. A evolução coloca, para o Direito, determinadas tarefas. Veja, por exemplo, o Direito de Família. Hoje há muito mais tipos de famílias do que antigamente: família monoparental, família de pais não casados...
Outra estratégia: a História também é usada para a legitimação da corporação dos juristas. A idéia de que os juristas são imparciais, neutros, é falsa; não existe neutralidade no âmbito social. E não que eles sejam vigaristas ou tendenciosos; é que tal neutralidade não é possível não por força do caráter de ninguém, mas por que, dentro da sociedade, todos têm um ponto de vista. Esse ponto de vista depende da classe social à qual o indivíduo pertence, do lugar onde ele nasceu, dos valores familiares dele, da sua ideologia política e de inúmeros outros fatores. É como imaginar que o juiz, ao vestir a toga, despe-se completamente de seus valores acumulados e preconceitos.