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A Teoria filosófica de Taine muito influenciou o campo da literatura, na metade do século XIX, em destaque a estética Naturalista, que tinha como principal ...
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Letras da Universidade Estadual da Paraíba, em cumprimento à exigência para obtenção do grau de Licenciado em Letras. Orientadora: Profª Drª Marilene Carlos do Vale Melo.
Irani Barbosa de Lima
Com base na teoria do Determinismo do filósofo, historiador e crítico literário Hippolyte Adolf Taine, o presente artigo trata de um estudo das personagens de O cortiço, de Aluísio Azevedo. A Teoria filosófica de Taine muito influenciou o campo da literatura, na metade do século XIX, em destaque a estética Naturalista, que tinha como principal representante Émile Édouard Charles Antoine Zola, o qual desenvolveu o Romance Experimental, onde mostrou uma análise profunda do homem e da sociedade, usando como base as teorias cientificistas da época, incluindo o Determinismo de Taine. No Brasil, influenciado por Zola, Aluísio Azevedo partiu do cientificismo e substituiu a visão subjetiva nos romances românticos, escreveu O cortiço onde pôs em prática os princípios naturalistas, que acreditava, e toda a sua capacidade artística para aplicar a teoria de Taine.
Palavras-chaves: Determinismo, Taine, Zola, Aluísio Azevedo, O cortiço
A metade do século XIX foi uma época de grande transformação na economia, na política e no campo cultural, impulsionado pela revolução industrial; momento caracterizado pela consolidação do poder da burguesia e o crescimento do proletariado; do avanço científico, com descobertas nos campos da física e química e evolução na genética e biologia. O sistema capitalista, juntamente com a revolução industrial, desenvolveu uma sociedade urbana que aumentou progressivamente e fez surgir classes sociais, como a dos operários, que sofriam a exploração social e manifestavam sua insatisfação promovendo as primeiras greves; a burguesia que usufruía dos avanços científicos da época; o materialismo e racionalismo substituíram o idealismo e o tradicionalismo; o método científico passou a ser o meio de análise e compreensão da realidade. Nesse cenário de progresso e de exploração social, o homem serviu de pano de fundo para uma nova transformação da realidade, e passou a ser analisado profundamente com o auxílio das novas teorias cientificistas. Algumas teorias deram fundamentos ideológicos à
representada pela raça, pelo meio e pelo momento e entendia que, esses fatores, eram a mola interna da pressão de fora e o impulso já adquirido. Aranha (2003) expõe muito bem cada um dos fatores deterministas defendido por hippolite Taine, quando caracterizou um por um. Vejamos:
A raça, a grande força biológica dos caracteres hereditários determinantes do comportamento do indivíduo; O meio, que submete o indivíduo aos fatores geográficos (como o clima, por exemplo), bem como ao ambiente sociocultural e as ocupações cotidianas da vida; O momento, pelo qual o individuo é fruto da época em que vive e se subordina a determinada maneira de pensar característica do seu tempo. (p.
A Teoria Determinista de Taine sofreu influência do pensamento filosófico-científico do século XIX. e foi bem aceita no campo científico; em área como a física, a química, a biologia, entre outras. Sendo um dos discípulos de Comte, Taine passou a defender a concepção desse grande filósofo que pregava ser a escolha livre uma mera ilusão. Para ele, o ato humano não é livre, mas resultado de fatores dos quais eles não podem escapar. Daí, os estudos da época utilizavam a concepção que advinha do Determinismo, a qual defendia a existência de uma causa que tudo determina, ou seja, todos os acontecimentos no mundo tinham uma causa e o indivíduo, imerso nele, não tinha liberdade de escolha, já que sofria a influência do meio, da raça e do momento. A literatura naturalista foi muito influenciada pela teoria determinista de Taine, pois procurava analisar profundamente o homem e a sua forma de vida na sociedade. Desta forma, os seus personagens sempre eram retratados como pessoas comuns, com defeitos e imperfeições como os da vida real. Foi no Naturalismo que a literatura se inovou e abriu espaço para diversos temas que antes eram considerados impróprios, que iam, desde os jogos de interesse, hipocrisia humana, a assuntos mais fortes como o adultério, o sexualismo e o homossexualismo. As obras naturalistas oferecem inúmeros exemplos do comportamento humano como decorrentes de fatores determinantes, sem possibilidade, alguma, de transcendência. Considerando esses aspectos, o nosso estudo visa investigar a influência da teoria determinista de Taine, na estética naturalista, no romance O cortiço , de Azevedo.
O Determinismo no Naturalismo
O Naturalismo surgido na metade do século XIX priorizava objetivar e racionalizar o pensamento da época. Os autores dessa estética fizeram obras literárias mostrando o retrato fiel da sociedade, analisando assim, o homem, a partir dos fatores deterministas, raça, meio e momento, rompendo o idealismo da estética romântica. O grande representante do movimento naturalista foi Émile Édouard Charles Antoine Zola, criador do Romance Experimental. Foi a partir desse romance que o homem passou a ser analisado profundamente através das diversas teorias cientificistas da época, incluindo o Determinismo, de Hippolyte Taine. Segundo Aranha (2003), Zola afirmou que o Romance Experimental era uma consequência da evolução científica do século. Cabia, então, a esse romance continuar e completar a fisionomia do homem dentro da sociedade, priorizando o seu estudo natural, mostrando que ele se submete às leis físico-químicas e sofre a influência do meio. Desta maneira, Zola, influenciado pelas demais teorias e pelo Determinismo, colocou em prática o Romance Experimental. O marco inicial desta estética foi o seu romance, Therese Raquim (1867), no qual há influencia da teoria de Taine. Nesse romance, Zola elaborou o enredo e suas personagens a partir dos componentes hereditários e das circunstâncias ambientais que determinam profundamente o seu comportamento. Outro romance de Zola que merece destaque é Germinal (1885), que consagrou o autor, sendo, então considerado um dos maiores escritores de todos os tempos, influenciando diversos autores naturalistas, em destaque, Aluízio Azevedo, o grande representante do Naturalismo no Brasil. Aluísio Tancredo Belo Gonçalves de Azevedo foi o pioneiro do Naturalismo no Brasil com o Romance O Mulato (1881), mas foi a publicação do romance O Cortiço (1890), que se tornou um dos maiores marcos da literatura brasileira. Em O Cortiço , Aluísio deu ênfase à coletividade expondo os problemas da sociedade, buscando desvendar suas causas, segundo os preceitos deterministas; seguiu à risca o estilo naturalista de Émile Zola e os preceitos da teoria determinista de Hippolyte Taine, colocando, nos seus romances, personagens condicionados à raça ao meio e ao momento histórico. Assim, O Cortiço se tornou um grande exemplo da estética naturalista e na exposição das marcas do Determinismo.
mostrar, de maneira concisa, como o homem atua sobre o meio e vice-versa. Veremos agora as marcas deterministas de Taine, em “O Cortiço”.
As marcas do Determinismo de Taine n’O Cortiço
1. Com relação à raça:
No romance O Cortiço, o ambiente é bem caracterizado, tanto que o próprio cortiço passa a ser visto, também, como a personagem central e isso pode ser confirmado quando Aluísio cita: “ Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.” (p. 37). Além disso, o autor prezou muito pelo coletivo, tanto que até o título do livro expressa coletividade. Enaltecendo constantemente o coletivo, Aluísio sempre comparou o cortiço com um formigueiro em constante atividade, com seus moradores se agitando sem parar: “O zunzum [do cortiço] chegava ao seu apogeu ”[..]. As corridas até à venda reproduziam-se transformando-se num verminar constante de formigueiro assanhado.” (p.38) Essa forma de valorizar o espaço, descrevendo-o em detalhes, é também influência do Determinismo. Entendendo isso, Aluísio Azevedo construiu o cortiço como um ambiente, orgânico vivo caracterizando-o como planta, formigueiro ou barro primordial do qual germina vida. Podemos notar essa característica nas primeiras páginas do livro onde está descrito o desenvolvimento do cortiço. Vejamos:
E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco. (p. 27) Durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de gente. E ao lado o Miranda assustava-se, inquieto com aquela exuberância brutal de vida, aterrado defronte daquela floresta implacável que lhe crescia junto da casa, por debaixo das janelas, e cujas raízes, piores e mais grossas do que serpentes, minavam por toda a parte, ameaçando rebentar o chão em torno dela, rachando o solo e abalando tudo. (p. 27) O Determinismo também se evidencia no personagem, João Romão, com a sua gana de mudar de classe social, foi comparado ao um animal, juntamente com a sua fiel escrava Bertoleza. Esses personagens, no decorrer do romance, são vistos sempre trabalhando “[...] a Bertoleza, sempre suja e tisnada, sempre sem domingo nem dia santo lá estava ao fogão”. (p.61) “[...] e João Romão junto a ela “ Sempre em mangas de camisa, sem domingo nem dia
santo apertava cada vez mais as próprias despesas, empilhando privações sobre privações, trabalhando e mais com como uma juntas de bois [...]” (p.19). Está aí, o homem visto numa redução biológica, onde, tanto o branco quanto o negro são tratados como animais, pois caracterização da forma de trabalho revela um nível grave de animalização, reduzindo o homem à condição de besta de carga, explorado para formar o capital do outro. Isto ficou evidente nos seguintes trechos da narrativa:
Bertoleza representava agora ao lado de João Romão o papel tríplice de caixeiro, de criada e de amante [...] às quatro da madrugada estava já na faina de todos os dias varria casa, cozinhava [...] vendia ao balcão na taverna (...) fazia a sua quitanda durante o dia e no intervalo outros serviços [...]. E o demônio da mulher ainda encontrava tempo para lavar e consertar, além da sua, a roupa do seu homem (p. 17 a 18) Na sua condição de animal de trabalho, já não era amor que a mísera escreva [Bertoleza] desejava, era somente confiança no amparo da sua velhice... (p. 188)
Outra característica marcante do Determinismo e que foi muito usada nas obras naturalistas é o enaltecimento do instinto, onde o homem regride e age como o animal, concebendo a vida, priorizando as atividades do sexo e da nutrição, menosprezando as demais. Em O Cortiço , o instinto prevalece nos personagens. O autor não mede esforços para igualar o homem ao animal, tanto que, ao descrever a vida coletiva nessa habitação, ele a narra como se fosse “uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas”. (p. 37) Um dos exemplos que podemos notar essa característica é na vida conjugal do casal Miranda e Estela que, apesar de se odiarem muito, cederam à tentação da carne e ficam juntos quando o instinto falava mais alto. Vejamos:
Miranda, que era um homem de sangue esperto [...] senti-se em estado insuportável de lubricidade [...]. Lembrou-se da mulher, mas repeliu logo esta idéia com escrupulosa repugnância. ( p. 20) Mas o sangue latejava-lhe, reclamando-a. [...] O Miranda não pode resistir, atirou-se contra ela, que, num pequeno sobressalto, mas de surpresa que de revolta, desviou-se. ( p. 20) Mas, daí a um mês, o pobre homem, acometido de um novo acesso de luxúria, voltou ao quarto da mulher (p. 21) A mulher percebeu a situação e não lhe deu tempo para fugir; passou rápido as pernas por cima e, grudando-se-lhe ao corpo.[...] ( p. 21)
Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele (Jerônimo) recebera chegando aqui: ela era a luz ardente do meio dia; ela era o calor vermelho das sestas da fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoava nas matas brasileiras [...] (p.77) Jerônimo pode ser visto de duas formas, antes de ser influenciado e, depois, completamente envolvido com o meio. Vejamos, primeiro, quando ele ainda não se encontrava dominado, nas seguintes citações:
Jerônimo só voltava à casa ao decair da tarde, morto de fome e de fadiga. A mulher prepara-lhe sempre para o jantar alguma das comidas da terra deles [...]. E, defronte do candeeiro de querosene, conversavam sobre a sua vida e sobre a sua Marianita, a filha que estava no colégio e que só os visitava aos domingos e dias santos. ( p. 58 a 59) Nunca passava das nove (para dormir), ele tomava a guitarra e ia para defronte da porta, junto com a mulher, dedilhar os fados de sua terra. (p. 59) E, depois de influenciado pelo meio, Jerônimo vivia uma vida tranqüila com a sua esposa. No entanto, depois de uma festa muito animada na casa de Rita Baiana, ele começou a ouvir a música e agir de forma diferente, no espaço da casa de Rita, influenciado pelo meio.É o que podemos ver nas citações: Jerônimo alheou-se da sua guitarra e ficou com as mãos esquecidas sobre as cordas, todo atento para aquela música estranha, que vinha dentro dele continuar uma revolução desde a primeira vez em que lhe bateu em cheio no rosto, como uma baforada de desafios, a luz deste sol orgulhoso e selvagem, e lhe cantou no ouvido o estribilho da primeira cigarra, e lhe acidulou a garganta o suco da primeira fruta provada nestas terras de brasa, e lhe entonteceu a alma o aroma do primeiro bogari, e lhe transtornou o sangue o cheiro animal da primeira mulher, da primeira mestiça, que junto dele sacudiu as saias e os cabelos. ( p. 76) O chorado arrastava-os a todos [...]. Mas, ninguém como Rita; só ela, só aquele demônio, tinha o mágico segredo daqueles movimentos de cobra amaldiçoada; aqueles requebros que não podiam ser sem o cheiro que a mulata soltava de si e sem aquela voz doce, quebrada, harmoniosa, arrogante, meiga e suplicante. (p. 77) Jerônimo nada mais sentia, nem ouvia, do que aquela música embalsamada de baunilha, que lhe entontecera a alma; e compreendeu perfeitamente que dentro dele aqueles cabelos crespos, brilhantes e cheirosos, da mulata, principiavam a formar um ninho de cobras negras e venenosas, que lhe iam devorar o coração. (p. 79) E, por último, podemos presenciar a transformação de Jerônimo por completo quando, rendido aos encantos de Rita, abandona a sua mulher e sua filha. O meio foi mais
forte do que ele. Vencido, deixou-se envolver e se transformar completamente. Vemos isso nas citações:
Uma transformação, lenta e profunda, operava-se nele, dia-adia, hora a hora, reviscerando-lhe o corpo e alando-lhe os sentidos, num trabalho misterioso e surdo [...]. A vida americana e a natureza do Brasil patenteavam-lhe agora aspectos imprevistos e sedutores que o comoviam; esquecia-se dos seus primitivos sonhos de ambição, para idealizar felicidades novas, gosto aos prazeres, e envolvia-se preguiçoso, resignando- se, vencido, [...]. E assim, pouco a pouco, se foram reformando todos os seus hábitos singelos de aldeão português: e Jerônimo abrasileirou-se. (p. 91 a 92) O tal Jerônimo, dantes tão apurado, era agora o primeiro a dar o mau exemplo! perdia noites no samba! não largava os rastros da Rita Baiana [...] (p. 117) O português abrasileirou-se para sempre (quando foi morar com Rita); fez-se preguiçoso, amigo das extravagâncias e dos abusos, luxurioso e ciumento; fora-se-lhe de vez o espírito da economia e da ordem; perdeu a esperança de enriquecer, e deu-se todo, todo inteiro, à felicidade de possuir a mulata e ser possuído por ela, só por ela, e mais ninguém. (p. 191) Com relação à personagem Pombinha, também foi influenciada pouco a pouco pelo meio. Jovem, de dezoito anos, era uma menina educada e delicada, vestia-se bem, era vista como a “flor do cortiço” (p.140), filha de dona Isabel e noiva de João da Costa, que não casara com o jovem, porque ainda não tinha iniciado a sua puberdade. Pombinha era muito estimada pelo cortiço e todos torciam para que a jovem menina logo que se tornasse moça, para concretizar o casamento. Tinha como função, no cortiço, escrever cartas. Assim, ela absorvia todas as intimidades e angustias dos moradores. Isso foi uma das causas que alterou suas atitudes e modificou seus valores e a fez se transformar numa prostituta ou cocote, como se chamava na época. Vejamos o trecho que apresenta como a vivência no ambiente do cortiço transformou sua vida::
Numa pequena mesa, coberta por um pedaço de chita, com o tinteiro ao lado da caixinha de papel, a menina escrevia, enquanto o dono ou a dona da carta ditava [...]. E ia lançando tudo no papel, apenas com algumas ligeiras modificações [...]. Pronta uma carta, sobrescritava-a, entregava-a ao dono e chamava outro, ficando a sós com um de cada vez, pois que nenhum deles queria dar o seu recado em presença de mais ninguém senão de Pombinha. De sorte que a pobre rapariga ia acumulando no seu coração de donzela toda a súmula daquelas paixões e daqueles ressentimentos, às vezes mais fétidos do que a evaporação de um lameiro em dias de grande calor. ( p.65)
entanto, os escravos permaneciam em situação de vulnerabilidade social, passando a ser escravo fora da senzala. Esse momento histórico marcou profundamente a vida de Bertoleza “[...] – Agora, disse ele (João Romão) à crioula, as coisas vão correr melhor para você. Você vai ficar forra [...] já este “[...] varria a casa, cozinhava, vendia ao balcão na taverna [...] à noite passava-se para a porta da venda [...] fritava fígado e frigia sardinhas[...]” (p. 16). E assim, como as demais personagem do cortiço ela sofre a influencia do meio. Coutinho (2002) afirma que Aluísio Azevedo, com interesse de defender a teoria determinista, descreveu Bertoleza com um comportamento submisso ao seu dono, João Romão, com o objetivo de igualar o homem ao animal. A citação seguinte expõe bem essa idéia:
Bertoleza é que continuava na cepa torta, sempre a mesma crioula suja, sempre atrapalhada de serviço, sem domingo nem dia santo; essa, em nada, em nada absolutamente, participava das novas regalias do amigo; pelo contrário, à medida que ele galgava posição social, a desgraçada fazia-se mais e mais escrava e rasteira. João Romão subia e ela ficava cá embaixo, abandonada como uma cavalgadura de que já não precisamos para continuar a viagem. (p. 146) Também no romance se evidencia o momento social vivido pela sociedade brasileira de copiar o modelo burguês trazido da Europa. João Romão, dono do cortiço buscava a ascensão social à custa da exploração social do povo do cortiço e da escrava Bertoleza, que lhe serviu como amante e serva fiel para o trabalho forçado. O texto revela as duas fases da vida desse personagem no cortiço, antes e depois da ascensão. Vejamos as citações:
João Romão não saía nunca a passeio, nem ia a missa aos domingos; tudo o que vendia a sua venda e mais a quitanda seguia direitinho para a caixa econômica e daí então para o banco”. ( p. 18) Sempre em mangas de camisa, sem domingo nem dia santo, não perdendo nunca a ocasião de assenhorear-se do alheio [...] enganando os fregueses, roubando nos pesos e nas medidas [...] apertava cada vez mais as próprias despesas, empilhando privações sobre privações, trabalhando e mais com (Bertoleza) como uma juntas de bois... ( p.19) João Romão agora sempre de paletó, engravatado calças brancas, colete e corrente de relógio, já não parava na venda, e só acompanhava as obras na folga das ocupações da rua. ( p. 187)
Aliando-se à família de Miranda, que morava em um sobrado ao lado do seu cortiço, João Romão passou a fazer parte da vida burguesa, sendo convidado para se coligar aos
abolicionistas. “Nesse momento parava à porta da rua uma carruagem. Era uma comissão de abolicionista que vinham, de casaca, trazer-lhe respeitosamente o diploma de sócio benemérito.” (p. 225). O espaço do cortiço modificou-se, ascende junto com João Romão, tornou-se uma rua, Rua João Romão.. Podemos ver isso na citação abaixo:
E, como a casa comercial de João Romão, prosperava igualmente a sua avenida. Já lá se não admitia assim qualquer pé-rapado, para entrar era preciso carta de confiança e uma recomendação especial. Os preços dos cômodos subiam, e muitos dos antigos hóspedes (...) iam, por economia, desertando para o Cabeça de Gato (o outro cortiço) e sendo substituído por gente mais limpa. (p.215)
4. A ruptura da influência do Determinismo
Com a ascensão social, João Romão passou a ser visto como “O animal vencedor” (p.182), pois, em vez de ser modelado pelo meio, foi o meio que o moldou, de acordo com seus interesses. Mas também não podemos dizer que João Romão se livrou da determinação do meio totalmente, pois se envolveu de maneira mais ampla com a sociedade, já que se deixou influenciar pelo sucesso do nobre vizinho, Miranda. E a partir daí operou-se nele uma transformação, conseqüência do convívio com a família do outro. Vejamos agora alguns esclarecimentos sobre o uso das marcas do determinismo n’O cortiço e a marca do Romantismo ainda presente nesse romance.
O Cortiço com influência do Determinismo e com marcas do Romantismo
Usando o cientificismo corrente na época para representar a sociedade, Aluísio conseguiu expressar o que a estética naturalista buscava, pois o seu romance criticava os padrões sociais da época. No entanto, ainda se faziam presentes em sua obra marcas do Romantismo. Um dos exemplos que melhor manifestam essas marcas está no capítulo que narra, de maneira idealizada, o inicio da puberdade de Pombinha Destacamos alguns fragmentos:
[...] toda ela transpirava uma contemplativa de convalescente; havia uma doce expressão dolorosa na limpidez cristalina de seus olhos de moça enferma; um pobre sorriso pálido a entreabrir-lhe as pétalas da boca, sem lhe alegrar os lábios, que pareciam ressequidos à míngua de beijos de amor;
Comendador Mirada “se serve” da mulher que o traíra. E disse que, enquanto a Europa diz “mata” o Brasil diz “esfola”. Sendo assim, o cortiço é um romance naturalista onde autor utilizou as marcas do Determinismo, para exprimir essa estética. Ele faz o possível para manifestar, através de seus personagens, os aspectos da teoria determinista de Taine.
Entendemos, assim, que O Determinismo de Taine foi fundamental para o Naturalismo, pois auxiliou os autores dessa estética a analisar, profundamente, a sociedade e o homem e cumprir o papel de denunciar e apresentar os fatos históricos do momento. Destacamos a importância de Zola que iniciou a estética naturalista, inovando a literatura, dando abertura para vários temas que antes eram evitados, por serem considerados impróprios, como, por exemplo, o adultério, o sexualismo e o homossexualismo. As obras naturalistas trataram as personagens dos seus romances o mais próximo possível da realidade e assim, elas se apresentaram cheias de imperfeições, com o objetivo de representar o homem dentro da sociedade. A teoria determinista de Taine se encaixou muito bem nessas obras, já que elas precisavam justificar o comportamento de suas personagens, que eram sempre descritas como produto de patologias de ordem biológica, como por exemplo, desvios psíquicos ou sexuais; ou de ordem social, como, miséria, violência e amoralidade, que as faziam vítimas do fatalismo, presas às determinações impostas pelo meio, raça e momento histórico. Aluísio Azevedo, n’O cortiço fez uso da teoria determinista de Taine e criou tipos humanos cheios de defeitos, imersos num ambiente coletivo, onde o meio e os fatores hereditários eram os seus principais modificadores. O meio foi descrito como se fosse vivo, orgânico, superando o sujeito, como nos casos dos personagens, Jerônimo e Pombinha, que foram influenciados, lentamente, modificando-se totalmente, mudando seus valores e suas atitudes. Também podemos ver que o autor permitiu que dois dos personagens escaparam da influencia do Determinismo, João Romão e o cortiço, que se modificou, vencendo junto com ele; o primeiro consegue ascender para vida burguesa, e o segundo, se transformou em Rua.
Desta forma, O cortiço, apesar de ainda ter algumas características românticas, se reafirma no Naturalismo, por denunciar a maneira de vida da época e empregar as teorias cientificistas, em destaque o Determinismo de Taine,
ABSTRACT
Based on the theory of Determinism philosopher, historian and literary critic Hippolyte Taine Adolf, this article deals with a study of characters in the slum of Aluisio Azevedo. The philosophical theory of Taine greatly influenced the field of literature in the mid-nineteenth century, emphasized the naturalist aesthetic, which had as its main representative Émile Édouard Charles Antoine Zola, who developed the Experimental Novel, where he showed a profound analysis of man and society, using as a basis scientistic theories of the time, including the determinism of Taine. In Brazil, influenced by Zola, Aluisio Azevedo came from scientism and replaced the subjective view on romance novels, wrote The slum where she put into practice the principles naturalists, who believed, and all his artistic ability to apply the theory of Taine.
Keywords : Determinism, Taine, Zola, Aluisio Azevedo, The slum