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A SITUAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA NA INGLATERRA (Engels), Notas de estudo de Língua Inglesa

a desuymana con dição de vida dos operários ingleses em começo da revolução industrial

Tipologia: Notas de estudo

2015

Compartilhado em 13/09/2015

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hamilton-santos-britto-2 🇧🇷

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A situAção dA clAsse

trAbAlhAdorA nA inglAterrA

tradução b. A. schumann

supervisão, apresentação e notas José Paulo netto

Friedrich engels

A situAção dA clAsse

trAbAlhAdorA nA inglAterrA

segundo as observações

do autor e fontes autênticas

É vedada, nos termos da lei, a reprodução de qualquer parte deste livro sem a expressa autorização da editora. Este livro atende às normas do novo acordo ortográfico, com exceção das citações, cuja grafia original foi mantida

boiteMPo editoriAl Jinkings editores Associados ltda. rua Pereira leite, 373 05442-000 são Paulo sP tel./fax: (11) 3875-7250 / 3872- e-mail: editor@boitempoeditorial.com.br site: www.boitempoeditorial.com.br

copyright da tradução © boitempo editorial, 2007, 2010 traduzido do original alemão: Die Lage der Arbeitenden Klasse in England. Leipzig, Otto Wigand Verlag, 1845. Coordenação ivana Jinkings Supervisão, apresentação e notas José Paulo Netto Editores Ana Paula castellani e João Alexandre Peschanski Assistência editorial Ana Lotufo Valverde Tradução b. A. schumann Revisão edison urbano e Mariana echalar Editoração eletrônica aeroestúdio Capa Antonio Kehl sobre desenho de loredano Produção Marcel iha e Paula Pires

ciP-brAsil. cAtAlogAção nA Fonte SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. e48s engels, Friedrich, 1820- A situação da classe trabalhadora na inglaterra / Friedrich engels ; tradução b. A. schumann ; supervisão, apresentação e notas José Paulo Netto. - [Edição revista]. - São Paulo : Boitempo, 2010. 388p. : il. -(Mundo do trabalho ; coleção Marx-engels) tradução de: die lage der Arbeitenden Klasse in england “segundo as observações do autor e fontes autênticas” Anexos Inclui bibliografia e índice isbn 978-85-7559-104-

  1. Trabalhadores - Inglaterra. 2. Grã-Bretanha - Condições econômicas - 1760-1860. I. Título. II. Série.

10-2526. cdd: 331. cdu: 331(420)(09)

  • nota da editora
  • Apresentação
  • Às classes trabalhadoras da Grã-Bretanha
    • Prefácio
    • introdução
    • o proletariado industrial
    • As grandes cidades
    • A concorrência
    • A imigração irlandesa
    • resultados
    • em sentido estrito
    • os outros ramos da indústria
    • os movimentos operários
    • o proletariado mineiro
    • O proletariado agrícola
    • A atitude da burguesia em face do proletariado
    • trabalhadoras na inglaterra. uma greve inglesa dados suplementares sobre a situação das classes
    • Prefácio à edição alemã de 1892....................................................
  • Fontes utilizadas por engels..............................................................
  • Índice onomástico
  • cronologia resumida de Friedrich engels e Karl Marx.................

NOTA dA ediTOrA

A situação da classe trabalhadora na Inglaterra , de Friedrich engels, obra clássica da tradição socialista revolucionária e referência obrigatória na bibliografia das Ciências Sociais, há muito não estava disponível para o público brasileiroa. A edição que a Boitempo agora oferece aos leitores, apresentando uma nova tradução, feita diretamente do alemão por Bernhard A. Schumann b, cuidadosamente revista e cotejada com o original por José Paulo Nettoc, pretende mais que atender a uma reconhecida demanda do mercado editorial: tem o propósito de tornar acessível o ensaio de engels numa versão precisa e segura, propiciando aos estudiosos e ao público mais amplo o acesso a uma fonte textual rigorosa. Foram utilizadas, no cotejo referido, as edições: italiana – La situazione della classe operaia in Inghilterra , em Karl Marx e Friedrich engels, Opere (Riuniti, 1972, v. IV); francesa – La situation de la classe laborieuse en Angle- terre (Éditions Sociales, 1961); inglesa – The Condition of the Working Class in England (Progress, 1973); mexicana – La situación de la clase obrera en Inglaterra , em Karl Marx e Friedrich engels, Obras fundamentales (Fondo de Cultura económica, 1981, v. 2). As notas originais de engels estão numera- das, no rodapé; as eventuais intervenções do editor nessas notas aparecem entre colchetes e podem ser identificadas pela sigla N. e. As demais notas,

a (^) Há anos estão esgotadas as duas versões que dela foram publicadas em português: a primeira sob a chancela da editora Afrontamento (Porto, 1975) e a segunda sob o selo da Global editora (São Paulo, 1986). b (^) A partir do texto contido em Karl Marx-Friedrich Engels Werke (Berlim, dietz, 1972, Band 2). c (^) doutor em Serviço Social, professor titular da escola de Serviço Social da Universidade Federal do rio de Janeiro. Autor, entre outras obras, de Marxismo impenitente (2004) e Capitalismo monopolista e serviço social (1992), ambas publicadas pela editora Cortez.

APreSeNTAçãO

Ao Lenin

Há quase cinquenta anos, um dos mais notáveis historiadores marxis- tas, o professor eric J. Hobsbawm, ao prefaciar uma tradução francesa d’ A situação da classe trabalhadora na Inglaterra , indagava-se dos motivos que justificavam a reedição de uma obra escrita ainda na primeira metade do século XiX e respondia socorrendo-se de

três razões principais – a primeira: este livro é um marco na história do capi- talismo e da moderna sociedade industrial; a segunda: ele constitui uma etapa na elaboração do marxismo, isto é, da nossa compreensão da sociedade; e a terceira diz respeito à sua qualidade literária. Simultaneamente erudito e apaixonado, articulando a denúncia e a análise, ele é, para dizê-lo numa só palavra, uma obra-prima.a Acrescentava, também, que frequentemente “as obras-primas têm ne- cessidade, quando publicadas há mais de um século, de comentários para serem lidas com proveito”. É com esse objetivo que são formulados, nesta apresentação, uns poucos comentários pertinentes a engels e à obra-pri- ma da sua juventude.

dos estudos pioneiros de Gustav Mayer, iniciados já antes da Primeira Guerra Mundial e concluídos em 1932 em sua monumental biografia de Friedrich engels b, aos dias correntes, a crônica da vida do companheiro de lutas e ideias de Karl Marx foi suficientemente esclarecidac.

a (^) Cf. o prefácio reproduzido em F. engels, La situation de la classe laborieuse en Angleterre (Paris, Éditions Sociales, 1961), p. 8. b (^) G. Mayer, Friedrich engels. Biografía (México, Fondo de Cultura económica, 1979). c (^) dentre um largo rol de fontes, pode-se citar: A. Cornu, Karl Marx et Friedrich Engels: leur vie et leur oeuvre (Paris, PUF, 1955-1962, t. i, ii e iii); W. O. Henderson, The Life of Friedrich

ele nasceu em 28 de novembro de 1820 em Barmen (renânia), filho de um rico industrial têxtil (seu pai – falecido em 1860, aos 64 anos – também se chamava Friedrich engels), cujos antepassados habitavam a região do Wuppertal desde o fim do século XVi, e de elizabeth Franziska Mauritia van Haar (1797-1873), mulher de finos dotes intelectuais. Foi o primeiro dos oito filhos do casal e o pai, um rígido pietista, aspirava a torná-lo seu sucessor nos negócios familiares, que tinham ramifica- ções na Inglaterra. Finalizada a sua formação secundária em 1837 – no curso em que revelou inclinações estéticas (poesia, música e desenho) e enorme facilidade para o domínio de idiomas –, o pai encaminhou-o para a vida empresarial, enviando-o a Bremen, onde permaneceu por dois anos e meio, até a Páscoa de 1841. Nesse período, combinou as obrigações comerciais (que detestava) com leituras centradas na literatura e na filosofia alemãs contemporâneas, estudos de filologia comparada e a prática de exercícios físicos, que não abandonará ao longo da vida. Também desses anos são as primeiras intervenções na imprensa (inicia- das em março de 1839) e o gosto pelas viagens (realiza, então, giros pela inglaterra, Suíça e itália). No outono de 1841, está em Berlim: presta o serviço militar num regi- mento de artilharia e frequenta livremente alguns cursos universitários. É nesse período, então, que ingressa, precocemente e com força, no debate intelectual: republicano e democrata sob a influência de Börne, e situado na esquerda hegeliana desde que lera d. F. Strauss, aproxima-se dos Livres de Berlima^ (especialmente edgar Bauer) e combate a pregação anti-hege- liana de Schelling por meio de textos que atraem a atenção da intelectua- lidade de oposição e o tornam conhecido nos meios liberais e democráti- cos. A essência do cristianismo , publicado em 1841, deixa-o impactado: mediante o materialismo de Feuerbach, evolui para a posição segundo a qual cristianismo e filosofia são incompatíveis. A sua consequente op- ção materialista é desdobrada, por meio da marcante influência de Moses Hess, na direção do comunismo pensado humanitária e filosoficamente.

Engels (Londres, Frank Cass, 1976); L. F. ilychov et al., Frederick Engels. A Biography (Mos- cou, Progress Publishers, 1982); T. Carver, Friedrich Engels. His Life and Thought (Londres, Macmillan, 1989); J. d. Hunley, The Life and Thought of Friedrich Engels: A Reinterpreta- tion (New Haven/Londres, Yale University Press, 1991). a (^) Cenáculo de jovens hegelianos, anteriormente reunidos no Doktorklub de que Marx fizera parte; liderados por edgar Bauer e Johann Kaspar Schmidt (Max Stirner), os Livres pouco a pouco deslizarão da oposição liberal para um radicalismo abstrato, inócuo politicamente.

Apresentação

Nos três anos que se seguem, até a eclosão da revolução em Paris (fevereiro de 1848), engels vai se dividir entre a Bélgica e a França, en- tregue vitalmente à organização do movimento operário revolucionário. São anos de atividade febril em que, juntamente com Marx (a quem leva à inglaterra, numa viagem de estudos em julho/agosto de 1845), dedica-se a contatar associações de trabalhadores, a estimular a criação de núcleos proletários e a divulgar, combatendo utopismos e soluções reformistas, ideias comunistas; envolve-se em polêmicas, publica artigos na imprensa operária do continente e da inglaterra, participa de reuniões e comícios. Todo esse empenho ideopolítico – que vai resultar, em finais de 1847, na decisão do ii Congresso da Liga dos Comunistas de atribuir a ele e a Marx a redação do Manifesto do Partido Comunista , documento que será editado em Londres às vésperas da revoluçãoa^ – apoia-se agora sobre fun- damentos mais sólidos: entre setembro de 1845 e agosto de 1846, Marx e engels elaboraram A ideologia alemã b, texto em que lançam as bases da

cidade natal: “[...] Aqui não tenho oportunidade de dar rédea solta a meu temperamen- to. digo-lhe que a vida que levo poderia ser invejada pelo mais brilhante dos filisteus, uma vida tranqüila e pacífica, piedosa e honrada ao extremo, trancado em meu quarto, trabalhando e, como um bom alemão, mal pondo os pés na rua. Se as coisas continua- rem assim, não me espantaria que o bom deus perdoasse meus escritos e me admitisse nos céus. Asseguro-lhe que começo a gozar de boa fama em Barmen”. Na mesma cor- respondência, há mostras dos dilaceramentos pessoais do jovem que, no marco de uma família tradicionalista e possidente, faz uma opção comunista; veja-se a última carta citada: “[...] É repugnante ser não apenas burguês, mas ainda industrial, ou seja, um burguês que participa ativamente na exploração do proletariado. Uns dias na fábrica de meu pai foram suficientes para convencer-me de que tudo isto é asqueroso [...]. Conta- va permanecer nessa atividade apenas o tempo que me conviesse e logo escrever algo atentatório aos olhos da polícia para cruzar a fronteira sem escândalos, no momento aprazado; mas não agüentarei até lá. Creio que eu seria um homem amargurado se não pudesse registrar diariamente no meu livro [ A situação da classe trabalhadora na Ingla- terra ] as coisas odiosas da sociedade inglesa [...]. A verdade é que um comunista pode levar, externamente, uma vida de burguês e ganhar dinheiro, desde que não escreva; mas é impossível dedicar-se, ao mesmo tempo, à propaganda comunista e aos ganhos e à indústria. [...] A isto se soma esta vida constrangedora numa família radicalmente cristã-prussiana – não, as coisas não podem continuar assim [...]” – as passagens são extraídas do volume 2 ( Escritos de juventud ) de Karl Marx e Friedrich engels, Obras fundamentales (México, Fondo de Cultura económica, 1981, p. 735 e 727). a (^) Cf. meu prólogo a Karl Marx e Friedrich engels, Manifesto do Partido Comunista (São Paulo, Cortez, 1998). b (^) A ideologia alemã (São Paulo, Boitempo, 2007), sabe-se, permaneceu inédita até 1932; também se sabe que, muitos anos depois, Marx observou que “abandonamos [ele e en- gels] sem pena o manuscrito à crítica roedora dos ratos” porque “já tínhamos alcançado nosso objetivo principal”, que era esclarecer as próprias concepções – cf. Karl Marx, prefácio a Critique de l´Économie Politique (Oeuvres/Économie. Paris, Bibliothèque de la

Apresentação

A situação da classe trabalhadora na Inglaterra

teoria social, cujo desenvolvimento caberia especialmente a Marx e cujo primeiro desdobramento viria pouco depois, com a marxiana Miséria da filosofia (dada à luz em julho de 1847). Os cerca de dezoito meses que circunscrevem a revolução de 1848 – que explode em Paris na última semana de fevereiro desse ano, alastra- -se pela europa e, sob dura repressão, esgota-se no segundo semestre de 1849 – marcam o fim do primeiro estágio do aprendizado prático- -revolucionário de engels: juntamente com Marx, chega a Colônia em princípios de abril de 1848 e assume, em maio, o posto de vice-redator- -chefe do jornal Neue Rheinische Zeitung [Nova Gazeta Renana] – que, sob a direção de Marx, orientará a vanguarda revolucionária alemã a^. Até a vitória da contrarrevolução, engels estará na primeira linha da luta, envolvido em combates e confrontos (elberfeld, Palatinado e Baden) b^. A derrota do movimento obrigará os dois companheiros ao exílio na in- glaterra e, ao chegar à ilha, em princípios de novembro de 1849, engels iniciará uma nova etapa em sua vida. Permanecerá quase um ano em Londres, articulando, com Marx, a reorganização da Liga dos Comunistas, necessária após o desfecho do processo revolucionárioc. em meados de novembro de 1850, estabelece- -se em Manchester, retomando seus afazeres na empresa em que estagiara anteriormente (ermen & engels) e da qual se tornará coproprietário em

  1. Por quase vinte anos, até junho de 1869, engels experimentará o que ele mesmo, aludindo à história do povo judeu, designará como “o ca- tiveiro egípcio”: será um escravo dos negócios, o que lhe dará condições de oferecer a Marx o continuado apoio financeiro sem o qual este não

Pléiade, 1965, i, p. 274). Mas o fato é que ele e engels, uma vez concluída a redação da obra, esforçaram-se por encontrar um editor que se dispusesse a publicá-la; somente em meados de 1847 desistiram de prosseguir nas muitas tentativas que fizeram nesse senti- do. Cabe salientar que, se a contribuição de engels foi diminuta na redação d’ A sagrada família , o mesmo não se deu na elaboração d’ A ideologia alemã – é a partir dessa obra que os dois amigos se ombreiam no trabalho comum. a (^) O essencial dos textos de Marx e engels publicados nesse periódico está reunido em Karl Marx e Friedrich engels, La Nouvelle Gazette Rhénane (Paris, Éditions Sociales, 1963- -1971, t. i, ii e iii). b (^) Para uma análise da intervenção de Marx e engels no processo revolucionário de 1848, cf. o belo ensaio de Fernando Claudín, Marx, Engels y la revolución de 1848 (Madri, Siglo XXi, 1975). c (^) No fim de 1852, a Liga é dissolvida. Sobre essa organização, cf. M. i. Mijailov, Historia de la Liga de los Comunistas (Moscou, Nauka, 1968).

A situação da classe trabalhadora na Inglaterra

tiria, quando da guerra franco-prussiana, elaborar os significativos ma- teriais que, entre julho de 1870 e fevereiro de 1871, publicou na Pall Mall Gazette a^. esses anos, contudo, são extremamente importantes para a consolidação de sua cultura enciclopédica: amplia seu já invejável conhecimento idiomático com o aprendizado de línguas eslavas e do persa, volta-se para a história do Oriente, dedica-se com afinco ao estu- do das ciências naturais e reúne documentação para escrever uma his- tória da irlanda, projeto que nunca concluiu. Ademais, a partir de 1860, realiza inúmeras viagens pela europa b^. Aos cinquenta anos, em plena maturidade intelectual e com invejá- vel disposição física, sem ter que se preocupar com questões financeiras, engels transfere-se para Londres em setembro de 1870 e aí viverá o quarto de século que lhe restará. Logo assume tarefas na Associação internacio- nal dos Trabalhadores, criada em 1864: torna-se, por eleição (4 de outu- bro de 1870), membro do seu Conselho Geral e passa a responder pelas relações com as seções belga, italiana, espanhola, portuguesa e dinamar- quesa da organização, que depois seria conhecida como Primeira inter- nacional. Participará, ao lado de Marx, de todos os eventos, iniciativas e polêmicas (como, por exemplo, a travada contra a facção bakuninista), que marcaram a existência da organização às vésperas de sua dissolução. Quando esta ocorre (de fato, em 1872, com o deslocamento de sua sede para Nova York; de direito, em 1876), engels já é reconhecido como uma liderança revolucionária mundial c. As tarefas organizativas no marco da Primeira internacional e as que se lhe seguiram foram conduzidas paralelamente a uma intensa produti- vidade teórica, facilitada pelo acúmulo realizado nos anos do “cativeiro egípcio”. A atividade do publicista prossegue em jornais e periódicos de

a (^) Uma seleção desses escritos encontra-se em Friedrich engels, Temas militares (Buenos Aires, Cartago, 1974). O interesse de engels pelos temas militares valeu-lhe, no círculo íntimo, o apelido de General. b (^) regressa várias vezes à Alemanha, visita a Suécia, a dinamarca e a irlanda. O gosto por viagens é traço da personalidade de engels: em 1888, conhecerá os estados Unidos e o Canadá; entre 1890 e 1893, percorrerá a Noruega, voltará à irlanda e ainda revisitará a Suíça e a Áustria, sem contar algumas idas à Alemanha. c (^) Sobre a Primeira internacional, cf. Annie Kriegel, Les Internationales Ouvrières. 1864- -1943 (Paris, PUF, 1964). Boa parcela da contribuição de engels à documentação pro- duzida pela Primeira internacional, assim como parte de sua correspondência pertinente com Marx, está reunida no volume 17 (“La internacional”) de Karl Marx e Friedrich engels, Obras fundamentales (México, Fondo de Cultura económica, 1988).

vários países; mas ele dá à luz contribuições mais densas, como a Contri- buição ao problema da habitação (1873) e A subversão da ciência pelo Sr. Dühring a^ , e começa a esboçar A dialética da natureza , que, inconclusa, será publicada postumamente (1927). A morte de Marx, pouco antes de completar 65 anos (14 de março de 1883), impõe-lhe um duplo trabalho: de uma parte, substituir o camarada de armas na direção política da vanguarda proletária; de outra, cuidar de seu legado teórico, na condição de seu testamenteiro literário – e nisso engels consumiu os doze anos seguintes, sem prejuízo da continuidade de sua obra pessoal (em 1884, publica A origem da família, do Estado e da propriedade privada ; em 1886, Ludwig Feuerbach e o fim da filoso- fia clássica alemã , texto a que apensa as até então inéditas Teses sobre Feuerbach , que Marx redigira em 1846)b. No tocante à direção do movimento proletário, a intervenção de en- gels – realizada também por meio de copiosa correspondência com diri- gentes políticos e intelectuais de inúmeros países – foi notável: a atenção que dedicou à social-democracia alemã (visível, por exemplo, nas críticas que a ela dirigiu às vésperas do Congresso de erfurt, em 1891) correu paralela a seu cuidado com as dimensões internacionalistas do movimen- to operário e revolucionário (de que é prova seu estímulo ao Congresso internacional dos Trabalhadores Socialistas, realizado em Paris, em 1889, no qual se funda a internacional Socialista, depois conhecida como Se- gunda internacional c). Decorrência desse trabalho diuturno – em que sua experiência e seu saber eram colocados à disposição de líderes políticos, organizações socialistas e militantes operários –, na passagem do seu sep- tuagésimo aniversário, manifestações de apreço enviadas de todas as par-

a (^) Publicado em 1878, esse livro – conhecido depois como Anti-Dühring – tornar-se-ia o texto responsável pela formação de várias gerações de marxistas (em 1880, partes da obra foram reunidas numa versão francesa sob o título Do socialismo utópico ao socialis- mo científico ). Uma contribuição à análise dessa obra, salientando seus méritos e limites, encontra-se em V. Gerratana, Investigaciones sobre la historia del marxismo (Barcelona, Grijalbo, 1975, i, p. 147-84). b (^) Outros textos significativos de engels, nessa etapa final, são: Contribuição à história da Liga dos Comunistas (1885), O socialismo na Alemanha (1891), História do cristianismo antigo e A questão camponesa na França e na Alemanha (1894); o último trabalho impor- tante de engels, considerado por muitos seu “testamento político”, escrito entre fevereiro e março de 1895 e publicado em seguida, foi sua introdução à As Luta de classes na França (1848-1850), de Marx. c (^) Uma síntese da história dessa organização é fornecida por J. Joll, La II Internacional. Movimiento obrero 1889/1914 (Barcelona, icaria, 1976).

Apresentação

referindo-se a sua relação com Marx, engels anotou, dez anos depois da morte do amigo, numa carta a F. Mehring:

[...] O senhor me atribui mais méritos [na elaboração do materialismo históri- co ] do que mereço, mesmo somando tudo o que, com o tempo, eu possivel- mente teria descoberto por mim mesmo, mas que Marx descobriu antes com seu coup d´oeil mais rápido e com sua visão mais ampla. Quando se tem a sorte de trabalhar durante 40 anos com um homem como Marx, normalmente não se é, enquanto ele vive, tão reconhecido como se crê merecer; quando, porém, o grande homem morre, freqüentemente o menor vem a ser superes- timado – e este parece agora exatamente meu caso. A história acabará colo- cando tudo isso no devido lugar, mas então já terei passado ao outro mundo e não saberei mais nada de nada.a Colocando-se sempre como o “segundo violino” em sua relação com Marx, engels rendia preito de verdade à grandeza intelectual do com- panheiro: é inconteste que nenhum teórico social moderno alteia-se ao nível da genialidade de Marx. entretanto, ao realçar o fato, com suas costumeiras generosidade e honestidade, engels também certamente co- laborou para dificultar a apreciação tanto de seu próprio valor intelectual quanto da contribuição teórica que ofereceu ao desenvolvimento de Marx b^ – colaborou, em suma, para que gerações de marxistas e cientistas sociais não tivessem a suficiente clareza acerca de outro fato: o de que ele, engels, no acertado dizer de Florestan Fernandes, era um pensador com luz própria. Ora, essa luz própria já se evidencia no trato dos materiais do jovem engels, considerando como tais os seus escritos até a redação, com Marx, d’ A ideologia alemã c. Se, justificadamente, os textos do jovem Marx rece- beram, a partir de sua publicação, especialmente nos anos trinta do sécu-

a (^) Carta de engels a Mehring, datada de 14 de julho de 1893, em Karl Marx e Friedrich engels, Oeuvres choisies (Moscou, Progrès, 1975), p. 720-1. b (^) Apenas um exemplo: um estudo cuidadoso da correspondência trocada entre ambos, especialmente entre o fim dos anos 1850 e meados dos anos 1860, sugere o quanto os estudos econômico-políticos de Marx devem a engels; e não se pode esquecer que o Esboço de uma crítica da economia política , a que me referirei adiante, foi decisivo nos rumos tomados pela reflexão de Marx em meados dos anos 1840. c (^) Também, como no caso de Marx, parece-me uma “estupidez historiográfica” (Lukács) contrapor o jovem engels ao engels da maturidade – não há “corte”, mas relação de rup- tura e continuidade no pensamento e na prática dos dois teóricos, com suas respectivas obras constituindo uma unidade (a que, naturalmente, é alheia a reiteração identitária).

Apresentação

A situação da classe trabalhadora na Inglaterra

lo XX, uma atenção cuidadosa, quase sempre a produção do jovem engels é descurada e reduzida, injustificadamente, ao tour de force intelectual que resultou n’ A situação da classe trabalhadora na Inglaterra a^. Não pode restar qualquer dúvida de que esse livro é o mais importante dos trabalhos de juventude de engels, redigido e publicado quando o autor ainda não completara 25 anos; todavia, a produção juvenil de engels está longe de limitar-se a eleb. As precoces primícias literárias de engels não devem ser levadas muito a sério: poemas de pouca valia, coisas de adolescente absolutamente co- muns em moços superiormente dotados, que depois a vida adulta encar- rega-se de pôr na conta de pecadilhos da juventude. Mas suas “Cartas de Wuppertal”, que publica em março-abril de 1839, no periódico hambur- guês Telegraph für Deutschland , dirigido por Gutzkow, merecem atenção; com elas inicia a sua intervenção na imprensa – prosseguida nesse órgão até fins de 1841, sob o pseudônimo de Friedrich Oswald –, criticando o pietismo que asfixiava a sua região natal e apontando para o viés da crítica social. Já então se manifestam os seus dotes estilísticos e, na continuidade de sua colaboração ao Telegraph für Deutschland , pronunciando-se sobre textos referentes a narrativas populares, seus argutos juízos literários. estimulado pela Jovem Alemanhac^ , põe-se sob a influência de Börne, que facilita seu caminho para o republicanismo e o radicalismo demo- crático. de Börne a Hegel foi o passo seguinte, por uma via complexa, mediado pela crítica da religião (e recorde-se que, como o jovem Marx o notou, na Alemanha daqueles anos, a crítica da religião era o vestíbulo para a crítica social) operada por Strauss; mas é passo dado: em fins de 1840, engels se assume neo-hegeliano. e é como tal que chega a Berlim no segundo semestre de 1841. e chega no momento exato em que Frederico Guilherme iV, há pouco no trono da Prússia, frustra as expectativas da intelectualidade liberal, dei-

a (^) Além do já citado Mayer (cf. nota b, p. 9), constituem exceção a esse reducionismo Cornu (cf. nota c, p. 9), G. Lukács (cf. o ensaio dedicado a engels no volume Marx e Engels como historiadores da literatura. Porto, Nova Crítica, s.d.) e P. Vranicki ( Storia del marxismo. roma, riuniti, 1973, v. i). b (^) O essencial dos escritos juvenis de engels está acessível no volume 2 da edição mexicana de Karl Marx e Friedrich engels, Obras fundamentales , cit. c (^) Grupo de escritores democratas e críticos do liberalismo (Gutzkow, Laube, Wienbarg, Mundt), constituído nos anos trinta do século XiX e liderado por Heine e Börne. O pro- cesso revolucionário de 1848 dispersou-os e boa parte deles passou para o campo da burguesia liberal.