Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Adaptações de Plantas Submersas à Absorção de Carbono Inorgânico, Exercícios de Crescimento

Este documento discute as principais adaptações de plantas submersas para evitar a limitação de carbono no ambiente aquático, incluindo a utilização do metabolismo c4, do ácido das crassuláceas (cam), da utilização do bicarbonato (hco3-), da utilização do co2 da água intersticial do sedimento e o desenvolvimento de folhas aéreas. O texto também aborda as variáveis correlacionadas com os atributos populacionais de macrófitas submersas, como luminosidade subaquática e nutrientes inorgânicos, especialmente nitrogênio e fósforo.

O que você vai aprender

  • Qual é a importância do metabolismo C4 e do ácido das crassuláceas (CAM) nas plantas submersas?
  • Como a luminosidade subaquática e os nutrientes inorgânicos influenciam as populações de macrófitas submersas?
  • Como as plantas submersas utilizam o bicarbonato e o CO2 da água intersticial do sedimento?
  • Quais são as principais variáveis correlacionadas com os atributos populacionais de macrófitas submersas?

Tipologia: Exercícios

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Agua_de_coco
Agua_de_coco 🇧🇷

4.6

(326)

768 documentos

1 / 13

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004
Review paper/Artigo de revisão
Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico
Sandra Andréa Pierini1,3 e Sidinei Magela Thomaz2
Recebido em 03/06/2003. Aceito em 18/02/2004
RESUMO – (Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico). No presente trabalho são discutidos alguns aspectos
teóricos dos mecanismos e adaptações empregados pela vegetação submersa para maximizar o aproveitamento do carbono inorgânico na
água. O tipo de estratégia utilizada pelas macrófitas aquáticas submersas deve-se a diferenças genéticas entre as espécies e também às
condições ambientais predominantes. Vários mecanismos fisiológicos e morfológicos, como a utilização do metabolismo C4, do ácido das
crassuláceas (CAM), a utilização do bicarbonato (HCO3-), a utilização do CO2 da água intersticial do sedimento e o desenvolvimento de
folhas aéreas foram considerados as principais adaptações para evitar a limitação do carbono no ambiente aquático. De relevância
ecológica, a utilização destas diferentes estratégias pode compensar baixas ofertas de CO2 às taxas fotossintéticas de várias espécies
submersas e suprimir a fotorrespiração por garantir altas concentrações intracelulares de CO2. Assim, estes mecanismos são responsáveis,
em parte, pelo sucesso das macrófitas aquáticas submersas em ambientes oligotróficos, com baixas concentrações de CO2.
Palavras-chave: planta submersa, carbono inorgânico
ABSTRACT – (Adaptations of submerged plants to inorganic carbon uptake). In this paper, the main theoretical aspects of the
mechanisms and adaptations used by submerged vegetation to maximize the utilization of inorganic carbon are discussed. The type of
strategy used by submerged plants is related to both genetic differences among species and environmental conditions. The use of C4
metabolism and crassulacean acid metabolism (CAM), uptake of bicarbonate (HCO3-), uptake of CO2 from interstitial (sediment) water
and the development of aerial leaves are considered the main physiological and morphological adaptations to avoid CO2 limitation. These
mechanisms are ecologically important given that their utilization overcome the low CO2 availability to several submerged species. In
addition, they suppress the photorespiration by increasing the intracellular CO2 concentrations. Thus, these mechanisms are considered
among the main reasons to explain the success of submerged plants even in CO2-poor, oligotrophic aquatic ecosystems.
Key words: submerged plant, inorganic carbon
Introdução
As macrófitas aquáticas apresentam grande
plasticidade fisiológica que as tornam capazes de
colonizar os ambientes com as mais diversas
características físicas e químicas. Representadas por
diferentes tipos biológicos, as plantas aquáticas
retornaram do ambiente terrestre para o ambiente
aquático, durante sua evolução, mostrando marcada
gradação nas adaptações associadas com a vida neste
último ambiente (Sculthorpe 1967).
Considerando um gradiente de distribuição
perpendicular à margem, as macrófitas submersas
habitam locais mais profundos do ambiente aquático,
sucedidas pelas macrófitas enraizadas com folhas
flutuantes e, por fim, as emergentes que geralmente
ocupam a zona marginal dos lagos (Sculthorpe 1967).
Desta forma, as maiores adaptações para a
sobrevivência no ambiente aquático foram
desenvolvidas pelas plantas submersas que,
diferentemente das flutuantes e emergentes, encontram
seus requerimentos quase que totalmente na água e
sedimento.
Vários trabalhos, realizados em diferentes
ecossistemas aquáticos, demonstraram que a
luminosidade subaquática e os nutrientes inorgânicos,
especialmente o nitrogênio e o fósforo, são as principais
variáveis correlacionadas com os atributos
populacionais (e.g. profundidade máxima de
colonização, biomassa, percentagem de cobertura) de
1Programa de Pós-graduação em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais, Departamento de Biologia, Universidade Estadual de
Maringá, Av. Colombo, 5790, CEP87020-900, Maringá, Paraná, Brasil
2Nupélia, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, CEP 87020-900, Maringá, Paraná, Brasil (smthomaz@nupelia.uem.br)
3Autor para correspondência: sapierini@nupelia.uem.br
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Adaptações de Plantas Submersas à Absorção de Carbono Inorgânico e outras Exercícios em PDF para Crescimento, somente na Docsity!

Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004

Review paper/Artigo de revisão

Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico

Sandra Andréa Pierini1,3^ e Sidinei Magela Thomaz^2

Recebido em 03/06/2003. Aceito em 18/02/

RESUMO – (Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico). No presente trabalho são discutidos alguns aspectos teóricos dos mecanismos e adaptações empregados pela vegetação submersa para maximizar o aproveitamento do carbono inorgânico na água. O tipo de estratégia utilizada pelas macrófitas aquáticas submersas deve-se a diferenças genéticas entre as espécies e também às condições ambientais predominantes. Vários mecanismos fisiológicos e morfológicos, como a utilização do metabolismo C4, do ácido das crassuláceas (CAM), a utilização do bicarbonato (HCO 3 - ), a utilização do CO 2 da água intersticial do sedimento e o desenvolvimento de folhas aéreas foram considerados as principais adaptações para evitar a limitação do carbono no ambiente aquático. De relevância ecológica, a utilização destas diferentes estratégias pode compensar baixas ofertas de CO 2 às taxas fotossintéticas de várias espécies submersas e suprimir a fotorrespiração por garantir altas concentrações intracelulares de CO 2. Assim, estes mecanismos são responsáveis, em parte, pelo sucesso das macrófitas aquáticas submersas em ambientes oligotróficos, com baixas concentrações de CO 2.

Palavras-chave : planta submersa, carbono inorgânico

ABSTRACT – (Adaptations of submerged plants to inorganic carbon uptake). In this paper, the main theoretical aspects of the mechanisms and adaptations used by submerged vegetation to maximize the utilization of inorganic carbon are discussed. The type of strategy used by submerged plants is related to both genetic differences among species and environmental conditions. The use of C metabolism and crassulacean acid metabolism (CAM), uptake of bicarbonate (HCO 3 - ), uptake of CO 2 from interstitial (sediment) water and the development of aerial leaves are considered the main physiological and morphological adaptations to avoid CO 2 limitation. These mechanisms are ecologically important given that their utilization overcome the low CO 2 availability to several submerged species. In addition, they suppress the photorespiration by increasing the intracellular CO 2 concentrations. Thus, these mechanisms are considered among the main reasons to explain the success of submerged plants even in CO 2 -poor, oligotrophic aquatic ecosystems.

Key words : submerged plant, inorganic carbon

Introdução

As macrófitas aquáticas apresentam grande plasticidade fisiológica que as tornam capazes de colonizar os ambientes com as mais diversas características físicas e químicas. Representadas por diferentes tipos biológicos, as plantas aquáticas retornaram do ambiente terrestre para o ambiente aquático, durante sua evolução, mostrando marcada gradação nas adaptações associadas com a vida neste último ambiente (Sculthorpe 1967). Considerando um gradiente de distribuição perpendicular à margem, as macrófitas submersas habitam locais mais profundos do ambiente aquático, sucedidas pelas macrófitas enraizadas com folhas

flutuantes e, por fim, as emergentes que geralmente ocupam a zona marginal dos lagos (Sculthorpe 1967). Desta forma, as maiores adaptações para a sobrevivência no ambiente aquático foram desenvolvidas pelas plantas submersas que, diferentemente das flutuantes e emergentes, encontram seus requerimentos quase que totalmente na água e sedimento. Vários trabalhos, realizados em diferentes ecossistemas aquáticos, demonstraram que a luminosidade subaquática e os nutrientes inorgânicos, especialmente o nitrogênio e o fósforo, são as principais variáveis correlacionadas com os atributos populacionais ( e.g. profundidade máxima de colonização, biomassa, percentagem de cobertura) de

(^1) Programa de Pós-graduação em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais, Departamento de Biologia, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, CEP87020-900, Maringá, Paraná, Brasil (^2) Nupélia, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, CEP 87020-900, Maringá, Paraná, Brasil (smthomaz@nupelia.uem.br) (^3) Autor para correspondência: sapierini@nupelia.uem.br

630 Pierini & Thomaz: Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico

macrófitas aquáticas submersas (Sand-Jensen 1989; Duarte 1991; Bini et al. 1999). Contrariamente, poucos trabalhos têm considerado o carbono inorgânico como potencialmente limitante às taxas de fotossíntese de macrófitas aquáticas submersas. De fato, o carbono é geralmente um elemento inesgotável devido à sua contínua oferta da atmosfera e produção considerável durante os processos de decomposição e respiração de organismos aquáticos (Vadstrup & Madsen 1995). Entretanto, a disponibilidade restrita de CO 2 pela zona de interface (“boundary layer”), e baixas taxas de difusão deste gás, devido à viscosidade elevada da água, podem ser considerados os principais fatores que limitam as taxas de fotossíntese e de crescimento de muitas macrófitas aquáticas submersas (Black et al. 1981; Sand-Jensen 1983; Maberly & Spence 1983). Por esta razão, as macrófitas submersas desenvolveram várias adaptações morfológicas e fisiológicas para evitar a limitação do carbono no ambiente aquático. Dentre estas, destacam-se o metabolismo C 4 , metabolismo ácido das crassuláceas (CAM), a utilização do HCO 3 - , a utilização do CO 2 da água intersticial do sedimento e o desenvolvimento de folhas aéreas. O objetivo do presente trabalho foi apresentar alguns aspectos teóricos de adaptações de macrófitas aquáticas submersas para maximizar o aproveitamento do carbono e algumas implicações ecológicas dessas adaptações para a competição entre estas plantas.

Dinâmica da fixação do CO 2 dissolvido no

ambiente aquático

A difusão do CO 2 a partir da atmosfera e a cinética das formas de carbono dissolvido no ambiente aquático são certamente de grande importância para os organismos fotossintetizantes que dependem da disponibilidade de CO 2 neste ambiente (Wetzel 1983). A magnitude de trocas de CO 2 entre a água e a atmosfera é de natureza difusiva, sendo que a pressão parcial e a temperatura são fatores considerados primordiais no fluxo deste gás. A solubilidade do CO 2 na água segue a regra de Henry. O coeficiente da solubilidade é dependente da temperatura e é alto para o CO 2 (1.019ml CO 2 l-1^ na água a 15ºC). Este coeficiente é definido como o volume de gás seco, em mililitros, a 0ºC e 760mmHg, dissolvido em 1L de água quando a pressão parcial do CO 2 é 760 mmHg. Em outras palavras, a quantidade de CO 2 na água em equilíbrio com a atmosfera é aproximadamente a mesma quantidade em um volume

de ar idêntico (Madsen & Sand-Jensen 1991; Prins & Elzenga 1989). Em ambientes aquáticos em equilíbrio com o ar, o CO 2 encontra-se em concentrações entre 13 e 27μmol a aproximadamente 20ºC (Maberly & Spence 1983; Sand-Jensen 1983). Nestas concentrações, o CO 2 pode ser suficiente para a manutenção de taxas de fotossíntese de algumas espécies de macrófitas submersas, como por exemplo de Elodea canadensis (Vadstrup & Madsen 1995). Entretanto, condições de equilíbrio na natureza são raras e taxas de consumo e produção de gases nos lagos excedem as taxas de trocas com a atmosfera levando a condições de supersaturação ou déficit (Lampert & Sommer 1997). O CO 2 , cujos suprimentos no ambiente aquático provêm principalmente da atmosfera, da respiração e da decomposição, pode apresentar-se sob diferentes formas químicas neste ambiente. Quando o CO 2 reage com a água, uma pequena proporção (menos que 1%) é hidratada para formar ácido carbônico (Wetzel, 1983): CO 2 + H 2 O ↔ H 2 CO 3 Uma parte do ácido carbônico formado se dissocia e forma bicarbonato e íons hidrogênio (essa reação diminui o pH): H 2 CO 3 ↔ HCO 3 -^ + H+. A terceira reação resulta na liberação de outro próton: HCO 3 -^ ↔ CO 3 2-^ + H+. As proporções das diferentes formas de carbono inorgânico são dependentes do pH (Wetzel, 1983) e podem ser definidas se os seguintes parâmetros são conhecidos: (1) pH; (2) A concentração de carbono inorgânico dissolvido total: [∑CO 2 ] = [CO 2 ] + [HCO 3 - ]

  • [CO 3 2-]; (3) A alcalinidade do sistema: [Alk] = [HCO 3 - ] + 2[CO 3 2-] + [OH-] - [H+] (Prins & Elzenga 1989). Se o pH aumenta (como resultado da absorção do CO 2 pelos organismos fotossintéticos, por exemplo), o equilíbrio move-se para produção de carbonatos. Por outro lado, em valores mais baixos de pH (resultantes de processos de respiração e decomposição, por exemplo) as formas CO 2 e H 2 CO 3 predominam. Dentre as diferentes formas de carbono, o HCO 3 - apresenta-se em concentrações mais elevadas que o CO 2 a partir do pH 6,35 (Smith & Walker 1980). Embora a maioria dos ecossistemas aquáticos tropicais possua valores de pH levemente ácido, o HCO 3 -^ pode tornar-se a principal forma de carbono disponível à fotossíntese de macrófitas aquáticas. Desta forma, em ambientes produtivos, com valores de pH entre 7 e 8, a capacidade de utilizar o bicarbonato como fonte adicional de carbono deve ser importante para o sucesso competitivo de algumas espécies de

632 Pierini & Thomaz: Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico

carboxilação como a principal resistência de absorção deste gás. De acordo com essa afirmação, os movimentos de água mais rápidos aumentam o fluxo de CO 2 para a planta, propiciando maior disponibilidade de CO 2 , comparado ao O 2 , para o sítio de carboxilação da enzima ribulose 1,5-bifosfato (RuBP carboxilase/ oxigenase), freqüentemente chamada de Rubisco (Prins & Elzenga 1989). A segunda equação é descrita como: P= ½ {(CR-

  • Km R-1^ + Pmax ) - [( R-1^ C + Km R-1^ + Pmax )^2 – 4R- C Pmax ]½}, onde: P= fotossíntese, Pmax = é a taxa fotossintética máxima, Km = constante de Michaelis- Menten para a enzima de carboxilação do carbono, R= resistência de transporte (unidade em s cm-1) e C= a concentração de CO 2 no meio externo. Essa equação combina a resistência de transporte do CO 2 pela zona de interface e a reação catalisada pela enzima Rubisco (equação de Michaelis-Menten) através da lei de Fick, tornando a resposta fotossintética aos incrementos do carbono mais linear. Vários trabalhos realizados em laboratório demonstraram que em macrófitas aquáticas submersas, a relação entre as taxas fotossintéticas e a concentração de carbono inorgânico segue um parâmetro menos gradual do que o apresentado pela equação de Michaelis-Menten, pois as taxas fotossintéticas de macrófitas submersas são somente proporcionais à concentração do carbono quando esta concentração encontra-se reduzida (Smith & Walker 1980). Em outras palavras, quando a resistência de transporte do CO 2 pela zona de interface aumenta, a relação entre as taxas fotossintéticas em condições de baixa concentrações de CO 2 no meio altera-se da forma de hipérbole (Michaelis-Menten) para uma resposta mais linear (Hill-Withingham) (Fig. 3). Por exemplo, Jones et al. (2000) demostraram que a relação entre as taxas fotossintéticas de Elodea nuttalli e as concentrações de CO 2 foi melhor descrita pela equação de Whittingham-Hill (R^2 = 0.93) comparativamente à equação de Michaelis Menten (R^2 = 0.75), evidenciando a maior resistência difusiva do CO 2 pela zona de interface do que a resistência de sua cinética enzimática. O desvio da cinética de Michaelis-Menten, causado pela alta resistência de transporte do CO 2 pela zona de interface deve refletir no aumento dos valores da constante da saturação média ( Km (CO 2 )) (Madsen & San-Jensen 1991). Desta forma, quanto mais espessa for a camada da zona de interface, utilizando a equação de Michaelis-Menten, maiores serão os valores de Km. Esta constatação apresenta grande implicação

ecológica, pois os valores de Km (CO 2 ), freqüentemente utilizados para comparar a eficiência de utilização do carbono entre as plantas de uma mesma espécie e entre espécies diferentes, podem ser superestimados. Por esta razão, a equação de Michaelis-Menten, para modelar a resposta da fotossíntese aos incrementos de CO 2 deve ser aplicada somente quando esta camada for extremamente reduzida (Smith &Walker 1980). Adicionalmente, comparações das taxas fotossintéticas intra e interespecíficas devem considerar esta variável. A importância da zona de interface como a principal limitação às taxas de fotossíntese de macrófitas submersas pode ser claramente demonstrada pela manipulação da espessura desta camada. Por exemplo, através de um experimento utilizando Elodea nuttalli , Jones et al. (2000) demos- traram haver maiores taxas fotossintéticas em fluxos de água mais rápidos (854μmol O 2 g-1^ clorofila min-1) quando comparadas com fluxos mais lentos (583μmol O 2 g-1^ clorofila min-1). De maneira similar, Wetslake (1967) mediu taxas fotossintéticas mais elevadas de Ranunculus pseudofluitan e Potamogeton pectinatus em fluxos de água também mais rápidos. Assim, pode-se concluir que os valores de Km (CO 2 ) e das taxas de fotossíntese de macrófitas submersas dependem da espessura da zona de interface. Correlações intra e interespecíficas das taxas fotossintéticas de macrófitas submersas com

Figura 3. Modelo teórico de curvas de taxas fotossintéticas em função da concentração do CO 2 baseada na equação de Michaelis- Menten (curva A); e na equação de Hill-Whittingham em três resistências de transporte: curva B (250 s cm-1), curva C (500 s cm-1), curva D (750 s cm-1) (Baseado em Madsen & Sand-Jensen 1991).

Concentração de CO 2

Taxas fotossintéticas

Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004 633

concentrações de clorofila e com a atividade da enzima Rubisco também têm sido freqüentemente aplicadas como medida da capacidade de extração do carbono da água. Estas relações são importantes para entender a regulação das taxas de fotossíntese da vegetação submersa. De acordo com Madsen et al. (1993), as espécies com elevada capacidade de extrair o carbono da água, como por exemplo aquelas que utilizam o HCO 3 - , apresentam menores concentrações de clorofila e menor atividade da enzima Rubisco. Isto corrobora a hipótese mais geral de que plantas submersas que apresentam fontes alternativas de assimilação do carbono, tais como o metabolismo do tipo C 4 , a utilização do HCO 3 - , entre outras, otimizam o processo de carboxilação e por essa razão, reduzem a atividade da enzima e a concentração de clorofila. O transporte ativo do HCO 3 -^ pela plasmalema pode ser considerado outro importante regulador das taxas fotossintéticas de várias espécies submersas. Somente algumas espécies de macrófitas aquáticas submersas são capazes de utilizar este íon como fonte alternativa de carbono inorgânico. Alguns detalhes de como ocorre o processo de utilização deste íon pelas plantas submersas serão considerados posteriormente.

Adaptações utilizadas pelas macrófitas

submersas para evitar a limitação do carbono

no ambiente aquático

Metabolismo C 3 (Ciclo de Calvin)

A redução do carbono na maioria das plantas aquáticas ocorre no cloroplasto por intermédio do ciclo de Calvin. A enzima catalisadora desta reação é a Rubisco, que apresenta atividade oxigenase e carbolixase. Em outras palavras, o oxigênio compete com o CO 2 pelo sítio ativo desta enzima. Na presença de baixas concentrações de CO 2 e de concentrações de O 2 relativamente altas, a enzima Rubisco catalisa a atividade oxigenase para produzir um PGA (3-fosfoglicerato) e uma molécula de fosfoglicolato. Esta atividade, da oxigenase com a Rubisco, consome O 2 e libera CO 2 , propiciando um processo denominado de fotorrespiração (Raven et al. 1992). Ambientes aquáticos produtivos apresentam valores de pH entre 7 e 9, nos quais as concentrações de CO 2 são baixas podendo ser limitantes à fotossíntese (Jones et al. 1993; 2000; Prins & Elzenga 1989). As plantas submersas que crescem em tais ambientes freqüentemente experimentam condições adversas como aumento na concentração de O 2 e redução na

concentração do CO 2 , restringindo a assimilação fotossintética e induzindo a atividades fotorrespiratórias (Jones et al. 1993). Dessa forma, a fotossíntese de plantas submersas que apresentam o metabolismo C 3 como via de redução do carbono é sempre acompanhada pela fotorrespiração. Este processo reduz a eficiência da fotossíntese porque desvia parte do poder redutor das reações dependentes da luz e não gera nenhum ATP (Raven et al. 1992). Além disso, a elevada atividade oxigenase da enzima Rubisco aumenta os valores do ponto de compensação do CO 2. Os valores do ponto de compensação variam amplamente entre as espécies de macrófitas aquáticas em respostas a rápidas mudanças ambientais, tais como luz, oxigênio e temperatura (Bowes 1985). Maberly & Spence (1983) elevaram as concentrações de oxigênio em experimento utilizando Hippuris vulgaris e observaram aumento no ponto de compensação do CO 2 de 0,7μmol L-1^ em 47% de saturação (133μmol O 2 /L) para 2,3μmol L-1^ em 169% de saturação (479μmol O 2 /L). Em ambientes aquáticos com elevados valores de pH, o ponto de compensação do íon HCO 3 -^ pode apresentar maior importância que o ponto de compensação do CO 2. Este primeiro pode alterar de 20 a 1.800μmol enquanto o ponto de compensação do CO 2 pode variar entre 0 e 10μmol (Maberly & Spence 1983). Entretanto, devido à dependência do estado fisiológico das espécies, ambos os pontos de compensação não podem ser considerados como atributos constantes, mas como indicadores da habilidade das espécies de utilizar diferentes formas de carbono inorgânico (Bowes 1985). De relevância ecológica é o fato de que diferentes valores do ponto de compensação estão associados com a razão fotossíntese/fotorrespiração (Bowes 1987). Assim, menores valores do ponto de compensação representam maior afinidade ao carbono que, por sua vez, devem garantir às espécies submersas taxas fotossintéticas mais elevadas. De maneira similar, os valores da constante de saturação média ( Km ), que expressa a concentração do CO 2 na qual a fotossíntese atinge metade da taxa fotossintética máxima, também podem alterar-se de acordo com a forma de carbono disponível. Os maiores valores da constante de saturação média do íon HCO 3 -^ comparado com o CO 2 devem ser explicados pelo alto custo energético envolvido com sua absorção. Algumas macrófitas submersas apresentam, além de adaptações morfológicas, diferentes mecanismos para aumentar a concentração interna do carbono

Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004 635

que concentra o CO 2 e reduz a atividade oxigenase da enzima Rubisco. As plantas aquáticas que realizam o metabolismo C 4 não o fazem continuamente, devido às correntes alterações entre altos e baixos valores de fotorres- piração. De acordo com Keeley & Sandquist (1992), algumas plantas aquáticas submersas podem substituir o metabolismo C 3 pelo C 4 para diminuir os efeitos da fotorrespiração. Por exemplo, as taxas de fotorrespiração de folhas emersas de Myriophyllum brasiliense e Proserpinaca palustris são reduzidas quando submersas devido à substituição do metabolismo C 3 pelo metabolismo do tipo C 4 (Salvucci & Bowes 1982). Entretanto, devido à grande variação no ponto de compensação causado pelas flutuações nas taxas de fotorrespiração, as macrófitas aquáticas submersas não devem ser simplesmente classificadas em plantas C 3 ou C 4. Várias outras espécies apresentam assimilação do CO 2 por ambos caminhos, dentre essas destacam-se Chara contraria , Eleocharis aciculares , Gloeotrichia sp. e Marsilea vestita (Keeley 1999). Deve-se ressaltar que o metabolismo C 4 apresenta vantagem energética potencial em relação ao metabolismo C 3 , devido à maior afinidade da enzima PEPCarboxilase ao CO 2 permitindo que a planta o utilize mais eficientemente. Entretanto, a utilização do CO 2 via PEPCarboxilase implica em custos adicionais. Por exemplo, para cada molécula de CO 2 fixada nesta via, uma molécula de PEP precisa ser regenerada a um custo de dois grupos fosfato por ATP. Desta maneira, as plantas C 4 necessitam, ao todo, de cinco ATPs para fixar uma molécula de dióxido de carbono, enquanto que as plantas C 3 necessitam de apenas três (Raven et al. 1992).

Metabolismo CAM

Outro mecanismo que aumenta a concentração interna de CO 2 é desenvolvido por algumas plantas aquáticas submersas que o fazem de forma semelhante às terrestres CAM. Keeley (1981) foi o primeiro a registrar este mecanismo em macrófitas aquáticas utilizando uma espécie do grupo das isoetáceas, Isoetes howellii. De maneira geral, o sistema envolve a absorção do carbono, por meio da elevada atividade da enzima PEPCarboxilase, durante o período noturno (Moore 1999). O malato, formado neste período, é armazenado no vacúolo tornando-o ácido. No período de luz, o malato é descarboxilado e o CO 2 fixado pela enzima Rubisco no ciclo de Calvin.

A separação temporal das reações ligadas ao metabolismo C 3 e C 4 mostra algumas características semelhantes com as plantas terrestres CAM. Entretanto, durante o período de luz, a fixação do CO 2 do meio aquoso via C 3 não é suprimida. A contribuição da fixação do CO 2 no período noturno, evidenciada pela atividade mais elevada da PEPCarboxilase, é sempre relativamente mais alta (> 30%). Neste período a disponibilidade de carbono torna-se mais elevada devido à atividade respiratória dos organismos autótrofos da comunidade aquática. Segundo Madsen et al. (2002), a importância quantitativa da fixação de CO 2 pode ocorrer dependentemente das concentrações externas de CO 2 durante o período de luz. Além disso, a baixa razão Rubisco/PEPCarboxilase tem sido a principal característica na identificação de plantas aquáticas que utilizam este metabolismo. Uma vantagem ecológica freqüentemente destacada pelos estudos é a atividade fotorrespiratória reduzida, pois a Rubisco opera com maior especificidade (taxa de carboxilação por unidade de enzima) durante este mecanismo. Dessa forma, para obter taxas fotossintéticas similares, as plantas aquáticas CAM necessitam, quantitativamente, menos Rubisco comparativamente às plantas que não dispõem desta atividade. De acordo com Madsen et al. (2002), acima de 25% do nitrogênio orgânico é destinado para a síntese desta enzima. A despeito da aclimatação fisiológica, a atividade CAM em plantas aquáticas é potencialmente controlada pela disponibilidade de CO 2 e pela intensidade luminosa. De acordo com vários estudos realizados em laboratório e em diferentes condições ambientais, a exposição de plantas em altas concentrações de CO 2 ou em reduzida intensidade luminosa pode inibir a de-acidificação e reduzir a concentração do malato. Algumas respostas de aclimatação indicam que a modificação fisiológica, principalmente relacionada aos ajustes da atividade da enzima PEPCarboxilase, pode ocorrer em folhas produzidas durante o período de aclimatação e também nas folhas mais velhas, sugerindo um controle em nível celular individual. A regulação da atividade CAM em folhas aéreas de plantas anfíbias também é bastante discutida. Entretanto, parece não haver um padrão com relação à supressão ou não desta atividade quando suas folhas são expostas às condições atmosféricas. Para mais detalhes de fatores controladores do mecanismo CAM, ver Aulio (1986). A afinidade ao CO 2 de plantas CAM é baixa se comparada a outras espécies de macrófitas aquáticas

636 Pierini & Thomaz: Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico

submersas. Algumas razões morfológicas e fisiológicas podem ser apontadas, como por exemplo no caso das isoetáceas, cujas folhas são mais espessas e a Rubisco encontra-se em quantidades relativamente mais baixas. Litorella , Crassula e Isoetes são macrófitas que apresentam o caminho fotossintético relacionado com o metabolismo CAM. Dessa forma, as menores taxas de absorção do CO 2 das isoetáceas devem refletir em taxas de crescimento mais lentas (Baattrup-Pedersen & Madsen 1999).

Utilização do bicarbonato

A capacidade de utilizar o bicarbonato como fonte adicional de carbono é bastante difundida entre as macrófitas submersas, embora não exista evidência sobre sua presença em Briófitas e Pteridófitas (Madsen & Maberly 1991). A utilização do HCO 3 -^ envolve gastos metabólicos e investimentos em sistemas de transporte como síntese de enzimas (ATPase, anidrase carbônica) que dependem de custos (gastos metabólicos) e benefícios (ganho de carbono) e do potencial genético de cada espécie. Entretanto, esse mecanismo fornece vantagem adaptativa quando a disponibilidade do CO 2 é baixa (principalmente em valores mais elevados de pH) e quando a razão HCO 3 - /CO 2 é alta (Sand-Jensen & Gordon 1986). Considerando que o transporte de CO 2 pela zona de interface ocorre somente por difusão, os processos de transporte deste gás através dessa zona são acompanhados pela mudança do pH (Prins et al. 1982). Como já considerado, a assimilação do CO 2 leva ao aumento do pH que altera o equilíbrio do sistema de dióxido de carbono na direção do íon HCO 3 -. Levando-se em consideração a importância deste íon como fonte alternativa de carbono para algumas espécies de macrófitas submersas, dois mecanismos são propostos para a sua utilização. A conversão extracelular de bicarbonato em CO 2 , mediado pelos baixos valores de pH, que por difusão passiva passa para o interior das células (Prins et al. 1982) e o cotransporte de H+/HCO 3 -^ (Lucas 1985). Em ambos os mecanismos, um gradiente local de pH faz-se necessário à utilização do íon HCO 3 -. No primeiro mecanismo, também chamado de polar, a zona de interface e o espaço periplasmático são acidificados pelo bombeamento de íon H+^ pela atuação da enzima ATPase, localizada na plasmalema da face abaxial das folhas. Esses íons são liberados na face abaxial da folha enquanto na superfície adaxial forma-se uma zona alcalina como resultado da liberação de OH-. Esse

mecanismo foi demonstrado em experimentos detalhados realizados entre as décadas de 30 e 50 (Arens 1933; 1946). No segundo mecanismo, o bicarbonato atravessa a plasmalema por meio do auxílio da atividade da enzima ATPase, que fornece um gradiente de prótons (íons hidrogênio) e força motriz para a entrada do bicarbonato associado ao íon H+. Por este processo, o CO 2 pode acumular-se no interior das células e alcançar concentrações muito maiores que as de fora da célula (Fig. 5). Fato importante que deve ser ressaltado é a importância da atividade reversível da enzima anidrase carbônica em ambos mecanismos. No primeiro mecanismo, a presença desta enzima no espaço periplasmático das folhas, principalmente de “elodeides” (uma referência ao gênero Elodea ), deve facilitar a conversão do HCO 3 -^ em CO 2. No cotransporte, a atividade externa desta enzima pode reduzir o retorno do CO 2 por difusão à zona de interface devido à alta concentração alcançada no interior das células. Assim, através da atuação dessa enzima, o CO 2 liberado nas células é novamente convertido a bicarbonato e reassimilado na plasmalema via contransporte HCO 3 - /H+. Pode-se ainda verificar, como nas macrófitas submersas, importância relevante da atividade da anidrase carbônica na fotossíntese de microalgas, como por exemplo em Chlamydomonas reinhardtii (Miyachi et al. 1985). As macrófitas aquáticas submersas, restritas ao CO 2 , apresentam maior afinidade a este gás do que plantas submersas que apresentam habilidade adicional de usar o íon HCO 3 -^ (Sand-Jensen 1983; 1987; Maberly & Madsen 1998). A diferenciada afinidade é demonstrada pelas taxas de fotossíntese mais elevadas de plantas submersas restritas ao CO 2 em valores de pH abaixo de 7, onde as concentrações perfazem mais de 80% do carbono total (Allen & Spence 1981). De acordo com diversos estudos (Sand-Jensen 1983; Pierini & Thomaz 2004), as taxas mais elevadas estão relacionadas com os reduzidos gastos energéticos envolvidos com sua absorção. Do ponto de vista ecológico, a utilização do bicarbonato pode conferir à planta vantagem competitiva, principalmente em ambientes lênticos produtivos, alcalinos e de intensa atividade fotossintética, nos quais os valores de CO 2 aproximam-se de zero e os de pH são mais altos (entre 9 e 10) levando à conversão do CO 2 livre em HCO 3 - no interior da zona de interface (Sand-Jensen & Gordon 1986). De acordo com James et al. (1998), Lagorisiphon major mostrou-se competitivamente

638 Pierini & Thomaz: Adaptações de plantas submersas à absorção do carbono inorgânico

menor eficiência apresentam razão próxima de 1. Os valores de pH medidos no final dos experimentos “pH drift” também indicam a utilização ou não do íon HCO 3 -. Em caso positivo, os valores finais do pH superam 9, pois as concentrações de CO 2 são muito reduzidas acima deste pH (Fig. 6). Entretanto, é importante lembrar que a eficiência de utilização deste íon em valores de pH elevados é bastante reduzida, devido ao elevado custo energético envolvido com a utilização do íon HCO 3 -.

várias adaptações morfológicas de plantas submersas. A absorção do carbono da água intersticial do sedimento é vantajosa, pois neste compartimento as concentrações de CO 2 podem ser aproximadamente 50 a 100 vezes superiores às da coluna de água. A despeito das diferentes características morfológicas, a utilização do carbono da água intersticial do sedimento requer algumas especializações caracteristicamente encontradas no grupo das isoetáceas (“isoetes”). Essas plantas possuem folhas e caules curtos, alta relação biomassa de raízes: biomassa de folhas, grande sistema lacunar com canais longitudinais que ligam as raízes às folhas e cutícula fina para facilitar a fotossíntese e diminuir a perda de CO 2 antes mesmo de ser fixado (Bowes 1987). Nestas plantas, o CO 2 derivado da água intersticial do sedimento pode ser responsável por mais de 90% da absorção total do carbono. Entretanto, a proporção do carbono utilizada da água ou sedimento depende principalmente da permeabilidade e da variação espacial e temporal da concentração do CO 2 próximas à superfície das folhas ou de suas raízes (Madsen & Sand-Jensen 1991). De relevância ecológica, a utilização do CO 2 da água intersticial do sedimento é especialmente vantajosa em ambientes com baixas concentrações de CO 2 na coluna de água e com baixa alcalinidade (Kelley 1987). Outra vantagem freqüentemente apontada pelos estudos é a redução da competição com as espécies “elodeides”, formadoras de dosséis, que se beneficiam de ambientes com elevada oferta de bicarbonato (Vestergaard & San-Jensen 2000). Além disso, considerando a longa distância da raiz até as folhas dessas últimas plantas, a elevada resistência de difusão do CO 2 pode ser considerada outro fator que contribui para a menor eficiência da utilização deste gás do sedimento. As plantas que dispõem deste mecanismo para evitar a limitação de carbono na coluna de água podem apresentar diferentes vias de redução do carbono. Por exemplo, Lobelia dortmanna apresenta a redução do carbono via C 3. Entretanto, evidências da presença do metabolismo C 4 , pela formação de ácidos de 4 carbonos, em Litorella uniflora , indicam que uma mesma espécie pode apresentar ambas estratégias (absorção CO 2 da água intersticial do sedimento e o metabolismo C 4 ) para aumentar a absorção do CO 2 e minimizar os efeitos inibitórios do O 2 (Bowes 1987). De maneira complementar, deve-se ressaltar que as espécies “isoetáceas” são incapazes de utilizar o bicarbonato como fonte adicional de carbono. Isto faz

0

500

1000

1500

2000

2500

3000

6.5 7.0 7.5 8.0 8.5 9.0 9.5 10.

Egeria najas Egeria densa

p H

μmol C

gT

-^

PS h

Figura 6. Taxas fotossintéticas de Egeria najas e Egeria densa em função do pH em alta alcalinidade (800μmol L-1) Modificado de Pierini & Thomaz (2004).

Na literatura, comparações da razão CT/Alc entre espécies e entre indivíduos da mesma espécie, demonstraram que uma classificação entre plantas restritas ao CO 2 e capazes de utilizar o bicarbonato não é adequada, visto que, para uma dada alcalinidade, um mesmo indivíduo pode ou não utilizar este íon (Maberly & Spence 1983). Em função disto, tem-se discutido a existência de um gradiente entre as plantas em termos da capacidade de utilizar diferentes formas de carbono inorgânico (Allen & Spence 1981; Spence & Maberly 1985). Desta forma, pode-se concluir que a importância do bicarbonato como fonte alternativa de carbono à fotossíntese e ao crescimento de plantas submersas depende da razão da concentração de HCO 3 - /CO 2 na água e do requerimento do carbono pelas plantas (Sand-Jensen & Gordon 1986).

Utilização do CO 2 da água intersticial do

sedimento

A habilidade de explorar diferentes fontes de carbono, como o CO 2 da água intersticial do sedimento e da atmosfera, é principalmente relacionada com

Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004 639

com que suas taxas fotossintéticas ocorram independentemente das concentrações de bicarbonato na água. Além disso, sua distribuição está restrita, na maioria das vezes, a ambientes oligotróficos e com baixa alcalinidade.

Desenvolvimento de folhas aéreas

Algumas espécies de macrófitas aquáticas submersas apresentam a habilidade de desenvolver folhas aéreas durante parte de seu ciclo de vida. A despeito de suas modificações fisiológicas, a atividade da PEPCarbolixase e Rubisco de folhas aéreas é mais elevada se comparada com as folhas submersas da mesma planta, tornando-as fotossinteticamente mais eficientes. Outro fator considerado importante para o desenvolvimento de folhas aéreas em plantas submersas é a maior disponibilidade de CO 2 no ambiente aéreo. De acordo com Madsen & Sand- Jensen (1991), a maior taxa de difusão de CO 2 neste ambiente faz com que sua resistência através da zona de interface seja reduzida. Isto aumenta as taxas fotossintéticas tornando as plantas capazes de desenvolver folhas aéreas competitivamente superiores. Por exemplo, as taxas fotossintéticas de plantas com folhas flutuantes do gênero Potamogeton foram superiores (8,30 ± 1,45μmol CO 2 m-2s-1) às taxas fotossintéticas de plantas que apresentaram suas folhas submersas (0,80 ± 0,58μmol CO 2 m-2s-1) (Frost- Christensen & Sand-Jensen 1995). De modo complementar, os valores de Km do CO 2 de macrófitas aquáticas submersas são superiores àqueles encontrados em plantas terrestres e folhas emersas de plantas anfíbias (Bowes 1985). Van et al. (1976), utilizando Hydrilla verticillata , encontraram valores de Km em condições não fotorrespiratórias (1% de oxigênio) de 175μM e 70μM quando as folhas foram submersas e emersas, respectivamente. Isto corrobora a hipótese de que a maior viscosidade do ambiente aquático aumenta a resistência do CO 2 pela zona de interface.

A utilização do carbono e sua implicação

ecológica na competição entre macrófitas

submersas

Quando a fotossíntese é limitada pela baixa disponibilidade de carbono, o desenvolvimento de estratégias adaptativas pode compensar a baixa oferta de CO 2 por difusão, reduzir ou suprimir a

fotorrespiração e estabelecer altas concentrações intracelulares de CO 2 (Prins & Elzenga 1989). Nesse sentido, fontes adicionais de carbono inorgânico à fotossíntese podem conferir à planta vantagem competitiva por meio da manutenção da fotossíntese enquanto outras plantas encontram-se em estresse (Jones et al. 1993). Comparativamente, a vantagem competitiva de macrófitas submersas é derivada das taxas fotossin- téticas ou de crescimento mais elevados de uma espécie em relação à outra. Por exemplo, em ambientes com alta disponibilidade de CO 2 , Callitriche copocharpa , incapaz de utilizar o bicarbonato, apresentou taxas de crescimento 60% mais rápidas que as taxas de crescimento de Elodea canadensis , capaz de utilizar o HCO 3 -^ como fonte adicional de carbono (Vadstrup & Madsen 1995). Isto capacita a primeira espécie a dominar ambientes em condições com altas concen- trações deste gás. Entretanto, ambas plantas podem substituir-se sazonalmente em função da disponibilidade de carbono inorgânico no ambiente aquático. Considerando a competição pelo carbono entre os organismos autótrofos presentes nas comunidades aquáticas, pode-se considerar que os organismos fitoplanctônicos são os mais eficientes (Spence & Maberly 1985; Allen & Spence 1981). A despeito do menor tamanho, estes organismos apresentam a espessura da zona de interface reduzida e uma distância menor para a difusão e/ou transporte ativo de carbono inorgânico do meio externo para o cloroplasto, tornando-os menos susceptíveis à limitação do carbono em relação às macrófitas submersas (Sand- Jensen 1989). De fato, em condições idênticas de laboratório, Anabaena cylindrica , Microcystis aeruginosa e Scenedesmus quadricauda foram capazes de extrair mais de 90% do carbono total presente na água comparativamente aos 70 % de Myriophyllum spicatum e Potamogeton perfoliatus , consideradas bastante eficientes na utilização do carbono (Maberly & Spence 1983). Outra explicação para o melhor desempenho fotossintético da comunidade fitoplanctônica foi sugerida por Spence & Maberly (1985). De acordo com esses autores, a utilização mais eficiente do carbono deve-se ao curto tempo de geração destes organismos e, portanto, à rápida capacidade de se adaptarem a flutuações das diferentes formas e concentrações de carbono no ambiente aquático. Pode-se destacar que a utilização do bicarbonato é considerada a estratégia mais difundida entre as espécies de macrófitas aquáticas submersas. De fato,

Acta bot. bras. 18(3): 629-641. 2004 641

Keeley, J.E. 1981. Isoetes howellii : a submerged aquatic CAM plant. American Journal of Botany 68 : 420-424. Keeley, J.E. 1987. The adaptative of photosynthetic modes in the genus Isoetes (Isoetaceae). Pp. 113-128. In: R.M.M. Crawford. Plant life in aquatic and amphibious habitats. Oxford. Keeley, J.E. 1999. Photosynthetic pathway diversity in a seasonal pool comunity. Functional Ecology 13 : 106-118. Keeley, J.E. & Sandquist, D.R. 1992. Carbon: freshwater plants. Plant, Cell and Environment 15 : 1021-1035. Lampert, W. & Sommer, U. 1997. Limoecology: The ecology of lakes and streams. Oxford University Press, New York. Lucas, W.J. 1985. Bicarbonate utilization by Chara : A re- analysis. Pp. 229-254. In: W.J. Lucas & J.A. Berry (eds.). Inorganic carbon uptake by aquatic photosynthetic organisms. Rockville: Maryland. Maberly, S.C. & Spence, D.H.N. 1983. Photosynthetic inorganic carbon use by freshwater plants. Journal of Ecology 71 : 705-724. Maberly, S.C. & Madsen, T.V. 1998. Affinity for CO 2 in relation to the ability of freshwater macrophytes to use HCO 3 -. Functional Ecology 12 : 99-106. Madsen, T.V. & Maberly, S.C. 1991. Diurnal variation in light and carbon limitation of photosynthesis by two species of submerged freshwater macrophyte with a differential ability to use bicarbonate. Freshwater Biology 26 : 175-187. Madsen, T.V. & Sand-Jensen, K. 1991. Photosynthetic carbon assimilation in aquatic macrophytes. Aquatic Botany 41 : 5-40. Madsen, T.V.; Olesen, B. & Bagger, J. 2002. Carbon acquisition and carbon dynamics by aquatic isoetids. Aquatic Botany 73 : 351-371. Madsen, T.V.; Sand-Jensen, K. & Beer, S. 1993. Comparison of photosynthetic performance and carboxylation capacity in a range of aquatic macrophytes of different growth forms. Aquatic Botany 44 : 373-384. Miyachi, S.; Tsuzuki, M. & Yagawa, Y. 1985. Carbonic anhydrase in various microalgae. Pp. 145-154. In: W.J. Lucas & J.A. Berry (eds.). Inorganic carbon uptake by aquatic photosynthetic organisms. Rockville: Maryland. Moore, P.D. 1999. Photosynthesis: Mixed metabolism in plant pools. Nature 399 (6732): 109-111. Pierini, S.A. & Thomaz, S.M. 2004. Effects of inorganic carbon source on photosynthetic rates of Egeria najas Planchon and Egeria densa Planchon (Hydrocharitaceae). Aquatic Botany 78 (2): 135-146. Prins, H.B.A. & Elzenga, J.T.M. 1989. Bicarbonate utilization: function and mechanism. Aquatic Botany 34 : 59-83.

Prins, H.B.A.; Snel, J.F.H.; Zanstra, P.E. & Helder, R.J. 1982. The mechanism of bicarbonate assimilation by the polar leaves of Potamogeton and Elodea. CO 2 concentrations at the leaf surface. Plant, Cell and Environment 5 : 207-214. Raven, P.H.; Evert, R.F. & Eichhorn, S.E. 1992. Biologia vegetal. 6 ed. São Paulo: Rio de Janeiro. Guanabara Koogan. Salvucci, M.E. & Bowes, G. 1982. Photosynthetic and photorespiratory responses of the aerial and submerged leaves of Myriophyllum brasiliense. Aquatic Botany 13 : 147-164. Sand-Jensen, K. 1987. Environmental control of bicarbonate use among freshwater and marine macrophytes. Pp. 99-112. In: R.M.M. Crawford. Plant life in aquatic and amphibious habitats. Oxford. Sand-Jensen, K. & Gordon, D.M. 1986. Variable HCO 3 - affinity of Elodea canadensis Michaux in response to different HCO 3 -^ and CO 2 concentrations during growth. Oecologia 70 : 426-432. Sand-Jensen, K. 1983. Photosynthetic carbon sources of stream macrophytes. Journal of Experimental Botany 34 (139): 198-210. Sand-Jensen, K. 1989. Environmental variables and their effect on photosynthesis of aquatic plant communities. Aquatic Botany 34 : 5-25. Sculthorpe, C.D. 1967. The biology of aquatic vascular plants. London: Belhaven Press. Smith, F.A. & Walker, N.A. 1980. Photosynthesis by aquatic plants: effects of unstirred layers in relation to assimilation of CO 2 and HCO 3 -^ and to carbon isotopic discrimination. New Phytologist 86 : 245-259. Spence, D.H.N. & Maberly, S.C. 1985. Occurrence and ecological importance of HCO 3 -^ use among aquatic higher plants. Pp. 125.143. In: W.J. Lucas & J.A. Berry (eds.). Inorganic carbon uptake by aquatic photosynthetic organisms. Rockville: Maryland. Vadstrup, M. & Madsen T.V. 1995. Growth limitation of submerged aquatic macrophytes by inorganic carbon. Freshwater Biology 34 : 411-419. Van, T.K.; Haller, W.T. & Bowes, G. 1976. Comparison of the photosynthetic characteristics of three submersed aquatic plants. Plant Physiology 58 : 761-768. Vestergaard, O. & Sand-Jensen, K. 2000. Alkalinity and trophic state regulate aquatic plant distribution in Danish lakes. Aquatic Botany 67 : 85-107. Wetslake, D.F. 1967. Some effects of low-velocity currents on metabolism of aquatic plants. Journal of Experimental Botany 18 : 187-205. Wetzel, R.G. 1983. Limnology. Philadelphia: W.B. Saunders.

Versão eletrônica do artigo em www.scielo.br/abb