






Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
amor por anexins
Tipologia: Notas de estudo
1 / 11
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Amor por anexins , de Artur Azevedo
Fonte: AZEVEDO, Artur. A capital federal , O badejo , A jóia , Amor por anexins. [estabelecimento de texto: Prof. Antonio Martins de Araújo]. Rio de Janeiro: Ediouro. (Prestígio).
Texto proveniente de: A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro http://www.bibvirt.futuro.usp.br A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo Permitido o uso apenas para fins educacionais.
Texto-base digitalizado pela voluntária: Selma Suely Teixeira – Curitiba/PR
Este material pode ser redistribuído livremente, desde que não seja alterado, e que as informações acima sejam mantidas. Para maiores informações, escreva para bibvirt@futuro.usp.br.
Estamos em busca de patrocinadores e voluntários para nos ajudar a manter este projeto. Se você quer ajudar de alguma forma, mande um e-mail para bibvirt@futuro.usp.br e saiba como isso é possível.
Ato Único
Sala simples, janela à esquerda, portas ao fundo e à direita. Mesa à esquerda com preparos de costura. Num dos cantos da sala uma talha d’água. Cadeiras.
Inês ( Cose sentada à mesa, e olha para a rua, pela janela .) – Lá está parado à esquina o homem dos anexins! Não há meio de ver-me livre de semelhante cáustico. Ora eu, uma viúva, e, de mais a mais com promessa de casamento, havia de aceitar para marido aquele velho! Não vê! E ninguém o tira dali! Isto até dá que falar à vizinhança... ( Desce à boca de cena .)
Copla Eu, que gosto, perdido Tenho casamentos mil, Com mais de um belo marido, Garboso, rico e gentil, De um velho agora a proposta, Meu Deus! Devia aceitar? Demais um velho que gosta De assim tão jarreta andar! Nada! Nada! Não me agrada! Quero um marido melhor! É bem mau não ser casada, Mas mal casada é pior.
Ainda hoje escreveu-me uma cartinha, a terceira em que me fala de amor, e a Segunda em que me pede em casamento. ( Tira uma carta da algibeira .) Ela aqui está. ( Lê .) “Minha bela senhora. Estimo que estas duas regras vão encontrá-la no
Isaías – Vim em pessoa saber da resposta de minha carta: quem quer vai e quem não quer manda; quem nunca arriscou nunca perdeu nem ganhou; cautela e caldo de galinha... Inês ( Interrompendo-o .) – Não tenho resposta alguma que dar! Saia, senhor! Isaías – Não há carta sem resposta... Inês ( Correndo à talha e trazendo um púcaro cheio d’água ) – Saia, quando não... Isaías ( Impassível .) – Se me molhar, mais tempo passarei a seu lado; não hei de sair molhado à rua. Eh! Eh! Foi buscar lã e saiu tosquiada... Inês – Eu grito! Isaías – Não faça tal! Não seja tola, que quem o é para sim pede a Deus que o mate e ao diabo que o carregue! Não exponha a sua boa reputação! Veja que sou um rapaz; a um rapaz nada fica mal... Inês – O senhor, um rapaz?! O senhor é um velho muito idiota e muito impertinente! Isaías – O diabo não é tão feio como se pinta... Inês – É feio, é!... Isaías – Quem o feio ama bonito lhe parece. Inês – Amá-lo eu?! Nunca... Isaías – Ninguém diga: desta água não beberei... Inês – É abominável! Irra! Isaías – Água mole em pedra dura, tanto dá... Inês – Repugnante! Isaías – Quem espera sempre alcança. Inês – Desengane-se! Isaías – O futuro a Deus pertence! Inês – Há alguém que me estima deveras... Isaías – Esse alguém ( Naturalmente .) sou eu. Inês – Isso era o que faltava! ( Suspirando .) Esse alguém... Isaías – Quem conta um conto, acrescenta um ponto... Inês – Esse alguém é um moço tão bonito... de tão boas qualidades... Isaías – Quem elogia a noiva... Inês – O senhor forma com ele um verdadeiro contraste. Isaías – Quem desdenha quer comprar... Inês – Comprar! Um homem tão feio!... Isaías – Feio no corpo, bonito na alma. Inês ( Sentando-se .) – Deus me livre de semelhante marido! Isaías – Presunção e água benta cada qual toma a que quer... ( Senta-se também .) Inês ( Erguendo-se .) – Ah, o senhor senta-se? Dispõe-se a ficar! Meu Deus, isto foi um mal que me entrou pela porta! Isaías ( Sempre impassível .) – Há males que vêm para bem. Inês – Temo-la travada. Isaías – Venha sentar-se a meu lado. ( Vendo que Inês senta-se longe dele .) Se não quiser, vou eu... ( Dispõe-se a aproximar a cadeira .) Inês – Pois sim! Não se incomode! ( Faz-lhe a vontade .) Não há remédio! Isaías ( Chegando mais a cadeira .) – O que não tem remédio remediado está. Inês ( Afastando a sua. ) – O que mais deseja? Isaías – Diga-me cá: o seu noivo? ... ( Faz-lhe uma cara .) Inês – Não entendo. Isaías – Para bom entendedor meia palavra basta...
Inês – Mas o senhor nem meia palavra disse! Isaías – Pergunto se... fala francês... Inês – Como? Isaías – Ora bolas! Quem é surdo não conversa! Inês – Mas a que vem essa pergunta? Isaías ( Naturalmente .) – Quem pergunta quer saber. Inês – Ora! Isaías ( Sentencioso .) – Dois sacos vazios não se podem Ter de pé. Inês – Essa teoria parece-se muito com o senhor. Isaías – Por quê? Inês – Porque já caducou também. Isaías ( Formalizado .) – Então eu já caduquei, menina? Isso é mentira. Inês – É verdade. Isaías – Não é. Inês – É. Isaías – Pois se é, nem todas as verdades se dizem. ( Ergue-se e passeia .) Inês – Ah! O senhor zanga-se? É porque quer; não me viesse dizer tolices! ( Ergue-se .) Isaías ( Interrompendo o seu passeio, solenemente. ) – Na casa em que não há pão, todos ralham, ninguém tem razão. Inês – Ora! Somos ainda muito moços! Isaías – Quem? Nós? Inês ( De mau humor .) – Não falo do senhor: falo dele... Isaías – Ah! Fala dele... Inês – Havemos de trabalhar um para o outro... Isaías – É bom, é: Deus ajuda a quem trabalha.
Canto
Inês – Sem desgosto viveremos, Seremos ricos, talvez; Muitos morgados teremos... Isaías – Mas um só de cada vez... ( Zangado .) A faceira Talvez convidar-me queira Para padrinho de algum! Inês – E não suponha que, apesar de pobre, não me faça bonitos presentes o meu noivo. Isaías – É! Quem cabras não tem e cabritos... Inês – Insulta-o? Isaías – Cão danado, todos a ele! Pois eu havia de insultá-lo, senhora? Inês – Se estivesse calado... Isaías – Sim, senhora: em boca fechada não entram mosquitos... mas é que o seu futurozinho me interessa... Inês – Muito obrigada. ( Senta-se .) Isaías – Não há de quê. Se bem que eu não seja nenhum Matusalém, estou no caso de lhe dar conselhos. Ouça-me; quem me avisa meu amigo é; quem à boa árvore se chega, boa sombra o cobre. Inês – Mesmo por já estar no caso de me dar conselhos, é que o não quero para marido.
Isaías – E eu tenho que fazer cá dentro. Um dia bom mete-se em casa. ( Pausa .) Olhe, senhora, olhe bem para mim acha-me feio; não acha? Inês – Ai, ai, ai!... Isaías – Eu também acho, e feliz é o doente que se conhece. Mas muitas vezes as aparências enganam e o hábito não faz o monge. Experimente e verá. ( Suplicante .) Case comigo. Inês – Gentes! Isaías – Ah! Se fôssemos casadinhos, outro galo cantaria! Por exemplo: em vez de sair agora à rua, com este sol de matar passarinho, mandava-me a mim, ao seu maridinho... Inês ( Arremedando-o .) – Ao seu maridinho... ( À parte .) Oh! Que idéia! Vou me ver livre dele. ( Alto .) Então, sem sermos casados, não pode prestar-me um pequeno serviço? Isaías – Conforme o serviço: ponha os pontos nos ii. Inês – Se me fosse comprar três metros de escumilha. Olhe... Aqui tem a amostra... No armarinho do Godinho.. Sabe onde é? Isaías – Sei; mas quando não soubesse? Quem tem boca vai a Roma. Inês – Está contrariado? Isaías – O que vai por gosto regala a vida. Inês – Tome o dinheiro. Isaías – Nada... não é preciso... ( Vai saindo e estaca .) Diabo! Não me lembra um ditado a propósito! ( Sai .)
Inês – Está bem aviado... Quando voltares, hás de achar a porta fechada. Safa! Que maçador! Agora, tratemos de sair: são mais que horas. ( Aparece à porta um carteiro .)
O Carteiro – Boa tarde, minha senhora. Inês – Boa tarde. O que deseja? O Carteiro – Aqui tem esta carta... é da caixa urbana... Inês – Uma carta? ( Recebendo a carta, consigo .) De quem será? ( Ao carteiro .) Obrigada. O Carteiro – Não há de quê, minha senhora. Passe muito bem! Inês - Adeus. ( O carteiro sai .)
Inês – Ah! A letra é de Filipe. Faz bem em escrever-me o ingrato! Há doze dias que nos não vemos... ( Abre a carta e lê. Jogo de fisionomia. ) “Inês. Peço-te perdão por Ter dado causa a que perdesses comigo o teu tempo. Ofereceram-me um casamento
vantajoso, e não soube recusar. Ainda uma vez perdão! Falta-me o ânimo para dizer- te mais alguma coisa. Dentro em uma semana estarei casado. Esquece-te de mim – Filipe.” ( Declamando .) Será possível! Oh! Meu Deus! ( Relendo .) Sim... cá está... é a sua letra... ( Depois de ter ficado pensativa um momento .) Ora, adeus. Eu também não gostava dele lá essas coisas... Digo mais, antes o Isaías; é mais velho, mais sensato, tem dinheiro a render, e Filipe acaba de me provar que o dinheiro é tudo nestes tempos. Espero aqui o Isaías com o meu “sim” perfeitamente engatilhado! Oh! O dinheiro...
Recitativo Louro dinheiro, soberano esplêndido, Força, Direito, Rei dos reis, Razão. Que ao trono teu auriluzente e fúlgido Meus pobres hinos proclamar-te vão.
Do teu poder universal, enérgico, Ninguém se atreve a duvidar! Ninguém! Rígida mola desta imensa máquina, Fácil conduto para o eterno bem!
Aos teus acenos, Deus antigo e déspota, Aos teus acenos, Deus modernos e bom, Caem virtudes e se exaltam vícios! Todos te almejam precioso Dom!
Inda hás de ser o derradeiro ídolo, Inda hás de ser a só religião, Louro dinheiro, soberano esplêndido, Força, Dinheiro, Rei dos reis, Razão!...
Isaías ( Entrando .) – Quem canta seus males espanta. Inês – Já de volta! O senhor foi a correr! Isaías – Nada! Quem corre cansa. Encontrei outro armarinho mais perto... Inês ( Tomando a fazenda .) – Muito obrigada. Quanto custou? Isaías – Um pau por um olho. Mil e duzentos o metro... Inês – Pois olhe: o outro vende mais barato. Isaías – O barato sai caro, e mais vale um gosto do que quatro vinténs. Inês – Regateou?
Inês – Mas imponho também a minha condição... Isaías – Imponha: manda quem pode. Inês – Se conseguir levar meia hora sem... Isaías – Sem praguejar?... Inês – Não! Sem dizer um anexim! Se conseguir, é sua a minha mão. Isaías – Deveras? Inês ( Sentando-se .) – Deveras. Isaías – Mas eu posso estar calado? Inês – Como assim?! Era o que faltava! Há de falar pelos cotovelos! Isaías – Isso é um pouco difícil: o costume faz lei... Inês – Ai, que escapou-lhe um! Isaías – Pois o que quer? A continuação do cachimbo... Inês – Faz a boca torta, já duas vezes. Isaías – Nas três o diabo as fez. Inês – Ai, ai, ai! Vamos muito mal! Isaías – Ma não tínhamos ainda entrado em campo... Aqueles foram ditos de propósito. Agora sim! Agora é que são elas! Inês – Outro! Isaías – Protesto! “Agora é que são elas” nunca foi anexim. A César o que é de César! Inês – O senhor vai perder... Olhe: são duas horas. (Aponta para um relógio que deve estar sobre a mesa.) Aceita o desafio? ( Pausa .) Bem. Quem cala consente... Isaías – Ah! Agora é a senhora quem os diz! Virou-se o feitiço contra o feiticeiro... Inês – Ai, ai! Isaías – Foi engano. Inês – Dos enganos comem os escrivães. ( Pausa .) Então? Diga alguma coisa... Isaías – O que hei de dizer.. senão.... que gosto muito da senhora... e... Inês – Pois diga: vai tantas vezes o cântaro à fonte, que lá fica. Isaías – Não me provoque, senhora, não me provoque! Inês – Cada qual puxa a brasa para sua sardinha... Isaías ( Agitado .) – Brasa! Sardinha! Oh! Que suplício! Inês – O que tem o senhor? Isaías – Nada... não tenho nada... é que esta proibição me incomoda... Este maldito costume... parece que não estou em mim... Inês – Sabe o que mais? Isaías – Vou saber. Inês – Diga o que quiser! Abra a torneira dos anexins, ditados, rifões, sentenças, adágios e provérbios... Fale, fale para aí? Isaías – E a condição? Inês – Caducou. ( Dando-lhe a mão .) Aqui tem: sou sua. Isaías ( Contente .) – Minha! ( Em outro tom .) E os outros? Inês – Não existem, nunca existiram! Isaías – Pois estou acordado? Se estiver dormindo, deixa-me estar: não me acordes. Inês – Está bem acordado. Isaías – Estou?! ( Pulando de contente .) Então viva Deus! Viva o prazer! ... Trá lá lá rá lá! ( Quer abraçá-la .) Inês ( Gritando .) – Alto lá! Mais amor e menor confiança! Isaías – E que o rato nunca comeu mel, quando come.. ( Outro tom .) Pode-se dizer este ditadozinho?...
Inês – Quantos quiser! Isaías ( Concluindo .) – ... se lambuza! ( Tomando-lhe as mão s.) E tu? Amas-me, meu bem? Inês – Sossegue: o amor virá depois. Seja bom marido e deixe o barco andar! Isaías – Apoiado. Roma não se fez num dia! Inês – E tenha sempre muita fé nos seus anexins. Isaías – É verdade: O que tem de ser tem muita força. O homem põe... e a mulher dispõe!... Inês – Basta! Despeça-se destes senhores, e vá tratar dos papéis... Isaías – Quem tem boca não manda... cantar. Mas, enfim... ( Ao público .)
Copla final
Antes que daqui nos vamos, Inês vos dirá quais são Os votos que alimentamos No fundo do coração.
Inês - Os votos que neste instante Fazemos nestes confins ( Deita a mão sobre o coração .) É que nos ameis bastante Embora por anexins.
Ambos- Muitas palmas esperamos De vós: Metade para o autor, metade para nós.
( Cai o pano .)