




























































































Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Livro em pdf.
Tipologia: Notas de estudo
1 / 690
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
http://br.groups.yahoo.com/group/digital_source/
ANTÔNIO DAMÁSIO
Tradução Laura Teixeira Motta
Revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro
2ª reimpressão
Para Hanna
Ou a cachoeira, ou música ouvida com tanta atenção, que você não ouve, mas é a música, enquanto dura. Sinais e pressentimentos, só isso, aqui, sinais e depois pressentimentos; e o resto é reza, observância, disciplina, pensamento e ação. O sinal vagamente pressentido, a dádiva vagamente entendida, é a Encarnação. T. S. Eliot, “Dry salvages”, de Four quartets
A questão de quem eu era me consumia. Convenci-me de que não encontraria a imagem da pessoa que eu era: segundos se passaram. O que em mim aflorava à superfície mergulhava e sumia de vista de novo. E no entanto eu sentia que o momento de minha primeira investidura foi o momento em que comecei a representar a mim mesma — o momento em que comecei a viver — gradualmente — segundo a segundo — incessantemente — Ah veja o que está fazendo! — quer ficar coberta ou quer ser vista? — E o traje — como lhe cai hem! — estrelado com os olhos de outros, chorando. Jorie Graham, “Notes on the reality of the self ”, de Materialism
PARTE 1
INTRODUÇÃO
Sempre me fascina o momento exato em que, da platéia, vemos abrir-se a porta que dá par a o palco e um artista sair à luz; ou, de outra perspectiva, o momento em que um artista que aguarda na penumbra vê a mesma porta abrir-se, revelando as luzes, o palco e a platéia. Percebi há alguns anos que o poder que esse momento tem de nos emocionar, de qualquer ponto de vista que o examinemos, nasce do fato de ele personificar um instante de nascimento, uma passagem de um limiar que separa um abrigo seguro mas limitador das possibilidades e dos riscos de um mundo mais amplo à frente. Porém, enquanto me preparo para redigir a introdução deste livro, refletindo sobre o que escrevi, tenho a intuição de que sair à luz é também uma eloqüente metáfora para a consciência, para o nascimento da mente conhecedora, para a simples mas decisiva chegada do sentido do
desejo de compreender e ao apetite por admirar-se com sua própria natureza, que segundo Aristóteles é o que distingue os seres humanos. O que poderia ser mais difícil de conhecer do que conhecer o modo como conhecemos? O que poderia ser mais deslumbrante do que perceber que é o fato de termos consciência que torna possíveis e mesmo inevitáveis nossas questões sobre a consciência? Embora eu não veja a consciência como o ápice da evolução biológica, penso que é um momento decisivo na longa história da vida. Mesmo quando recorremos à simples e clássica definição de consciência encontrada nos dicionários — que a apresenta como a percepção que um organismo tem de si mesmo e do que o cerca —, é fácil imaginar como a consciência provavelmente abriu caminho, na evolução humana, para um novo gênero de criações, impossível sem ela: consciência moral,*^ religião, organização social e política, artes, ciências e
tecnologia. De um modo ainda mais imperioso, talvez a consciência seja a função biológica crítica que nos permite saber que estamos sentindo tristeza ou alegria, sofrimento ou prazer, vergonha ou orgulho, pesar por um amor que se foi ou por uma vida que se perdeu. O páthos, individualmente vivenciado ou observado, é um subproduto da consciência, tanto quanto o desejo. Jamais teríamos conhecimento de nenhum desses estados pessoais sem a consciência. Não culpe Eva por conhecer; culpe a consciência, e agradeça a ela. Escrevo estas palavras no centro comercial de Estocolmo, enquanto observo pela janela um velhinho frágil andando em direção à balsa que está para partir. O tempo urge, mas ele anda devagar; a dor artrítica nos tornozelos faz seus passos vacilantes; ele tem cabelos brancos e usa um casaco puído. Chove sem parar, ele se verga ao vento como uma árvore solitária em campo aberto. Por fim ele alcança a balsa. Sobe com dificuldade o degrau alto da plataforma de embarque e começa a caminhar pelo convés, com receio de desequilibrar-se no declive; move a cabeça de um lado para o outro, rapidamente, examinando o local, procurando tranqüilizar-se. Seu corpo inteiro parece
permite-nos reconhecer um impulso irresistível para permanecer vivos e cultivar o interesse pelo self. Em seu nível mais complexo e elaborado, a consciência ajuda-nos a cultivar um interesse por outras pessoas e a aperfeiçoar a arte de viver.
Há 32 anos, um homem estava sentado diante de mim em uma sala estranha, totalmente circular, pintada de cinza. O sol da tarde entrava pela clarabóia e nos iluminava enquanto conversávamos. De repente, o homem parou no meio de uma sentença e seu rosto empalideceu; a boca paralisou-se ainda aberta, os olhos fixaram-se no vazio, em algum ponto da parede atrás de mim. Por alguns segundos, ele permaneceu imóvel. Chamei-o pelo nome, mas ele não respondeu. Depois começou a fazer alguns movimentos breves: estalou os lábios, o olhar dirigiu-se para a mesa que havia entre nós, ele pareceu enxergar uma xícara de café e um vasi-nho de metal com flores; decerto enxergou, pois pegou a xícara e bebeu. Falei novamente com ele, e mais uma vez não houve resposta. Ele tocou no vaso. Perguntei-lhe o que estava acontecendo, ele não respondeu, seu
rosto era inexpressivo. Não olhava para mim. Então ele se levantou. Fiquei apreensivo, não sabia o que poderia acontecer. Chamei-o pelo nome, ele não respondeu. Quando aquilo acabaria? Ele se virou e andou devagar em direção à porta. Levantei-me e tornei a chamá-lo. Ele parou, olhou para mim, seu rosto readquiriu certa expressividade — parecia perplexo. Chamei-o novamente, e ele disse: “Sim?” Por um breve período, que me pareceu uma eternidade, aquele homem sofreu um comprometimento da consciência. Neurologi-camente falando, ele teve uma crise de ausência seguida por automa-tismos associados à crise de ausência, duas dentre as diversas manifestações da epilepsia, uma doença causada por disfunção cerebral. Aquela não foi a primeira vez que presenciei um caso de comprometimento da consciência, mas foi a mais intrigante até então. Eu sabia por experiência própria como era dissolver-se numa inconsciência involuntária e recobrar a consciência — quando criança, fiquei inconsciente uma vez, depois de um acidente, e na adolescência fui submetido a uma anestesia geral. Também vira pacientes em coma e observara, da perspectiva de terceira pessoa, como o