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Borboletas da Alma Pg 01 a 152 Drauzio Varella , Notas de estudo de Educação Física

Borboletas da Alma Pg 01 a 152 Drauzio Varella

Tipologia: Notas de estudo

2013

Compartilhado em 10/10/2013

lala-pooh-6
lala-pooh-6 🇧🇷

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BORBOLETAS . DA ALMA ESCRITOS SOBRE CIÊNCIA E SAÚDE 81 -4:616 COMPAN HIA me j BTRAS À Há exatos cem anos, o histolo- gista espanhol Santiago Ramón y Cajal descobriu que o cérebro era composto de bilhões de células, Chamou-as de neurônios e compa- rou-as com “as misteriosas borbo- ieias da alma”, cujo voecjar esclare- ceria no fuluro os segredos da men- te. O pioneirismo valeu a Ramón v Cajal à Nobel de medicina; O lirismo da metáfora valeu a Drauzio Varella o belo úítulo deste livro. É o cérebro, órgão mais simbólico do corpo hu- mano, promessa mais fascinante da biologia deste século, o tema-sínte- se das escritos aqui reunidos. As borboletas da alma respondem tan- to pelo instinto materno como pela violência urbana, pelo alcoolismo e a longevidade, por uma gama de doenças e comportamentos. Estes textos falam de genes e primatas, de clonagem e planeja- mento familiar, de males incuráveis e mazelas corriqueiras, de sinto- mas e prevenção, de drogas lícitas e llicitas, envelhecimento e infância. São interrogações recorrentes nas obras de Drauzio Varelia, médico que, há mais de trinia anos lidando com doentes graves, soube huma- nizar a prática da medicina e trans- miti-la num estilo conciso. Em Estação Carandiru (1909), relatos sobre o cotidiano do presídio paulista, e em Por um fio (2009), narrativas sobre pacientes confron- tados com a iminência da própria fi- nitude, Drauzio Varella contava his- tórias de vida e morte que calavam fundo na emoção de seus leitores. Em Borboletas da alma, o foco se desloca para a razão. Ao fim destes escritos, o leitor terá eliminado pre- ca” DRAUZIO VARELLA Borboletas da alma Escritos sobre ciência e saúde Organização: Maria Guimarães CompaNHTA DAS LETRAS O odor dos genes 68 Dengue 190 Machos exibicionistas, fêmeas seletivas 77 A gripe dos frangos 195 Amor, só de mãe 80 Prevenção de cálculo renal 198 Causas da homossexualidade 82 O segundo cérebro 201 5. Violência 85 Síndrome da fadiga crônica 207 í Raízes orgânicas e sociais da violência urbana 85 DPOC 212 Violência na Tv e comportamento agressivo 107 Sintomas nasais crônicos 215 Dor crônica 218 PARTE II — DIA-A-DIA 11 Gota: a doença dos reis 220 Repouso e dor ciática 223 1. Cuidados n3 Depressão 224 A alergia do isolamento 113 O combate ao mau hálito 233 Os micróbios da boca 116 A epidemia de diabetes 236 Mercurocromo, mertiolate e outras crenças 118 A cura do câncer 241 Olha esse vento nas costas. menino! 121 A próstata do seu Olinto 245 Privação do sono 124 O risco do câncer de mama 248 O sonho 129 Regeneração cardíaca 252 Planejamento familiar 130 Um exame de sangue para prevenção do ataque cardíaco 255 Estilo de vida 136 'A terceira onda da aids 261 2. Dieta 139 Transmissão de Hrv resistente 264 Come, meu filho! 139 Raízes biológicas da obesidade 142 PARTE IV — DROGAS: REMÉDIOS L DEPENDÊNCIA QUÍMICA 269 Carne vermelha: verdade ancestral 147 Inimigo traiçoeiro 165 Toma, que é bom para a gripe 271 Crianças obesas e sedentárias 169 Fórmulas milagrosas 274 Uvas, vinhos e longevidade 172 Descoberta da vacina da poliomielite 277 Erradicação da poliomielite 280 PARTE IT — A SAÚDE NO COTIDIANO 177 A vacina da gripe 283 Reposição hormonal: continuar ou descontinuar? 287 Azia: sintoma de mal crônico 179 Disfunção erétil e doença vascular 291 Doença de Alzheimer 181 Compulsões comportamentais 294 Aterosclerose: doença infecciosa 187 Morfina 301 Abuso de anabolizantes 304 Nota do autor Abstinência de antidepressivos 307 Considerações sobre o alcoolismo 309 Alcoolismo em mulheres 313 Cigarro: droga pesada 316 De gravata ou revólver na mão 322 Café e ataque cardíaco 325 PARTE V — VIDA E MORTE 329 Longevidade 331 Os genes do envelhecimento 336 O ambiente e o envelhecimento 345 A memória dos neurônios 356 O momento da morte 367 re5D o - Este livro contém boa parte dos artigos sobre temas científi- vos que escrevi nos últimos cinco anos para o jornal Folha de Notas 371 É sus S.Paulo e para a revista CartaCapital. Nele, o leitor encontrará Índice remissivo 379 textos ligados à medicina, ao comportamento social e aos fatos biológicos responsáveis pelos rumos que a vida tomou na Terra. Com todo o respeito pelos que acreditam ter sido o homem ertado por um sopro transcendental, a visão de que a vida surgiu aleatoriamente, há quase 4 bilhões de anos, a partir de moléculas cupazes de fazer cópias de si mesmas e que, através da seleção na- tural, formaram seres tão dispares quanto bactérias, árvores e ma- miferos encerra mais mistério e poesia. Entender os seres vivos como indivíduos em competição per- manente pelos recursos naturais, empenhados em sobreviver a to- do custo para transmitir seus genes às gerações futuras, integra o homem na ordem natural adotada pela vida em nosso planeta e em qualquer outro onde ela porventura exista ou venha a existir. O conjunto de ensaios reunidos em Borboletas da alma tem 1. Vida na Terra “E o homem povoou a Terra...” A vida na Terra é um rio que começou a correr há quase 4 bilhões de anos, e chegou até você e eu no meio de uma diversi- dade espetacular: leões, mosquitos, coqueiros, bactérias, algas ma- rinhas e dezenas de milhões de outras espécies. Veja o caso dos dinossauros. Dominaram o planeta por mais de 200 milhões de anos e sumiram num piscar de olhos, possivel- mente varridos por um meteoro que abriu uma cratera de dez qui- lômetros no México. A poeira levantada e os vulcões que entra- ram em atividade como consequência do impacto poluíram tanto a atmosfera que a Terra ficou no escuro e os dinossauros foram extintos. Para azar deles. E sorte nossa. Um desvio de milésimo de grau na órbita do meteoro e eles estariam aí até hoje, enormes, pre- dadores, sem deixar qualquer espaço para que surgisse algo pare- cido com o homem. Enquanto os dinossauros é sLiam, os mami- feros não passavam de uns poucos roedores noturnos apavorados nas tocas. Indiferente à tragédia dos desaparecidos, o rio da vida seguiu seu destino impiedoso de formar novas espécies c abandoná-las à própria sorte. Estima-se que as 30 milhões de espécies existen- tes hoje correspondam a apenas 1% das 3 bilhões que já povoa rama Terra, 'á uma fração de minuto evolutivo surgiu na África um pri- mata diferente dos macacos comuns: era grande e não tinha ra- bo. Esse ancestral teve cinco descendentes: orangotango, gorila, ho- mem, chimpanzé e bonobo. a metade do século passado, a ciência acreditava que to- de$ as espécies haviam sido criadas por Deus num único dia, Nessa época, os museus britânicos já contavam com uma coleção razoável de fósseis, recolhidos em vários países. Entre os natura- listas, a análise desse material gerou três grandes indagações: Que fenômenos teriam provocado a extinção irreversível dessas espé- cies? Por que razão muitos [ósseis guardavam tanta semelhança anatômica com espécies ainda vivas? Como explicar o sucesso ecológico de uma espécie e o fracasso de outra? Os cientistas da época elaboraram diversas teorias para res- ponder a essas questões. Então vieram Alfred Wallace e Charles Darwin, dois naturalistas ingleses que imaginaram uma teoria in- crivelmente simples: a vida é uma competição eterna na qual os mais aptos sobrevivem e os fracos são extintos. Embora Darwin tenha justificado suas idéias através da pu- blicação de uma série de observações meticulosas colhidas numa viagem pelas Américas e pelo Caribe, que incluiu o Brasil, a teo- ria de Wallace-Darwin nasceu de apenas uma idéia, como costu- mam surgir as teorias universais. Desde sempre, a experiência mostrou que um fruto maduro cai da árvore, no chão. Todos os animais sabem disso e nós tam- bém, mas foi preciso nascer um homem chamado Isaac Newton para interpretar a queda de forma nunca antes imaginada: não é a maçã que cai da árvore, é a Terra que a atrai, Assim foi criada a lei da gravitação, válida para todos os corpos celestes. Princípio uni- versal, como a teoria da seleção natural enunciada por Wallace- Darwin. Se no futuro a vida for descoberta num planeta distan- te, ela obedecerá à mesma ordem: competição e seleção natural. Imagine a Terra há quase 4 bilhões de anos, no instante em que surgiu a vida. Que instante foi esse? Foi quando apareceu a molécula de RNA, a primeira dotada de uma propriedade singu- lar: fazer cópias de si mesma. A vida nada mais é do que uma re 14 plicação eterna: um ser forma dois, dois formam quatro, quatro geram oito, dezesseis, 32, 64... numa progressão sem fim. Se não existissem limites impostos ao processo de multipli- cação, uma molécula replicante como essa cobriria a superfície da Lerra em camadas sucessivas, acumuladas geometricamente até preencher o universo. Como a vida, no entanto, está longe de ser matemática, a mo- léculas de eva não puderam se multiplicar sem restrições. Para se formar precisaram ser sintetizadas a partir de outras moléculas pre- sentes no ambiente primordial que compunha a superfície da Terra. Em outras palavras, foram obrigadas a competir pelos re- cursos existentes naquele tempo, de tal modo que sobreviveram as mais aptas, aquelas capazes de retirar do meio tudo o que ne- cessitavam para dar origem a moléculas-filhas, que herdaram a ha- bilidade das mães. É fácil imaginar que a primeira molécula de RNA capaz de sin- tetizar uma camada externa protetora ficou menos sujeita às in- tempéries químicas ambientais e criou uma estrutura como a de certos vírus existentes hoje (o da aids, por exemplo). Essas formas de vida devem ter levado tamanha vantagem na competição, que persistiram até nossos dias. Na competição desenfreada entre as moléculas replicantes pri- mordiais, algumas moléculas de RNA desenvolveram a proprieda- de de sintetizar o pna, molécula capaz de arquivar informações genéticas muito mais complexas que as arquivadas pelo RNA, que lhe deu origem. Apareceram então os primeiros seres unicelula- res, as bactérias arcaicas, habitantes exclusivos do planeta por 3 bi- lhões de anos. O sucesso ecológico desses seres formados por uma só célula pode ser medido não só pelo tempo em que eles consti- tuíram a única forma de vida existente, mas pelo fato de as bac- térias estarem disseminadas nos mais diversos ambientes da Terra até os dias de hoje. meas. Quanto mais acentuado o dimorfismo sexual, como nos orangotangos e gorilas, mais dominadores são eles e mais de sunidas as s. Nos bonobos e homens, espécies menos dimórficas, com fêmeas capazes de formar alianças, o poder masculino é reduzido significativamente. Os machos, como regra geral, procuram o acasalamento com diversas fêmeas e se empenham em evitar que outras machos façam o mesmo. Os bonobos são exceção; o homem, um ca- so intermediário. Nas cinco espécies, muitos filhotes são concebidos fora do gru- po em que as mães vivem, graças à infidelidade feminina. As fêmeas têm preferência sexual pelos machos que ocupam os postos mais altos na hierarquia masculina. A gorila chega a abandonar o macho que não foi capaz de proteger o filho- te, e pode até acompanhar o invasor infanticida. A vida terrestre dos primatas, que começou com os gorilas, trouxe a necessidade de formação do grupo. Chimpanzés, bo- nobos e homens formam comunidades maiores, nas quais os indivíduos estabelecem redes complexas de alianças. São os mais políticos dos animais. O canibalismo é encontrado nos homens e chimpanzés. Nessas espécies, os machos formam bandos para, com pre- meditação, invadir território alheio e matar o semelhante. São Os únicos animais com essa característica. Como regra geral, os grandes primatas são capazes de ut zar ferramentas. Chimpanzés e bonobos reconhecem a pró- pria imagem no espelho, capacidade que a criança desenvol- vc a partir dos dezoito meses de vida. Chimpanzés e bonobos conseguem aprender o significado dos sinais representados na linguagem dos surdos-mudos, e chegam a interpretar sen- Lenças que nunca ouviram antes. 18 Milhares de horas de observação de primatas no campo e em cativeiro permitiram aos primatólogos modernos estabelecer as bases evolutivas do comportamento humano. De fato, admitimos que temos em nossas personalidades um lado escuro, despótico, sanguinário, herdado de nossos ancestrais primitivos. Já as quali- dades das quais temos orgulho. consideramos tipicamente hu- manas — afinal, apenas nós somos capazes de amar ao próximo como a nós mesmos. A evolução não cria mecanismos especiais para nenhuma espécie. Se nosso lado sinistro denuncia nosso passado animal, o mais nobre também o revela. Quando um chimpanzé traz comi- da para o companheiro doente, uma gorila enfrenta o macho enorme para defender um filhote que não é dela, a orangotango coça as costas do filho ou um bonobo cola os lábios nos da fêmea e introduz a língua em sua boca, por que não dizer que tais atitu des representam altruísmo, solidariedade com o mais fraco, cari- nho materno e beijo na boca? O que nos diferencia dos outros primatas não são as atitu des nobres nem as bestiais, mas o fato de termos um sistema ner- voso central mais elaborado e versátil que o deles. O orangotan- go-alfa dá gritos longos para atrair fêmeas receptivas e assustar subordinados; gorilas e chimpanzés berram e quebram galhos na floresta para afastar intrusos; e os bonobos, quando brigam, gri- tam alternadamente na direção do adversário, como se trocassem ofensas. Não há dúvida de que os grandes primatas não humanos conseguem dizer coisas fundamentais um para o outro através da fala. O que eles não são capazes é de recombinar sílabas sem sen- tido de modo a formar milhares de palavras que podem ser agru- padas em sentenças com infinitos significados. A linguagem, sim, é uma característica tipicamente humana; nada parecido com ela (existe em qualquer espécie. Nosso cérebro evoluiu passo a passo a partir de ancestrais co- 19 muns aos dos outros primatas. Não houve saltos qualitativos ou acrobacias evolutivas, apenas um longo processo de compeli- ção e seleção natural que conduziu aos cinco grandes primatas e seus mais de 9: % de identidade genética, entre 30 milhões de ou- tras espécies sobreviventes das sucessivas extinções em massa. Num mundo de reservas limitadas, a diferença de 5% que sur- giu entre nós e os grandes primatas foi decisiva para o homem po- voar o planeta aos bilhões, número jamais sonhado por qualquer ais. Nessa outro vertebrado, e ainda aventurar-se às viagens csp: pequena constelação de genes exclusiva dos humanos estão aque- les que aumentaram a complexidade da atividade cerebral. Comparado ao de orangotangos, gorilas, chimpanzés e bo- nobos, o cérebro humano não é apenas mais volumoso e saliente na fronte: ele apresenta maior capacidade computacional. Na evo- lução da espécie humana não ocorreu simplesmente o crescimen- to volumétrico cerebral, houve o crescimento diferencial de algu- mas áreas. Nosso cérebro é formado por células nervosas, os neurônios, que se comunicam por circuitos computacionais montados pacien- temente durante milhões de anos de competição e seleção natu- ral. Cada estímulo que atinge o sistema nervoso central percorre s centrais um circuito particular de neurônios até chegar às esta que decodificam os sinais recebidos. Quando um raio de luz im- cruza o cé pressiona nossa retina, por exemplo, o estímulo visual rebro até a parte posterior da cabeça, no lobo occipital, onde se encontram os centros da visão. A partir deles, novos circuitos de neurônios fazem a informação trafegar em velocidade vertigino- às áreas cerebrais que irão situar o estímulo no domínio do cons- ciente. Em milésimos de segundos saberemos se aquela luz indi- ca um barco se aproximando, um vaga-lume ou um automóvel ameaçador. No caminho evolutivo que conduziu ao homem, houve o cres- cimento diferencial de alguns centros cerebrais nas regiões que cor- respondem à transição dos ossos occipitais (atrás da cabeça), pa- rietais (em cima) e temporais (do lado). Nessas áreas, são recebi- s, acústicos e dos e integrados os estímulos visuais, táteis, olfativ gustativos. O crescimento dessa parte do cérebro permitiu a cria- ção de um universo abstrato, desconhecido entre os outros ani- mais. Num instante, o cheiro de uma flor pode evocar uma mú- si a, à partir dela uma pessoa, um vestido branco e um compromisso que não podemos perder no dia seguinte, senão laltará dinheiro no final do mês para pagar a prestação do automóvel. Como no caso da linguagem, não há evidência de que nossos irmãos prima- tas ou outros animais sejam dotados de circuitos de neurônios ca- pazes de associações tão complexas. Além do crescimento diferencial d: te posterior do cérebro, na linhagem que conduziu aos seres hu- imento progressivo do lobo frontal, O ho- cas situadas na par- manos houve mem de hoje não tem a testa inclinada para Lrás como os demais primatas ou mesmo os homens primitivos. O lobo frontal proe- minente permitiu a organização e processamento das informa- ções colhidas do resto do corpo e do ambiente pelos circuitos ce- rebrais específicos. Disso resulta uma integração do universo interno do organismo com o mundo externo, que nos permite avaliar simultaneamente o nível de urina na bexiga, a velocidade do carro, a chuva que as nuvens negras trarão, o impacto delas no tráfego e quanto tempo ainda falta para chegar no próximo posto de gasolina. O desenvolvimento do lobo frontal na espécie humana co- locou as representações internas do corpo permanentemente on-line com as do mundo externo. Desse universo or-line resul- tou um crescimento exponencial da capacidade de elaborar pro- jetos. Como, por exemplo, o de criar colônias em Marte nos pró- ximos cem anos. a tade da biomassa terrestre, isto é, se somarmos o peso de cada uma, obteremos mais da metade da massa de todos os demais seres vi- vos somados, incluindo árvores, elefantes e baleias O Homo sapiens é simplesmente uma entre milhões de espé- cies. Nascemos há 5 milhões de anos, um segundo evolutivo com- parado aos 4 bilhões de anos das bactérias. Não fizemos nenhu- ma falta à vida na Terra durante praticamente toda a existência dela, e se um dia formos extintos, nenhuma formiga, cigarra ou besouro chorará a nossa ausência, À evolução continuará seu ca- minho inexorável de competição e seleção natural, como ensina- ram Charles Darwin e Alfred Wallac Na verdade, os números do Projeto Genoma são lógicos. Os seres vivos mantêm a quase totalidade de seus genes ocupados na execução das tarefas do dia-a-dia: respiração, circulação, movimen- tação, digestão, excreção e produção de energia, entre outras. Í Muitos desses genes são tão essenciais ao trabalho domés- tico que a evolução os preservou praticamente intactos de um ser vivo para outro. Vejam o caso do gene responsável pela ubiqui- tina. Awubiquitina é uma proteína envolvida no maquinário celu- lar, encarregada de cortar outras proteínas. Dentro da célula, es- sa é uma função importantíssima, porque as proteínas que fica- ram velhas ou saíram defeituosas precisam ser destruídas para não interferir no funcionamento celular. Outras têm que ser cortadas para permitir que ocorram determinadas reações inibidas por sua presença, da mesma forma que a tampa de um tanque precisa ser retirada para que escoe a água nele contida. Se compararmos a ubiquitina de um fungo à da mosca que sobrevoa as bananas maduras, à de um verme, à de um sapo ou à do homem, veremos que as moléculas são praticamente iguais (daí o nome, para sugerir ubiquidade). A semelhança é tanta que os biólogos interessados nos mecanismos de ação da ubiquitina 24 não são obrigados a estudá-la no homem: podem fazé-lo num fungo e transpor os resultados para a fisiologia humana. É provável que o ancestral comum aos fungos e aos homens, que viveu há 600 milhões de anos, tenha desenvolvido um méto- do tão eficiente de cortar proteínas que o mesmo se manteve intacto durante o processo evolutivo. Os descendentes desse an- cestral incapazes de produzir ubiquitina não tiveram chance na competição e desapareceram. Como o gene da ubiquitina, vários outros são compartilha- dos por todos os seres vivos, com diferenças mínimas. Estão geral- mente ligados às funções essenciais à manutenção da vida celular. Representam soluções tão econômicas para a execução das tarefas diárias que a evolução não conseguiu selecionar outras melhores. É o caso da existência de dois olhos na cabeça, por exemplo, estra- tégia adotada por todos os animais dotados de visão. Entender a razão pela qualtemos 30 mil genes como os ra- tos é fác : eles são mamiferos como-nós e apresentam fisiologia tão semelhante à nossa que costumamos utilizá-los em experiên- [o s para entender a fisiologia humana. O que intriga na evolução não é a proximidade genética entre as espécies, mas os genes res- ponsáveis pelas diferenças. . Se o que nos distingue dos ratos são mesmo trezentos genes, as interações entre estes e o ambiente envolvem imensa comple- xidade biológica. A história da clonagem Todos lembram de Dolly, clonada a partir de uma ovelha adulta. lan Wilmut e Keith Campbel, os dois escoceses que a clo- naram, ganharam as páginas dos jornais, e provavelmente um dia receberão o prêmio Nobel. > A clonagem é um processo simples de entender, mas difícil de executar com segurança por causa de dificuldades técnicas, que no entanto estão sendo transpostas rapidamente. Em pouco tempo teremos rebanhos de animais clonados, e estaremos às vol- tas com os aspectos éticos e sociais das clonagens n humana. A revista Scierice, que divide com a Nature o pódio do pres- tígio científico. publicou na seção “Pathways of Discovery” [Ca- minhos da Descoberta] uma revisão sobre a evolução ocorrida no campo da clonagem. Vamos mostrar como a ciência chegou a Dolly e o que aconteceu depois de seu nascimento, em 1996. espécie Para isso, é preciso voltar no tempo. Em 18: cendo que os organismos são formados por células que se orga- nizam em tecidos. Em 1855, outro alemão, Rudolf Virchow, enunciou o conceito Omnis cellula e celula: toda célula vem de ou- tra célula, Dez anos mais tarde, o monge Gregor Mendel descre- veu em ervilhas as leis fundamentais da hereditariedade, ignora- , Theodor Schwann? criou a teoria celular, estabele- das até o início do século xx. Há mais de cem anos, portanto, já se sabia que depois da fe- cundação o ovo se divide sucessivamente até formar o indivíduo. De acordo com a teoria celular, as células-filhas herdam as carac- terísticas das células-mães e depois se diferenciam para exercer as funções específicas dos órgãos às quais se destinam, seja fígado, pulmões ou pele. Na época, não havia dúvida de que as duas células resultan tes da primeira divisão do óvulo recém-fecundado eram aparen- temente iguais. Mas e se fossem separadas uma da outra? Conser- varia cada uma a capacidade de gerar o embrião inteiro ou formaria apenas metade dele? A questão da igualdade ou diferença das duas primeiras cé- lulas do embrião foi mais uma das demonstrações de que em ciência é fundamental formular a pergunta instigante, O esclare- cimento dessa dúvida deu origem aos bebês de proveta e às clo- nagens de vegetais e animais como Dolly. Em 1892, Hans Drieschº esperou um ovo de ouriço-do-mar dlividir-se pela primeira vez num meio de cultura e separou as duas células: cada uma formou uma larva de ouriço-do-mar comple- ta, Numa segunda experiência, esperou a divisão formar quatro células para depois separá-las, e o resultado foi o semelhante: sur piram quatro larvas. Em 1901, Hans Spemannº separou as du s primeiras células de um ovo de e com elas obteve dois girinos bem formados. Estava confirmada, num animal mais complexo, a experiência com o ou- riço-do-mar. Assim, no início do século xx a ciência chegou à conclusão de que as primeiras células embrionárias são totipotentes, isto é, enrregam consigo todas as informações necessárias para gerar o brganismo completo. Aí foi feita a pergunta seguinte: em que parte da célula esta- tia armazenada essa informação? Como nessa época os cromossomos já haviam sido caracte Hlzados como responsáveis pela hereditariedade, a suspeita recaiu sobre o núcleo. Jacques Loeb e o próprio Spemann, trabalhando tos. Começava a ser respondida a pergunta que Spemann fizera 24 anos antes: o núcleo de células adultas, já diferenciadas, pare- cia reter o mesmo potencial do núcleo das células embrionárias. Cinco anos depois, em 1967, Marie Di Bernardino relatou mais de 1200 transferências de núcleos obtidos a partir de células ner- vosas de rãs adultas para óvulos não fecundados. Apesar do su- cesso técnico das transferências, apenas quatro dos animais gera- dos tinham cromossomos normais, dos quais três apresentaram defeitos de desenvolvimento. Em 1977, o mesmo John Gurdon retirou o núcleo de um óvulo de rã preta e nele inseriu o núcleo de células adultas de uma rãalbina.” Nasceram trinta rãs, todas elas albinas, como a doado- ra do núcleo que lhes deu origem. O autor publicou a foto das rãs dispostas em cinco colunas de seis indivíduos cada, Esses trabalhos provocaram furor na imprensa leiga. A com- paração com os seres humanos clonados da ficção de Aldous Huxley — Admirável mundo novo, publicada em 1932 — foi ine- vitável, e alimentou numerosas especulações na imprensa, histó- rias literárias e cinematográficas: A duplicação do homem, de David Rorvik (1978)," Os meninos do Brasil, de Ira Levin (1976), "A clo- nagem de Joanna May, de Fay Weldon,” dentre outros. Até então, os cientistas pareciam interessar-se apenas pela ciên- cia bási -nvolvida na clonagem. A consciência de suas aplicações práticas veio apenas em 1979, quando Steen Willadsen"” conseguiu realizar 101 transferências de núcleos retirados de células na fase As técnicas de inicial do desenvolvimento de embriões de boi. clonagem de ouriços-do-mar e sapos chegavam à pecuária. Em 1991, 0 mesmo Willadsen isolou núcleos de oito células do embrião de um boi na fase de blástula e transferiu-os para oi- to óvulos previamente anucleados. * Verificou que diversos bezer- ros nascidos apresentavam defeitos congênitos, dos quais o mais fregiente era o excesso de peso ao nascer, causador de sérias difi- 30 culdades de parto que inviabilizavam a aplicação comercial do ex- perimento. Nos anos que se seguiram, Tan Wilmut e Keith Campbell” tra- balhavam no célebre Roslin Institute, na Escócia, para encontrar formas de modificar geneticamente ovelhas e bois. Impressionados pelas experiências que demonstravam a possibilidade de clonar sa- pos e rãs a partir de núcleos obtidos de células adultas, os pesqui- sadores criaram culturas de células de embriões de carneiro para Nesse am mantê-las em estado de “dormência” (quiescência) nte, as células embrionárias envelhecem e diferenciam-se co- mo a dos adultos. Em seguida, os autores colocaram essas células em presença de óvulos não fecundados e aplicaram uma corren- te elétrica no meio de cultura para fundir as células embrionárias som o óvulo e lhes transferir o núcleo, Em 1995, Wilmut e Campbell haviam conseguido 244 trans- lorências. Delas, 34 atingiram o estágio de desenvolvimento que lhes permitiu o implante no útero de ovelhas-mães adotivas. Nas deram cinco carneiros, dos quais apenas dois sobreviveram até a idade adulta: Megan e Morag, os primeiros mamíferos clonados 4 partir de células diferenciadas envelhecidas em cultura. os de seus predecessores com clonagens a partir de células adultas, os dois escoceses tentaram transferir pa- pi úvulos núcleos retirados das glândulas mamárias de uma ove- Hi dle seis anos. Em 1996, depois de 277 tentativas, nasceu Dolly, | primeiro mamífero clonado a partir das células de um adulto, pxperimento que muitos julgavam impossível.” foram necessários 58 anos para que a hipótese “fantástica” do Spemann ficasse comprovada: a informação genética guarda- dino núcleo das células adultas retém de fato a capacidade de ge- Hi novos indivíduos. A metodologia empregada na concepção de Dolly foi alvo de intensa polêmica nos meios acadêmicos, como tradicionalmen- te acontece com a publicação de observações revolucionárias. Difícil aceitar que um animal seja cópia em carbono de um adul- to, gerado por um método que subverte os papéis clássicos de pai e mãe. Em 1997, os dois escoceses que criaram Dolly obtiveram Polly,” ovelha clonada a partir de fibroblastos adultos (células do tecido conjuntivo) nos quais havia sido inserido um gene que co- difica o fator 1x, proteína de valor comercial envolvida na coagu- lação do sangue humano. Polly foi o segundo mamífero obtido a partir de células adultas e o primeiro animal clonado para fun- cionar como biorreator — fábrica de proteínas de interesse eco- nômico. Nos anos seguintes, a transferência de núcleos de células adultas para óvulos anucleados foi executada com sucesso em bois, cabritos e ratos. Por enquanto o rendimento está abaixo das expectativas comerciais: as clonagens são trabalhosas e os indices de sucesso raramente ultrapassam 3%, porque os embriões mor- rem com facilidade. Outros morrem ao nascer, frequentemente com anormalidades físicas. As razões para essas mortes são desconhecidas. Talvez o nú- cleo adulto exija técnicas especiais para reprogramar-se na me- dida necessária para formar um novo indivíduo. Apesar dos re- veses, porém, inúmeras companhias de biotecnologia fazem investimentos pesados no setor, com a intenção de clonar animais de raças mais apuradas e biorreatores que produzam proteínas ou tecidos de interesse médico. No começo de 2001 havia cerca de trezentos bezerros clo- nados a partir de células fetais ou adultas. Gestações como essas muitas vezes terminam em abortamento espontâneo. Nesses ca- sos, os fetos costumam ser surpreendentemente grandes. Dos que sobrevivem até o nascimento, cerca de 25% são maiores do que os normais, dificultando o trabalho de parto. Mesmo os que nas- 32 “cem com tamanho normal apresentam pulmões imaturos e níveis de potássio muito altos no sangue. | Os pesquisadores que trabalham com gado constroem atual- mente um banco de dados contendo informações sobre as linha- gens de células utilizadas na clonagem, técnicas usadas para a — transferência de núcleos, os cuidados e a alimentação indicada pa- ta as mães adotivas e a velocidade de crescimento intra-uterino dos embriões, com o objetivo de caracterizar melhor os fatores en- Ívidos no processo. Em março de 2000, Alan Colman, cientista de uma compa- nhia chamada ppr Therapeutics, comunicou a obtenção de por- tos clonados. Clonagem de Porcos é um dos tópicos mais dispu- lindos da ciência atual, Pois muitos cientistas acreditam que tecidos tomo coração, figado e pâncreas de porcos transgênicos poderão er usados para substituir órgãos humanos nos transplantes. Trabalhar com porcos é mais difícil do que com bois ou ove- lhas porque os filhotes nascem em ninhadas, e, a menos que E stam quatro fetos viáveis no útero, a gravidez termina espon- | lleamente. Isso representa uma complicação a mais; é preciso 0 psi implantar pelo menos quatro embriões viáveis no úte- To Eotivo. Além disso, os embriões são mais frágeis e difíceis de manipular. Apesar das dificuldades, empresas como a PPL procuram mo- as células doadoras de material genético para obter tecidos nais facilmente aceitos pelo sistema imunológico humano. Cabritos parecem mais fáceis de ser clonados. Em 1999, duas mpanhias relataram a obtenção desses animais. Uma delas exia Biotechnology, clonou dois cabritos biorreatores, RortEdds Ee um gene retirado de uma espécie de aranha que constrói feia com um fio semelhante à seda. Em 2000, os dois foram ados com fêmeas normais Para tentar obter no leite materno proteína responsável pela teia. Com ela esperam fabricar fios pa- 3 dade os filhos têm nascido para preencher as mais variadas expec- tativas de mulheres c homens. Mesmo proibir a clonagem porque a criança assim gerada se- ria cópia idêntica do progenitor que lhe doou os genes não pare- ce argumento razoável: a semelhança estaria limitada ao aspecto físico, se tanto. A personalidade individual é consegiência de in- terações muito complexas entre o genoma e as experiências co- lhidas do ambiente. Andi, o macaquinho transgênico A biologia começa a decifrar os mecanismos de criação da vi- da. No passado, a vida era estudada como um produto acabado da evolução das espécies, uma massa de atividade biológica criada por imposição de um conjunto de genes impossíveis de manipular. Foi nos anos 1950 que Watson e Crick descobriram a estru- tura do DNA, a estante-arquivo dos genes, e aprendemos que eles não passam de substâncias químicas, ou seja, substâncias quimi- camente iguais em todas as espécies. O que nos diferencia de uma bactéria é simplesmente a complexidade: elas possuem 10 mil ge- nes, e nós, cerca de 30 mil. olarmos o gene responsável pelo azul Como conseguência, se dos olhos de uma criança e, com uma agulha microscópica, for mos capazes de implantá-lo muma bactéria, cla não o estranhará. Ao contrário, passará a considerá-lo seu na hora de executar o ofi- cio incansável de todos os genes: dar ordem para produzir proteí- na. Assim, uma reles bactéria pode fabricar a proteína que deixa azul o olho de uma criança. 36 Foi o que os cientistas fizeram a partir dos anos 1960 e 1970: transplantaram para bactérias o gene da insulina humana, do in- terferon e de outras proteínas de interesse comercial. A tecnolo- gia foi chamada de DNA recombinante. Em 1980, um grupo de pesquisadores americanos retirou células da medula óssea de um rato, introduziu nelas um novo ge- ne e devolveu-as ao animal. Foi o primeiro animal transgênico. Pouco depois, surgiram os experimentos de transplantes de genes em óvulos e espermatozóides, procedimento muito mais radical, porque o gene lransplantado fica definitivamente incorporado ao genoma e pode ser transmitido às gerações luturas. À transgenia não ficou limitada aos ratos. Logo apareceram as ovelhas, porcos e bois — para não falar dos vegetais transgêni- cos. Diversas proteínas de interesse para o homem começam a ser fabricadas por essa tecnologia que mudará a medicina, a agricul- tura e a pecuária. Na edição de janeiro de 2001, na revista Science, pesquisa- dores do centro de primatologia de Oregon, nos Estados Unidos, relataram um trabalho que mais parece curiosidade de almana- que: o transplante de um gene da água-viva para um macaco Rhestis O gene transplantado produz uma proteína (Ger) que exibe coloração esverdeada quando iluminada por laser. Foi es- colhido um macaco porque a presença da luz verde nos tecidos desse animal seria uma maneira fácil de confirmar o sucesso do transplante. O gene foi retirado das células de uma água-viva e introdu sido num vírus preparado para funcionar como vetor do trans- plante. Os pesquisadores tomaram então 224 óvulos de macacas & introduziram neles os vírus-vetor carregando o gene em ques- tão. Depois, fecundaram esses óvulos ir vitro, com a mesma téc- nica dos bebês de proveta. Os quarenta embriões mais vigorosos fo am finalmente implantados no útero de vinte macacas. Nasceram “ apenas três macaquinhos, entre eles Andi, com traços da proteí- na esverdeada em seus músculos, cabelos e glóbulos brancos. Se Andi será capaz de transmitir o gene a seus descendentes, só sa- beremos daqui a quatro ou cinco anos, quando atingir a maturi- dade sexual. O assunto ganhou destaque no noticiário internacional. O olhar meigo do macaquinho no colo da pesquisadora deixou cla- ro que os transplantes de genes entre espécies diferentes chegaram muito próximo do homem. Enquanto eram ratos, porcos ou ove- lhas, tudo bem, mas macacos! Esse tipo de situação provoca os mesmos temores da época de Dolly, a ovelhinha clonada pelo escocês de barba ruiva. Não fal- tam visionários para antever hordas de crianças clonadas para atender ao desejo de tiranos desalmados ou uma profusão de pais a inserir genes em seus filhos para torná-los mais espertos. Embora a tecnologia para obtenção de macacos transgêni- cos esteja muito atrasada em relação à utilizada nos ratos, há ra- zões óbvias para desenvolvê-l. Os conhecimentos obtidos por meio deles serão fundamentais para corrigirmos defeitos genéticos que trazem ao mundo crian- » além : macacos são primatas como nós. ças com retardo intelectual, cegueira, deformidades fí de adultos que terminam a vida com câncer, infarto do miocár- dio ou enclausurados na solidão das demências. Os transplantes de genes encontrarão tantas aplicações no tra- tamento de doenças congênitas e adquiridas que provocarão uma revolução sem precedentes na história da medicina. É absurdo renunciarmos a esse tipo de tecnologia por medo de possíveis aplicações criminosas. Bastará à sociedade criar leis que estabeleçam limites rígidos para esses procedimentos, como fizemos para os transplantes de órgãos, por exemplo. 3. Cérebro As borboletas misteriosas da alma O cérebro humano é a estrutura mais complexa do univer- so. Pesa ao redor de um quilo e meio, mas contém tantos neurô- nios quantas cstrelas a Via Láctea: 100 bilhões. Pa le lembrar que en um milímetro cúbico de tecido cerebral exis- dar idéia da complexidade de nosso sistema nervoso, va- tem 100 mil neurônios que estabelecem 1 bilhão de conexões uns com os outros. Se medissemos uma por uma todas as ramifica- ções que essas células apresentam, chegaríamos à conclusão de que O cérebro contém uma fiação de 100 mil quilômetros, duas vezes e meia a circunferência da Terra. A curiosidade pela fisiologia cerebral é muito antiga. Existe farta documentação sobre esqueletos de 10 mil anos que exibem um buraco regular no topo da cabeça, procedimento ainda hoje utilizado com o nome de trepanação. Pelas características da os- sificação ne local, é possível concluir que esses orifícios foram aber- los em pessoas vivas, e não como parte de um ritual depois da mor- te, Há forte suspeita de que essas trepanações tenham sido realizadas por médicos para tratar cefaléias e doenças mentais, talvez com o propósito de abrir caminho para os maus espíritos abandonarem O cérebro. Há 5 mil anos, os egípcios, que descreveram diversos sinais de doenças r ma e a biblioteca das memórias. curol gicas, consideravam o coração o templo da al- O coração permaneceu como sede da consciência até Hi- 39