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Guias e Dicas
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Capítulo sistema digestivo, Resumos de Medicina

Capítulo do livro sistema digestivo

Tipologia: Resumos

2022

Compartilhado em 20/03/2023

nathalia-fantin
nathalia-fantin 🇧🇷

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CAPÍTULO
MOTILIDADE DO TRATO
GASTRINTESTINAL
Armenio Aguiar dos Santos
Pedro Jorge Caldas Magalhães
Ricardo de Freitas Lima
17.1 MOTILIDADE GASTRINTESTINAL
A ingestão de alimentos e a exoneração dos resíduos digestivos em condições
normais são atos deliberados que se passam pelas extremidades do sistema diges-
tório graças à atividade da musculatura estriada. Já o tubo de permeio é dotado
de musculatura lisa cuja atividade motora se desenrola autonomamente.
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CAPÍTULO

MOTILIDADE DO TRATO GASTRINTESTINAL Armenio Aguiar dos Santos Pedro Jorge Caldas Magalhães Ricardo de Freitas Lima

17.1 MOTILIDADE GASTRINTESTINAL

A ingestão de alimentos e a exoneração dos resíduos digestivos em condições normais são atos deliberados que se passam pelas extremidades do sistema diges- tório graças à atividade da musculatura estriada. Já o tubo de permeio é dotado de musculatura lisa cuja atividade motora se desenrola autonomamente.

412 Sistema digestório: integração básico-clínica

A motilidade do tubo digestivo mostra características notáveis. Em primeiro lugar, exibe grande variabilidade do comportamento motor nos diversos segmen- tos e, em cada segmento, em variados momentos. Isso decorre mais por mudanças no estado funcional da musculatura lisa do que por eventuais diferenças morfo- lógicas. Em segundo lugar, a motilidade gastrintestinal, embora automática, está longe de ser caótica. De fato, o exame da motilidade revela padrões típicos, di- ferentes conforme o órgão e as condições, sugerindo coordenação dos conjuntos musculares, quando das retrações e distensões. E, finalmente, o trato gastrintesti- nal (TGI) é sede de distúrbios motores com importante influxo na prática médica.

17.1.1 BASES CELULARES DA MOTILIDADE GASTRINTESTINAL

O TGI é composto desde o lúmen pelas camadas mucosa, submucosa, mus- cular e serosa. A fina mucosa compreende epitélio, lâmina própria e a muscular da mucosa. Na submucosa, vê-se tecido conectivo frouxo com nervos, vasos e células linfoides. A camada mais espessa é a muscular, formada, exceto no terço superior do esôfago, por células musculares lisas, dispostas de modo ortogonal. A musculatura circular, mais interna, tem disposição circunferencial que, ao se retrair, ocasiona, em cada segmento, contração anelar. A longitudinal, embora mais delgada, forma túnica contínua, abrangendo toda a parede ao longo do comprimento do tubo digestivo — exceto no cólon, restrita às Teniae coli. A con- tratilidade longitudinal afeta o comprimento da víscera. Por via da camada serosa passam a inervação extrínseca e os vasos sanguíneos. As camadas longitudinal e circular são separadas pelo plexo nervoso mioentérico e o plexo nervoso submu- coso separa a circular da muscular da mucosa ( vide cap. tal ). O miócito liso gastrintestinal exibe a forma de fuso e dispõe de miofilamen- tos aderidos a elementos do citoesqueleto. Embora detenha actina e miosina em maior proporção (15:1), não exibe troponina nem os miofilamentos têm a forma de sarcômeros, conferindo ao tubo digestivo à visão microscópica o aspecto li- vre de estrias. Rodeados de tecido conectivo, os miócitos se agrupam em feixes musculares. Fato notório nas cólicas abdominais, a musculatura gastrintestinal atua como sincício, mercê das junções intercelulares (“Gap junctions”), sítios de baixa resistência elétrica pelos quais a despolarização atinge rapidamente as cé- lulas ao derredor, sem carecer de sistema especial de condução. Estas junções in- tercelulares são formadas por canais transmembrana, as conexinas, que permitem a passagem de íons, metabolitos e pequenas moléculas (> 1000 Da), incluindo os segundos mensageiros AMPc e IP3. Tais conexões entre os miócitos fazem do feixe muscular uma unidade contrátil. Há, todavia, perda eletrotônica da despo- larização, sendo necessário à amplificação do sinal para garantir a unidade da contração do feixe muscular.

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musculatura gastrintestinal até decai, sem ser abolida. Essa tensão em repouso é chamada de tônus basal. A contratilidade do músculo liso gastrintestinal é mais complexa que a do esquelético. No acoplamento excitação-contração, os neurotransmissores promo- vem a abertura de canais dependentes de voltagem na membrana celular com influxo de Ca++, mas também pode haver liberação de Ca++^ dos estoques citoplas- máticos, via fosfatidilinositol. Assim, mesmo sob potencial de membrana está- vel, ativadores da proteína G liberam Ca++^ (acoplamento farmacomecânico). Pela ideia prevalente, com a formação no citoplasma do complexo Ca++-calmodulina, é ativada a miosina-cinase, que, por sua vez, fosforila a cadeia leve da miosina e potencia a capacidade da actina em ativar a miosina-Mg-ATPase hidrolisar o ATP ligado à cabeça da miosina, fazendo deslizar os miofilamentos. Por outro lado, os níveis citosólicos de Ca++^ são subtraídos pela bomba Ca++ATPase (transferindo o Ca++^ para fora da célula ou de volta aos estoques intracelulares) bem como pela própria repolarização (inibindo o influxo de Ca++, via canais operados por volta- gem). A miosina é então desfosforilada, interrompendo a interação miofilamentar e permitindo o relaxamento muscular. Sabe-se que as ICC e os miócitos do trato gastrintestinal apresentam canais iônicos mecanossensíveis, e que a distensão da parede intestinal eleva a amplitude e frequência das ondas lentas e, por conse- quência, a contração. Tais canais contribuem para elevar no miócito a amplitude das correntes de Ca++, via canais operados por voltagem. O curso temporal dos movimentos ao longo do TGI é bem heterogêneo. Mús- culos do corpo do esôfago, antrogástrico e intestino delgado retraem-se em segun- dos (contrações fásicas ). Já os esfíncteres esofagiano inferior, íleocecal e anal inter- no ou o fundo gástrico exibem contrações sustentadas; por horas, até, de duração (contrações tônicas ). Embora a latência da contratilidade esquelética seja menor, a gastrintestinal produz grau similar de tensão por área de secção transversal. O arranjo espacial e temporal da motilidade afeta o trânsito dos conteúdos no tubo digestivo. Com o advento da radiologia, Walter Cannon descreveu as contrações de segmentação , síncronas, nas quais o quimo pouco se desloca entre segmentos vizinhos (favorecendo a mistura do bolo alimentar com as enzimas digestivas e a exposição dos nutrientes à superfície absortiva do intestino), e a propulsão do quimo mediante a contração consecutiva de segmentos vizinhos, ou peristalse.

17.1.2 REGULAÇÃO DA MOTILIDADE GASTRINTESTINAL

Diverso do sistema cardiovascular, cuja bomba única propele o sangue na mesma direção, o TGI manipula ao mesmo tempo conteúdos sólido, líquido e gasoso, em órgãos distintos, gerando trânsito oroanal embora haja até retropul-

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são. No período pós-prandial, enquanto o esôfago permanece quase imóvel, o estômago se esvazia, o intestino delgado propele lentamente o quimo e os cólons acomodam resíduos fecais, proeza factível mercê da rica inervação, extrínseca e intrínseca, além das dezenas de hormônios disponíveis no trato gastrintestinal. Foi após o TGI que Bayliss e Starling descreveram em 1902 o primeiro hor- mônio, a secretina. Hoje sabemos ser o TGI o principal órgão endócrino, secre- tando dezenas de hormônios, que afetam a motilidade do tubo digestivo, seja ao nível dos neurônios aferentes sensoriais ou dos próprios miócitos. Aliás, a liberação hormonal ao longo do tubo digestivo é bem peculiar; alguns restritos ao estômago e duodeno (p.ex., gastrina), outros confinados ao intestino grosso (p.ex., peptídeo YY). Tomando a homologia estrutural para agrupar hormônios possivelmente originários de genes ancestrais comuns, identificam-se cinco fa- mílias: peptídeos opióides; neurotensina/substância P; neuropeptídeoY/peptídeo pancreático/peptídeo YY; gastrina/colecistocinina; e secretina/glucagon/peptídeo intestinal vasoativo/peptídeo ativador da adenil ciclase da pituitária/polipeptídeo inibitório gástrico. O TGI dispõe de cem milhões de neurônios, mesma magnitude encontrada em toda a medula espinhal! Na deriva evolutiva humana, o tubo digestivo mante- ve “cérebro” próprio, a curta distância, livrando espaço no encéfalo para neurô- nios com funções “superiores”. Os corpos celulares dos neurônios entéricos agru- pam-se em gânglios nos plexos intramurais, submucoso e mioentérico , com ampla interconexão. O plexo mioentérico provê, ao longo do TGI, inervação motora às camadas circular e longitudinal bem como secretomotora à mucosa. Outras pro- jeções atingem gânglios na vesícula e pâncreas e mesmo os gânglios simpáticos. O plexo submucoso se condensa no intestino delgado, inervando, além do epitélio glandular, a muscular da mucosa, células linfóides e vasos sanguíneos. Plexo afim ocorre na vesícula, nos ductos cístico e hepatocolédoco, bem como no pâncreas. Gânglios entéricos exibem ainda inúmeras células da glia (similares aos astró- citos), que liberam interleucinas e expressam antígenos do complexo maior de histocompatibilidade da classe II ao serem estimuladas por citocinas, fenômeno relevante na inflamação gastrintestinal. O TGI dispõe dos elementos essenciais ao arco reflexo: neurônios aferentes, interneurônios e motores. De fato, segmentos isolados do tubo digestivo conse- guem expelir em sentido aboral o conteúdo luminal. Langley propôs assim o siste- ma nervoso autônomo em ramos simpático, parassimpático e entérico. Quanto à morfologia, Dogiel classificou os neurônios entéricos em tipos I (dendritos curtos, axônio único e longo) e II (dendritos de tamanho variável e extensa ramificação). Em termos biofísicos, neurônios entéricos são ditos de tipos S (alta excitabilidade: múltiplos disparos na despolarização) e AH (baixa excitabilidade: disparo único seguido de longa hiperpolarização).

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receptores muscarínicos. Sob estímulos potentes, tais neurônios também liberam taquicininas (substância P e neurocininas). Já os neurônios inibitórios liberam em projeção caudal neurotransmissor do tipo não adrenérgico, não colinérgico (NANC). Na maioria dos segmentos, o NO é o principal agente, variando a con- tribuição do VIP, ATP ou PACAP. Embora o sistema digestório opere até desconectado do sistema nervoso cen- tral, há extensas interconexões cujas implicações funcionais se notam claramen- te nas situações de estresse, na forma de diarréia, vômito ou dor abdominal. A inervação extrínseca do TGI compreende corpos neuronais situados fora do tubo digestivo com projeções até suas entranhas. Segundo a localização dos corpos celulares e os trajetos dos nervos, foram agrupados em sistema nervoso simpático ou parasimpático. Tal separação, no entanto, é incompleta: alguns nervos tora- co-lombares se distribuem junto do nervo vago e outros penetram com os nervos pélvicos a partir dos gânglios pré-vertebrais. A conexão parassimpática do neuroeixo com o TGI se dá ao nível tectal e sa- cral, via nervos vago e pélvico, nesta ordem. Corpos celulares dos eferentes vagais se situam nos núcleos motor e dorsal do vago e ambíguo, os quais formam com a área postrema e o núcleo do trato solitário no bulbo raquidiano o complexo va- gal. Daí o nervo vago passa bilateralmente para o esôfago, estômago e intestinos. Já os corpos celulares dos nervos pélvicos se situam na medula sacral donde atin- gem o cólon distal e o reto. As fibras pré-ganglionares são colinérgicas e ativam neurônios intrínsecos, via receptores nicotínicos, ou inibem o plexo mioentérico, via NO e VIP. Em geral, as fibras excitatórias exibem baixo limiar de excitação, enquanto as inibitórias são de alto limiar. Diferente dos demais segmentos, a iner- vação parassimpática do intestino delgado se concentra nos poucos conjuntos de neurônios mioentéricos que atuam como centros geradores de padrão. O efeito mais evidente da vagotomia é o retarde no esvaziamento gástrico e o da terapia anticolinérgica é a constipação colônica. A inervação simpática gastrintestinal tem corpos celulares situados no corno intermediolateral da medula toracolombar. Da raiz ventral emergem fibras eferen- tes pré-ganglionares com sinapse inicial nos gânglios pré-vertebrais celíaco e me- sentéricos (superior e inferior). Daí, por sua vez, as fibras pós-ganglionares proje- tam axônios ao TGI, onde estabelecem sinapse com neurônios entéricos, além de inervar vasos sanguíneos, mucosa e musculatura esfincteriana. Se a transmissão pré-ganglionar é nicotínica, o principal mediador pós-ganglionar é a norepinefri- na, atuando nos plexos entéricos em receptores dois pré-sinápticos. A ativação simpática gastrintestinal desvia o fluxo sanguíneo da circulação esplâncnica para a sistêmica durante o estresse, tolhendo a digestão e propulsão dos alimentos. Por outro lado, as vísceras gastrintestinais dispõem de extensa aferência para o sistema nervoso central. Cerca de 75% das fibras existentes nos nervos vagos,

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pélvicos e esplâncnicos são, na verdade, aferentes, ainda que tenhamos normal- mente pouca consciência das sensações viscerais. Com terminais entranhados no tubo digestivo, neurônios aferentes vagais (não mielinizados) possuem corpos celulares nos gânglios nodoso e jugular, donde partem, preservando a viscerotopia, ao núcleo do trato solitário. Dos segmentos distais do intestino grosso, outros terminais partem via fibras não mielinizadas junto dos nervos pélvicos para a medula sacral entre S2 e S4. Os corpos celulares das fibras aferentes sacrais situados no gânglio da raiz dorsal se projetam até o bulbo. Dadas as conexões do complexo motor dorsal com mesencéfalo, hipo- tálamo, sistema límbico e tálamo, a ativação de núcleos sub-corticais permitiria os estímulos viscerais despertarem emoções. Terminais aferentes extrínsecos nos músculos longitudinal e circular têm baixo limiar e atuariam como receptores de tensão (em série), disparando quando da distensão mecânica ou contração contínua da víscera. Terminais aferentes vagais na mucosa são sensíveis à concen- tração luminal de glicose, aminoácidos ou ácidos graxos de cadeia longa e outros respondem a acidez ou temperatura. Mediadores químicos liberados por células endócrinas da mucosa agiriam na transdução de sinais em aferentes vagais. As- sim, a liberação excessiva de serotonina pelas células enterocromafim da mucosa gastrintestinal danificada após pulsos de quimioterapia pode induzir vômitos in- tensos. Neurônios aferentes primários esplâncnicos têm terminais na parede do tubo digestivo e corpos celulares nos gânglios da raiz dorsal. Os terminais aferentes são geralmente multimodais, respondendo a estímulos mecânicos, térmicos e quími- cos com potencial lesivo. Muitos contêm receptores para o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP) e alguns também para a substância P. Expresso difusamente no TGI, em especial nas fibras delgadas ao redor dos gânglios intra- murais, há também o receptor vaniloide (VRI). Em um canal catiônico não-sele- tivo, ativado por temperatura, acidez e capsaicina (substância ativa da pimenta). A eventual ativação de tais vias é implicada na hipersensibilidade visceral encon- trada na dispepsia funcional, síndrome do intestino irritável e doença intestinal inflamatória. Eferentes simpáticos participam de vários reflexos autonômicos que em geral inibem a atividade gastrintestinal, notadamente de segmentos distantes da origem da estimulação. A via aferente de tais reflexos seria neurônios entéricos ou extrínsecos intestinofugais, cujo eixo é o gânglio simpático pré-vertebral ou a medula espinhal. O gânglio pré-vertebral integra vias que modulam a atividade final de efe- rentes simpáticos pós-ganglionares. Além de sinapses dos eferentes pré-ganglio- nares, os gânglios celíaco e mesentérico recebem colaterais de neurônios aferentes espinhais. Neurônios intestinofugais oriundos do plexo mioentérico estabelecem

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entre os processos de sucção, deglutição e respiração. Vários fatores podem nisso interferir, em especial, a idade gestacional do recém-nascido e o tipo de criação. No aleitamento natural, a sucção promove o adequado desenvolvimento dos ór- gãos fonoarticulatórios quanto a mobilidade, força e postura, amadurecendo a mastigação e a articulação dos sons da fala.

17.1.4 EFEITOS DE GÊNERO, IDADE E RITMO CIRCADIANO

Em comparação a homens e adultos jovens, há nas mulheres e pessoas idosas restrições na peristalse esofagiana, no esvaziamento gástrico e no trânsito colô- nico. Embora o estágio do ciclo menstrual não altere a atividade mioelétrica gas- trintestinal, a taxa de esvaziamento gástrico, em especial de sólidos, é mais lenta em mulheres. Em geral, o envelhecimento traz dismotilidade. É notória a disfagia do presbiesôfago com ondas peristálticas diminutas e lentas. A progressão do complexo motor migratório (CMM) também é mais lenta em idosos. É, todavia, incerto o significado de tais fenômenos, talvez pela grande reserva funcional do TGI. Ademais, a evolução do CMM tem variação circadiana, manifesta em retar- de do esvaziamento gástrico, à noite.

17.1.5 MASTIGAÇÃO

Com a ingestão de alimento sólido, iniciamos a mastigação. A estimulação das papilas gustativas e epitélio olfatório respondem por muito da satisfação do ato de comer e inclusive desencadeiam a fase cefálica da digestão. Ademais, há secreção reflexa de saliva que, ao se misturar à comida, amacia o bolo alimentar. Aliás, a mastigação reduz o alimento a um volume cômodo à deglutição. Embora a mastigação seja ato voluntário, tem natureza em parte reflexa – tanto que ani- mais descerebrados acima do mesencéfalo mastigam tão logo o alimento é posto na boca. A mastigação combina a ação de músculos estriados na mandíbula, lá- bios, bochechas e língua – graças ao núcleo ambíguo que coordena a atividade do V par craniano (trigêmeo). A pressão nos dentes, gengivas, língua e palato relaxa os músculos de fecha- mento da maxila (principalmente os pares de masseter e temporais) enquanto ativa os músculos de abertura (digástrico e pterigoídes laterais). Graças à articula- ção temporomandibular, a mastigação, além de mover a maxila para cima e para baixo, também o faz para diante e para trás, bem como lateralmente, moendo o alimento sob a frequência de um ciclo/s. Apesar de a força gerada entre os molares ser necessária para triturar o alimento comum, o principal fator de eficiência mas- tigatória é a área de contato oclusivo. Distúrbios oclusivos (por ex.: bruxismo) podem originar quadros de cefaleia e desgaste dentário intensos.

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17.1.6 DEGLUTIÇÃO

A deglutição é descrita em etapas segundo as regiões de trânsito do bolo ali- mentar em direção ao estômago: oral, faríngea, esofágica. Aparentemente singelo, o ato de engolir é crucial pelo risco potencial de aspiração pulmonar do material e carece de perfeita coordenação. Embora possa ser iniciada voluntariamente, a deglutição progride de maneira autônoma, sem ser interrompida. Aliás, é iniciada na maioria das vezes de modo inconsciente, independente de ingestão e inclusive ocorrendo durante o sono. Muitos dos fenômenos vigentes na deglutição aparecem na cinerradiografia, após a pessoa ingerir suspensão radiopaca de bário. Mediante sondas contendo pequeninos transdutores em vários pontos do trajeto oro-farin- go-esofagiano é possível se medir as pressões vigentes durante e após a deglutição.

17.1.6.1 FASE OROFARINGEANA

Inicialmente , o alimento passa da boca, através do istmo das fauces, para a faringe. A extremidade anterior da língua, ao se lançar para cima e para trás, empurra o bolo alimentar contra o palato duro. Ao mesmo tempo, o músculo milo-hioideo se contrai rapidamente e força o bolo em direção à faringe. Daí o bolo passa rápida (~1seg) e involuntariamente da faringe ao esôfago, graças a fenômenos síncronos. A contração contínua do músculo milo-hioideo e a posição da língua evitam a regurgitação alimentar para a cavidade oral. A inspiração e o reflexo da náusea são inibidos temporariamente. O palato mole eleva-se, fechan- do a região nasal posterior. A elevação da laringe e a aproximação das cordas vocais fecham a glote, obstruindo a passagem para a laringe. Quando a epiglote é pressionada para baixo sobre o vestíbulo laríngeo, contribui para prevenir a entrada do alimento na via respiratória, mas a remoção da epiglote não impede a deglutição. Ao se fecharem tais válvulas e a faringe se contrair, há propulsão do bolo para o esôfago. Com efeito, a pressão no estreito faríngeo atinge 100mmHg.

17.1.6.2 FASE ESOFAGIANA

Ao unir a faringe ao estômago, o esôfago atravessa o tórax, de pressão sub- atmosférica. Esfíncteres situados nas extremidades velam o esôfago quanto aos conteúdos orofaringiano e gástrico. Entre as deglutições, a entrada do esôfago está obstruída pelo esfíncter eso- fagiano superior. É formado basicamente por faixa de músculo estriado em forma de “U” com origens nos dois lados da cartilagem cricoide. O músculo cricofarín- geo se contrai de forma tônica entre as deglutições, relaxando só quando o bolus se aproxima. A seguir, retrai-se de novo e a pressão intraluminal na região atinge até 150mmHg, prevenindo o refluxo esôfago-faríngeo.

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nível de tensão por 1-2. Após discreta zona de transição no terço medial do esôfago, o terço distal é composto de fibras lisas. Nos dois terços inferiores, o músculo do esôfago é inervado desde o plexo mioentérico, cuja atividade excitatória e inibitória é modulada por fibras vagais pré-ganglionares colinérgicas. Daí haver peristalse re- sidual no esôfago distal, mesmo após a vagotomia. Já a neurotransmissão inibitória é do tipo não adrenérgica, não colinérgica, seja pela liberação de ATP, VIP ou NO.

17.1.6.2.2 ANOMALIAS NA DEGLUTIÇÃO E PERISTALSE

Distúrbios em qualquer das fases da deglutição ocasionam disfagia. Na aca- lasia, a peristalse esofágica inexiste, com contrações incoordenadas ou espásticas, défice de relaxamento do esfíncter inferior após a deglutição, e dilatação do corpo esofágico em fases mais tardias da doença. A patogênese decorre por degeneração dos gânglios do plexo mioentérico, seja por origem idiopática ou sequela de rea- ção inflamatória na doença de Chagas. Um evento importante é a diminuição da síntese de NO pelas fibras nervosas das células intersticiais de Cajal no esôfago distal.

17.1.6.2.3 ANOMALIAS DA JEG

As funções da JEG podem estar afetadas em doenças diversas. A acalasia abala a função esfincteriana e, de forma oposta, a função de barreira está preju- dicada na doença do refluxo gastroesofágico (DRGE). Tanto o componente eso- fágico da JEG (o próprio esfíncter inferior) quanto o diafragmático ( pars crural ) podem estar afetados. Recentemente, foi percebido o papel do diafragma crural. Pacientes com esofagite de refluxo parecem ter défices anatômico e funcional do componente crural da JEG, seja pela subtração de sua espessura ou pela menor capacidade de elevar a pressão da JEG durante a inspiração. Neste sentido, a pres- são inspiratória da JEG discrimina melhor os pacientes com esofagite daqueles sadios e alguns pacientes com esofagite de refluxo podem ter alívio parcial dos sintomas via treinamento muscular inspiratório. A DRGE é a dismotilidade gastrintestinal mais comum. Em lactentes sadios, o refluxo gastroesofágico (RGE), ou seja, a passagem do conteúdo gástrico para o esôfago, com ou sem regurgitações ou vômitos, é fenômeno fisiológico que ocorre várias vezes ao dia, com resolução espontânea de 12 a 14 meses de idade. Nos adultos manifesta-se, em geral, com vômitos e dor epigástrica em queimação. Por vezes, ocorre de forma silente, ou RGE oculto, surgindo as complicações após longos períodos assintomáticos. A monitoração continua do pH esofágico por 24hs (pHmetria esofágica) é o exame mais útil para avaliar a frequência e duração dos episódios de refluxo ácido (cuja definição inclui quedas do pH esofágico < 4).

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Pessoas saudáveis exibem, na pHmetria esofágica, episódios frequentes de pH < 4 (em especial logo após as refeições), mas com tempo total de pH ácido nas 24hs inferior a 4%. Métodos mais sensíveis para detecção de RGE são a impedâncio- metria-pHmetria de 24 h, que mede RGE ácido e não ácido, e a pHmetria pelo método Bravo, que avalia RGE por até 48h.

17.1.7 MOTILIDADE GÁSTRICA

Além de servir de reservatório temporário para alimentos ingeridos, o estô- mago mistura-os às secreções gástricas e os tritura a ponto de liquefazê-los. Por fim, o quimo é esguichado no intestino delgado sob taxas apropriadas à digestão e absorção. Tudo isso advém de complexos arranjos, sob influência neuro-humoral.

17.1.7.1 RELAXAMENTO RECEPTIVO

A propriedade gástrica de acomodação foi revelada em 1904 por Cannon, via radioscopia. Em adultos sob jejum, o estômago proximal se mostra retraí- do, contendo volume de ar e uns 50mL de secreção gástrica. Com a ingestão da refeição há, simultâneo ao relaxamento do esfíncter esofagiano inferior, breve dilatação do estômago proximal ( relaxamento receptivo ), seguida doutra mais duradoura, fruto da distensão das paredes da víscera pelo volume recém-ingerido ( relaxamento adaptativo ). Assim, o fundo e o corpo gástrico acomodam alimen- tos em camadas segundo a densidade, incorporando refeições até volumosas sem incremento substancial na pressão intragástrica. Embora as fibras musculares li- sas tenham natureza elástica, deslizando passivamente entre si ao serem estiradas, o aumento na complacência gástrica decorre principalmente de inibição reflexa por via vagovagal da musculatura lisa do fundo e do corpo – pois abolido ex vivo. Tal fenômeno envolve neurotransmissão não adrenérgica não colinérgica, possi- velmente do tipo NOérgica e/ou VIPérgica. O estômago proximal também exibe contrações fásicas que geram suave pres- são, mas suficiente para mover o conteúdo luminal para o estômago distal. Essa atividade surge após as refeições, ao cessarem os estímulos de relaxamento gástrico. A duração desse processo varia segundo o volume e a composição da refeição inge- rida. Além do já mencionado efeito vagal inibitório sobre a complacência gástrica, a ingestão alimentar libera hormônios, como secretina, colecistocinina (CCK) e poli- peptídio inibitório gástrico (GIP) que contribuem para a dilatação. Já as contrações do estômago proximal dependem de fibras excitatórias colinérgicas.

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acidez e ao teor de ácidos graxos de cadeia longa. Soluções eletrolíticas neutras e osmolaridade similar à do plasma esvaziam-se rapidamente, enquanto as de os- molaridade ou acidez elevada, ou ricas em triglicérides ou proteínas, esvaziam-se lentamente. Os fatores responsáveis pelos padrões de esvaziamento gástrico estão des- critos na equação F=ΔP/R, que traduz os fenômenos hidrodinâmicos, sendo F a taxa de esvaziamento gástrico, ΔP o gradiente de pressão entre o estômago e o intestino delgado, e R a resistência ao fluxo gastroduodenal de líquido. Em humanos sob jejum, a pressão intragástrica e intraduodenal é igual à pressão intra-abdominal (~5-10mmHg), na maioria do tempo. Embora a ingestão pouco altere a pressão intragástrica (p.ex. 2L de salina ingerida só adiciona 10mmHg à pressão intraluminal), esta já basta para esvaziar no duodeno notáveis volumes de líquido, cuja resistência ao fluxo é muito baixa: afinal o piloro se mostra relaxado no intervalo das contrações, enquanto a pressão intraduodenal se mantêm em ní- veis basais. Considera-se ser o fundo e o terço proximal do corpo do estômago a parcela responsável pela geração da pressão intraluminal necessária à evacuação de líquido. Aliás, a fundectomia acelera o esvaziamento gástrico de líquidos sem alterar a retenção fracional de sólidos. O esvaziamento dos sólidos, por outro lado, depende da atividade motora do estômago distal. A cada 20s surge da zona de marca-passo onda de contração (com 2-3cm de extensão), que evolui com velocidade e intensidade crescentes, passando de 0,5cm/s e suave depressão na parede do estômago proximal para alcançar o antro a 4cm/s, formando recorte profundo a ponto de ocluir o lúmen e elevar a pressão intragástrica até 150mmHg. As contrações antrais, além de impulsionarem o quimo em direção pilórica, atritam as partículas entre si ao tur- bilhonar o conteúdo gástrico, fragmentando-as ainda mais. Através do piloro só passam partículas pequeninas (raio<1mm); as maiores são retidas e são alvo de retropulsão para o corpo gástrico. Assim, os sólidos, acaso ingeridos em grandes bocados, só são esvaziados após haver suficiente solubilização; daí o lapso entre o fim da ingestão de uma refeição e o início da vazão dos elementos sólidos. No caso de refeição mista (p.ex. pão com leite), o líquido ingerido até influencia o processo; se a composição contiver, por exemplo, alto teor de gordura pode des- pertar reflexos enterogástricos, postergando assim o esvaziamento do sólido. Por fim, vazam do estômago as partículas indigeríveis, horas após a última refeição. A motilidade do estômago distal já foi comparada à “bomba” cardíaca, ca- paz de a cada “sístole antral” esguichar o quimo para o duodeno. Graças a dados radiológicos e manométricos, a noção prevalente é atuar feito um “moedor de carne”, capaz de triturar o quimo, embora também lhe sirva de resistência. À me- dida que moi a massa do alimento para baixo, fragmentos solúveis se esvaziam junto da fase líquida, enquanto retêm as partículas maiores. Ademais, como o

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piloro se retrai vigorosamente ao mesmo tempo ou logo depois do antro terminal, a vazão gástrica ocorre no intervalo (e não durante) das contrações antrais. O estômago transfere o quimo para o intestino delgado a um fluxo aquém das capacidades da digestão e absorção, ajudando a máxima incorporação de nutrientes. Por sua vez, a mucosa do intestino delgado dispõe de quimiorecep- tores capazes de inibir (via reflexos neuro-humorais) o esvaziamento gástrico. O efluxo gástrico tende a ativar um ou mais desses receptores de pH, osmorecepto- res, receptores para glicose, lipídeo ou aminoácido. Assim, a chegada de lipídeos ao duodeno dilata o estômago proximal, reduz a amplitude das contrações do antro e a frequência de contrações propulsivas no duodeno, reduzindo o esva- ziamento gástrico. Embora seja notável marco anatômico, é discutível o papel funcional do pi- loro na regulação do esvaziamento gástrico, em especial dos sólidos. A excisão do piloro ou a inserção de um tubo rígido nele pouco altera a taxa de esvaziamento gástrico. Em vez do esfíncter esofagiano inferior, tonicamente contraído que ao se relaxar deixa o bolus passar livremente, o piloro é abertura estreita, periodica- mente apertada pelas retrações geradas na camada circular, donde o tamanho da abertura pilórica determina a dimensão máxima da partícula que o atravessa. O antro, o piloro e o bulbo reagem de forma síncrona à onda de contração, que, ao atingir o piloro, este se retrai e daí o bulbo duodenal. Além do piloro, o duodeno, cujo diâmetro é menor que o do antro, também resiste ao efluxo gástrico. A mo- tilidade duodenal exerce assim resistência expressiva, segundo a intensidade e o grau de coordenação com o antro e o piloro: o quimo jorra do estômago no curto período entre a oclusão completa do piloro e a contração do bulbo duodenal. Por outro lado, a peristalse pode desaparecer do duodeno, dando lugar a contrações estacionárias ou até anti-peristálticas, ocasionando refluxo duodeno-gástrico — condição de potencial lesão à barreira da mucosa gástrica via ação biliar. Nas crianças portadoras de DRGE, a bile no conteúdo gástrico pode ensejar refluxo alcalino para o esôfago, bastante lesivo à mucosa esofágica, além de acar- retar manifestações de distúrbios das vias aéreas, associadas de modo imprecisa à DRGE na pHmetria esofágica de 24hs. O advento da impedanciometria esofágica intraluminal associada à pHmetria permitiu estabelecer a associação entre sinto- mas respiratórios e episódios de refluxo não ácidos (pH≥ 4).

17.1.7.3 REGULAÇÃO DA MOTILIDADE GÁSTRICA

Reflexos neuro-humorais afeitos à regulação da secreção gástrica também afetam a motilidade. A distensão do estômago pelo alimento ocasiona secreção de gastrina que, por sua vez, realça a força de contrações e aumenta a mistura do quimo ( reflexo gastrogástrico ). Por sua vez, cadencia o esvaziamento gástrico,

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de gordura ou carbohidratos complexos inibe notavelmente a motilidade do es- tômago e do delgado proximal (reflexo ileogástrico), sendo tal retroalimentação negativa ( freio ileal ) mediada pelo peptídeo YY. A supra-distensão dos intestinos também inibe as motilidades gástrica e entérica; é o reflexo intestino-intestinal. A estimulação dos nociceptores somáticos e viscerais também inibem os movimen- tos gástricos. Estados emocionais, como o medo e a raiva, poderiam ainda inibir a motilidade gástrica, via liberação de ACTH.

17.1.8 VÔMITO

Expulsão oral, repentina e forçada, do conteúdo gástrico e às vezes duode- nal é antecedida de náusea e eructação, além de ativação autonômica: salivação copiosa, palidez, sudorese fria, hipotensão arterial e taquicardia. A respiração é interrompida por instantes enquanto a vedação da nasofaringe e laringe, impedin- do a inalação de material. A principal força para a expulsão advém da contração dos músculos abdominais, mais do que das vísceras – a intoxicação pelo curare até evita a indução de vômito. Já o estômago, desde o piloro até o cárdia, torna-se flácido e a contração duodenal inverte o gradiente normal da pressão intralu- minal, levando ao refluxo intestino-gástrico (ou peristalse reversa ). Contraem-se então vigorosamente o diafragma e a parede abdominal, enquanto o esfíncter eso- fagiano inferior se relaxa e o piloro se contrai. A crescente pressão intraluminal expulsa por fim o conteúdo gástrico. O vômito é, portanto, ato reflexo primitivo, coordenado na plano dorsal do tronco cerebral, próximo às áreas de regulação cardio-vascular e respiratória. Embora o vômito nos proteja ao remover substâncias com potencial tóxico, quadros prolongados podem induzir hemorragias esofagianas e estado de alcalose metabólica, em razão da drenagem de ácidos do organismo.

17.1.9 MOTILIDADE DO INTESTINO DELGADO

Já parcialmente digerido pelo suco gástrico e liquefeito, o alimento atinge o intestino delgado humano (uns 4m de extensão), onde se completa a maior parte da digestão. De tão eficaz a absorção de nutrientes nos segmentos proximais do delgado, pouco sobra de alimento no íleo de pessoas sob jejum, daí os nomes de jejuno e duodeno, pela extensão de uns doze dedos. Tal como no estômago, a motilidade intestinal tem subjacente ritmo elétrico básico. As ondas lentas se originam da região de marca-passo, ao nível do bulbo duodenal, donde se propagam, nas direções longitudinal e radial. Se a conjunção dos agentes elevar num dado segmento o potencial de membrana da musculatura até ao limiar, superpõem-se à onda lenta as espículas, ocasionando contração segmentar. Eventualmente, cada onda lenta se acompanha de potencial de ação e

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o segmento intestinal atinge enfim a frequência contrátil máxima. Segundo Code, há um gradiente de atividade na frequência do ritmo elétrico básico desde o del- gado proximal ao distal: no duodeno é de 12 ciclos por minuto, no jejuno dez por minuto e de oito por minuto no íleo. Os conteúdos tendem, portanto, a fluir no sentido anal e, em caso de ressecção de alças, o intestino restante mantêm com- portamento motor praticamente normal. Exceto nos distúrbios metabólicos, a frequência do ritmo elétrico básico do intestino delgado se mantêm sob notável constância, ante situações distintas, seja quanto ao estado alimentar ou à vigília. A força da contração associada à onda lenta é bem variável: a estimulação vagal aumenta a segmentação intestinal, en- quanto a simpática a diminui ou mesmo a anula. Tais efeitos notórios decorrem da influência dos neurotransmissores, acetilcolina e noradrenalina nesta ordem, sobre o número de espículas e a consequente força das contrações.

17.1.9.1 PADRÕES DE MOTILIDADE INTESTINAL

Tal como ocorre com as secreções entéricas, a condição alimentar modula o a motilidade do intestino delgado humano: vigora um padrão sob jejum e outro no período pós-prandial. O tempo necessário para concluir o esvaziamento gástrico, a digestão e a absorção intestinal de uma refeição varia segundo o tamanho, índice calórico e composição química – cerca de 4h para o almoço padrão de 500kcal. Ao de- saparecer a refeição do lúmen, a atividade secretora e motora do TGI tende a voltar às condições basais. Sob jejum, há interrupção quase total das contrações no intestino delgado até aparecer, de início debilmente, até atingir atividade má- xima. Cada ciclo, chamado de complexo motor migratório (CMM), é composto de três fases consecutivas. Na fase I, as ondas lentas oscilam abaixo do limiar e, assim, não geram tensão. A seguir, na fase II (~30min), proporção crescente das ondas lentas tende a atingir potenciais de ação. E culmina na fase III (de 5 a 10min), quando quase toda onda lenta culmina em despolarização e se expressa como salva de máxima atividade mecânica. Cada ciclo tem 1,5 a 2h de duração e leva uns 90min para percorrer desde o estômago até a junção ileocecal. Assim, o fim de um ciclo no íleo coincide com o início de outro ciclo no estômago. A velocidade de propagação do CMM diminui do duodeno ao íleo (de 8 a 3cm/ seg), bem como ao adormecermos. A madureza da motilidade migratória intesti- nal é diretamente proporcional à idade gestacional. Os prematuros exibem com- portamento desordenado da motilidade gastrintestinal, prorrogando bastante o trânsito intestinal. Cada fronte de atividade motora parece se seguir de aumento nas secreções gástrica, biliar e pancreática, de igual periodicidade. Como o tônus pilórico ten-