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Diagnóstico rápido e dialogado em estudos de desenvolvimento rural sustentável, Notas de estudo de Engenharia Florestal

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Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 01/11/2008

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Pesq. agropec. bras., Brasília, v.35, n.1, p.83-91, jan. 2000
DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS 83
DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS
DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL1
ALFREDO JOSÉ BARRETO LUIZ2 e MIGUEL ÂNGELO DA SILVEIRA3
RESUMO - O principal objetivo deste trabalho foi verificar se a suposição de predominância da
agricultura familiar na microbacia do Taquara Branca, Sumaré, SP, poderia ser sustentada com base em
informações concretas. Foi possível a utilização de amostragem probabilística, pois estava disponível
um map a co m os lim ite s da s 10 6 pr opr ied ade s da mic rob aci a, s en do s ort ead as 3 3 de las par a a a pli caç ão
de questionários do tipo cross-section. A técnica multivariada empregada foi a análise de agrupamentos,
para a qual foi utilizado o procedimento PROC CLUSTER do SAS. Nessa análise só foram considera-
dos os dados referentes aos 22 respondentes que exerciam atividade agrícola. Após a análise
unidimensional, algumas perguntas foram selecionadas com base na variabilidade entre as respostas e, a
partir destas, construíram-se as variáveis necessárias para se proceder à análise multidimensional. A
análise de agrupamento permitiu identificar claramente três grupos naturais entre as 22 propriedades.
De acordo com as características dos componentes de cada grupo, foi possível classificá-los em: grupo
1, doze propriedades de agricultura familiar; grupo 2, seis propriedades de agricultura não familiar em
pequenas áreas; e grupo 3, quatro propriedades de agricultura não familiar em grandes áreas. Embora não
seja predominante (apenas 36%), a agricultura familiar é o grupo mais freqüente na microbacia do
Taquara Branca.
Termos para indexação: agricultura familiar, análise de agrupamentos, amostragem.
RAPID RURAL AND DIALOGED APPRAISAL FOR SUSTAINABLE RURAL DEVELOPMENT
ABSTRACT - The main objective of this research was to test the hypothesis of whether family
agriculture, as defined herewith, would indeed be predominant in the Taquara Branca watershed, in the
State of São Paulo, Brazil, site of a larger sustainable development assessment study. Data on 33 of 106
landholdings in the watershed were obtained by directly applied cross-section questionnaires. The
variables for multivariate analysis were first selected through a unidimensional analysis, when some
questions were selected with basis on answer variability. Multivariate statistics was used (PROC
CLUSTER, SAS) to define and analyze the groupings. Twenty two respondents (out of the 33) were
involved in agricultural activities, comprising, then, the universe of the study. Cluster analysis allowed
the identification of three natural groups among the 22 landholdings. It was possible to classify each
group, according to their characteristics, as follows: group 1  twelve typical family landholdings;
group 2  six non-family, small landholdings; and group 3 - four non-family, large landholdings.
Although not predominant in terms of area, typical family agriculture was found to be the more
frequent (36%) in the watershed.
Index terms: family agriculture, cluster analysis, sampling
unidade de análise microbacia desempenha no con-
texto das pesquisas sobre impactos ambientais cau-
sados pelas práticas agrícolas. Apesar desse enten-
dimento, os limites e as possibilidades a propósito
de avaliar a unidade microbacia como um referencial
analítico de excelência, ainda não se esgotaram.
Contudo, essa discussão se torna mais complexa
quando o foco é centrado em sistemas agrícolas pra-
ticados por produtores familiares. Isso porque os
estudos que optam pela unidade microbacia
hidrográfica têm-se restringido ao plano ambiental,
1Aceito para publicação em 25 de março de 1999.
2Eng. Agrôn., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa
de Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental
(CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna,
SP. E-mail: alfredo@cnpma.embrapa.br
3Rel. Púb., Dr., Embrapa-CNPMA.
INTRODUÇÃO
Parece haver um consenso, entre pesquisadores
e técnicos, em considerar o importante papel que a
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DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS 8 3

DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS

DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL 1

ALFREDO JOSÉ BARRETO LUIZ^2 e MIGUEL ÂNGELO DA SILVEIRA^3

RESUMO - O principal objetivo deste trabalho foi verificar se a suposição de predominância da agricultura familiar na microbacia do Taquara Branca, Sumaré, SP, poderia ser sustentada com base em informações concretas. Foi possível a utilização de amostragem probabilística, pois estava disponível um mapa com os limites das 106 propriedades da microbacia, sendo sorteadas 33 delas para a aplicação de questionários do tipo cross-section. A técnica multivariada empregada foi a análise de agrupamentos, para a qual foi utilizado o procedimento PROC CLUSTER do SAS. Nessa análise só foram considera- dos os dados referentes aos 22 respondentes que exerciam atividade agrícola. Após a análise unidimensional, algumas perguntas foram selecionadas com base na variabilidade entre as respostas e, a partir destas, construíram-se as variáveis necessárias para se proceder à análise multidimensional. A análise de agrupamento permitiu identificar claramente três grupos naturais entre as 22 propriedades. De acordo com as características dos componentes de cada grupo, foi possível classificá-los em: grupo 1, doze propriedades de agricultura familiar; grupo 2, seis propriedades de agricultura não familiar em pequenas áreas; e grupo 3, quatro propriedades de agricultura não familiar em grandes áreas. Embora não seja predominante (apenas 36%), a agricultura familiar é o grupo mais freqüente na microbacia do Taquara Branca. Termos para indexação: agricultura familiar, análise de agrupamentos, amostragem.

RAPID RURAL AND DIALOGED APPRAISAL FOR SUSTAINABLE RURAL DEVELOPMENT

ABSTRACT - The main objective of this research was to test the hypothesis of whether family agriculture, as defined herewith, would indeed be predominant in the Taquara Branca watershed, in the State of São Paulo, Brazil, site of a larger sustainable development assessment study. Data on 33 of 106 landholdings in the watershed were obtained by directly applied cross-section questionnaires. The variables for multivariate analysis were first selected through a unidimensional analysis, when some questions were selected with basis on answer variability. Multivariate statistics was used (PROC CLUSTER, SAS) to define and analyze the groupings. Twenty two respondents (out of the 33) were involved in agricultural activities, comprising, then, the universe of the study. Cluster analysis allowed the identification of three natural groups among the 22 landholdings. It was possible to classify each group, according to their characteristics, as follows: group 1 – twelve typical family landholdings; group 2 – six non-family, small landholdings; and group 3 - four non-family, large landholdings. Although not predominant in terms of area, typical family agriculture was found to be the more frequent (36%) in the watershed.

Index terms: family agriculture, cluster analysis, sampling

unidade de análise microbacia desempenha no con-

texto das pesquisas sobre impactos ambientais cau-

sados pelas práticas agrícolas. Apesar desse enten-

dimento, os limites e as possibilidades a propósito

de avaliar a unidade microbacia como um referencial

analítico de excelência, ainda não se esgotaram.

Contudo, essa discussão se torna mais complexa

quando o foco é centrado em sistemas agrícolas pra-

ticados por produtores familiares. Isso porque os

estudos que optam pela unidade microbacia

hidrográfica têm-se restringido ao plano ambiental,

(^1) Aceito para publicação em 25 de março de 1999. (^2) Eng. Agrôn., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliação de Impacto A mbiental (CNPMA), Caixa Postal 69, CEP 13820-000 Jaguariúna, SP. E-mail: alfredo@cnpma.embrapa.br (^3) Rel. Púb., Dr., Embrapa-CNPMA.

INTRODUÇÃO

Parece haver um consenso, entre pesquisadores

e técnicos, em considerar o importante papel que a

8 4 A.J.B. LUIZ e M.Â. DA SILVEIRA

no seu sentido mais restrito, “numa ótica que ignora

a determinação dos atores principais dos processos

de produção do meio ambiente: os seres humanos,

ou o conjunto das relações sociais através das quais

eles se apropriam da natureza” (Silveira, 1998b).

O presente texto retoma, aqui, para todos os que

lidam com a problemática da agricultura familiar e

sustentabilidade, um dos desafios metodológicos

enfrentados pela equipe de pesquisadores do proje-

to Avaliação Socioambiental de Impactos e Agricul-

tura Familiar. O caráter interdisciplinar dessa pesqui-

sa enfoca a agricultura familiar distintamente de in-

vestigações que têm a perspectiva da neutralidade

técnica e a transferência tecnológica como trilhas

dominantes (Busch et al., 1989). Por isso mesmo,

conta, em retorno, com os métodos qualitativos da

Sociologia, da Antropologia, e com os instrumentos

de pesquisa da Estatística, incorporados aos das ci-

ências naturais. A descrição do citado desafio des-

taca particularmente o importante papel cumprido,

uma vez mais, pela Estatística em atividades

interdisciplinares de pesquisa agropecuária.

Espera-se que desse exercício resultem algumas

contribuições significativas, não apenas para futu-

ros trabalhos, mas também para o desenvolvimento

da reflexão sobre metodologia de avaliação de im-

pactos ambientais, tema de interesse central na

Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de

Monitoramento e Avaliação de Impacto Ambiental

(CNPMA).

No estágio inicial da elaboração do diagnóstico

agroambiental realizado na microbacia hidrográfica

do córrego Taquara Branca (MTB), em Sumaré, SP,

os membros da equipe de pesquisa notaram a possí-

vel existência de unidades de produção familiares

integradas ao capital comercial, principalmente por

meio do cultivo de hortaliças, cafeicultura e, mes-

mo, produção de leite, e de lavouras com o propósi-

to de autoconsumo.

A intenção daquele projeto de pesquisa era le-

vantar e analisar a relação existente entre os impac-

tos ambientais e a agricultura praticada pelos pro-

dutores rurais familiares da MTB, bem como os do

Assentamento Rural I, inserido na área, tendo-se em

vista uma intervenção em conjunto com os mesmos.

O Assentamento Rural I de Sumaré foi instalado na

MTB no começo do ano de 1984, como decorrência

de uma forte pressão exercida por um grupo de famí-

lias durante 1983. Esse grupo organizou-se com apoio

da comunidade eclesial de base da Igreja Nossa Se-

nhora de Fátima, no bairro de Rosolém, na própria

cidade de Sumaré, antes mesmo de o Movimento

dos Trabalhadores Sem Terra – MST – organizar-se

em âmbito nacional. Apesar da familiaridade com o

MST (também organizou-se a partir da influência

da chamada ala progressista da Igreja Católica) o

movimento surge relativamente isolado de outros

movimentos similares.

Para que fosse possível aprofundar e hierarquizar

as informações sobre a heterogeneidade e o modo

de gestão da produção familiar, em termos de

integração com o mercado, forma de acesso à terra

e à tecnologia, localização, tipo e formas de cultivo,

entre outras, foi necessário, em primeiro lugar, iden-

tificar a existência ou persistência das unidades de

agricultura familiar na MTB.

Assim, como objetivo principal deste trabalho,

optou-se por verificar se a suposta predominância

da agricultura familiar na área podia ser sustentada

com base em informações concretas, coletadas por

meio de questionários simples aplicados aos produ-

tores. A forma escolhida para a obtenção dos dados

foi a execução de um diagnóstico rápido dialogado

como primeiro passo de uma proposta metodológica,

o que é comum em pesquisas onde a necessidade

básica é o conhecimento da realidade na qual se in-

sere o produtor (Gastal et al., 1993). Como objetivo

secundário, pretendeu-se demonstrar a validade dos

métodos utilizados para a coleta e para o tratamento

dos dados.

Mudança rural, agricultura familiar e sustentabilidade

Do ponto de vista das ciências sociais, o proces-

so de transformação capitalista da agricultura no

Brasil, por demais estudado, tem como conseqüên-

cias mais visíveis, por um lado, o aumento da pro-

dutividade e da eficiência, integração crescente aos

capitais industrial, financeiro e comercial, e o esta-

belecimento dos complexos agroindustriais, entre

outros (Silva, 1982; Martine, 1989). Por outro lado,

provocou a extrema concentração fundiária, o êxodo

rural, o inchaço de cidades, o surgimento de traba-

lho do bóia-fria e o estabelecimento da monocultura,

8 6 A.J.B. LUIZ e M.Â. DA SILVEIRA

dutivo; ênfase no uso de insumos internos” (FAO,

Ademais, segundo Canuto et al. (1994), a agri-

cultura familiar compreende sistemas de amplitude

variável, que têm a família como referencial econô-

mico e sociocultural; engloba sistemas camponeses

e sistemas de pequena agricultura parcialmente mo-

dernizada.

A essas características, soma-se o fato de a agri-

cultura familiar ter, no que diz respeito aos recursos

naturais, a perspectiva da preservação voltada para

o futuro e não para a próxima safra e, em contraste

com o paradigma técnico-científico homogeneizante

da monocultura, intimamente relacionado a uma

série de danos ambientais, o conhecimento da ope-

ração de sistemas diversificados.

Para Mussoi (1997), a diversificação produtiva,

própria da agricultura familiar, lhe garante o

autoconsumo e a integração com o mercado em con-

dições de manter “níveis adequados de biodiver-

sidade (produtiva, medicinal, artesanal e de reserva

biológica), sendo capaz de processar muitos dos pro-

dutos por ela produzidos e reciclar dejetos para sua

reutilização”.

Como contraponto, contudo, existem autores que

defendem a idéia de que “por disporem de poucos

recursos materiais e tecnológicos, o segmento de

subsistência da agricultura familiar cria e perpetua

um ciclo de degradação → baixa produtividade →

pobreza → poucos recursos → mais degradação”

(Lal, 1994). Portanto, a relação entre a agricultura

familiar e a degradação ambiental precisa ser alvo

de estudos profundos, que visem qualificar e

quantificar os impactos ambientais, positivos ou

negativos, desse tipo de atividade.

MATERIAL E MÉTODOS

A área do estudo

A área do estudo, a microbacia do córrego Taquara Branca, abrange 2.700 hectares, sendo 85% em Sumaré e 15% em Hortolândia, SP, caraterizando-se como área de agricultura diversificada (Otani et al.,1995). As ativida- des agrícolas mais importantes são a olericultura e as cul- turas de tomate, batata, cana-de-açúcar, feijão, milho, man- dioca e café. As atividades de pecuária se caracterizam

pela criação de gado de leite e de corte (Kitamura et al., 1999). Outras características importantes da área da microbacia, além do conjunto de 26 famílias que forma o Assentamen- to Fundiário I, são a existência de três glebas de extração de terra para olarias, dois bairros residenciais, e chácaras de lazer. Na microbacia do córrego Taquara Branca também se localiza, vizinha ao assentamento, a Represa do Horto com 19,5 km 2 de área de drenagem, construída em 1988, e tendo por contribuintes os córregos Taquara Branca e Bassos. A represa é a principal fonte de abastecimento de água das cidades de Sumaré e de Hortolândia, atendendo a uma população estimada em 250 mil pessoas (Silveira, 1998b). A ocupação do solo da Taquara Branca parecia indi- car “uma predominância do modelo baseado na agricul- tura familiar” (Bazin, 1994), que seria responsável por uma parte significativa da produção agrícola, bem como pela composição da mão-de-obra. Os múltiplos usos do solo dessa microbacia (agricul- tura, mineração e residencial), associados à inadequação de tecnologias utilizadas, vêm acarretando impactos ambientais expressivos, refletindo-se principalmente na erosão do solo e na qualidade e quantidade de água da Represa do Horto e de seus afluentes (Kitamura et al., 1999). Na agricultura, o uso intensivo de máquinas e implementos agrícolas, o desmatamento, a eliminação da matéria orgânica do solo (queima de restos culturais), manejo inadequado de pastagens (ausência de calagem e adubação, divisão incorreta dos pastos e localização dos cochos de sal e bebedouros), plantio sucessivo de cultu- ras anuais intensivas e utilização de sistemas de irrigação por aspersão e por sulco (grande escorrimento superficial da água sem captação do excedente), enfim, ausência de práticas conservacionistas, vêm acarretando a perda de fertilidade e erosão do solo (Kitamura et al., 1999). As perdas de solo ocasionadas pelas práticas agríco- las, estradas rurais mal dimensionadas e sem conserva- ção, além das áreas de movimento de terra, provocam gran- de deslocamento de sedimentos para o fundo dos córregos e Represa do Horto. Estudos feitos pela CETESB (1991) comprovam as modificações ocorridas no leito da repre- sa, fator que compromete a capacidade de armazenamento e diminui a expectativa de sua vida útil. Como o consumo de água para a irrigação na Taquara Branca durante o ano todo é alto, os agricultores também têm observado os riscos da falta de água, principalmente nas lavouras plantadas nos meses mais secos do ano (ju- nho a agosto, chegando, em 1994, a cerca 120 dias sem chuva). Nesse período, os reservatórios de captação redu-

DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS 8 7

zem-se a níveis críticos, causando racionamento de água (Silveira, 1998b). Além da redução da quantidade disponível, já se faz sentir a queda na qualidade da água captada para usos urbanos. O sistema de filtro lento instalado na Represa do Horto está dimensionado para processar água de boa qua- lidade, separando apenas macroelementos. Em razão da elevada presença de partículas de solo, a filtragem não tem sido satisfatória, com muitas reclamações da popula- ção quanto a cor e sabor da água consumida (Silveira, 1998b). A relevância da microbacia pode ser ressaltada em fun- ção do significativo uso de agrotóxicos em culturas de expressão como a do tomate e a da batata. Além do risco de contaminação dos recursos hídricos, observa-se, a des- peito do crescente uso desses produtos, o aumento contí- nuo da incidência de pragas e doenças, conseqüência da falta de critério na utilização desses insumos. Não existe, por parte da maioria dos aplicadores de agrotóxicos, a consciência dos riscos à saúde, que a manipulação desses produtos pode causar. Trabalham, via de regra, sem a uti- lização de equipamentos de proteção individual (Silveira, 1998a). A estrutura fundiária da Taquara Branca é bastante concentrada, e grande parte dos produtores tem pequenos lotes. Associada à expansão da urbanização, apresentam sistemas de produção que em sua maioria “guardam certa dependência externa (crédito rural, mercados de insumos e produtos, assistência técnica, etc.), mas com a produção agrícola, mesmo que para venda, ainda voltada basica- mente para a reprodução familiar” (Kitamura et al., 1999).

Coleta e análise de dados

Os dados foram coletados através da aplicação de 33 questionários do tipo cross-section, distribuídos de forma aleatória entre as propriedades da MTB. Os questionários foram aplicados por pessoal treinado, em um único dia de maio de 1996. O questionário aplicado continha apenas oito perguntas, quase totalmente fechadas, a maioria com respostas numéricas, o que permitiu que o tempo médio para o seu preenchimento fosse de 20 minutos. É importante ressaltar que neste trabalho, diferente- mente de outros (Santana & Khan, 1990; Souza Neto et al., 1995), foi possível a utilização de amostragem probabilística, pois estava disponível um mapa com os limites de todas as propriedades da microbacia (Fig. 1). De posse desse mapa, foi atribuído um número a cada propriedade e, através do uso da função geradora de nú- meros aleatórios RANUNI do SAS (SAS, 1988), foram sorteadas 32 delas, o que corresponde a 30% do total de 106 propriedades da MTB. Como uma das propriedades

escolhidas estava arrendada para dois agricultores, consti- tuindo duas unidades de produção distintas, o questioná- rio foi desmembrado, produzindo um total de 33 respondentes. Para a análise de dados obtidos através de questioná- rios que avaliam características socioeconômicas, alguns autores preferem se utilizar apenas de análises unidimensionais (Otani et al., 1995, 1996); outros, apli- cam apenas análises multidimensionais (Angelo et al., 1990), e há ainda os que preferem utilizar os dois tipos de análise simultaneamente (Molina Filho, 1976; Souza Neto et al., 1995). Pelas características dos dados e dos objeti- vos deste trabalho, também aqui optou-se pelo uso das duas abordagens, ou seja: primeiramente, foram explora- dos os dados, mediante a análise unidimensional, e a se- guir, utilizaram-se técnicas de análise multivariada. A análise univariada, nesse caso, é extremamente sim- ples, e consiste na tabulação, em separado, das respostas a

FIG. 1. Distribuição espacial das propriedades, área de assentamento rural (A) e barragem (B), na microbacia do Córrego Taquara Branca, em Sumaré, SP.

DIAGNÓSTICO RÁPIDO E DIALOGADO EM ESTUDOS 8 9

Grupo 1 = agricultura familiar;

Grupo 2 = agricultura não familiar em pequenas

áreas;

Grupo 3 = agricultura não familiar em grandes

áreas.

O grupo 1, formado por doze propriedades, se

caracteriza por ter todos os respondentes tomando

as decisões quanto à compra de insumos e venda da

produção, a maioria (9) das áreas com duas ou mais

atividades agrícolas; na quase totalidade (11) delas,

se cria pelo menos uma espécie animal, todos utili-

zam menos de 30% de trabalho contratado, 67% afir-

mam que terão um sucessor na família, quase todos

(11) obtêm mais da metade da sua renda da atividade

agrícola e todos têm propriedades entre 7 e 56 ha,

havendo predominância (9) de áreas entre 7 e 14 ha.

É importante ressaltar que as seis propriedades

sorteadas, que pertenciam ao assentamento rural

existente na MTB, foram classificadas dentro deste

grupo; isso é particularmente interessante quando

sabemos que 27 das 106 propriedades formam o as-

sentamento, 25,5% portanto.

O grupo 2, formado por seis propriedades, se ca-

racteriza por ter a maioria (5) dos respondentes to-

mando as decisões quanto à compra de insumos e

venda da produção, a maioria (4) das áreas tem ape-

nas uma atividade agrícola, na quase totalidade (5)

delas não se cria nenhuma espécie animal, todos uti-

lizam mais de 70% de trabalho contratado, 67% afir-

mam que não terão um sucessor na família e que

obtêm mais da metade da renda da atividade agríco-

la, e todas as propriedades têm menos de 28 ha.

O grupo 3, formado por apenas quatro proprieda-

des, se caracteriza por ter a maioria (3) dos

respondentes tomando as decisões quanto à com-

pra de insumos e venda da produção, a maioria (3)

das áreas tem apenas uma atividade agrícola, na me-

tade (2) delas não se cria nenhuma espécie animal,

todos utilizam mais de 70% de trabalho contratado,

metade afirma que não terá um sucessor na família, a

maioria (3) afirma que obtém menos da metade da

renda da atividade agrícola, e todas as propriedades

têm mais de 56 ha.

Forma de posse do Tipo de equipamento equipamento (^) Irrigação Pulverizador manual

Pulverizador motorizado

Pulverizador tratorizado

Trator

Próprio 10 10 2 9 11 A lugado 1 0 0 1 4 Outros 4 1 0 3 1

TABELA 2. Número de propriedades, por forma de posse e tipo de equipamento, na microbacia do Taquara Branca, em Sumaré, SP. Maio de 1996.

Proveniência da renda Categoria de renda Nenhuma Pouca Metade Muita Total Plantação 4 2 1 4 8 Criação 10 7 1 1 0 Arrendamento 18 1 0 0 0 Salário 17 0 1 1 0 Outros 10 5 1 3 0

TABELA 1. Número de propriedades, por categoria e proveniência da renda, na microbacia do Taquara Bran- ca, Sumaré, SP. Maio de 1996.

9 0 A.J.B. LUIZ e M.Â. DA SILVEIRA

CONCLUSÕES

1. A agricultura familiar é a categoria indivi-

dualmente mais freqüente na MTB, embora não seja

predominante.

2. O questionário utilizado é de aplicação fácil e

rápida, e permite coletar informação suficiente para

a identificação de grupos de unidades de produção

similares.

3. O método quantitativo utilizado na análise das

respostas aos questionários se mostra adequado às

necessidades de estudos dessa natureza e similares.

4. A facilidade encontrada tanto na aplicação

como na análise e interpretação das respostas aos

questionários, permite recomendar o método aqui

utilizado para a fase inicial de aquisição de dados

em trabalhos similares.

5. A possibilidade de incluir aspectos quantitati-

vos às análises qualitativas geralmente adotadas nes-

sa etapa dos trabalhos, auxilia a compreensão e for-

nece bases mais consistentes para as conclusões so-

bre os sistemas observados.

6. A análise multidimensional equaciona de ma-

neira satisfatória o problema de tratar simultanea-

mente diversas variáveis, situação que é praticamente

constante nos estudos ambientais.

AGRADECIMENTOS

Ao técnico especializado da Embrapa-CNPMA,

agrônomo José Abrahão Haddad Galvão, e aos esta-

giários Alberto Paulo Vasquez, Gustavo Henrique

Martinez e Marlene Borges, pelo auxílio na aplicação

dos questionários.

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