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texto de Friedrich Engels
Tipologia: Notas de estudo
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Friedrich Engels
I
O socialismo moderno é, em primeiro lugar, por seu conteúdo, fruto do reflexo na inteligência, de um lado dos antagonismos de classe que imperam na moderna sociedade entre possuidores e despossuidos, capitalistas e operários assalariados, e, de outro lado, da anarquia que reina na produção. Por sua forma teórica, porém, o socialismo começa apresentando-se como uma continuação, mais desenvolvida e mais conseqüente, dos princípios proclamados pelos grandes pensadores franceses do século XVIII. Como toda nova teoria, o socialismo, embora tivesse suas raízes nos fatos materiais econômicos, teve de ligar-se, ao nascer, às Idéias existentes. Os grandes homens que, na França, iluminaram os cérebros para a revolução que se havia de desencadear, adotaram uma atitude resolutamente revolucionária. Não reconheciam autoridade exterior de nenhuma espécie. A religião, a concepção da natureza, a sociedade, a ordem estatal: tudo eles submetiam à crítica mais impiedosa; tudo quanto existia devia justificar os títulos de sua existência ante o foro da razão, ou renunciar a continuar existindo. A tudo se aplicava como rasoura única a razão pensante. Era a época em que, segundo Hegel, "o mundo girava sobre a cabeça" (1), primeiro no sentido de que a cabeça humana e os princípios estabelecidos por sua especulação
reclamavam o direito de ser acatados como base de todos os atos humanos e toda relação social, e logo também, no sentido mais amplo de que a realidade que não se ajustava a essas conclusões se via subvertida, de fato, desde os alicerces até à cumieira. Todas as formas anteriores de sociedade e de Estado, todas as leis tradicionais, foram atiradas no monturo como irracionais; até então o mundo se deixara governar por puros preconceitos; todo o passado não merecia senão comiseração e desprezo, Só agora despontava a aurora, o reino da razão; daqui por diante a superstição, a injustiça, o privilégio e a opressão seriam substituídos pela verdade eterna, pela eterna justiça, pela igualdade baseada na natureza e pelos direitos Inalienáveis do homem.
Já sabemos, hoje, que esse império da razão não era mais que o império idealizado pela burguesia; que a justiça eterna tomou corpo na justiça burguesa; que a igualdade se reduziu à igualdade burguesa em face da lei; que como um dos direitos mais essenciais do homem foi proclamada a propriedade burguesa; e que o Estado da razão, o "contrato social" de Rousseau, pisou e somente podia pisar o terreno da realidade, convertido na república democrática burguesa. Os grandes pensadores do século XVIII, como todos os seus Predecessores, não podiam romper as fronteiras que sua própria época lhes impunha.
Mas, ao lado do antagonismo entre a nobreza feudal e a burguesia, que se erigia em representante de todo o resto da sociedade, mantinha-se de pé o antagonismo geral entre exploradores e explorados, entre ricos gozadores e pobres que trabalhavam. E esse fato exatamente é que permitia aos representantes da burguesia arrogar-se a representação, não de uma classe determinada, mas de toda a humanidade sofredora. Mais ainda: desde o momento mesmo em que nasceu, a burguesia conduzia em suas entranhas sua própria antítese, pois os capitalistas não podem existir sem os operários assalariados, e na mesma proporção em que os mestres de ofícios das corporações medievais se convertiam em burgueses modernos, os oficiais e os jornaleiros não agremiados transformavam-se em proletários. E se, em termos gerais, a burguesia podia arrogar-se o direito de representar, em suas lutas com a nobreza, além dos seus Interesses, os das diferentes classes trabalhadoras da época, ao lado de todo grande movimento burguês que se desatava, eclodiam movimentos independentes daquela classe que era o precedente mais ou
menos desenvolvido do proletariado moderno. Tal foi na época da Reforma e das guerras camponesas na Alemanha. a tendência dos anabatistas e de Thomas Münzer; na grande Revolução Inglesa, os "levellers" (2), e na Revolução Francesa, Babeuf. Essas sublevações revolucionárias de uma classe incipiente são
acompanhadas, por sua vez, pelas correspondentes manifestações teóricas: nos séculos XVI e XVII (3)
aparecem as descrições utópicas de um regime ideal da sociedade; no século XVIII, teorias já abertamente comunistas, como as de Morelly e Mably. A reivindicação da igualdade não se limitava aos direitos políticos, mas se estendia às condições sociais de vida de cada indivíduo; já não se tratava de abolir os privilégios de classe, mas de destruir as próprias diferenças de classe. Um comunismo ascético, ao modo espartano, que renunciava a todos os gozos da vida: tal foi a primeira forma de manifestação da nova teoria. Mais tarde vieram os três grandes utopistas: Saint-Simon, em que a tendência continua ainda a se afirmar, até certo ponto, junto à tendência proletária; Fourier e Owen, este último, num pais onde a produção capitalista estava mais desenvolvida e sob a impressão engendrada por ela, expondo em forma sistemática uma série de medidas orientadas rio sentido de abolir as diferenças de classe, em relação direta com o materialismo francês.
Traço comum aos três é que não atuavam como representantes dos interesses do proletariado, que entretanto surgira como um produto histórico. Da mesma maneira que os enciclopedistas, não se propõem emancipar primeiramente uma classe determinada, mas, de chofre, toda a humanidade. E assim como eles, pretendem instaurar o império da razão e da justiça eterna. Mas entre o seu império e o dos enciclopedistas medeia um abismo. Também o mundo burguês, instaurado segundo os princípios dos enciclopedistas, é Injusto e irracional e merece, portanto, ser jogado entre os trastes inservíveis, tanto quanto o feudalismo e as formas sociais que o antecederam. Se até agora a verdadeira razão e a verdadeira justiça não governaram o mundo é simplesmente porque ninguém soube penetrar devidamente nelas. Faltava o homem genial, que agora se ergue ante a humanidade com a verdade, por fim descoberta. O fato de que esse homem tenha aparecido agora, e não antes, o fato de que a verdade tenha sido por fim descoberta agora, e não antes, não é, segundo eles, um acontecimento inevitável, imposto pela concatenação do desenvolvimento histórico, e sim porque o simples acaso assim o quis. Poderia ter aparecido quinhentos anos antes, poupando assim à humanidade quinhentos anos de erros, de lutas e de sofrimentos.
Vimos como os filósofos franceses do século XVIII, que abriram o caminho à revolução, apelavam para a razão como o juiz único de tudo o que existe. Pretendia-se instaurar um Estado racional, uma sociedade ajustada à razão, e tudo quanto contradissesse a razão eterna deveria ser rechaçado sem nenhuma piedade. Vimos também que, em realidade, essa razão não era mais que o senso comum do homem idealizado da classe média que, precisamente então, se convertia em burguês. Por isso, quando a Revolução Francesa empreendeu a construção dessa sociedade e desse Estado da razão, redundou que as novas instituições, por mais racionais que fossem em comparação com as antigas, distavam bastante da razão absoluta. O Estado da razão falira completamente. O contrato social de Rousseau tomara corpo na época do terror, e a burguesia, perdida a fé em sua própria habilidade política, refugiou-se, primeiro na corrupção do Diretório e, por último, sob a égide do despotismo napoleônico. A prometida paz eterna convertera-se numa interminável guerra de conquistas. Tampouco teve melhor sorte a sociedade da razão. O antagonismo entre pobres e ricos, longe de dissolver-se no bem-estar geral, aguçara-se com o desaparecimento dos privilégios das corporações e outros, que estendiam uma ponte sobre ele, e os estabelecimentos eclesiásticos de beneficência, que o atenuavam. A «liberação da propriedade" dos entraves feudais, que agora se convertia em realidade, vinha a ser para o pequeno burguês e o pequeno camponês a liberdade de vender a esses mesmos poderosos senhores sua pequena propriedade, esgotada
reino da utopia; quanto mais detalhados e minuciosos fossem, mais tinham que degenerar em puras fantasias.
Assentado isso, não há por que nos determos nem um momento mais nesse aspecto, já definitivamente incorporado ao passado. Deixemos que os trapeiros literários revolvam solenemente nessas fantasias, que parecem hoje provocar o riso, para ressaltar sobre o fundo desse «cúmulo de disparates" a superioridade de seu raciocínio sereno. Quanto a nós, admiramos os germes geniais de idéias e as idéias geniais que brotam por toda parte sob essa envoltura de fantasia que os filisteus são incapazes de ver.
Saint-Simon era filho da grande Revolução Francesa, que estalou quando ele não contava ainda trinta anos. A. Revolução foi o triunfo do terceiro estado, isto é, da grande massa ativa da nação, a cujo cargo corriam a produção e o comércio, sobre os estados até então ociosos e privilegiados da sociedade: a nobreza e o clero. Mas logo se viu que o triunfo do terceiro estado não era mais que o triunfo de uma parte multo pequena dele, a conquista do poder político pelo setor socialmente privilegiado dessa classe: a burguesia possuidora. Essa burguesia desenvolvia-se rapidamente já no processo da revolução, especulando com as terras confiscadas e logo vendidas da aristocracia e da Igreja, e lesando a nação por meio das verbas destinadas ao exército. Foi precisamente o governo desses negocistas que, sob o Diretório, levou à França e a Revolução à beira da ruína, dando com isso a Napoleão o pretexto para o golpe de Estado. Por isso, na idéia de Saint-Simon, o antagonismo entre o terceiro estado e os estados privilegiados da sociedade tomou a forma de um antagonismo entre "trabalhadores" e "ociosos". Os «ociosos" eram não só os antigos privilegiados, mas todos aqueles que viviam de suas rendas, cem intervir na produção nem no comércio. No conceito de "trabalhadores" não entravam somente os operários assalariados, mas também os fabricantes, os comerciantes e os banqueiros. Que os ociosos haviam perdido a capacidade para dirigir espiritualmente e governar politicamente era um fato Indisfarçável, selado em definitivo pela Revolução. E, para Saint-Simon, as experiências da época do terror haviam demonstrado, por sua vez, que os descamisados não possuíam tampouco essa capacidade. Então, quem haveria de dirigir e governar? Segundo Saint-Simon, a ciência e a indústria, unidas por um novo laço religioso, um "novo cristianismo", forçosamente místico e rigorosamente hierárquico, chamado a restaurar a unidade das idéias religiosas, destruída desde a Reforma. Mas a ciência eram os sábios acadêmicos; e a indústria eram, em primeiro lugar, os burgueses ativos, os fabricantes, os comerciantes, os banqueiros. E embora esses burgueses tivessem de transformar-se numa espécie de funcionários públicos, de homens da confiança de toda a sociedade, sempre conservariam frente aos operários uma posição autoritária e economicamente privilegiada. Os banqueiros seriam os chamados em primeiro lugar para regular toda a produção social por meio de uma regulamentação do crédito. Esse modo de conceber correspondia perfeitamente a uma época em que a grande indústria, e com ela o antagonismo entre a burguesia e o proletariado, mal começava a despontar na França. Mas Saint-Simon insiste muito especialmente neste ponto: o que o preocupa, sempre e em primeiro lugar, é a sorte da "classe mais numerosa e mais pobre" ela sociedade ("la classe la plus nombreuse et la plus paurre").
Em suas Cartas de Genebra, Saint-Simon formula a tese de que "todos os homens devem trabalhar". Na mesma obra já se expressa a Idéia de que o reinado do terror era o governo das massas despossuídas. "Vede - grita-lhes - o que se passou na França quando vossos camaradas subiram ao poder: provocaram a fome". Mas conceber a Revolução Francesa como urna luta de classes, e não só entre a nobreza e a burguesia, mas entre a nobreza, a burguesia e os despossuídos, era, em 1802, uma descoberta verdadeiramente genial.
Em 1816, Saint-Simon declara que a política é a ciência da produção e prediz já a total absorção da
política pela economia. E se aqui não faz senão aparecer em germe a idéia de que a situação econômica é a base das instituições políticas, proclama já claramente a transformação do governo político sobre os homens numa administração das coisas e na direção dos processos da produção, que não é senão a idéia da "abolição do Estado", que tanto alarde levanta ultimamente. E, elevando-se ao mesmo plano de superioridade sobre os seus contemporâneos, declara, em 1814, imediatamente, depois da entrada das tropas coligadas em Paris, e reitera em 1815, durante a Guerra dos Cem Dias, que a aliança da França com a Inglaterra e, em segundo lugar, a destes países com a Alemanha é a única garantia do desenvolvimento próspero e da paz na Europa. A fim de aconselhar aos franceses de 1815 uma aliança com os vencedores de Waterloo era necessário possuir tanto valentia quanto capacidade para ver longe na história.
O que em Saint-Simon é amplitude genial de visão, que lhe permite conter já, em germe, quase todas as Idéias não estritamente econômicas dos socialistas posteriores, em Fourier é a critica engenhosa autenticamente francesa, mas nem por isso menos profunda, das condições sociais existentes. Fourier pega a burguesia pela palavra, por seus inflamados profetas de antes e seus Interesseiros aduladores de depois da revolução. Põe a nu, impiedosamente, a miséria material e moral do mundo burguês, e a compara com as fascinantes promessas dos velhos enciclopedistas, com a imagem que eles faziam da sociedade em que a razão reinaria sozinha, de urna civilização que faria felizes todos os homens e de uma ilimitada capacidade humana de perfeição. Desmascara as brilhantes frases dos ideólogos burgueses da época, demonstra como a essas frases grandiloqüentes corresponde, por toda parte, a mais cruel das realidades e derrama sua sátira mordaz sobre esse ruidoso fracasso da fraseologia. Fourier não é apenas um crítico; seu espírito sempre jovial faz dele um satírico, um dos maiores satíricos de todos os tempos. A especulação criminosa desencadeada com o refluxo da onda revolucionária e o espírito mesquinho do comércio francês naqueles anos aparecem pintados em suas obras com traços magistrais e encantadores. Mas é ainda mais magistral nele a crítica das relações entre os sexos e da posição da mulher na sociedade burguesa. É ele o primeiro a proclamar que o grau de emancipação da mulher numa sociedade é o barômetro natural pelo qual se mede a emancipação geral. Contudo, onde mais sobressai Fourier é na maneira como concebe a história da sociedade. Fourier divide toda a história anterior em quatro fases ou etapas de desenvolvimento:o selvagismo, a barbárie, o patriarcado e a civilização, esta última fase coincidindo com o que chamamos hoje sociedade burguesa, isto é, com o regime social implantado desde o século XVI, e demonstra que a "ordem civilizada eleva a uma forma complexa, ambígua, equívoca e hipócrita todos aqueles vícios que a barbárie praticava em meio à maior simplicidade". Para ele a civilização move-se num "círculo vicioso", num ciclo de contradições, que reproduz constantemente sem poder superá-las, conseguindo sempre precisamente o contrário do que deseja ou alega querer conseguir. E assim nos encontramos, por exemplo, com o fato de que "na civilização, a pobreza brota da própria abundância". Como se vê, Fourier maneja a dialética com a mesma mestria de seu contemporâneo Hegel. Diante dos que enchem a boca falando da ilimitada capacidade humana de perfeição, põe em relevo, com Igual dialética, que toda fase histórica tem sua vertente ascensional, mas também sua ladeira descendente, e projeta essa concepção sobre o futuro de toda a humanidade. E assim como Kant Introduziu na ciência da natureza o desaparecimento futuro da Terra, Fourier introduz em seu estudo da história a idéia do futuro desaparecimento da humanidade.
Enquanto o vendaval da revolução varria o solo da França, desenvolvia-se na Inglaterra um processo revolucionário, mas tranqüilo, porém nem por isso menos poderoso. O vapor e as máquinas-ferramenta converteram a manufatura na grande indústria moderna, revolucionando com Isso todos os fundamentos da sociedade burguesa. O ritmo vagaroso do desenvolvimento do período da manufatura converteu-se
caso de New Lanark era, só que em proporções maiores, o de todas as fábricas da Inglaterra. "Sem essa nova fonte de riqueza criada pelas máquinas, teria sido impossível levar adiante as guerras travadas para derrubar Napoleão e manter de pé os princípios da sociedade aristocrática. E, no entanto, esse novo poder era obra da classe operária." (5) A ela deviam pertencer também, portanto, os seus frutos. As novas e
gigantescas forças produtivas, que até ali só haviam servido para que alguns enriquecessem e as massas fossem escravizadas, lançavam, segundo Owen, as bases para uma reconstrução social e estavam fadadas a trabalhar somente para o bem-estar coletivo, como propriedade coletiva de todos os membros da sociedade.
Foi assim, por esse caminho puramente prático - resultado, por dizê-lo, dos cálculos de um homem de negócios que surgiu o comunismo oweniano, conservando sempre esse caráter prático Assim, em 1823, Owen propõe um sistema de colônias comunistas para combater a miséria reinante na Irlanda e apresenta, em apoio de sua proposta, um orçamento completo de despesas de instalação, desembolsos anuais e rendas prováveis. E assim também em seus planos definitivos da sociedade do futuro, os detalhes técnicos são calculados com um domínio tal da matéria, Incluindo até projetos, desenhos de frente, de perfil e do alto que, uma vez aceito o método oweniano de reforma da sociedade, pouco se poderia objetar, mesmo um técnico experimentado, contra os pormenores de sua organização.
O avanço para o comunismo constitui um momento crucial na vida de Owen. Enquanto se limitara a atuar só como filantropo, não colhera senão riquezas, aplausos, honra e fama. Era o homem mais popular da Europa Não só os homens de sua classe e posição social, mas também os governantes e os príncipes o escutavam e o aprovavam. No momento, porém, em que formulou suas teorias comunistas, virou-se a página. Eram precisamente três grandes obstáculos os que, segundo ele, se erguiam em seu caminho da reforma social: a propriedade privada, a religião e a forma atual do casamento. E não ignorava ao que se expunha atacando-os: à execração de toda a sociedade oficial e à perda de sua posição social. Mas isso não o deteve em seus ataques implacáveis contra aquelas instituições, e ocorreu o que ele previa. Desterrado pela sociedade oficial, ignorado completamente pela imprensa, arruinado por suas fracassadas experiências comunistas na América, às quais sacrificou toda a sua fortuna, dirigiu-se à classe operária, no seio da qual atuou ainda durante trinta anos. Todos os movimentos sociais, todos os progressos reais registrados na Inglaterra em interesse da classe trabalhadora, estão ligados ao nome de Owen. Assim, em 1819, depois de cinco anos de grandes esforços, conseguiu que fosse votada a primeira lei limitando o trabalho da mulher e da criança nas fábricas. Foi ele quem presidiu o primeiro congresso em que as trade-unions de toda a Inglaterra fundiram-se numa grande organização sindical única. E foi também ele quem criou, como medidas de transição, para que a sociedade pudesse organizar-se de maneira integralmente comunista, de um lado, as cooperativas de consumo e de produção - que serviram, pelo menos, para demonstrar na prática que o comerciante e o fabricante não são Indispensáveis -, e de outro lado, os mercados operários, estabelecimentos de troca dos produtos do trabalho por meio de bonus de trabalho e cuja unidade é a hora de trabalho produzido; esses estabelecimentos tinham necessariamente que fracassar, mas se antecipam multo aos bancos proudhonianos de troca, diferenciando-se deles somente em que não pretendem ser a panacéia universal para todos os males sociais, mas pura e simplesmente um primeiro passo para uma transformação multo mais radical da sociedade.
As concepções dos utopistas dominaram durante muito tempo as idéias socialistas do século XIX, e em parte ainda hoje as dominam. Rendiam-lhes homenagens, até há muito pouco tempo, todos os socialistas franceses e Ingleses e a eles se deve também o incipiente comunismo alemão, incluindo Weitling. Para todos eles, o socialismo é a expressão da verdade absoluta, da razão e da justiça, e é bastante revelá-lo para, graças à sua virtude, conquistar o mundo. E, como a verdade absoluta não está sujeita a condições
de espaço e de tempo nem ao desenvolvimento histórico da humanidade, só o acaso pode decidir quando e onde essa descoberta se revelará. Acrescente-se a isso que a verdade absoluta, a razão e a justiça variam com os fundadores de cada escola; e como o caráter específico da verdade absoluta, da razão e da justiça está condicionado, por sua vez, em cada um deles, pela Inteligência pessoal, condições de vida, estado de cultura e disciplina mental, resulta que nesse conflito de verdades absolutas a única solução é que elas vão acomodando-se umas às outras. E, assim, era inevitável que surgisse uma espécie de socialismo eclético e medíocre, como o que, com efeito, continua imperando ainda nas cabeças da maior parte dos operários socialistas da França e da Inglaterra: uma mistura extraordinariamente variegada e cheia de matizes, compostas de desabafes críticos, princípios econômicos e as imagens sociais do futuro menos discutíveis dos diversos fundadores de seitas, mistura tanto mais fácil de compor quanto mais os ingredientes individuais iam perdendo, na torrente da discussão, os seus contornos sutis e agudos, como as pedras limadas pela corrente de um rio. Para converter o socialismo em ciência era necessário, antes de tudo, situá-lo no terreno da realidade.
II
Entretanto, junto à filosofia francesa do século XVIII, e por trás dela, surgira a moderna filosofia alemã, cujo ponto culminante foi Hegel. O principal mérito dessa filosofia é a restauração da dialética, como forma suprema do pensamento. Os antigos filósofos gregos eram todos dialéticos inatos, espontâneos, e a cabeça mais universal de todos eles - Aristóteles - chegara já a estudar as formas mais substanciais do pensamento dialético. Em troca, a nova filosofia, embora tendo um ou outro brilhante defensor da dialética (como por exemplo, Descartes e Spinoza) caía cada vez mais, sob a influência principalmente dos ingleses, na chamada maneira metafísica de pensar, que também dominou quase totalmente entre os franceses do século XVIII, ao menos em suas obras especificamente filosóficas. Fora do campo estritamente filosófico, eles criaram também obras-primas de dialética; como prova, basta citar O Sobrinho de Rameau, de Diderot, e o estudo de Rousseau sôbre a origem da desigualdade entre os homens. Resumiremos aqui, sucintamente, os traços mais essenciais de ambos os métodos discursivos.
Quando nos detemos a pensar sobre a natureza, ou sobre a história humana, ou sobre nossa própria atividade espiritual,. deparamo-nos, em primeiro plano, com a imagem de uma trama infinita de concatenações e Influências recíprocas, em que nada permanece o que era, nem como e onde era, mas tudo se move e se transforma, nasce e morre. Vemos, pois, antes de tudo, a imagem de conjunto, na qual os detalhes passam ainda mais ou menos para o segundo plano; fixamo-nos mais no movimento, nas transições, na concatenação, do que no que se move, se transforma e se concatena Essa concepção do mundo, primitiva, ingênua, mas essencialmente exata, é a dos filósofos gregos antigos, e aparece claramente expressa pela primeira vez em Heráclito: tudo é e não é, pois tudo flui, tudo se acha sujeito a um processo constante de transformação, de Incessante nascimento e caducidade. Mas essa concepção, por mais exatamente que reflita o caráter geral do quadro que nos é oferecido pelos fenômenos, não basta para explicar os elementos isolados que formam esse quadro total; sem conhecê-los a Imagem geral não adquirirá tampouco um sentido claro. Para penetrar nesses detalhes temos de despregá-los do seu tronco histórico ou natural e Investigá-los separadamente, cada qual por si, em seu caráter, causas e efeitos especiais, etc. Tal é a missão primordial das ciências naturais e da história, ramos de investigação que os gregos clássicos situavam, por motivos muito justificados, num plano puramente secundário, pois primariamente deviam dedicar-se a acumular os materiais científicos necessários. Enquanto não se reúne uma certa quantidade de materiais naturais e históricos não se pode proceder ao exame crítico, à comparação e, consequentemente, a divisão em classes, ordens e espécies. Por isso, os rudimentos das
Nenhum desses fenômenos e métodos discursivos se encaixa no quadro das especulações metafísicas. Ao contrário, para a dialética, que focaliza as coisas e suas Imagens conceituais substancialmente em suas conexões, em sua concatenação, em sua dinâmica, em seu processo de nascimento e caducidade, fenômenos como os expostos não são mais que outras tantas confirmações de seu modo genuíno de proceder. A natureza é a pedra de toque da dialética, e as modernas ciências naturais nos oferecem para essa prova um acervo de dados extraordinariamente copiosos e enriquecido cada dia que passa, demonstrando com Isso que a natureza se move, em última instância, pelos caminhos dialéticos e não pelas veredas metafísicas, que não se move na eterna monotonia de um ciclo constantemente repetido, mas percorre uma verdadeira história. Aqui é necessário citar Darwin, em primeiro lugar, quem, com sua prova de que toda a natureza orgânica existente, plantas e animais, e entre eles, como é lógico, o homem, é o produto de um processo de desenvolvimento de milhões de anos, assestou na concepção metafísica da natureza o mais rude golpe. Até hoje, porém, os naturalistas que souberam pensar dialeticamente podem ser contados com os dedos, e esse conflito entre os resultados descobertos e o método discursivo tradicional põe a nu a Ilimitada confusão que reina presentemente na teoria das ciências naturais e que constitui o desespero de mestres e discípulos, de autores e leitores.
Somente seguindo o caminho da dialética, não perdendo jamais de vista as inumeráveis ações e reações gerais do devenir e do perecer, das mudanças de avanço e retrocesso, chegamos a uma concepção exata do universo, do seu desenvolvimento e do desenvolvimento da humanidade, assim como da imagem projetada por esse desenvolvimento nas cabeças dos homens. E foi esse, com efeito, o sentido em que começou a trabalhar, desde o primeiro momento, a moderna filosofia alemã. Kant iniciou sua carreira de filósofo dissolvendo o sistema solar estável de Newton e sua duração eterna - depois de recebido o primeiro impulso - num processo histórico: no nascimento do Sol e de todos os planetas a partir de uma massa nebulosa em rotação. Dai, deduziu que essa origem implicava também, necessariamente, a morte futura do sistema solar. Meio século depois sua teoria foi confirmada matematicamente por Laplace e, ao fim de outro meio século, o espectroscópio veio demonstrar a existência no espaço daquelas massas igneas de gás, em diferente grau de condensação.
A filosofia alemã moderna encontrou sua culminância no sistema de Hegel, em que pela primeira vez - e aí está seu grande mérito - se concebe todo o mundo da natureza, da história e do espírito como um processo, isto é, em constante movimento, mudança, transformação e desenvolvimento, tentando além disso ressaltar a intima conexão que preside esse processo de movimento e desenvolvimento. Contemplada desse ponto de vista, a história da humanidade já. não aparecia como um caos inóspito de violências absurdas, todas igualmente condenáveis diante do foro da razão filosófica hoje já madura, e boas para serem esquecidas quanto antes, mas como o processo de desenvolvimento da própria humanidade, que cabia agora ao pensamento acompanhar em suas etapas graduais e através de todos os desvios, e demonstrar a existência de leis internas que orientam tudo aquilo que à primeira vista poderia parecer obra do acaso cego.
Não importava que o sistema de Hegel não resolvesse o problema que se propunha. Seu mérito, que marca época. consistiu em tê-lo proposto. Não em vão, trata-se de um problema que nenhum homem sozinho pôde resolver. E embora fosse Hegel, como Saint-Simon, a cabeça mais universal. de seu tempo, seu horizonte achava-se circunscrito, em primeiro lugar, pela limitação inevitável de seus próprios conhecimentos e, em segundo lugar, pelos conhecimentos e concepções de sua época, limitados também em extensão e profundidade. Deve-se acrescentar a isso uma terceira circunstância. Hegel era idealista; isto é, para ele as Idéias de sua cabeça não eram imagens mais ou menos abstratas dos objetos ou
fenômenos da realidade, mas essas coisas e seu desenvolvimento se lhe afiguravam, ao contrário, como projeções realizadas da "Idéia", que já existia, não se sabe como, antes de existir o mundo. Assim, foi tudo posto de cabeça para baixo, e a concatenação real do universal apresentava-se completamente às avessas. E por mais exatas e mesmo geniais que fossem várias das conexões concretas concebidas por Hegel, era inevitável, pelos motivos que acabamos de apontar, que muitos dos seus detalhes tivessem um caráter amaneirado, artificial, construído; em uma palavra, falso. O sistema de Hegel foi um aborto gigantesco, mas o último de seu gênero. De fato, continuava sofrendo de uma contradição interna incurável; pois, enquanto de um lado partia como pressuposto inicial da concepção histórica, segundo a qual a história humana é um processo de desenvolvimento que não pode, por sua natureza, encontrar o arremate intelectual na descoberta disso que chamam verdade absoluta, de outro lado nos é apresentado exatamente como a soma e a síntese dessa verdade absoluta. Um sistema universal e definitivamente plasmado do conhecimento da natureza e da história é incompatível com as leis fundamentais do pensamento dialético - que não exclui, mas longe disso implica que o conhecimento sistemático do mundo exterior em sua totalidade possa progredir gigantescamente de geração em geração.
A consciência da total inversão em que incorria o Idealismo alemão levou necessariamente ao materialismo; mas não, veja-se bem, àquele materialismo puramente metafísico e exclusivamente mecânico do século XVIII. Em oposição à simples repulsa, ingenuamente revolucionária, de toda a história anterior, o materialismo moderno vê na história o processo de desenvolvimento da humanidade, cujas leis dinâmicas é missão sua descobrir. Contrariamente à idéia da natureza que imperava entre os franceses do século XVIII, assim como em Hegel, em que esta era concebida como um todo permanente e invariável, que se movia dentro de ciclos estreitos, com corpos celestes eternos, tal como Newton os representava, e com espécies invariáveis de seres orgânicos, como ensinara Linneu, o materialismo moderno resume e compendia os novos progressos das ciências naturais, segundo os quais a natureza tem também sua história no tempo, e os mundos, assim como as espécies orgânicas que em condições propícias os habitam, nascem e morrem, e os ciclos, no grau em que são admissíveis, revestem dimensões infinitamente mais grandiosas. Tanto em um como em outro caso, o materialismo moderno é substancialmente dialético e já não precisa de uma filosofia superior às demais ciências. Desde o momento em que cada ciência tem que prestar contas da posição que ocupa no quadro universal das coisas e do conhecimento dessas coisas, já não há margem para uma ciência especialmente consagrada ao estudo das concatenações universais. Da filosofia anterior, com existência própria, só permanece de pé a teoria do pensar e de suas leis: a lógica formal e a dialética. O demais se dissolve na ciência positiva da natureza e da história.
No entanto, enquanto que essa revolução na concepção da natureza só se pôde impor na medida em que a pesquisa fornecia à ciência os materiais positivos correspondentes, já há muito tempo se haviam revelado certos fatos históricos que imprimiram uma reviravolta decisiva no modo de focalizar a história. Em 1831, estala em Lyon a primeira insurreição operária, e de 1838 a 1842 atinge o auge o primeiro movimento operário nacional: o dos cartistas ingleses. A luta de classes entre o proletariado e a burguesia passou a ocupar o primeiro plano da história dos países europeus mais avançados, ao mesmo ritmo em que se desenvolvia neles, de uni lado, a grande indústria, e de outro lado, a dominação política recém-conquistada da burguesia. Os fatos refutavam cada vez mais rotundamente as doutrinas burguesas da identidade de interesses entre o capital e o trabalho e da harmonia universal e o bem-estar geral das nações, como fruto da livre concorrência. Não havia como passar por alto esses fatos, nem era tampouco possível ignorar o socialismo francês e inglês, expressão teórica sua, por mais imperfeita que fosse. Mas a velha concepção idealista da história, que ainda não havia sido removida, não conhecia lutas de classes
isso, as causas profundas de todas as transformações sociais e de todas as revoluções políticas não devem ser procuradas nas cabeças dos homens nem na idéia que eles façam da verdade eterna ou da eterna justiça, mas nas transformações operadas no modo de produção e de troca; devem ser procuradas não na filosofia, mas na economia da época de que se trata. Quando nasce nos homens a consciência de que as instituições sociais vigentes são irracionais e injustas, de que a razão se converteu em insensatez e a bênção em praga (7), isso não é mais que um indício de que nos métodos de produção e nas formas de
distribuição produziram-se silenciosamente transformações com as quais já não concorda a ordem social, talhada segundo o padrão de condições econômicas anteriores. E assim já está dito que nas novas relações de produção têm forçosamente que conter-se - mais ou menos desenvolvidos - os meios necessários para pôr termo aos males descobertos. E esses meios não devem ser tirados da cabeça de ninguém, mas a cabeça é que tem de descobrí-los nos fatos materiais da produção, tal e qual a realidade os oferece.
Qual é, nesse aspecto, a posição do socialismo moderno?
A ordem social vigente - verdade reconhecida hoje por quase todo o mundo - é obra das classes dominantes dos tempos modernos, da burguesia. O modo de produção característico da burguesia, ao qual desde Marx se dá o nome de modo capitalista de produção, era incompatível com os privilégios locais e dos estados, como o era com os vínculos interpessoais da ordem feudal. A burguesia lançou por terra a ordem feudal e levantou sobre suas ruínas o regime da sociedade burguesa, o império da livre concorrência, da liberdade de domicílio, da igualdade de direitos dos possuidores de mercadorias, e tantas outras maravilhas burguesas. Agora já podia desenvolver-se livremente o modo capitalista de produção. E ao chegarem o vapor e a nova maquinaria ferramental, transformando a antiga manufatura na grande indústria, as forças produtivas criadas e postas em movimento sob o comando da burguesia desenvolveram-se com uma velocidade Inaudita e em proporções até então desconhecidas. Mas, do mesmo modo que em seu tempo a manufatura e o artesanato, que continuava desenvolvendo-se sob sua influência, se chocavam com os entraves feudais das corporações, a grande indústria, ao chegar a um uivei de desenvolvimento mais alto, já não cabe no estreito marco em que é contida pelo modo de produção capitalista. As novas forças produtivas transbordam já da forma burguesa em que são exploradas, e esse conflito entre as forças produtivas e o modo de produção não é precisamente nascido na cabeça do homem - algo assim como o conflito entre o pecado original do homem e a Justiça divina - mas tem suas raízes nos fatos, na realidade objetiva, fora de nós, independentemente da vontade ou da atividade dos próprios homens que o provocaram. O socialismo moderno não é mais que o reflexo desse conflito material na consciência, sua projeção Ideal nas cabeças, a começar pelas da classe que sofre diretamente suas conseqüências: a classe operária.
Em que consiste esse conflito? Antes de sobrevir a produção capitalista, isto é, na Idade Média, dominava, com caráter geral, a pequena Indústria, baseada na propriedade privada do trabalhador sobre seus meios de produção: no campo, a agricultura corria a cargo de pequenos lavradores, livres ou vassalos; nas cidades, a indústria achava-se em mãos dos artesãos. Os meios de trabalho - a terra, os instrumentos agrícolas, a oficina, as ferramentas - eram meios de trabalho individual, destinados unicamente ao uso individual e, portanto, forçosamente, mesquinhos, diminutos, limitados. - Mas isso mesmo levava a que pertencessem, em geral, ao próprio produtor. O papel histórico do modo capitalista de produção e seu portador - a burguesia - consistiu precisamente em concentrar e desenvolver esses dispersos e mesquinhos meios de produção, transformando-os nas poderosas alavancas produtoras dos tempos atuais. Esse processo, que a burguesia vem desenvolvendo desde o século XV e que passa historicamente pelas três etapas da cooperação simples, a manufatura e a grande indústria, é
minuciosamente exposto por Marx na seção quarta de O Capital. Mas a burguesia, como fica também demonstrado nessa obra, não podia converter aqueles primitivos meios de produção em poderosas forças produtivas sem transformá-los de meios individuais de produção em meios sociais, -só manejáveis por uma coletividade de homens. A roca, O tear manual e o martelo do ferreiro foram substituídos pela máquina de fiar, pelo tear mecânico, pelo martelo movido a vapor; a oficina individual deu o lugar à fábrica, que impõe a cooperação de centenas e milhares de operários. E, com os meios de produção, transformou-se a própria produção, deixando de ser uma cadeia de atos Individuais para converter-se numa cadeia de atos sociais, e os produtos transformaram-se de produtos individuais em produtos sociais. O fio, as telas, os artigos de metal que agora safam da fábrica eram produto do trabalho coletivo de um grande número de operários, por cujas mãos tinha que passar sucessivamente para sua elaboração. Já ninguém podia dizer: isso foi feito por mim, esse produto é meu.
Mas onde a produção tem por forma principal um regime de- divisão social do trabalho criado paulatinamente, por impulso elementar, sem sujeição a plano algum, a produção imprime aos produtos a forma de mercadoria, cuja troca, compra e venda permitem aos diferentes produtores Individuais satisfazer suas diversas necessidades. E Isso era o que acontecia na Idade Média. O camponês, por exemplo, vendia ao artesão os produtos da terra, comprando-lhe em troca os artigos elaborados em sua oficina. Nessa sociedade de produtores Isolados, de produtores de mercadorias, veio a Introduzir-se mais tarde o novo modo de produção. Em meio àquela divisão elementar do trabalho, sem plano nem sistema, que imperava no seio de toda a sociedade, o novo modo de produção implantou a divisão planificada do trabalho dentro de cada fábrica; ao lado da produção individual surgiu a produção social Os produtos de ambas eram vendidos no mesmo mercado e, portanto, a preços aproximadamente iguais. Mas a organização planificada podia mais que a divisão elementar do trabalho; as fábricas em que o trabalho estava organizado socialmente elaboravam seus produtos mais baratos que os pequenos produtores Isolados. A produção Individual foi pouco a pouco sucumbindo em todos os campos e a produção social revolucionou todo o antigo modo de produção. Contudo, esse caráter revolucionário passava despercebido; tão despercebido que, pelo contrário, se Implantava com a única e exclusiva finalidade de aumentar e fomentar a produção de mercadorias. Nasceu diretamente ligada a certos setores de produção e troca de mercadorias que já vinham funcionando: o capital comercial, a indústria artesanal e o trabalho assalariado. E já que surgia como uma nova forma de produção de mercadorias, mantiveram-se em pleno vigor sob ela as formas de apropriação da produção de mercadorias.
Na produção de mercadorias, tal como se havia desenvolvido na Idade Média, não podia surgir o problema de a quem pertencer os produtos do trabalho. O produtor individual criava-os, geralmente, com matérias-primas de sua propriedade, produzidas não poucas vezes por ele mesmo, com seus próprios meios de trabalho e elaborados com seu próprio trabalho manual ou de sua família. Não necessitava, portanto, apropriar-se deles, pois já eram seus pelo simples fato de produzi-los. A propriedade dos produtos baseava-se, pois, no trabalho pessoal. E mesmo naqueles casos em que se empregava a ajuda alheia, esta era, em regra, acessória, e recebia freqüentemente, além do salário, outra compensação: o aprendiz e o oficial das corporações não trabalhavam menos pelo salário e pela comida do que para aprender a chegar a ser mestres algum dia. Sobrevêm a concentração dos meios de produção em grandes oficinas e manufaturas, sua transformação em meios de produção realmente sociais. Entretanto, esses meios de produção e seus produtos sociais foram considerados como se continuassem a ser o que eram antes: meios de produção e produtos individuais. E se até aqui o proprietário dos meios de trabalho se apropriara dos produtos, porque eram, geralmente, produtos seus e a ajuda constituía uma exceção, agora o proprietário dos meios de trabalho continuava apoderando-se do produto, embora já não fosse um
Na sociedade medieval, e sobretudo em seus primeiros séculos, a produção destinava-se principalmente ao consumo próprio, a satisfazer apenas às necessidades do produtor e sua família. E onde, como acontecia no campo, subsistiam relações pessoais de vassalagem, contribuía também para satisfazer às necessidades do senhor feudal. Não se produzia, pois, nenhuma troca, nem os produtos revestiam, portanto, o caráter de mercadorias. A família do lavrador produzia quase todos os objetos de que necessitava: utensílios, roupas e viveres. Só começou a produzir mercadorias quando começou a criar um excedente de produtos, depois de cobrir suas próprias necessidades e os tributos em espécie que devia pagar ao senhor feudal; esse excedente, lançado no intercâmbio social, no mercado, para sua venda, converteu-se em mercadoria. Os artesãos das cidades, por certo, tiveram que produzir para o mercado desde o primeiro momento. Mas também elaboravam eles próprios a maior parte dos produtos de que necessitavam para seu consumo; tinham suas hortas e seus pequenos campos, apascentavam seu gado nos campos comunais, que lhes forneciam também madeira e lenha; suas mulheres fiavam o linho e a lã, etc. A produção para a troca, a produção de mercadorias, achava-se em seu inicio. Por Isso o intercâmbio era limitado, o mercado era reduzido, o modo de produção era estável. Em face do exterior imperava o exclusivismo local; no interior, a associação local: a Marca no campo, as corporações nas cidades.
Mas ao estender-se a produção de mercadorias e, sobretudo, ao aparecer o modo capitalista de produção, as leis da produção de mercadorias, que até aqui haviam apenas dado sinais de vida, passam a funcionar de maneira aberta e p0-dêrosa. As antigas associações começam a perder força, as antigas fronteiras vão caindo por terra, os produtores vão convertendo-se mais e mais em produtores de mercadorias independentes e isolados. A anarquia da produção social sai à luz e se aguça cada vez mais. Mas o instrumento principal com que o modo de produção capitalista fomenta essa anarquia na produção social é precisamente o Inverso da anarquia: a crescente organização da produção com caráter social, dentro de cada estabelecimento de produção. Por esse meio, põe fim à velha estabilidade pacifica. Onde se implanta num ramo industrial, não tolera a seu lado nenhum dos velhos métodos. Onde se apodera da indústria artesanal, ela a destrói e aniquila. O terreno de trabalho transforma-se num campo de batalha. As grandes descobertas geográficas e as empresas de colonização que as acompanham multiplicam os mercados e aceleram o processo de transformação de oficina do artesão em manufatura. E a luta não eclode somente entre os produtores locais isolados; as contendas locais não adquirem envergadura nacional, e surgem as guerras comerciais dos séculos XVII e XVIII (10). Até que, por fim, a grande
indústria e a implantação do mercado mundial dão caráter universal à luta, ao mesmo tempo que lhe imprimem uma inaudita violência. Tanto entre os capitalistas individuais como entre industriais e países inteiros, a primazia das condições - natural ou artificialmente criadas - da produção decide a luta pela existência. O que sucumbe é esmagado sem piedade. É a luta darwinista da existência individual transplantada, com redobrada fúria, da natureza para a sociedade. As condições naturais de vida da besta convertem-se no ponto culminante do desenvolvimento humano. A contradição entre a produção social e a apropriação capitalista manifesta-se agora como antagonismo entre a organização da produção dentro de cada fábrica e a anarquia da produção no seio de toda a sociedade.
O modo capitalista de produção move-se nessas duas formas da contradição a ele inerente por suas próprias origens, descrevendo sem apelação aquele "círculo vicioso" já revelado por Fourier. Mas o que Fourier não podia ver ainda em sua época é que esse círculo se vai reduzindo gradualmente, que o movimento se desenvolve em espiral e tem de chegar necessariamente ao seu fira, como o movimento dos planetas. chocando-se com o centro. É a força propulsora da anarquia social da produção que converte a Imensa maioria dos homens, cada vez mais marcadamente, em proletários, e essas massas proletárias serão, por sua vez, as que, afinal, porão fim à anarquia da produção É a força propulsora da
anarquia social da produção que converte a capacidade infinita de aperfeiçoamento das máquinas num preceito imperativo, que obriga todo capitalista industrial a melhorar continuamente a sua maquinaria, sob pena de perecer. Mas melhorar a maquinaria equivale a tornar supérflua uma massa de trabalho humano. E assim como a implantação e o aumento quantitativo da maquinaria trouxeram consigo a substituição de milhões de operários manuais por um número reduzido de operários mecânicos, seu aperfeiçoamento determina a eliminação de um número cada vez maior de operários das máquinas e, em última instância, a criação de uma massa de operários disponíveis que ultrapassa a necessidade média de ocupação do capital, de um verdadeiro exército industrial de reserva, como eu já o chamara em 1845 (11), de um exército de trabalhadores disponíveis para as épocas em que a indústria trabalha a pleno
vapor e que logo nas crises que sobrevêm necessariamente depois desses períodos, é lançado às ruas, constituindo a todo momento uma grilheta amarrada aos pés da classe trabalhadora em sua luta pela existência contra o capital e um regulador para manter os salários no nível baixo correspondente às necessidades do capitalista. Assim, para dizê-lo com Marx, a maquinaria converteu-se na mais poderosa arma do capital contra a classe operária, um meio de trabalho que arranca constantemente os meios de vida das mãos do operário, acontecendo que o produto do próprio operário passa a ser o instrumento de sua escravização. Desse modo, a economia nos meios de trabalho leva consigo, desde o primeiro momento, o mais impiedoso desperdício da força de trabalho e a espoliação das condições normais da função mesma do trabalho. E a maquinaria, o recurso mais poderoso que se pôde criar para reduzir a jornada de trabalho, converte-se no mais infalível recurso para converter a vida inteira do operário e de sua família numa grande jornada disponível para a valorização do capital; ocorre, assim, que o excesso de trabalho de uns é a condição determinante da carência de trabalho de outros, e que a grande indústria, lançando-se pelo mundo inteiro, em desabalada carreira, à conquista de novos consumidores, reduz em sua própria casa o consumo das massas a um mínimo de fome e mina com isso o seu próprio mercado interno. "A lei que mantém constantemente o excesso relativo de população ou exército industrial de reserva em equilíbrio com o volume e a intensidade da acumulação do capital amarra o operário ao capital com ataduras mais fortes do que as cunhas com que Vulcano cravou Prometeu no rochedo. Isso dá origem a que a acumulação do capital corresponda a uma acumulação igual de miséria. A acumulação de riqueza em um dos polos determina no polo oposto, no polo da classe que produz o seu próprio produto como capital, uma acumulação igual de miséria, de tormentos de trabalho, de escravidão, de ignorância, de embrutecimento e de degradação moral." (Marx, O Capital, t. 1, cap. XXIII) E esperar do modo capitalista de produção uma distribuição diferente dos produtos seria o mesmo que esperar que os dois eletrodos de uma bateria, enquanto conectados com ela, não decomponham a água nem engendrem oxigênio no polo positivo e hidrogênio no polo negativo.
Vimos que a capacidade de aperfeiçoamento da maquinaria moderna, levada a seu limite máximo, converte-se, em virtude da anarquia da produção dentro da sociedade num preceito imperativo que obriga os capitalistas industriais, cada qual por si, a melhorar incessantemente a sua maquinaria, a tornar sempre mais poderosa a sua força de produção. Não menos imperativo é o preceito em que se converte para ele a mera possibilidade efetiva de dilatar sua órbita de produção. A enorme força de expansão da grande indústria, a cujo lado a expansão dos gases é uma brincadeira de crianças, revela-se hoje diante de nossos olhos como uma necessidade qualitativa e quantitativa de expansão, que zomba de todos os obstáculos que se lhe deparam. Esses obstáculos são os que lhe opõem o consumo, a saída, os mercados de que os produtos da grande indústria necessitam. Mas a capacidade extensiva e intensiva de expansão dos mercados obedece, por sua vez, a leis muito diferentes e que atuam de uma maneira muito menos enérgica. A expansão dos mercados não podo desenvolver-se ao mesmo ritmo que a da produção. A colisão torna-se inevitável, e como é impossível qualquer solução senão fazendo-se saltar o próprio modo
capitalista a considerá-las cada vez mais abertamente como forças produtivas sociais, na medida em que é possível dentro das relações capitalistas. Tanto os períodos de elevada pressão industrial, com sua desmedida expansão do crédito, como o próprio crack, com o desmoronamento de grandes empresas capitalistas, estimulam essa forma de socialização de grandes massas de meios de produção que encontramos nas diferentes categorias de sociedades anônimas. Alguns desses meios de produção e de comunicação já são por si tão gigantescos que excluem, como ocorre com as ferrovias, qualquer outra forma de exploração capitalista. Ao chegar a uma determinada fase de desenvolvimento já não basta tampouco essa forma; os grandes produtores nacionais de um ramo Industrial unem-se para formar um truste, um consórcio destinado a regular a produção; determinam a quantidade total que deve ser produzida, dividem-na entre eles e impõem, desse modo, um preço de venda de antemão fixado. Como, porém, esses trustes se desmoronam ao sobrevirem os primeiros ventos maus nos negócios, conduzem com isso a uma socialização ainda mais concentrada; todo o ramo industrial converte-se numa única grande sociedade anônima, e a concorrência interna dá lugar ao monopólio interno dessa sociedade única; assim aconteceu já em 1890 com a produção inglesa de álcalis, que na atualidade, depois da fusão de todas as quarenta e oito grandes fábricas do país, é explorada por uma só sociedade com direção única e um capital de 120 milhões de marcos.
Nos trustes, a livre concorrência transforma-se em monopólio e a produção sem plano da sociedade capitalista capitula ante a produção planificada e organizada da nascente sociedade socialista. É claro que, no momento, em proveito e benefício dos capitalistas. Mas aqui a exploração torna-se tão patente, que tem forçosamente de ser derrubada. Nenhum povo toleraria uma produção dirigida pelos trustes, uma exploração tão descarada da coletividade por uma pequena quadrilha de cortadores de cupões.
De um modo ou de outro, com ou sem trustes, o representante oficial da sociedade capitalista, o Estado, tem que acabar tomando a seu cargo o comando da produção (13) A necessidade a que corresponde essa
transformação de certas empresas em propriedade do Estado começa a manifestar-se nas. grandes empresas de transportes e comunicações, tais como o correio, o telégrafo e as ferrovias.
Além da incapacidade da burguesia para continuar dirigindo as forças produtivas modernas que as crises revelam, a transformação das grandes empresas de produção e transporte em sociedades anônimas, trustes e em propriedade do' Estado demonstra que a burguesia já não é indispensável para o desempenho dessas funções. Hoje, as funções sociais do capitalista estão todas a cargo de empregados assalariados, e toda a atividade social do capitalista se reduz a cobrar suas rendas, cortar seus cupões e jogar na bolsa, onde os capitalistas de toda espécie arrebatam, uns aos outro, os seus capitais. E se antes o modo capitalista de produção deslocava os operários, agora desloca também os capitalistas, lançando-os, do mesmo modo que aos operários, entre a população excedente; embora, por enquanto ainda não no exército industrial de reserva.
Mas as forças produtivas não perdem sua condição de capital ao converter-se em propriedade das sociedades anônimas e dos trustes ou em propriedade do Estado. No que se refere aos trustes e sociedades anônimas, é palpàvelmente claro. Por sua parte, o Estado moderno não é tampouco mais que uma organização criada pela sociedade burguesa para defender as condições exteriores gerais do modo capitalista de produção contra os atentados, tanto dos operários como dos capitalistas isolados. O Estado moderno, qualquer que seja a sua forma, é uma máquina essencialmente capitalista, é o Estado dos capitalistas, o capitalista coletivo Ideal. E quanto mais forças produtivas passe à sua propriedade tanto mais se converterá em capitalista coletivo e tanto maior quantidade de cidadãos explorará. Os operários continuam sendo operários assalariados, proletários. A relação capitalista, longe de ser abolida com essas
medidas, se aguça. Mas, ao chegar ao cume, esboroa-se. A propriedade do Estado sobre as forças produtivas não é solução do conflito, mas abriga já em seu seio o meio formal, o instrumento para chegar à solução.
Essa solução só pode residir em ser reconhecido de um modo efetivo o caráter social das forças produtivas modernas e, portanto, em harmonizar o modo de produção, de apropriação e de troca com o caráter social dos meios de produção. Para isso, não há senão um caminho: que a sociedade, abertamente e sem rodeios, tome posse dessas forças produtivas, que já não admitem outra direção a não ser a sua. Assim procedendo, o caráter social dos meios de produção e dos produtos, que hoje se volta contra os próprios produtores, rompendo periodicamente as fronteiras do modo de produção e de troca, e só pode impor-se com uma força e eficácia tão destruidoras como o impulso cego das leis naturais, será posto em vigor com plena consciência pelos produtores e se converterá, de causa constante de perturbações e cataclismas periódicos, na alavanca mais poderosa da própria produção.
As forças ativas da sociedade atuam, enquanto não as conhecemos e contamos com elas, exatamente como as forças da natureza: de modo cego violento e destruidor. Mas, uma vez conhecidas, logo que se saiba compreender sua ação, suas tendências e seus efeitos, está em nossas mãos o sujeitá-las cada vez mais à nossa vontade e, por meio delas, alcançar os fins propostos. Tal é o que ocorre, muito especialmente, com as gigantescas forças modernas da produção. Enquanto resistirmos obstinadamente a compreender sua natureza e seu caráter - e a essa compreensão se opõem o modo capitalista de produção e seus defensores -, essas forças atuarão apesar de nós, e nos dominarão, como bem ressaltamos. Em troca, assim que penetramos em sua natureza, essas forças, postas em mãos dos produtores associados, se converterão de tiranos demoníacos em servas submissas. É a mesma diferença que há entre o poder maléfico da eletricidade nos raios da tempestade e o poder benéfico da força elétrica dominada no telégrafo e no arco voltaico; a diferença que há entre o fogo destruidor e o fogo posto a serviço do homem. O dia em que as forças produtivas da sociedade moderna se submeterem ao regime congruente com a sua natureza por fim conhecida, a anarquia social da produção deixará o seu posto à regulamentação coletiva e organizada da produção, de acordo com as necessidades da sociedade e do indivíduo. E o regime capitalista de apropriação, em que o produto escraviza primeiro quem o cria e, em seguida, a quem dele se apropria, será substituído pelo regime de apropriação do produto que o caráter dos modernos meios de produção está reclamando: de um lado, apropriação diretamente social, como meio para manter e ampliar a produção; de outro lado, apropriação diretamente individual, como meio de vida e de proveito.
O modo capitalista de produção, ao converter mais e mais em proletários a imensa maioria dos indivíduos de cada pais, cria a força que, se não quiser perecer, está obrigada a fazer essa revolução. E, ao forçar cada vez mais a conversão dos grandes meios socializados de produção em propriedade do Estado, já indica por si mesmo o caminho pelo qual deve produzir-se essa revolução. O proletariado toma em suas mãos o Poder do Estado e principia por converter os meios de produção em propriedade do Estado. Mas, nesse mesmo ato, destrói-se a si próprio como proletariado, destruindo toda diferença e todo antagonismo de classes, e com isso o Estado como tal. A sociedade, que se movera até então entre antagonismos de classe, precisou do Estado, ou seja, de uma organização da classe exploradora correspondente para manter as condições externas de produção e, portanto, particularmente, para manter pela força a classe explorada nas condições de opressão (a escravidão, a servidão ou a vassalagem e o trabalho assalariado), determinadas pelo modo de produção existente. O Estado era o representante oficial de toda a sociedade, sua síntese num corpo social visível; mas o era só como Estado que, em sua época, representava toda a sociedade: na antiguidade era o Estado dos cidadãos escravistas, na Idade