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Gruppi - Tudo - comecou - com - Maquiavel - parte - 1 - pdf, Notas de estudo de Ciência Política

ciência politica

Tipologia: Notas de estudo

2017
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Compartilhado em 10/01/2017

sharlison-araujo-diniz-12
sharlison-araujo-diniz-12 🇧🇷

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TUDO COMEÇOU COM
MAQUIAVEL
(As concepções de Estado em
Marx, Engels, Lênin e Gramsci)
Este livro é uma rara combinação
do rigor científico no exame do surgi-
mento e da consolidação do Estado mo-
derno com' um texto enxuto de leitura
extremamente agradável.
Além das qualidades conhecidas de
Gruppi como, filósofo e escritor, cQntri-
bui para esse bom resultado a estrutura
didática deste trabalho, que, flaverda-
de, é um curso no sentido literal.
O livro foi feito apardr de uma cui-
dadosa edição, realizada pelo jornalista
Daria Canali (que também é autQr da
impecável tradução), das aulas proferi-
das por Luciano Gruppi no Instituto
Palmiro Togliatti de Roma.
AssÍm, este "TUDO COMEÇOU
COM MAQUIAVEL" consegue ser, ao
mesmo tempo, obra indispensável tanto
para quem realiza estúdo sistemático so-
bre as questões da política e do Estado
moderno, como também para os que
buscam através de uma leitura agradável
conhecer algumas questões essenciais do
seu tempo.
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TUDO COMEÇOU COM

MAQUIAVEL

(As concepções de Estado em

Marx, Engels, Lênin e Gramsci)

Este livro é uma rara combinação

do rigor científico no exame do surgi-

mento e da consolidação do Estado mo-

derno com' um texto enxuto de leitura

extremamente agradável.

Além das qualidades conhecidas de

Gruppi como, filósofo e escritor, cQntri-

bui para esse bom resultado a estrutura

didática deste trabalho, que, flaverda-

de, é um curso no sentido literal.

O livro foi feito apardr de uma cui-

dadosa edição, realizada pelo jornalista

Daria Canali (que também é autQr da

impecável tradução), das aulas proferi-

das por Luciano Gruppi no Instituto

Palmiro Togliatti de Roma.

AssÍm, este "TUDO COMEÇOU

COM MAQUIAVEL" consegue ser, ao

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PARTE I

 - II11 n - L - A CONCEPÇÃO DO ESTADO EM MARX E ENGELS SUMÁRIO 
  • ( )~pensadores políticos desde N. Maquiavel até G. W. F. Hegel
  • A rrítica de Marx
  • A origem do Estado segundo Engels
  • A i~ualdade jurídica
  • A extinção do Estado e a liberdade do homem
  • A ditadura do proletariado
  • Sobre a Comuna de Paris
  • PARTE
    • A CONCEPÇÃO DO ESTADO EM LÊNIN E GRAMSCI. - autsky "renegado" ou não?
  • O debate em torno de Bernstein
  • () Estado e a revolução - s Sovietes e a Comuna
    • Nem tudo deve ser "quebrado"
    • Democracia e ditadura do proletariado - ontra o burocratismo f
    • Desde Lênin até Gramsci : - s conselhos de fábrica
    • A necessidade de explorar o terreno nacional
  • Hegemonia e bloco histórico
  • A noção de intelectual
  • O partido como moderno "Príncipe"
  • Que tipo de pluralismo?
  • Referências bibliográficas

MEC UFRN Biblioteca Ceotral"Zila Mamede"

N° de (- i! ChamaJ!.a (i --... FOJnecedúr J j, Jl ~t'"i):ma I dA'e 4U1slçao. - C (,~J~ h\

Empenho

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Tradução e ediçiio do texto: Dario Canali Capa: L&PM Editores revisão: Suely Bastos Montagem: Antônio Aliardi

ISBN 85-254-0500-

j ~s c t.2/~ Registro

G892t Gruppi, Luciano Tudo Começou eõmMaquHwelL.Lu.ci.aHcr Gruppi; l1:adução , de Dario Canali. -- 14.ed. -- Porto Alegre: L&PM, 1996, 96 p.: 21 em.

I.Filosofia-Maquiavel. 2 Maquiavelismo. I. Título.

CDU 1 Maquiavel Filosofia de Maquiavel

Catalogação elaborada por Isabel A. Merlo, CRB 10/

© Lueiano Gruppi, 1980

Todos os direitos reservados à L&PM Editores S/A Matriz: Rua Padre Chagas, 185/802 - 90570-080 - Porto Alegre - RS Filial: Rua Mareelina, 672 - sala 2 - Lapa - 05044.0 10- São Paulo - SP

Impresso no Brasil Verão 1996

Nesse sentido, por exemplo, o Vaticano não é um Estado no ver- dadeirosentido da palavra. É um Estado por convenção, no sentido de que dispõe do poder e de um território (embora pequeno, mas isso não tem importância), mas não tem um povo. Essa é apenas uma descrição externa do Estado, não é uma explicação de sua natureza intrínseca. Em nossa pesquisa, vamos partir do Estado moderno. O Estado moderno - o Estado unitário dotado de um poder próprio indepen- dente de quaisquer outros poderes (voltaremos a falar sobre isso) - co- meça a nascer na segunda metade do século XV na França, Inglaterra e Espanha; posteriormente alastra-se por outros países europeus, entre os quais, muito mais tarde, a Itália. Como sempre acontece, só quando se formam os Estados no senti· do moderno da palavra é que nasce também uma reflexão sobre o Esta- do. Desde o começo de 1500 temos Nicolau Maquiavel, que é o pri- meiro a refletir sobre o Estado. No Príncipe de Maquiavel encontra- mos esta afirmação: "Todos os Estados, todas as dominações que tive- ram e têm o império sobre os homens foram e são repúblicas ou princi- pados". Também aqui o Estado consiste na dominação (poder) e o que es- tá sendo frisado é a dominação sobre os homens. O que interessa é esse grifo do elemento da dominação, e de uma dominação exercida mais sobre os homens do que sobre o território. Gramsci, em toda sua longa e cuidadosa reflexão sobre Maquia- vel, afirma que ele foi o teórico da formação dos Estados modernos. Com efeito, o pensamento de Maquiavel se molda numa Itália onde havia fracassado a revolução das Comunas (cidades-Estado), num país fragmentado em muitos Estados pequenos, e que está a caminho de perder sua independência nacional desde a invasão das tropas do rei francês Carlos VIII, em 1494. Maquiavel, refletindo sobre a experiên- cia de outros países (Espanha, Inglaterra e, principalmente, França), analisa a maneira como se deveria construir na Itália um Estado moder- no e unitário, graças à iniciativa do Príncipe. Maquiavel, na verdade, é um republicano e um democrata, liga- do à experiência da República de Florença, da Comuna florentina; ele afirma que nenhum príncipe, mesmo dos mais sábios, pode ser tão sá- bio como o povo. Apesar disso, ao escrever O príncipe, Maquiavel par- te da consciência do fato de que na Itália existe uma situação de érise de todas as velhas instituições e que só se poderá reconstruir o Estado, renovar a sociedade, se existir o poder absoluto de um príncipe que en- cabece esse movimento. Em outra obra de Maquiavel, onde faz comentários à história de Roma (Discursos sobre a pn'meira década de Tito Lívio), encontramos uma reflexão sobre a lenda de Rômulo e Remo: ele afirma que Rômulo

fez bem em matar Remo, pois no ato de fundar, ou de reconstruir, ou de reorgarnizar um Estado só uma pessoa deve mandar. Na Itália, tratava-se de fundar um Estado e de reconstituir uma organização política da sociedade italiana. Para tanto, Maquiavel pen- sa no poder de um príncipe, embora ele próprio seja republicano e do- mocrata, ligado emocionalmente à República de Florença. Uma fase importante da formação do Estadº-.-moJierno foi a rebe- lião da Inglaterra - mais exatamente de Henrique VIII - contra o poder do papa. A Igreja da Inglaterra separou-se da Igreja católica e Henrique VIII foi proclamado chefe dessa Igreja anglicana. Estamos

em 153l.

Claro está que é puramente circunstancial a questão do divórcio de Henrique VIII de sua esposa espanhola, Catarina de Aragão, para casar com Ana Bolena; esse divórcio foi recusado pelo papa por uma motivação política, pois ele não queria perder a amizade com a Espa- nha, que era então um grande império possuindo territórios também na Itália. Na verdade, as condições estavam maduras para a proclama- ção da plena independência inglesa, da plena soberania do Estado; e do rei que personifica, representa e realiza a soberania do Estado, declarando-se também chefe da Igreja anglicana (fórmula que, juridi- camente, será aperfeiçoada mais tarde). C.-om esse ato firma-se que o poder do Estado é absoluto, que a soberania estatal é absoluta e não depende de nenhuma outra autoridade, isto é, que não vem da autori- dade do papa; a soberania do monarca vem de sua própria condição de monarca, este não a recebe do papa. Proclama-se, assim, a absoluta au- tonomia e soberania do Estado. Por conseguinte, desde seu nascimento, o Estado moderno apre- senta dois elementos que diferem dos Estados do passado, que não existiam, por exemplo, nos Estados antigos dos gregos e dos romanos. A pn'meira característica do Estado moderno é essa autonomia, essa plena soberania do Estado, o qual não permite que sua autoridade de- penda de nenhuma outra autoridade. A segunda característica é a dis- tinção entre Estado e sociedade civil, que vai evidenciar-se no século XVII, principalmente na Inglaterra, com o ascenso da burguesia. O Es- tado se torna uma organização distinta da sociedade civil, embora seja ·xprçssão desta. Uma terceira característica diferencia o Estado moderno em rela- ~'ão àquele da Idade Média. O Estado medieval é propriedade do se- nhor, é um Estado patrimonial: é patrimônio do monarca, do mar- quês, do conde, do barão, ete. O senhor é dono do território, bem co- rno de tudo o que nele se encontra (homens e bens); pode vendê-lo, dá-lo de presente, cedê-lo em qualquer momento, como se fosse uma área de caça reservada.

No Estado moderno, pelo contrário, existe uma identificação ab- soluta entre o Estado e o monarca, o qual representa a soberania esta- tal. Mais tarde, em fins de 1600, o rei francês Luís XIV afirmava "L'État c'est moi" (o Estado sou eu), no sentido de que ele detinha I) poder absoluto; mas também de que ele identificava-se completamen- te no Estado.

Os pensadores políticos desde N. Maquiavel até G.W.F. Hegel

r Nicolau Maquiavel (1469-1527)

Maquiavel, ao refletir sobre a realidade de sua época, elaborou não uma teoria do Estado moderno, mas sim uma teoria de como se formam os Estados, de como na verdade se constitui o Estado moder- no. Isso é o começo da ciência política; ou, se quisermos, da teoria e da técnica da política entendida como uma disciplina autônoma, separa- da da moral e da religião. O Estado, para Maquiavel, não tem mais a função de assegurar a felicidade e a virtude, segundo afirmava Aristóteles. Também não é mais - como para os pensadores da Idade Média - uma preparação dos homens ao Reino de Deus. Para Maquiavel o Estado passa a ter sua~ próprias características, faz política, segue sua técnica e suas pró- prias leis. Logo no começo de O príncipe, Maquiavel escreve: "Como minha finalidade é a de escrever coisa útil para quem a entender, jul- guei mais conveniente acompanhar a realidade efetiva do que a imagi- nação sobre esta". Trata-se já da linha do pensamento experimental, na mesma senda de Leonardo da Vinci: as coisas como elas são, a reali- dade política e social como ela é, a verdade efetiva. Maquiavel acrescenta: "Muitos imaginam repúblicas e principa- dos que nunca foram vistos nem conhecidos realmente"; isto é, mui- tos imaginam Estados ideais, que no entanto não existem, tais como a República de Platão. "Pois grande é a diferença entre a maneira em que se vive e aquela em que se deveria viver; assim, quem deixar de fa- zer o que é de costume para fazer o que deveria ser feito encaminha-se mais para a ruína do que para sua salvação. Porque quem quiser comportar-se em todas as circunstâncias como um homem bom vai ter que perecer entre tantos que não são bons". Isso significa que devemos estudar as coisas como elas são e deve-

mos observar o que se pode e é necessário fazer, não aquilo que seria

certo fazer; pois quem quiser ser bom entre os maus fica arruinado. Enfim, é necessário levar em consideração a natureza do homem e atuar na realidade efetiva.

Dessa forma, Maquiavel retoma aqui um tema que já foi de Aris- tóteles: a política é a arte do possível, é a arte da realidade que pode ser efetivada, a qual leva em conta como as coisas estão e não como elas deveriam estar. Existe aqui uma distinção nítida entre política e moral, pois esta última é que se ocupa do que "deveria ser". A política leva em consideração uma natureza dos homens que, para Maquiavel, é imutável: assim a história teria altos e baixos, mas seria sempre a mesma, da mesma forma que a técnica da política (o que não corresponde à verdade). Maquiavel afirma: "Há uma dúvida se é melhor sermos amados do que temidos, ou vice-versa. Deve-se responder que gostaríamos de ter ambas as coisas, sermos amados e temidos; mas, como é difícil jun- tar as duas coisas, se tivermos que renunciar a uma delas, é muito mais seguro sermos temidos do que amados ... pois dos homens, em geral, podemos dizer o seguinte: eles são ingratos, volúveis, simuladores e dis- simuladores; eles furtam-se aos perigos e são ávidos de lucrar. Enquanto você fizer o bem para eles, são todos teus, oferecem-te seu próprio san- gue, suas posses, suas vidas, seus filhos. Isso tudo até o momento que você não tem necessidade. Mas, quando você precisar, eles viram as costas". E o príncipe que esperar gratidão por ter sido bondoso com os seus súditos, pelo contrário, será derrotado: "Os homens têm menos escrúpulo de ofender quem se faz amar do que quem se faz temer. Pois o amor depende de uma vinculação moral que os homens, sendo malvados, rompem; mas o temor é mantido por um medo de castigo que não nos abandona nunca". Por conseguinte, deve-se estabelecer o terror; o poder do Estado, o Estado moderno, funda-se no terror. Com isso, Maquiavel contradiz profundamente o que ele próprio havia escrito nos Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio: isto é, que o poder baseia-se na democracia, no consentimento do povo, ' entendendo-se como povo a burguesia do seu tempo. Mas agora Ma- quiavel pensa na construção de um Estado unitário e moderno, por- tanto do Estado absoluto, e descreve o que será o processo real da for- mação dos Estados unitários .. Maquiavel não se ocupa de moral, ele trata da política e estuda as leis específicas da política, começa a fundamentar a ciência política. Na verdade - como observou Hegel e, posteriormente, fizeram-no De Sanctis e Gramsci - Maquiavel funda uma nova moral que é'a do cidadão, do homem que constrói o Estado; uma moral imanente, mundana, que vive no relacionamento entre os homens. Não é mais a moral da alma individual, que deveria apresentar-se ao julgamento di- vino "formosa" e limpa.

jam completamente livres, existe entre eles uma luta que não garante a propriedade e, por conseguinte: tampouco uma liberdade durável. Locke afirma que os homens se juntam em sociedades políticas e submetem-se a um governo com a finalidade principal de conservarem suas propriedades. O estado natural (isto é, a falta de um Estado) não garante a propriedade. Ê necessário constituir um Estado que garanta o exercício da propriedade, a segurança da propriedade. Visando isso, estabelece-se entre os homens um contrato que ori- gina tanto a sociedade, como também o Estado (para Locke, as duas coisas vão juntas). Fica evidente a base burguesa dessa concepção. Já estamos numa sociedade em que nasceu o mercado, onde a relação en- tre os homens se dá entre os indivíduos que estabelecem entre si con- tratos de compra e de venda, de transferência de propriedades, ete. Es-

ta realidadeções mercantls ~ndividualista e de contrato, da sociedade expressa-se bur~pesa,~licerç,a?ana IdeologIa pohtlca, nas rela-na con-

cepção do Estado. O Estado também aí surge de um contrato. Para Hobbes, porém, esse contrato gera um Estado absoluto, enquanto para Locke o Estado pode ser feito e desfeito como qualquer contrato. Isto é, se o Estado ou o governo não respeitar o contrato, este vai ser desfeito. Portanto, o go- verno deve garantir determinadas liberdades: a propriedade, e tam- bém aquela margem de liberdade política e de segurança pessoal sem o que fica impossível o exercício da propriedade e a própria defesa da li- berdade. Já estão implícitos, aqui, os fundamentos de algumas liber- dades políticas que devem ser garantidas: a de assembléia, a da pala- vra, ete. Mas, em primeiro lugar, a liberdade de iniciativa econômica. Ê o típico individualismo burguês, no sentido de que o indivíduo humano preexistiria ao Estado, de que os homens partiriam de uma condição natural em que são indivíduos soltos (para Marx, pelo contrá- rio, o homem é um ser social e só torna-se homem na medida em que vive e trabalha em sociedade; de outra forma seria um animal, um bruto ). Segundo esses pensadores, o indivíduo existiu antes da sociedade humana e esta nasceria pelo contrato entre indivíduos preexistentes. Ora, do ponto 'de vista histórico, isso é pura fantasia, pois o homem só se torna homem vivendo em sociedade com outros homens, só organi- zando socialmente sua própria vida. Imaginar que um indivíduo possa ser homem antes de organizar-se em sociedade não passa de uma típica projeção ideológica do individualismo burguês. Ê no modo de produ- ção burguês que cada um individualmente se põe em relação com ou- trO indivíduo, sem ter consciência do caráter social dessas relações 'eco- nômicas. O Estado é soberano, mas sua autoridade vem somente do contr;1-

to que o faz nascer: este é o fundamento liberal, sem dúvida progres- sista, do pensamento de John Locke. O Estado não recebe sua sobera- nia de nenhuma outra autoridade. Ao contrário do que se poderia pensar, o liberal Locke não polemiza contra o absolutismo de Hobbes, mas sim contra outro autor inglês: Robert Filmer (1588-1653), segun- do o qual o poder estatal se originaria do poder divino. Locke entra em polêmica contra Filmer justamente para defender a plena autonomia, a absoluta soberania do Estado moderno, assim como pensava também Hobbes. A relação entre propriedade e liberdade é extremamente eviden- te: o poder supremo não pode tirar do homem uma parte de suas pro- priedades sem o seu consentimento. Pois a finalidade de um governo e de todos os que entram em sociedade é a conservação da propriedade. Isso pressupõe e exige que o povo tenha uma propriedade, sem o que deveríamos concluir que - ao entrar na sociedade - perde-se justa- mente aquilo que constitui o objetivo desse contrato. O Estado não pode tirar de ninguém o poder supremo sobre sua propriedade. Não é possível nenhum ato arbitrário do Estado que viole a propriedade: por exemplo, os impostos devem ser aprovados pelo Parlamento, o monarca não pode decretar impostos sem o consenti- mento do Parlamento, conforme tradição que já estava mnsolidada na Inglaterra - e assim por diante. Ê realmente estrita essa conexão entre propriedade e liberdade: a liberdade está em função da propriedade e esta é o alicerce da liberda- de burguesa, que nessa época era progressista. Repito, é a visão burguesa que está na base dessa concepção. No entanto, é interessante observar que para Locke já existe uma distinção entre sociedade política (o Estado) e sociedade civil (isto é, aquilo que no século XVIII passará a chamar-se de sociedade civil); por conseguin- te, entre público e privado. Em que sentido nasce esta distinção? Locke afirma que a propriedade é objeto de herança, pois o pai transmite a propriedade aos filhos; o poder político, ao contrário, não se transmite pela herança, deve ter uma origem democrática, parla- mentar. Ê interessante notar que, no Estado da Idade Média, transmitia-se pela herança quer a propriedade, quer o poder político: o rei transmi- tia para seus filhos a propriedade patrimonial do Estado e o poder; o latifundiário transmitia a terra, o marquês o marquesado, o conde o condado, isto é, todos os bens e todo o poder sobre esses bens, assim como também sobre os homens que viviam no condado e no marque- sado. Na Idade Média, a sociedade e o Estado (poder político) são inse- paráveis, estão entrelaçados, são transmitidos juntos; na sociedade

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burguesa moderna esses dois aspectos são separados, pois na sociedade civil existe a transmissão da propriedade, mas não há transmissão do poder político. A sociedade política e a sociedade civil obedecem a normas e leis diferentes. Todos os direitos de propriedade são exercidos na sociedade civil e o Estado não deve interferir, mas sim garantir e tutelar o livre exercíció da propriedade. A separação dessas duas esferas está também na base das próprias liberdades políticas, que são as garantias necessárias para tutelar em ní- vel político a propriedade e, portanto, a livre iniciativa econômica. Também o casamento é concebido por Locke como um contrato entre indivíduos. A mentalidade mercantil se reflete na concepção do

casamento: este pertence à sociedade civil, ao direito civU, não ao di- reito público, pois é um pacto exclusivamente privado. Não era assim, por exemplo, na sociedade antiga (por exemplo, na grega e na roma- na), onde o casamento era um fato público que tinha a ver com o Esta- do.

Emmanuel Kant (1724-1804)

Produz-se, então. uma separação formal, não real, entre o Estado e a sociedade civil. Temos assim, ao nível do poder estatal, um tipo di- ferente de manifestação da sociedade civil e das relações econômicas. A burguesia começa a formar seu próprio Estado. Isso pode ser visto mais nitidamente ainda em Kant. Kant parte de uma afirmação que leva em conta a revolução fran- cesa e as teorizações de J.J. Rousseau (como veremos mais adiante): Kant afirma que a soberania pertence ao povo, o que já é um princípio democrático. Em Locke não encontramos isso: a sociedade nasce de um contrato, mas uma clara afirmação de que a soberania é do povo não -existe (pelQ menos não claramente), sendo que em Kant isso é explíci- to. Mas, após essa consideração, Kant acrescenta que há cidadãos in- dependentes e cidadãos não-independentes. Aqueles independentes

  • os que podem exprimir uma opinião política, que podem decidir da política do Estado - são os cidadãos que não dependem de outros, isto é, os proprietários. Não se pode pensar que sejam capazes de uma opinião independente os servos das fazendas, ou os aprendizes das ofi- cinas artesanais. Por conseguinte, eles não podem ter direito de voto, nem de serem eleitos. Os direitos políticos ativos cabem somente aos proprietários. Este é o critério que vai nortear toda a concepção liberal. Na Itália do século passado, por exemplo, só tinha direito de eleger e de ser elei-

to quem pagasse um determinado nível de impostos, isto é, exclusiva- mente os proprietários. Essa distinção entre proprietários e não- proprietários é o alicerce do liberalismo e é expressa com extrema luci- dez por Kant. Após ter afirmado que a soberania pertence ao povo, na realidade Kant nega ao povo o efetivo exercício da soberania, pois o restringe so- mente a uma parte do povo. Aqui fica em plena evidência a relação entre propriedade e liberdade; só é livre quem for proprietário (trata- se essencialmente da propriedade da terra, quer para Kant, quer para Locke). A relação indissociável entre propriedade e liberdade é justamen- te a essência do liberalismo. Fala-se de povo num sentido geral mas depois, dentro desse povo, se faz uma discriminação entre quem pode exercer os direitos civis por ser independente - no sentido de proprietário, por conseguinte capaz de um pensamento independente - e quem não pode. Além disso, Kant chega à conclusão de que toda lei é tão sagrada, tão inviolável, que é crime até mesmo colocá-Ia em discussão. Dessa forma, após afirmar a soberania do povo, na realidade a nega. Adverte que o monarca nunca deixa de ser um justo intérprete da soberania do povo, do direito natural, e que as leis sempre correspondem ao direito natural, à própria soberania do povo. A lei sobrepõe-se assim à soberania do povo. É a típica visão libe- ral do Estado de Direito. A soberania do povo deve ser delimitada por algumas leis que estão acima dela e são invioláveis, indiscutíveis: o di- reito de propriedade, a liberdade de palavra, de expressão, de reunião, de associação. Liberdades que, na prática, são gozadas apenas por quem tiver recursos suficientes para usufruir delas. Na referida concepção liberal do Estado de Direito, destaca-se es- te elemento: o Estado é um Estado de Direito na medida que nele exis- tem alguns direitos que nunca podem ser colocados em discussão, e dentro deste marco exerce-se a soberania popular. ~ soberania popular depende e é delimitada por algun~ direitos que podemos definir per- manentes, eternos - direitos naturais. Estes são a expressão típica dos interesses da alta burguesia, ou da aristocracia que vai se aburguesan- do, as quais se afirmam como classes a partir desse direito fundamental de propriedade, defendido com a liberdade de palavra e de associação e com a representatividade do Parlamento.

jeanJacques Rousseau (1712-1778)

Vimos sinteticamente alguns momentos da concepção liberal, do surgimento do Estado moderno. Ao mesmo tempo, nasce a concepção

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burguesia francesa, da burguesia artesã da França; hessa questão existe uma continuidade. Em todo caso, Rousseau não soube indicar como se superada a propriedade privada. Outra contradição aparece quanto.à soberania da assembléia. A assembléia não deve delegar o seu poder, o povo nunca pode transferir sua soberania, nem que seja por um instante ..Conseqüentemente, há uma identidade entre sociedade política e sociedade civil. Mas o pró- prio Rousseau afirma que um povo não pode ficar sempre reunido em assembléia, pois existe uma dificuldade prática, real. Por outro lado; Rousseau formulava ideologicamente a experiên- cia da democracia de Genebra (a sua cidade), que se havia constituído depois da reforma calvinista. Era a: democracia, a assembléia, possível em uma pequena cidade, mas que, na prática, encontraria enorme di- ficuldade num Estado moderno que tentasse se organizar daquela for- ma. Roússeau tem em vista também a democracia da antiga Atenas, onde a soberania c3.bia à assembléia (eclesia). Nessa assembléia, na

época de, Péricles, eram sorteados 500 membros do conselho (bulé),

sorteados e não eleitos. A eleição já seria uma seleção; através do sor- teio, todos poderiam ser atingidos. O conselho dos 500 ficava reunido em sessão permanente com exceção dos dias de festividades religiosas. Os 500 eram sorteados na base de 50 para cada uma das tribos em que Atenas era dividida administrativamente; os 50 representantes de cada tribo reveZavam-se em turnos no desempenho das tarefas governamen- tais, mas só durante poucas semanas. Na prática, não havia separação entre os poderes legislativo, representativo e executivo; quase não exis- tia distinção entre sociedade civil e Estado. Mas esse modelo só era possível porque - enquanto os cidadãos estavam reunidos em assembléia, em conselho - havia quem traba- lhasse por eles: os escravos e os .. metecos." (estrangeiros que não eram cidadãos com plenos direitos, embora não fossem escravos). Uma de- mocracia do tipo da antiga Atenas pressupõe que o cidadão não traba- lhe, mas que outros trabalhem para ele. Também Rousseau se dava conta das dificuldades desse.modelo, pois escrevia: a democracia da qual eu falo não existe, nunca existiu e talvez nunca existirá; também essa condição natural a que devemos as- pirar - a do homem que não cede a sua soberania, a sua liberdade - não existe, talvez nunca existiu e nunca vai existir. É um objetivo ideal para o qual devemos tender. O próprio Rousseau percebe, então, o elemento utópico presente em sua concepção.

Benjamin Conrtant de Rebecque (1767-1830)

Mu.ito mais tarde, temos as teorias de Benjamin Constant. Nessa epoca, o liberalismo começa a ser um ideal no qual toda a Europa se inspira, após a experiência da Revolução Francesa. É o momento em que é derrotada a fase democrática da Revolução Francesa - a de Ro- bespierre, em 1793 - e tende-se a formar sociedades liberais do tipo que surgirá na França após a revolução de 1830, ou no Piemonte (e de- pois na Itália toda,com a unificação do país) em 1848. Na Inglaterra, a partir da revolução de 1689, sempre existirá uma sociedade liberal. O pensamento de B. Constant é interessante porqu~e.leJewl-ao mbimo de nitidez a..sepat:ação--e-fltJ.:~st-ado-lH0e-ietlack civil. Ao dis- tinguir entre as antigas democracias romana e ateniente, por um lado, e o liberalismo moderno, por outro, Constant salienta que ,a liberdade dos antigos exercia-se na esfera pública da sociedade, isto é, no Estado, nao na esfera particular. A vida privada era então vinculante; ao passo

que a liberdadedo e, em relação do cidadão ao Estado, se_exer~e essencia~ment: e mUlto fraca, lOconSlstente, na esfera d~ priva- parcIal. Pergunta Benjamin Constant: "O que entende hoje como liber- dade um francês, um inglês, um habitante dos Estados Unidos da América? Para cada um deles, liberdade é o direito de submeter-se apenas à lei; de não ser preso, ou mantido na cadeia, ou condenado à morte, nem sofrer maus tratos de qualquer outro tipo pela vontade ar- bitrária de um ou mais indivíduos. Para cada um deles é o direito de xpressar sua própria opinião, de exercer o seu trabalho, de dispor da ua propriedade e até abusar dela, de ir e vir sem pedir licença, etc. Fi- nalmente, é o direito para cada um de exercer sua influência sobre a dministração do governo, quer concorrendo à nomeação de todos ou IRuns de seus funcionários, quer com reclamações, petições, pedidos que a autoridade é forçada a levar em consideração de alguma forma". Benjamin Constant observa, em outro trecho, que a liberdade do homem moderno é grande na esfera do privado; ao passo que, na esfe- ra do público, sua liberdade é limitada, pois só limitadamente poçle influenciar a condução do governo. Para os antigos, acontecia o contrário. A liberdade dos antigos onsistia em exercer coletivamente (mas diretamente, sem delegá-Ias O governo) muitas funções da soberania: em deliberar na praça públi- a sobre a guerra e a paz; em concluir com os Estados estrangeiros tra- tados de aliança; em votar as leis e pronunciar julgamentos; em exami- nar os balanços e os atos dos magistrados, levá-Ios diante de todo o po- vo. acusá-Ios, condená-Ios ou absolvê-Ios. Na esfera do público, então, eram enormes os direitos dos cida- dAos da república romana e da democracia ateniense. O governo não

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decidia da paz e da guerra fora da assembléia dos cidadãos, sendo que os governos modernos prescindem desta. Isso era o que os antigos entendiam como liberdade. Mas, ao mes- mo tempo, eles admitiam que essa liberdade coletiva fosse compatível com a completa subordinação do indivíduo à autoridade do conjunto social. Seria inútil (ou quase) procurar entre os antigos a possibilidade de gozar dessas vantagens que fazem parte da liberdade dos modernos. To<;lasas ações privadas eram submetidas a uma vigilância severa, nada era· concedido à independência individual, nem nas opiniões pessoais nem nas atividades econômicas; e sobretudo em matéria de religião (não havia liberdade de consciência). Todas as atividades econômicas eram controladas, etc. Toda a esfera do privado era absorvida pela esfe- ra pública, pela vida política. Em lugar disso, para os modernos - diz Benjamin Constal).t, a li- berdade é exercida principalmente na esfera do privado, ela f reivindi- cada na esfera particular. É nítida a distinção que Benjamin Constant faz entre sociedade civil e sociedade estatal (sociedade política); ele afirma que os direitos da liberdade são gozados principalmente na vida particular, pois são direitos de iniciativa econômica (direitos da burguesia). Daí toda sua polêmica contra Rousseau: a igualdade de Rousseau destrói toda liber- dade, por conseguinte suas concepções devem ser rejeitadas como uma grande ameaça à liberdade. Constant defende assim a identificação en- tre propriedade e liberdade, isto é, a liberdade como diferença, e não como igualdade.

Charles Tocqueville (1805-1859)

Esseé o dilema que enfrentará, em pleno século XIX, o grande li- beral Tocqueville. Ele é suficientemente inteligente e realista para com- preender que a democracia está destinada a vingar, que a igualdade ju- rídica vai ,se realizar. Mas ele pergunta se a igualdade para a qual ten- de a humanidade não vai destruir a liberdade, isto é, se conseguiremos ao mesmo tempo realizar a igualdade e salvar a humanidade; enfim, se a igualdade não vai se transformar em tirania. As duas diferentes concepções progressistas do Estado, que se afir- mam com muito esforço na Europa da época, são as seguintes: a) a concepção liberal, que defende a correlação entre proprieda- de e liberdade (isto é, a liberdade exige a desigualdade); b) a concepção democrática, segundo a qual a liberdade baseia-se na igualdade, mas essencialmente na igualdade jurídica (embora Rousseau chegue a colocar o problema da pr,,>priedade). A corrente democrática, que se afirmou na Revolução Francesa

com Robespierre, na verdade foi derrotada na história da Europa. Nes- te continente, após as .décadas de 1860 e 1870, teremos regimes libe- rais; teremos uma fusão de liberalismo e democracia, isto é, uma am- pliação do sufrágio universal, da igualdade jurídica. Uma mistura de liberalismo e democracia que, no entanto, reafirma sempre o direito da propriedade, tutela sempre a iniciativa econômica e o desenvolvi- mento capitalista.

Benedetto Croce (1866-1952)

Benedetto Croce, em sua Históna da Europa, na década de 1930, vai esclarecer as coisas a partir de seu ponto de vista liberal. Numa épo- ca em que já não há mais distinção entre Estado de Direito liberal e Es- tado democrático - isto é, não se faz distinção entre liberalismo e de- mocracia pois, na realidade, os dois elementos estão entrelaçados -, Croce destaca que se tratam de duas concepções muito diferentes. Croce afirma: apesar da afinidade de alguns elementos do catoli- cismo e das monarquias absolutas com o liberalismo, e apesar da dis- ponibilidade do liberalismo para aceitá-Ios e fazê-Ios seus, esses dois sistemas se mantêm inimigos dele e vice-versa. O liberalismo é inimigo da monarquia absoluta e do clericalismo, bem como de um terceiro sis- tema, de uma terceira fé que parecia confundir-se (ou pelo menos entrelaçar-se) com o liberalismo: o ideal democrático. No século XIX parecia que o ideal democrático se fundiria com o ideal liberal. A concordância entre liberalismo e democracia se dava não somente ao negativo (pela oposição comum contra o clericalismo e o absolutismo), mas também ao positivo (através da comum exigência de liberdade individual, de igualdade civil e política e de soberania popular). Mas é justamente aqui que se escondia a diversidade, segun- do Croce. Com efeito, os democratas e os liberais concebiam de manei- ras diferentes o indivíduo, a igualdade, a soberania, o povo. Para os democratas, os indivíduos eram seres iguais, a quem - como eles diziam - devia-se propiciar uma igualdade de fato. Já para os liberais os indivíduos eram pessoas iguais como homens, portanto sempre dignos de respeito, mas não eram iguais como cidadãos. O li- beral Croce, por exemplo, considera a liberdade de movimento e de competição como uma função das capacidades: ele não compreende que, na realidade, trata-se de uma competição de forças econômicas. Além disso, pára os liberais, o povo não era uma soma de forças iguais (conforme pensavam 0$ democratas), mas sim um mecanismo diferenciado, válido em cada uma de suas peças e em sua associação, com,uma unidade complexa, com governantes e governados, com clas- ses dirigentes abertas e móveis mas sempre necessárias para as tarefas

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mocracia burgilesa ou do liberalismo - começa logo depois da Revo- lução Francesa, com Babeuf e Buonarroti. COloeça com o comunismo utópico: que demonstra como essa liberdade e igualdade de que falava a Revolução Francesa não eram realmente universais (como afirmava-se ou almejava-se durante a revolução): era liberdade e igualdade só para uma parcela da sociedade, para o setor economicamente dominante, isto é, para a burguesia. Os milaneses, durante o período da ocupação napoleônica, co- r;nentavam esse fato com uma expressão popular: "Liberté, Êgalité, Fraternité, os franceses de carruagem e nós a pé". A tese típica, central, do comunismo utópico é que após a rev0lu- ção (que deu a igualdade jurídica) deve-se desencadear a revolução econômico-social: esta vai dar a igualdade efetiva, sem o que a igual- dade jurídica é pura aparência, que esconde e aliás consolida as desi- gualdades reais. Nessa maneira de expressar-se há uma distinção esquemática en- tre revolução política e revolução econômico-social, pois a Revolução Francesa foi ao mesmo tempo uma revolução política e econômico- social, naturalr;nenteem favor da burguesia. Mas o sentido dessa dis- tinção está claro: após a igualdade diante da lei, a igualdade jurídica, devemos ganhar a igualdade efetiva, a econômico-social. Marx, no mo- mento em que adere ao comunismo, parte dessa distinção, ainda es- quemática. Em sua obra A questão judia (1843), que indica o começo de sua adesão ao comunismo, evidencia-se a verdadeira relação entre a socie- dade civil (entendida como o conjunto das relações econômicas) e a so- ciedade política (o Estado). Marx viu então a conexão entre as duas, se~ paradas pelo pensamento liberal; elas estão entrelaçadas, uma é a ex- pressão da outrá. A sociedade política, o Estado, é expressão da socie- dade ciYiI, isto é, das relações de produção que nela se instalaram. Por outro lado, Gramsci, que fala muito em sociedade civil e so- ciedade política, se dá conta que esta é só uma distinção de método, não orgânica, isto é; qlie na realidade esses dois elementos estão estri- tamente ligados, não separados. Marx partiu justamente da visão dessa conexão entre sociedade ci- vil e sociedade estatal, em seu escrito Crítica da filosofia hegeliana do Direito Público (comentário à obra de Hegel, Traços fundamentais da Filosofia do Direito, de 1827). Essa obra de Marx é de 1842, mas foi publicada pela primeira vez só em 1927. Nessa época, Marx ainda não era comunista, mas sim um democrata radical. Mesmo assim, ao criti- car Hegel, ele já estava no caminho que iria levá-Io ao comunismo. O sumo dessa crítica à concepção hegelianado Estado foi sinteti- zado pelo próprio Marx no segundo prefácio (1859) de sua obra Con-

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tn'buição para a crítica da Economia Política (Roma, Editori Riuniti, 1974, pp. 745-749). Marx afirma: "Minha pesquisa chegou à condu- são que as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, não po_ dem ser compreendidas por si só, nem pela assim chamada evolução geral do espírito humano, mas têm suas raízes nas relações materiais da existência - cujo conjunto Hegel inclui notermo de sociedade civil, seguindo o exemplo dos ingleses e franceses do século XVIII - e que a anatomia da sociedade civil deve ser procurada na Economia Política". Por conseguinte, não é o Estado que funda a sociedade civil, que absorve em si a sociedade civil, como afirmava Hegel; pelo contrário, é a sociedade civil, entendida como o conjunto das relações econômicas (essas relações econômicas são justamente a anatomia da sociedade ci- vil), que explica o surgimento do Estado, seu caráter, a natureza de suas leis, e assim por diante. Através da crítica à democracia burguesa contida em A questão judia, Marx chega em 1845 às conclusões de sua obra A ideologia ale- mã, que não foi publicada na época. Aqui ele elaborou a essência de seu método/concepção e descobriu a correlação existente entre o de- senvolvimento das relações econômicas, o Estado e as ideologias. No famoso segundo prefácio de 1859, acima citado, Marx define essa relação de maneira límpida, embora sumária: "O conjunto dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, isto é, a base real sobre a qual levanta-se uma superestrutura jurídica e po- lítica, à qual correspondfm formas determinadas, da consciência social". Uma vez afirmada assim a relação de determinação entre relações econômicas e formas políticas, Estado, Direito e a própria cultura, te- mos um método que permite entender o que é o Estado, como e por que ele surge. Isso permite fundamentar cientificamente uma teoria do Estado. Não é o Estado que determina a estrutura econômica, mas sim o contrário. Dizer que o Estado é uma superestrutura não significa afirmar que seja uma coisa acessória ou supérflua. Tampouco significa separar

. o Estado da sociedade civil. Na verdade a sociedade civil, isto é, as rela-. ções econômicas, vivem no quadro de um Estado determinado, na me- dida que o Estado garante aquelas relações econômicas. Pode-se dizer que o Estado é parte essencial da estrutura econômica, é um elemento essencial da estrutura econômica, justamente porque a garante. O Estado escravista garante a dominação sobre os escravos, o Esta- do feudal garante as corporações; e o Estado capita,lista garante o pre- domínio das relações da.produção capitalistas, protege-as, liberta-as dos laços de subordinação à renda fundiária absoluta (ou renda parasi- tária), 'garante a reprodução ampliada do capital, a acumulação capita

lista: Portanto é um elemento que faz parte integrante das próprias re- lações de produção capitalistas, mas é determinado por estas. É só pensar, por exemplo, na abolição da servidão da gleba como condição para o desenvolvimento capitalista. Em alguns países, o fim da servidão da gleba Se deu antes do ascensoda burguesia; em outros, pelo contrário, foi decidida.pelo Estado, visando permitir um desen- volvimento de tipo burguês capitalista, como aconteceu na Rússia on- de a servidão 'da gleba foi abolida em 1861. Visando analisar a relação existente entre o modo de produção ca- pitãlista e o Estado da burguesia, Marx planejava concluir O capital com um capítulo dedicado às classes sociais, e outro capítulo dedicado ao Estado. Embora inacabado, O capital- ao definir a anatomia eco- nômica da sociedade capitalista - mostra o esqueleto que sustenta o Estado burguês e fundamenta uma teoria científica do Estado. Marx não pôde elaborar essa teoria, mas ela deve ser buscada em O capital. A teoria marxista do Estado está implícita na análise das relações eco- nômicas. Em Marx falta uma elaboração orgânica do problema do Estado, da teoria do ES,tado. Mas ele forneceu a teoria fundamental, a partir da qual pode-se construir a teoria do Estado: a estrutura econômica está na base do próprio Estado. Esse é o fundamento de onde devemos par- tIC.

A origem do Estado segundo Friedrich Engels (1820-1895)

Podemos perguntar-nos se existe essa teoria orgânica do Estado em Engels, que escreveu sobre esse tema uma obra famosa, aconselha-

da por Lênin como texto fundamental para a teoria do Estado: A ori-

gem dafamília, da propriedade privada e do Estado (1894). Engels escreveu esse livro baseando-se nas anota.ções que Marx ti- nha redigido ao ler uma obra do etnólogo norte-americano Lewis Henry Morgan (1818-1881), A sociedade antiga, que estudava a vida tribal dos índios Iroqueses, na América do Norte. Era a época em que nascia o que se chama de etnologia e antropologra. Com base nessas anotações de Marx e no texto de Morgan, a ela- boração de Engels vai além da questão do Estado: mostra a conexão histórica entre família, propriedade e Estado, identificando assim a origem do Estado. Essa questão é muito importante, pois os fenômenos da realidade podem ser compreendidos examinando-<;>s a partir de 'suas origens, co- mo afirmava Gianbattista Vico (1668-1774). Mas, para chegarmos a compreender a gênese, a origem do Estado, é preciso examinar a forma completamente desenvolvida do Estado moderno capitalista. De fato~

I ~

Engels parte do conhecimento do Estado capitalista para. buscar na his- tória sua origem e sua gênese: partir da anatomia do homem para che- gar à anatomia do macaco, como dizia Marx no primeiro prefácio (1857) à Contn"buição para a crítica da Economia Política (op. cit., p. 713 e seguintes). Antes de mais nada, Engels afirma que a sociedade não é a soma das famílias que a constituem, como pensava Aristóteles e como pensou-se durante séculos até Engels. A formação da sociedade e da fa- mília são duas coisas qUe marcham juntas, pois a sociedade orga~iza as relações entre os sexos para sua própria vida e sobrevivência, e princi- palmente visando suas necessidades econômicas.

O momento em que surge a sOciedade em suas formas mais pri-

mitivas coincide com a regulamentação das relações sexuais segundo normas. determinadas. Evidentemente é um absurdo pensar que a fa- mília exista antes da sociedade. A sociedade originária, a tribo - diz Engels - ainda não conhe- ce a propriedade privada, a'subordinação da mulher, e a descendência é por linha materna. Engels fala de matriarcado, não no sentido de· preponderância. das mulheres sobre os homens, mas no da descendên- cia; a relação parental entre mãe e filhos é evidentemente muito mais clara do que a entre pai e filhos, portanto é lógico partir da descendên- cia por linha materna. Mas quando surge a propriedade? A propriedade privada surge da caça, quando nasce a criaçãp do gado. Eis que o caçador se torna pro- prietário de rebanhos, e quem exerce a caça é homem. Já existia na tri- bo essa divisão Clementar do trabalho, pela qual a caça era atribuição prevalente de homens. Com a formação da propriedade privada, afirma-se também a descendência por linha paterna, ou patriarcado: a sucessão da herança é de p ••.ipara filho. Começa, nessa época, a subordinação da mulher. Cria-se uma ordem patriarcal da sociedade, a famíliâ baseada na auto- ridade do pai. Isso é típico da sociedade grega e da sociedade romana.

O pai é a autoridade suprema. Com o termo latino "família"

entendia-se a propriedade: os escravos, o gado, a propriedade em seu

conjunto. O pater famtlias tinha autoridade absoluta sobre a vida dos

filhos e da mulher, além da dos escravos. Mas, com o desenvolvimento da economia, surgem diferenciações econômicas, de classes, no interior de toda a descendência familiar (de toda a estirpe, de toda a parentela, pois como "família" entende-se todos os parentes, não somente pais e filhos). Então, a ordem gentílica

  • isto é, a descendência, a "gens", a "família" dissolve-se, entra em crise. É• justamente com a crise da "gens", do ordenamento gentílico,

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rel:l.ções de produção ),e posição política, poder político; não existia a distinção entre sociedade civil e sociedade política que surge com a so- ciedade burguesa.

A igualdade jurídica

;} Numa democracia burguesa todos são declaraQos iguais diante da lei, pois em termos jurídicos os direitos de cada cidadão são iguais aos de qualquer outro cidadão. O burguês, na sociedade medieval, não podia ser representado numa assembléia; mas todos podem ser eleitos no Parlamento a partir do momento que se afirma o sufrágio qniversal, e a lei é igual para todos. Isso, diz Marx, é um progresso enorme. Façamos um exemplo atual: é sem dúvida um passo adiante enor- me que o voto de Gianni Agnelli tenha peso um, assim como o de quaisquer operários da FIAT; e que, para ser eleito, ele precise do mes- mo número de votos que seria necessário a um dependente de suas fá- bricas; e que, se Agnelli cometer um crime, ele tenha que aparecer diante do mesmo tribunal onde compareceria um operário da FIAT, e seja julgado com base nas mesmas leis. Mas, na realidade, não é bem aSSIm. Sabemos muito bem que, se um Agnelli disser que quer ser eleito senador, ele vai ser eleito de qualquer jeito, etc. A diversidade subs- tancial é a diversidade nas relações de produção. Então, diz Marx, para que serve essa igualdade jurídica? Serve para separar o elemento da vi- da econômica do homem (a colocação do homem has relações de pro- dução) da sua figura jurídica de cidadão, e faz desta uma abstração. Esses cidadãos todos iguais diante da lei são, na verdade, uma abstração: você, operário, como cidadão é igual ao seu patrão; más, quando você entra na fábrica, não é mais igual ao patrão, antes pelo contrário, você deixa de ser um cidadão. Você conquista os seus direi- tos de cidadão ao preço de lutas infindáveis e, no entanto, nunca existe igualdade de fato entre o patrão da firma e você, operário. Essa igual- dade é forjada criando uma figura formal jurídica, abstrata (a do cida- dão), que cinde a unidade do homem, a unidade entre o homem no trabalho e o mesmo homem diante da lei. O cidadão é uma hipótese jurídica, uma forma jurídica. O problema, então, é o de desencadear uma revolução econômico-social após a revolução política, a fim de estabelecer uma igualdade econômico-social, de reunificar os dois aspectos, de cidadão e de trabalhador; a fim de reconquistar a unidade do homem, que é homem também quando trabalha, isto é, em sua posição nas relações de produção e de troça .. Enfim, é preciso que uma efetiva liberdade acompanhe a noção

burguesa de liberdade. A liberdade do burguês, diz Marx, considera o homem como uma mônada, isto é, como uma unidade por si só, fe- chada, incomunicável; ela só concebe indivíduos separados, como se eles não vivessem em sociedade. Ao passo que, na verdade, eles só vi- vem em sociedade. Há um trecho em que Marx diz: só vivendo em sociedade oho- mem pode isolar-se, ele não poderia isolar-se se não vivesse em socie-

dade. Até o isolamento se torna possível graças à sociedade. Então é

preciso sair dessa concepção da libe'rdade como uma função puramente individualista; é preciso compreender que, muito pelo contrário, a li- berdade é cooperação, solidariedade, trabalho coletivo. Enfim, é preci- so passar da figura do cidadão à do companheiro ou, se quisermos, da figura do trabalhador explorado à do produtor (como diria posterior- mente Gramsci). Para reconquistar a unidade do homem é preciso su- perar esse dualismo,essa separação entre hom~m e cidadão. Já vimos acima que o'primeiro passo da revolução operária é a ele- vação do proletariado ao nível de classe dominante, é a conquista da democracia. Para o proletariado, o poder e a conquista da democracia coincidem. O processo revolucionário de transformação da sociedade

exige exatamente a conquista do poder. Diz Marx: .'O proletariado vai

empregar a sua supremacia política para arrancar gradualmente das mãos da burguesia todo o capital, para concentrar todos os instrumen- tos de produção nas mãos do Estado - isto é, do próprio proletariado organizado como classe d0t!Ünante - e para aumentar com a máxima rapidez possível a massa das forças produtivas". No Manifesto do Partido Comunista se diz que todo governo bur- guês não passa de um comitê de negócios da classe dominante, da bur- guesia. Em lugar disso, o poder da classe operária consiste na apropria- ção do Estado pelo proletariado, que socializa os meios de produção e dirige um processo que mais tarde será chamado de ditadura do prole- tariado; esta vai levar à sociedade comunista. Finalmente, quando as diferenças de classes tiverem desaparecido no decorrer desse processo, quando o poder da classe operária tiver ar- rancado da burguesia a propriedade privada dos meios de produção - estes serão concentrados completamente nas mãos da comunidade -, então o poder público perderá seu caráter polltico, isto é, não será mais uma dominação sobre os homens, um poder estatal. O poder público, no verdadeiro sentido da palavra, é o poder or- ganizado de uma classe para oprimir outra. Mas, ao desaparecerem as diferenças de classes graças à apropriação coletiva dos meios de produ- ção - instalando o comunismo que é a sociedade sem classes -, desa- parece a razão da existência do Estado, o Estado extingue-se.

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Aextinção do Estado ea liberdade do homem

o proletariado, em sua luta contra a burguesia, se constitui neces- sariamente em classe e, através da revolução, transforma-se em classe dominante; dessa forma, ele destrói pela y-iolência as velhas relações de produção e, junto com estas, também destrói as condições de existên- cia dos antagonismos de classes, as classes em geral. Por conseguinte, destrói também· sua própria dominação de classe. A classe operária parte de sua dominação de classe para eliminar a propriedade privada, para tornar social a propriedade dos meios de produção; ela elimina as classes antagônicas, elimina as dif~renças de classes, elimina até a si mesma como classe, pois todos se tornam traba- lhadores. Portanto, elimina a razão últirpa da existência do Estado: •'No lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e seus anta- gonismos de classes, substitui-se uma associação na qual o livre desen- volvimento de cada um é a condição do livre desenvolvimento de to- dos". Só no comunismo existirá a liberdade pleria e o pleno desenvolvi- mento da personalidade, graças à propriedade social dos meios de pro- dução. Ao passo que a propriedade privada de um priva 0S demais, oprime-os, e impede a liberdade. O objetivo que Marx quer alcançar, como partidário do comunismo, é a liberdade: não a justiça ou a igual- dade, como às vezes se costuma dizer, mas a liberdade. A igualdade social é a condição para o mais amplo desenvolvimento da liberdade. Por oUtro lado Engels, em seus Princípios do comunismo (1847), já escrevia: ':0 comunismo é a criação das condições para a libertação do homem". O objetivo é então a libertação, é sempre aquele da li- berdade .. Para chegarmos a essa sociedade sem cl_asses,portanto sem Estado, é preciso atravessar uma fase de transição. Deve ser uma fase de-transi- ção dirigida pelo poder estatal do proletariado. Marx não fala ainda em ditadura do proletariado e não coloca ainda a necessidade de destroçar o Estado burguês; esses elementos não aparecem ainda no Mamfesto do Partido Comunista (1848). Por outro lado, é interessante ver de que forma Marx esboça o de- senvolvimentb da sociedade, do Estado burguês, por exemplo em seu livro As lutas de classes na França (1850), onde descreve os aconteci- melltos franceses entre 1848 e 1850. Afirma Marx: a derrota do prole- tariado pela burguesia em junho permitiu o nascimento da república burguesa de 1848; mas, por outro lado, obrigou esse regime a apresentar-se em sua forma autêntica, isto é, como um Estado cuja fi- nalidade explícita é a de perpetuar a dominação do capital, a escravi- dão assalariada.

Como a república parlamentar francesa de junho de 1848 nasceu de uma repressão sangrenta contra a classe operária, o 'caráter de classe do Estado burguês capitalista fica completamente desmascarado. Rea- parece aqui um conceito que já vimos estar contido no Mamfesto do Partido Comunista: com a formação da grande indústria e do mercado mundial, a burguesia apoderou-se finalmente do poder político exclu- sivo no moderno Estado represe.nrativo. O poder político do Estado moderno não passa de um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa. Em outro trecho Marx observa que, na França de 1848-1849. diante de quaisquer reivindicações, gritava-se continuamente: "Isso é socialismo!" Por quê? Porque a burguesia compreendia perfeitamente que todas as ar- mas por ela forjadas contra o feudalismo viravam suas pontas contra ela. Via 'que todas as formas de luta que havia ideado se levantavam contra si, que todas as chamadas liberdades e instituições progressistas burguesas atacavam e ameaçavam a sua dominação de classe, quer em sua base social, quer em sua cúpula política; isto é, haviam-se tornado socialistas. Até a reivindicação da liberdade política, da democracia, se virava contra ela na medida que favorecia a maioria, pois era o campo de luta da classe operária. Então a própria burguesia se volta contra a democra- cia burguesa e, visando conservar o seu poder, considera necessária a ditadura de Luís BonapaC1;.e.{Napoleão I1I). Além disso, em outra obra posterior ao golpe do futuro Nàpoleão III (O 18 Brumário de Luís Bonaparte), Marx escreve: "Esse poder-exe- cutivo, com sua enorme organização burocrática e militar, com seu mecanismo complicado e artificial, com um exército de meio milhão de funcionários ao lado de outro exército de meio milhão de soldados

  • esse corpo parasitário medonho que envolve como um invólucro to- do o organismo da sociedade francesa e entop'e todos os seus poros -, criou-se no período da monarquia absoluta, no fim do sistema feudal, aperfeiçoando o centralismo estatal". Centralismo este que foi aperfei- çoado mais ainda com Nepoleão I, depois com Napoleão I1I, etc. Eis um processo de contínua centralização burocrática, militar e policial do Estado, o qual se torna sempre mais um corpo separado que oprime toda a sociedade, mas ao mesmo tempo exprime o poder da classe dominante. O conceito de poder estatal toma forma como mecanismo de opressão, que voltaremos a encontrar mais tarde. Nasce daí a necessi- dade de opor à ditadura da burguesia uma ditadura do proletariado_ Marx não define o Estado democrático como ditadura da burguesia, es- \ ta definição ,será de Lênin. Mas esse conceito de mecanismo opressivo

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