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Livro - Equações Diferenciais Ordinárias - nível Mestrado, Notas de estudo de Matemática

Este livro é para aluno que estão no mestrado em matemática.

Tipologia: Notas de estudo

2021

Compartilhado em 26/05/2021

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Equac¸˜oes Diferenciais Ordin´arias

Jorge Sotomayor

  • Pref´acio
  • Introdu¸c˜ao
  • 1 Existˆencia e unicidade de solu¸c˜oes
    • 1.1 Preliminares
    • 1.2 O problema de Cauchy
    • 1.3 Exemplos
    • 1.4 Teoremas de Picard e de Peano
    • 1.5 Solu¸c˜oes m´aximas
    • 1.6 Sistemas e equa¸c˜oes diferenciais de ordem superior
    • 1.7 Exerc´ıcios
  • 2 Equa¸c˜oes Diferenciais Lineares
    • 2.1 Preliminares
    • 2.2 Propriedades gerais
    • 2.3 Equa¸c˜oes lineares com coeficientes constantes
    • 2.4 Sistemas bidimensionais simples
    • 2.5 Conjuga¸c˜ao de sistemas lineares
      • 2.5.1 Introdu¸c˜ao
    • 2.6 Classifica¸c˜ao dos sistemas lineares hiperb´olicos
    • 2.7 Sistemas lineares complexos
    • 2.8 Oscila¸c˜oes mecˆanicas e el´etricas
    • 2.9 Exerc´ıcios
  • 3 Teoria Qualitativa das EDOs: Aspectos Gerais
    • 3.1 Campos vetoriais e fluxos
    • 3.2 Diferenciabilidade dos fluxos de campos vetoriais
    • 3.3 Retrato de fase de um campo vetorial
      • vetoriais 3.4 Equivalˆencia e conjuga¸c˜ao de campos
    • 3.5 Estrutura local dos pontos singulares hiperb´olicos
    • 3.6 Estrutura local de ´orbitas peri´odicas 4 Sum´ario
      • 3.6.1 A transforma¸c˜ao de Poincar´e
      • 3.6.2 Ciclos limites no plano
      • 3.6.3 Derivadas da Transforma¸c˜ao de Poincar´e
    • 3.7 Fluxos lineares no toro
    • 3.8 Exerc´ıcios
  • 4 Teorema de Poincar´e - Bendixson
    • 4.1 Conjuntos α-limite e ω-limite de uma ´orbita
    • 4.2 O Teorema de Poincar´e-Bendixson
    • 4.3 Aplica¸c˜oes
      • 4.3.1 Pontos singulares no interior de uma ´orbita peri´odica
      • 4.3.2 As equa¸c˜oes de Lienard e van der Pol
    • 4.4 Exerc´ıcios
  • 5 Estabilidade no sentido de Liapounov
    • 5.1 Estabilidade de Liapounov
    • 5.2 O Crit´erio de Liapounov
    • 5.3 Teorema de Cetaev
    • 5.4 Exerc´ıcios
  • Referˆencias Bibliogr´aficas

Pref´acio

Este livro desenvolve a Teoria das Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias. Isto ´e o estudo das propriedades gerais das fun¸c˜oes que s˜ao solu¸c˜oes deste tipo de equa¸c˜oes, a partir de hip´oteses amplas sobre as fun¸c˜oes que as definem, usando recursos da An´alise Matem´atica Cl´assica e da Algebra Linear, sem recorrer necessariamente ´ a forma particular das equa¸c˜oes. A Teoria das Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias se distingue tanto por sua riqueza de ideias e m´etodos como por sua aplicabilidade. O leitor obter´a de seu estudo uma experiˆencia de grande valor formativo. Ter´a a oportunidade de integrar, num ´unico corpo, os fundamentos da An´alise Matem´atica Cl´assica, Algebra Linear e Elementos´ de Topologia, disciplinas ami´ude apresentadas isoladamente. Os trˆes primeiros cap´ıtulos, devotados respectivamentea Existˆencia e Unicidade, as Equa¸c˜oes Lineares ea Teoria Qualitativa, s˜ao basicamente auto-suficientes e podem ser abordados diretamente. Ao nosso ver, estes enfoques independentes d˜ao uma vis˜ao mais ampla dos m´etodos dispon´ıveis. Todos os cap´ıtulos cont´em exerc´ıcios propostos. Quando n˜ao rotineiros, estes representam complementos, aplica¸c˜oes ou abordagens diferentes para a teoria; al- gumas vezes, eles visam fornecer informa¸c˜oes sobre assuntos correlatos importantes que n˜ao foram tratados com plenitude no texto. Recomendamos ao leitor abordar e pensar em todos os exerc´ıcios propostos. Quase sempre inclu´ımos sugest˜oes para aqueles menos imediatos. Esta ´e uma vers˜ao abreviada e revista de parte do j´a esgotado “Li¸c˜oes de Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias”, [23]. Ela cont´em os assuntos mais estudados na maioria dos cursos de mestrado e in´ıcio de doutorado em prestigiosos centros de p´os-gradua¸c˜ao no Brasil. A longa lista de agradecimentos de 1979, devo acrescentar com prazer os nomes` de Ronaldo A. Garcia, Daniel C. Panazzolo, Luis F. Mello, Anderson L. Maciel e Mariana S. V. Garcia pela invalor´avel ajuda prestada na diagrama¸c˜ao, arte gr´afica e revis˜ao da edi¸c˜ao deste texto.

Jorge Sotomayor S˜ao Paulo, novembro de 2009.

Introdu¸c˜ao

Uma equa¸c˜ao da forma F (t, x, x(1), x(2),... , x(n)) = 0, onde a inc´ognita x ´e fun¸c˜ao de uma vari´avel, chama-se equa¸c˜ao diferencial ordin´aria. Muitas das leis gerais da F´ısica, Biologia e Economia, entre outras Ciˆencias, encontram sua express˜ao geral nestas equa¸c˜oes. Por outro lado, in´umeras quest˜oes dentro da pr´opria Matem´atica (por exemplo na Geometria Diferencial e no C´alculo de Varia¸c˜oes) formuladas con- venientemente se reduzem a estas equa¸c˜oes. As equa¸c˜oes diferenciais evolu´ıram dos m´etodos do C´alculo Diferencial e Inte- gral, descobertos por Newton e Leibnitz, e elaborados no ´ultimo quarto do s´eculo XVII para resolver problemas motivados por considera¸c˜oes de natureza f´ısica ou geom´etrica. Estes m´etodos conduziram gradualmente a consolida¸c˜ao de um novo ramo da Matem´atica, que a meados do s´eculo XVIII transformou–se uma disciplina independente. Neste est´agio, a procura e an´alise de solu¸c˜oes tornou-se uma finalidade pr´opria. Tamb´em nesta ´epoca ficaram conhecidos os m´etodos elementares de resolu¸c˜ao – inte- gra¸c˜ao – de v´arios tipos especiais de equa¸c˜oes diferenciais, entre elas as de vari´aveis separ´aveis (x′^ = f (t)g(x)), as lineares (x′^ = a(t)x+b(t)), as de Bernoulli (x′^ = p(x)+ q(t)x′′), as de Clairaut (f (x′) + tx′^ = x), as de Riccati (x′^ = a 0 (t) + a 1 (t)x + a 2 (t)x^2 ), todas estudadas at´e nossos dias em cursos introdut´orios. A natureza daquilo que era considerado solu¸c˜ao foi evoluindo gradualmente, num processo que acompanhou e,as vezes, propiciou o desenvolvimento do pr´opio con- ceito de fun¸c˜ao. Inicialmente buscavam-se solu¸c˜oes expressas em termos de fun¸c˜oes elementares: polinomiais, racionais, trigonom´etricas, exponenciais. Posteriormente, passou-se a considerar satisfat´orio expressar a solu¸c˜ao em termos de uma integral – quadratura – contendo opera¸c˜oes elementares envolvendo estas fun¸c˜oes. Quando estes procedimentos deixaram de resolver os problemas focalizados, surgiram a solu¸c˜oes expressas por meio de s´eries infinitas (ainda sem a preocupa¸c˜ao com a an´alise da convergˆencia). Em fins do s´eculo XVIII a Teoria das Equa¸c˜oes Diferenciais se transformou numa das disciplinas matem´aticas mais importantes e o m´etodo mais efetivo para pesquisa cient´ıfica. As contribui¸c˜oes de Euler, Lagrange, Laplace, entre outros, expandiram notavelmente o conhecimento dentro do C´alculo de Varia¸c˜oes, Mecˆanica Celeste, Teoria das Oscila¸c˜oes, Elasticidade, Dinˆamica dos Fluidos, etc.

8 Sum´ario

No s´eculo XIX os fundamentos da An´alise Matem´atica experimentaram uma revis˜ao e reformula¸c˜ao gerais visando maior rigor e exatid˜ao. Assim, os conceitos de limite, derivada, convergˆencia de s´eries de fun¸c˜oes e outros processos infinitos foram definidos em termos aritm´eticos. A integral, que no s´eculo anterior era con- cebida como primitiva (ou inversa da deriva¸c˜ao), foi definida como limite de somas. Este movimento de fundamenta¸c˜ao n˜ao deixou de atingir as equa¸c˜oes diferenciais. Enquanto no s´eculo anterior procurava-se a solu¸c˜ao geral para uma dada equa¸c˜ao diferencial, passou-se a considerar como quest˜ao pr´evia em cada problema a exis- tˆencia e unicidade de solu¸c˜oes satisfazendo dados iniciais. Este ´e o Problema de Cauchy, ponto no qual o presente livro se inicia. O cap´ıtulo 1 estuda o Problema de Cauchy e quest˜oes correlatas. O cap´ıtulo 2 aborda as propriedades b´asicas dos sistemas de equa¸c˜oes diferenciais lineares, classe para a qual um conhecimento bastante completo ´e poss´ıvel. Um marco de referˆencia fundamental na evolu¸c˜ao das equa¸c˜oes ´e o trabalho de Poincar´e M´emoire sur les courbes d´efinies par une ´equation differentielle, de 1881, no qual s˜ao lan¸cadas as bases da Teoria Qualitativa das Equa¸c˜oes Diferenciais. Esta teoria visa a descri¸c˜ao global das solu¸c˜oes e o efeito nelas de pequenas perturba¸c˜oes das condi¸c˜oes iniciais e de parˆametros. Os cap´ıtulos 3, 4 e 5 s˜ao devotados respectivamente aos fundamentos da Teoria Qualitativa das Equa¸c˜oes Diferenciais, ao Teorema de Poincar´e – Bendixson e a Estabilidade de Liapounov. Os cap´ıtulos que seguem cobrem boa parte dos assuntos cl´assicos de equa¸c˜oes diferenciais que tem conservado atualidade por sua aplicabilidade e interesse te´orico. Eles formam um subconjunto pr´oprio do j´a esgotado e mais abrangente “Li¸c˜oes” [23]. Esta sele¸c˜ao obedece `a possibilidade da leitura da presente vers˜ao ser completada num curso semestral. Numerosos caminhos promissores se abrem a partir dos passos iniciais dados neste livro. Alguns foram abordados em [23], outros, visando a dimens˜ao supe- rior, podem ser encontrados em Palis e Melo [17], assuntos de interesse para as aplica¸c˜oes podem ser vistos em Chicone [3]. Para um estudo inicial da estabilidade estrutural das equa¸c˜oes diferenciais e de suas bifurca¸c˜oes (a quebra da estabilidade estrutural) recomendamos Andronov e Leontovich [1], Sotomayor [24] e Roussarie [20]. As rela¸c˜oes entre a Geometria Cl´assica e as Equa¸c˜oes Diferenciais podem ser estudadas em Sotomayor e Gutierrez [8] e Sotomayor e Garcia [7]. Citaremos aqui poucas obras de uma longa lista que evolui muito rapidamente e deve ser atualizada permanentemente.

10 1. Existˆencia e unicidade de solu¸c˜oes

1.1 Preliminares

Sejam Ω um subconjunto aberto do espa¸co R × E, onde R ´e a reta real e E = Rn^ um espa¸co euclidiano n-dimensional. Um ponto de R × E ser´a denotado por (t, x), t ∈ R e x = (x 1 , x 2 ,... , xn) em E; salvo men¸c˜ao em contr´ario, adotaremos em R × E a norma:√ |(t, x)| = max{|t|, |x|}, onde |x| denota uma norma em E, por exemplo |x| = x^21 + x^22 + · · · + x^2 n ou |x| = max{|x 1 |,... , |xn|} ou ainda |x| = |x 1 | + · · · + |xn|. Seja f : Ω → E uma aplica¸c˜ao cont´ınua e seja I um intervalo n˜ao degenerado na reta, isto ´e, um subconjunto conexo de R n˜ao reduzido a um ponto. O intervalo I pode ser fechado, aberto, semi aberto, limitado ou n˜ao.

Defini¸c˜ao 1.1 Uma fun¸c˜ao diferenci´avel ϕ : I → E chama-se solu¸c˜ao da equa¸c˜ao

dx dt

= f (t, x) (1.1)

no intervalo I se:

(i) o gr´afico de ϕ em I, isto ´e, {(t, ϕ(t)); t ∈ I} est´a contido em Ω e

(ii) d dϕt (t) = f (t, ϕ(t)) para todo t ∈ I. Se t ´e um ponto extremo do intervalo, a derivada ´e a derivada lateral respectiva.

A equa¸c˜ao (1.1) chama-se equa¸c˜ao diferencial ordin´aria de primeira ordem e ´e denotada abreviadamente por x′^ = f (t, x). Sejam fi : Ω → R, i = 1,... , n as componentes de f ; ϕ = (ϕ 1 ,... , ϕn) com ϕi : I → R ´e uma solu¸c˜ao de (1.1) se, e somente se, cada ϕi ´e diferenci´avel em I, (t, ϕ 1 (t),... , ϕn(t)) ∈ Ω para todo t ∈ I e        

      

dϕ 1 dt

(t) = f 1 (t, ϕ 1 (t),... , ϕn(t))

dϕ 2 dt

(t) = f 2 (t, ϕ 1 (t),... , ϕn(t))

dϕn dt

(t) = fn(t, ϕ 1 (t),... , ϕn(t))

para todo t ∈ I. Por esta raz˜ao diz-se que a equa¸c˜ao diferencial “vetorial” (1.1) ´e equivalente ao sistema de equa¸c˜oes diferenciais escalares

dxi dt

= fi(t, x 1 ,... , xn), i = 1,... , n. (1. 1 ′′)

1.2 O problema de Cauchy 11

1.2 O problema de Cauchy

Consideremos inicialmente dois exemplos.

(1) Ω = I × R, f (t, x) = g(t), onde g ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua no intervalo I; ϕ ´e uma solu¸c˜ao de x′^ = g(t) em I se, e somente se, ϕ(t) = c +

∫ (^) t t 0 g(s)ds^ onde t 0 ∈ I e c ´e uma constante.

(2) Ω = R^2 , f (t, x) = 3x^2 /^3. Para todo c ∈ R a fun¸c˜ao ϕc : R → R dada por

ϕc(t) =

(t − c)^3 , t ≥ c 0 , t ≤ c

´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao x′^ = 3x^2 /^3 em I = R, como se vˆe por verifica¸c˜ao direta das condi¸c˜oes (i) e (ii) da defini¸c˜ao 1.1.

Mas a fun¸c˜ao constante ϕ = 0 tamb´em ´e solu¸c˜ao desta equa¸c˜ao. Ver Figura 1. Estes exemplos ilustram o fato de que as equa¸c˜oes diferenciais possuem em geral uma infinidade de solu¸c˜oes. Por´em, no exemplo 1, por cada ponto de Ω passa uma unica solu¸´ c˜ao; isto ´e, dado (t 0 , x 0 ) ∈ Ω existe uma ´unica solu¸c˜ao ϕ tal que ϕ(t 0 ) = x 0.

t^ t

x x

c

c 1

c 1

c 2

t 0 0 c 2 x′^ = g(t) (^) x′^ = 3 x^23

ϕc

ϕc 1

ϕc 1

ϕc 2 ϕc 2

ϕ 0

Figura 1.1: Exemplos: (1) a esquerda; (2)a direita

O mesmo n˜ao acontece no exemplo 2; neste caso para cada ponto da forma (t 0 , 0) existe uma infinidade de solu¸c˜oes passando por ele. Sob hip´oteses bem gerais sobre f – por exemplo, se f e ∂f ∂x s˜ao cont´ınuas em Ω – existe uma, e s´o uma, solu¸c˜ao de (1.1) num intervalo que cont´em t 0 e tal que ϕ(t 0 ) = x 0. Uma tal ϕ ser´a chamada de solu¸c˜ao do problema com dados iniciais (t 0 , x 0 ) para a equa¸c˜ao (1.1). Este problema ´e tamb´em conhecido como problema de Cauchy e ser´a denotado abreviadamente por

x′^ = f (t, x), x(t 0 ) = x 0. (1.2)

1.3 Exemplos 13

Se ϕ ´e uma solu¸c˜ao de (1.4), ent˜ao

ϕ′(t) = f (ϕ(t)) e ϕ(t 0 ) = x 0 , (1.5)

donde segue-se ϕ′(t) f (ϕ(t))

Se F : (a 1 , a 2 ) → R ´e dada por

F (x) =

∫ (^) x

x 0

dξ f (ξ)

vˆe-se que F ′(x) = (^) f (^1 x) 6 = 0 em (a 1 , a 2 ), provando que F ´e invers´ıvel e aplica (a 1 , a 2 )

num intervalo (b 1 , b 2 ) onde F −^1 est´a definida. De (1.5) e (1.6) resulta que

ϕ′(t) f (ϕ(t))

= F ′(ϕ(t))ϕ′(t),

ou seja, (F ◦ ϕ)′(t) = 1.

Integrando ambos os lados entre t 0 e t obtemos

F (ϕ(t)) − F (ϕ(t 0 )) = t − t 0

e como F (ϕ(t 0 )) = 0, F (ϕ(t)) = t − t 0.

Logo, a solu¸c˜ao de (1.4) ´e dada por

ϕ(t) = F −^1 (t − t 0 ), t ∈ (t 0 + b 1 , t 0 + b 2 ).

Vˆe-se facilmente que esta ´e a ´unica solu¸c˜ao.

Compare este exemplo com o exemplo 2 da se¸c˜ao 1.2, onde n˜ao existe unicidade de solu¸c˜oes e com a equa¸c˜ao do tipo x′^ = g(t) apresentada no exemplo 1 da se¸c˜ao 1.2. Note tamb´em que (^) ddxt = (^) f (^1 x) , que ´e deste tipo, tem solu¸c˜oes que s˜ao inversas das

solu¸c˜oes de (1.4) e vice-versa.

Exemplo 1.3 Equa¸c˜oes de vari´aveis separ´aveis. Consideremos o problema de Cauchy

x′^ = g(t)f (x), x(t 0 ) = x 0 , (1.7)

14 1. Existˆencia e unicidade de solu¸c˜oes

b 1 b 1 + t 0 b 2 t 0 b 2 + t 0 t

ϕ(t)

a 1

x 0

a 2

Figura 1.3: Ilustra¸c˜ao do Exemplo 1.

onde g e f s˜ao cont´ınuas em intervalos abertos (t 1 , t 2 ) e (a 1 , a 2 ), respectivamente, e f n˜ao se anula em (a 1 , a 2 ). Procedendo como no exemplo anterior (que ´e o caso particular e que g(t) ≡ 1), se ϕ ´e solu¸c˜ao de (1.7), obtemos

ϕ′(t) = g(t)f (ϕ(t)),

ou seja, definindo F (x) =

∫ (^) x x 0 dξ/f^ (ξ) obtemos,

g(t) = F ′(ϕ(t))ϕ′(t) = (F ◦ ϕ)′(t).

Integrando ambos os lados entre t 0 e t resulta

γ(t) =

∫ (^) t

t 0

g(τ )dτ = F (ϕ(t))

e da´ı, no intervalo I contendo t 0 tal que t ∈ I implica b 1 <

∫ (^) t t 0 g(τ^ )dτ < b^2 , a solu¸c˜ao

´e ϕ(t) = F −^1

t t 0 g(τ^ )dτ

O leitor deve verificar que esta ´e a ´unica solu¸c˜ao de (1.7). Observe que a solu¸c˜ao obtida ´e dada implicitamente, para constantes de inte- gra¸c˜ao apropriadas, pela rela¸c˜ao

∫ g(t)dt =

dx f (x)

entre as integrais indefinidas.

16 1. Existˆencia e unicidade de solu¸c˜oes

Para ver qual ´e a mudan¸ca de vari´aveis que transforma (1.8) em (1.10), basta derivar (1.9) e substituir em x′^ = a(t)x + b(t). Obtemos ent˜ao

c′^ exp

[∫ (^) t

t 0

a(τ )dτ

]

  • ca(t) exp

[∫ (^) t

t 0

a(τ )dτ

]

= ca(t) exp

[∫ (^) t

t 0

a(τ )dτ

]

  • b(t),

isto ´e,

c′^ = b(t) exp

[

∫ (^) t

t 0

a(τ )dτ

]

O termo “varia¸c˜ao de parˆametros” deriva do fato de c(t) ≡ x 0 no caso homogˆeneo.

Exemplo 1.5 Redu¸c˜ao a uma equa¸c˜ao linear complexa. Consideremos agora um sistema de duas equa¸c˜oes lineares e o problema de Cauchy (^)  

x′^ = α(t)x − β(t)y + δ(t), y′^ = β(t)x + α(t)y + η(t), x(t 0 ) = x 0 , y(t 0 ) = y 0 ,

onde α, β, δ e η s˜ao fun¸c˜oes cont´ınuas num intervalo (t 1 , t 2 ) que cont´em o ponto t 0. Este problema n˜ao difere em seu tratamento formal do exemplo anterior. Intro- duzindo nota¸c˜ao complexa, z = x + iy, a(t) = α(t) + iβ(t) e b(t) = δ(t) + iη(t), vemos que (1.11) se escreve

z′^ = a(t)z + b(t), z(t 0 ) = z 0 ,

cuja ´unica solu¸c˜ao ´e, para t ∈ (t 1 , t 2 ),

ϕ(t) = γ(t) exp

[∫ (^) t

t 0

a(τ )dτ

]

onde γ(t) = z 0 +

∫ (^) t t 0 b(s) exp

[

∫ (^) s t 0 a(τ^ )dτ

]

ds. Ilustremos o caso homogˆeneo (δ ≡ η ≡ 0), com coeficientes constantes (α(t) ≡ α e β(t) ≡ β) e com t 0 = 0. Neste caso, ϕ(t) = z 0 eαteiβt. A figura 1.5 d´a uma ideia das possibilidades para v´arios valores de α e β.

1.4 Teoremas de Picard e de Peano 17

x

x x

x

y

y y

y

z 0

z 0

z 0

z 0

a) β > 0 , α < 0 b) β < 0 , α > 0

c) β > 0 , α = 0 d) β = 0, α < 0

Figura 1.5: Ilustra¸c˜ao do Exemplo 1.

1.4 Teoremas de Picard e de Peano

Uma aplica¸c˜ao f : Ω ⊆ R × Rn^ → Rn^ chama-se Lipschitziana em Ω relativamente `a segunda vari´avel ou, simplesmente, Lipschitziana, se existe uma constante K tal que |f (t, x) − f (t, y)| ≤ K|x − y|

para todos (t, x), (t, y) ∈ Ω. Uma K nestas condi¸c˜oes chama-se de constante de Lipschitz de f. Por exemplo, se f admite derivada parcial em rela¸c˜ao `a segunda vari´avel, D 2 f , com ‖D 2 f ‖ ≤ K em Ω e Ωt = {x; (t, x) ∈ Ω} ´e um conjunto convexo para todo t, ent˜ao f ´e Lipschitziana em Ω e K ´e sua constante de Lipschitz. De fato, pelo teorema do valor m´edio,

|f (t, x) − f (t, y)| ≤ { sup 0 <θ< 1

|D 2 f (t, θx + (1 − θ)y)|} |x − y| ≤ K|x − y|.

A aplica¸c˜ao f diz-se localmente Lipschitziana em Ω se cada (t 0 , x 0 ) tem uma vizinhan¸ca V = V (t 0 , x 0 ) tal que f |V ´e Lipschitziana em V. Por exemplo, se f admite derivada parcial em rela¸c˜ao `a segunda vari´avel, D 2 f , cont´ınua em Ω, ent˜ao f ´e localmente Lipschitziana em Ω. Isto resulta de se aplicar o argumento anterior a vizinhan¸cas convexas V onde D 2 f ´e limitada. Lembramos a seguir o Lema da Contra¸c˜ao e, principalmente, um corol´ario deste que ser´a usado na demonstra¸c˜ao do Teorema 1.8, abaixo.

1.4 Teoremas de Picard e de Peano 19

E

R

(t 0 , x 0 )

x 0

b

t 0

t 0 − a (^) t 0 − α t 0 + α t 0 + a

Figura 1.6: Teorema de Picard

Demonstra¸c˜ao Seja X = C(Iα, Bb) o espa¸co m´etrico completo das fun¸c˜oes cont´ı- nuas ϕ : Iα → Bb, com a m´etrica uniforme

d(ϕ 1 , ϕ 2 ) = sup t∈Iα

|ϕ 1 (t) − ϕ 2 (t)|.

Para ϕ ∈ X, seja F (ϕ) : Iα → E definida por

F (ϕ)(t) = x 0 +

∫ (^) t

t 0

f (s, ϕ(s))ds, t ∈ Iα.

Assim a correspondˆencia ϕ → F (ϕ) define uma fun¸c˜ao F com as seguintes propriedades:

(1) F (X) ⊂ X;

(2) F n^ ´e uma contra¸c˜ao, para n suficientemente grande.

Ou seja, F : X → X ´e uma fun¸c˜ao tal que F n^ ´e uma contra¸c˜ao. De fato, para todo t ∈ Iα,

|F (ϕ)(t) − x 0 | =

∫ (^) t

t 0

f (s, ϕ(s))ds

∣ ≤^ M α^ ≤^ b.

Isto prova (1). Quanto a (2), para todo par ϕ 1 , ϕ 2 ∈ X e todo n ≥ 0,

|F n(ϕ 1 )(t) − F n(ϕ 2 )(t)| ≤

Kn|t − t 0 |n n!

d(ϕ 1 , ϕ 2 ), t ∈ Iα, (∗)

20 1. Existˆencia e unicidade de solu¸c˜oes

onde K ´e a constante de Lipschitz de f. Verificamos esta desigualdade por indu¸c˜ao em n. Para n = 0 ela ´e ´obvia. Suponhamos que ´e v´alida para k. Ent˜ao,

|F k+1(ϕ 1 )(t) − F k+1(ϕ 2 )(t)| = |F (F k(ϕ 1 ))(t) − F (F k(ϕ 2 ))(t)|

∫ (^) t

t 0

|f (s, F k(ϕ 1 )(s)) − f (s, F k(ϕ 2 )(s))|ds

∫ (^) t

t 0

K|F k(ϕ 1 )(s) − F k(ϕ 2 )(s)|ds

≤ K

∫ (^) t

t 0

Kk(s − t 0 )k k!

d(ϕ 1 , ϕ 2 )ds

∣ =^

Kk+1|t − t 0 |k+ (k + 1)!

d(ϕ 1 , ϕ 2 ).

Portanto, d(F n(ϕ 1 ), F n(ϕ 2 )) ≤ K nαn n! d(ϕ^1 , ϕ^2 ) e, para^ n^ grande,^ K

nαn/n! < 1,

pois este ´e o termo geral de uma s´erie cuja soma ´e eKα, donde F n^ ´e uma contra¸c˜ao em X. Pelo corol´ario do Lema da Contra¸c˜ao, existe uma ´unica ϕ ∈ X tal que F (ϕ) = ϕ. De fato, o ponto fixo ϕ ´e de classe C^1 e isto prova o teorema de Picard.

Corol´ario 1.9 Seja Ω aberto em R×E e seja f : Ω → E cont´ınua com D 2 f tamb´em cont´ınua. Para todo ponto (t 0 , x 0 ) em Ω existe uma vizinhan¸ca V = I(t 0 ) × B(x 0 ) tal que x′^ = f (t, x), x(t 0 ) = x 0 , tem uma ´unica solu¸c˜ao em I(t 0 ). Al´em disso, o gr´afico desta solu¸c˜ao est´a contido em V.

Demonstra¸c˜ao Seja U uma vizinhan¸ca de (t 0 , x 0 ) tal que f |U ´e Lipschitziana e |f | ≤ M em U. Seja α > 0 suficientemente pequeno para que V = Iα(t 0 ) × Bb(x 0 ) ⊆ U , onde b = αM. Conclui-se o argumento aplicando o Teorema 1.8.

Proposi¸c˜ao 1.10 Seja f cont´ınua e Lipschitziana em Ω = [a, b] × E. Ent˜ao, para todo (t 0 , x 0 ) ∈ Ω existe uma ´unica solu¸c˜ao de (1.2) em I = [a, b].

Demonstra¸c˜ao Considerar X = C(I, E) e F : X → X definida como na demons- tra¸c˜ao do Teorema 1.

F (ϕ)(t) = x 0 +

∫ (^) t

t 0

f (s, ϕ(s))ds.

F tem um ´unico ponto fixo pois, para n grande, F n^ ´e uma contra¸c˜ao. Basta observar que a desigualdade (∗) da demonstra¸c˜ao do Teorema 1.8 ´e verificada.

Corol´ario 1.11 (Equa¸c˜oes lineares) Sejam A(t) e b(t) respectivamente matrizes n × n e n × 1 de fun¸c˜oes cont´ınuas num intervalo I. Para todo (t 0 , x 0 ) ∈ I × Rn existe uma ´unica solu¸c˜ao de x′^ = A(t)x + b(t), x(t 0 ) = x 0 definida em I.