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Livro de Dawkins que trata sobre assuntos relacionados a genética e biologia geral
Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas
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Não perca as partes importantes!
O chimpanzé e os seres humanos compartilham cerca de 99,5 por cento de sua história evolutiva, no entanto a maioria dos pensadores humanos considera o chimpanzé uma excentricidade malformada e irrelevante, enquanto se vêem a si próprios como degraus para o Todo-poderoso. Para um evolucionista isto não pode ocorrer. Não há fundamento objetivo para qual elevar uma espécie acima de outra. Chimpanzés e seres humanos, lagartixas e fungos, todos evoluímos durante aproximadamente três bilhões de anos por um processo conhecido como seleção natural. Dentro de cada espécie alguns indivíduos têm mais descendentes sobreviventes do que outros, de modo que as características herdáveis (genes) daqueles reprodutivamente bem sucedidos tornam-se mais numerosos na geração seguinte. A seleção natural é isto: a reprodução diferencial não aleatória dos genes. Ela nos formou e é ela que devemos entender se quisermos compreender nossas próprias identidades.
Embora a teoria da evolução através da seleção natural de Darwin seja central ao estudo do comportamento social (especialmente quando unida à genética de Mendel), ela tem sido amplamente ignorada. Verdadeiras indústrias se desenvolveram nas ciências sociais dedicadas à construção de uma visão pré-darwiniana e pré-mendeliana do mundo social e psicológico. Mesmo na Biologia o esquecimento e o abuso da teoria darwiniana têm sido surpreendentes. Sejam quais forem as razões deste estranho desenvolvimento, há indicações de que ele está terminando. A grande obra de Darwin e de Mendel tem sido ampliada por um número crescente de pesquisadores, notavelmente R. A. Fisher, W. D. Hamilton, G. C. Williams e J. Maynard Smith. Agora, pela primeira vez, este importante corpo de teoria social baseada na seleção natural é apresentado sob forma simples e popular por Richard Dawkins.
Um a um, Dawkins examina os principais temas da nova pesquisa em teoria social: os conceitos de comportamento altruísta e egoísta, a definição genética de auto-interesse, a evolução do comportamento agressivo, a teoria do parentesco (as relações entre pais e prole e a evolução dos insetos sociais), a teoria da proporção entre os sexos, o altruísmo recíproco, o engano e a seleção natural das diferenças sexuais. Com a confiança oriunda do domínio da teoria subjacente, Dawkins revela a nova pesquisa com estilo e clareza admiráveis. Educado largamente em Biologia, ele dá ao leitor uma amostra de sua literatura rica e fascinante. Quando discorda de trabalhos publicados (como o faz ao criticar uma falácia minha), quase invariavelmente acerta o alvo. Dawkins também se esforça por tornar clara a 1ógica de seus argumentos, de modo que o leitor, aplicando a lógica fornecida, possa ampliar os argumentos (e até mesmo rivalizar com o próprio Dawkins). Os próprios argumentos estendem-se em muitas direções. Por exemplo, se (como Dawkins mantém) o fraude é fundamental à comunicação animal, então deve haver forte seleção para detectar o engano, e isto, por sua vez, deve selecionar certo grau de engano próprio, tornando inconscientes alguns fatos e motivos, de modo a não trair – pelos sinais sutis de auto-conhecimento – o fraude que está sendo praticado. Assim, a idéia convencional de que a seleção natural favorece aqueles sistemas nervosos que produzem imagens cada vez mais exatas do mundo deve ser uma visão muito ingênua da evolução mental.
O progresso recente na teoria social tem sido importante o suficiente para gerar um pequeno alvoroço de atividade contra-revolucionária. Tem-se alegado, por exemplo, que o progresso recente é, de fato, parte de uma conspiração cíclica para impedir o avanço social, fazendo com que ele pareça ser geneticamente impossível. Idéias tênues semelhantes têm sido reunidas para dar a impressão que a teoria social darwiniana é reacionária em suas implicações políticas. Isto está muito longe da verdade. A igualdade genética dos sexos, por exemplo, foi, pela primeira vez, claramente estabelecida por Fisher e Hamilton. A teoria e os dados quantitativos provenientes dos insetos sociais demonstram que não há uma tendência inerente aos pais de dominarem sua prole (ou vice- versa). E os conceitos de investimento parental e escolha por parte da fêmea fornecem um fundamento objetivo e imparcial para examinar as diferenças sexuais, um avanço considerável em
Este livro deveria ser lido quase como se fosse ficção científica. Ele destina-se a agradar a imaginação. Mas não é ficção científica: é Ciência. Seja ou não um lugar-comum, "mais estranho do que ficção" exprime exatamente como me sinto com relação à verdade. Somos máquinas de sobrevivência – veículos robô programados cegamente para preservar as moléculas egoístas conhecidas como genes. Esta é uma verdade que ainda me enche de surpresa. Embora a conheça há anos, parece que nunca me acostumo completamente a ela. Um de meus desejos é ter algum sucesso em surpreender a outros.
Três leitores imaginários olharam por sobre meu ombro enquanto escrevia, e agora a eles dedico o livro. Em primeiro lugar o leitor geral, o leigo. Por ele evitei o jargão técnico quase totalmente e onde tive que usar palavras especializadas eu as defini. Agora me pergunto por que não censuramos a maior parte de nosso jargão também das revistas especializadas. Supus que o leigo não tenha conhecimento especializado, mas não supus que ele seja estúpido. Qualquer um pode popularizar a Ciência se ele simplificar demasiadamente. Trabalhei arduamente tentando popularizar algumas idéias sutis e complicadas em linguagem não matemática, sem perder de vista sua essência. Não sei quanto sucesso tive nisto, nem quanto sucesso tive em outra de minhas ambições: tentar tornar o livro tão fascinante e agradável quanto o assunto merece. Desde há muito senti que a Biologia deve parecer tão excitante quanto uma história de mistério, pois ela é exatamente isto. Não ouso esperar ter transmitido mais do que uma pequena fração da excitação que o assunto tem a oferecer.
Meu segundo leitor imaginário foi o especialista. Ele tem sido um crítico severo, suspirando profundamente com algumas de minhas analogias e figuras de linguagem. Suas frases favoritas são "com exceção de", "por outro lado", e "ah, não". Ouvi-o atentamente e até reescrevi por completo um capítulo apenas em seu benefício, mas, no fim, tive que contar a história da minha maneira. O especialista ainda não estará completamente satisfeito com a maneira pela qual expus o assunto. No entanto, minha maior esperança é que até ele encontrará aqui algo de novo; uma nova maneira, talvez, de ver idéias familiares; até mesmo estímulo para idéias novas próprias. Se esta é uma aspiração alta demais, poderei pelo menos esperar que o livro o distraia em um trem?
O terceiro leitor que tive em mente foi o estudante, realizando a transição do leigo para o especialista. Se ele ainda não decidiu em que campo quer se especializar, espero encorajá-la a considerar meu próprio campo da Zoologia. Há uma razão melhor para estudar a Zoologia do que sua possível "utilidade" e estima que os animais provocam. Esta razão é que nós animais somos as máquinas mais complicadas e perfeitamente planejadas do universo conhecido. Apresentada desta forma, é difícil entender como alguém pode estudar qualquer outra coisa! Para o estudante que já se comprometeu com a Zoologia, espero que meu livro tenha algum valor educativo. Ele está tendo que estudar os artigos originais e livros técnicos nos quais minha exposição se baseia. Se ele achar as fontes originais difíceis de entender, talvez minha interpretação não matemática possa ajudar, como uma introdução e fonte suplementar.
Há perigos óbvios em se tentar agradar três tipos diferentes de leitores. Só posso dizer que estive cônscio desses perigos e eles pareceram ser compensados pelas vantagens da tentativa.
Sou etólogo e este é um livro sobre comportamento animal. Minha dívida à tradição etológica na qual fui treinado será óbvia. Em particular, Niko Tinbergen não imagina a importância de sua influência durante os doze anos nos quais trabalhei sob sua direção em Oxford. A frase "máquina de sobrevivência", embora não seja, de fato, criação sua, poderia muito bem sê-lo. Mas a Etologia recentemente tem sido revigorada por uma invasão de idéias novas oriundas de fontes normalmente não consideradas etológicas. Este livro baseia-se em grande parte nessas novas idéias. Seus autores
são mencionados nos lugares apropriados no texto; as principais figuras são G. C. Williams, J. Maynard Smith, W. D. Hamilton e R. L. Trivers.
Várias pessoas sugeriram títulos para o livro que eu agradecidamente usei como títulos dos capítulos: "Espirais Imortais", John Krebs; "A Máquina Gênica", Desmond Morris; "Manipulando os Genes", Tim Clutton-Brock e Jean Dawkins, independentemente, com desculpas a Stephen Potter.
Os )citares imaginários podem servir como alvos para esperanças e aspirações piedosas, mas eles têm menos utilidade prática do que os leitores e críticos reais. Sou dado a revisares, e Marian Dawkins foi sujeitada a inúmeros rascunhos e novos rascunhos de todas as páginas. Seu conhecimento considerável da literatura biológica e sua compreensão de assuntos teóricos, juntamente com seu encorajamento e apoio moral incessantes, foram-me essenciais. John Krebs também leu todo o rascunho do livro. Ele conhece o assunto melhor do que eu e revelou-se generoso e irrestrito em seus conselhos e sugestões. Glenys Thomson e Walter Bodmer criticaram minha manipulação dos tópicos de Genética de maneira gentil mas firme. Temo que minha revisão ainda não os satisfaça completamente, mas espero que a acharão bastante melhorada. Estou muito grato pelo seu tempo e paciência. John Dawkins esteve infalivelmente atento a construções ambíguas e propôs excelentes sugestões para reformulação. Não poderia ter desejado um "leigo inteligente" mais apropriado do que Maxwell Stamp. Sua detecção ponderada de uma falha geral importante no estilo do primeiro rascunho muito contribuiu para a versão final. Outros que criticaram construtivamente capítulos específicos, ou de alguma outra forma deram sua opinião de especialistas, foram John Maynard Smith, Desmond Morris, Tom Maschler, Nick Blurton Jones, Sarah Kettlewell, Nick Humphrey, Tim Clutton-Brock, Louise Johnson, Christopher Graham, Geoff Parker e Robert Trivers. Pat Searle e Stephanie Verhoeven não apenas datilografaram com habilidade, mas encorajaram-me parecendo fazê-la com alegria. Finalmente, quero agradecer Michael Rodgers da Editora da Universidade de Oxford o qual, além de criticar proveitosamente o manuscrito, trabalhou muito além de seu dever ao controlar todos os aspectos da produção deste livro.
Richard Dawkins
entanto, como veremos, existem circunstâncias especiais nas quais um gene pode atingir melhor seus próprios objetivos egoístas cultivando uma forma limitada de altruísmo ao nível dos animais individuais. "Especiais" e "limitada" são palavras importantes na última sentença. Por mais que desejemos acreditar diferentemente, o amor e o bem-estar universais da espécie como um todo são conceitos que simplesmente não têm sentido na evolução.
Isto leva-me a primeira questão que quero esclarecer sobre o que este livro não é. Não estou defendendo uma moralidade baseada na evolução. Estou dizendo como as coisas evoluíram. Não estou dizendo como nós, humanos, moralmente temos que nos comportar. Enfatizo isto porque sei que corro o risco de ser mal interpretado por aquelas pessoas, bastante numerosas, que não podem distinguir uma afirmação de crença no que ocorre, de uma defesa do que deve ocorrer. Minha própria impressão é que seria muito desagradável viver em uma sociedade humana baseada simplesmente na lei do gene de egoísmo implacável universal. Mas, infelizmente, não importa o quanto deploremos algo, este algo não deixa de ser verdadeiro. Este livro pretende principalmente ser interessante, mas se você for extrair uma lição de moral dele, leia-o como uma advertência. Fique advertido que se você desejar, como eu o desejo, construir uma sociedade na qual os indivíduos cooperem generosa e desinteressadamente para um bem comum, você poderá esperar pouca ajuda da natureza biológica. Tentemos ensinar generosidade e altruísmo, porque nascemos egoístas. Compreendamos o que nossos próprios genes egoístas tramam, porque assim, pelo menos, poderemos ter a chance de frustrar seus intentos, uma coisa que nenhuma outra espécie jamais aspirou fazer.
Como corolário dessas observações sobre ensino, é uma falácia – e, a propósito, bastante comum – supor que características herdadas geneticamente são por definição fixas e inalteráveis. Nossos genes poderão nos instruir a ser egoístas, mas não estamos necessariamente compelidos a obedecê-los por toda nossa vida. Talvez seja mais difícil aprender altruísmo do que seria se fôssemos programados geneticamente para ser altruístas. Entre os animais, o homem é dominado de maneira singular pela cultura, pelas influências aprendidas e transmitidas. Alguns diriam que a cultura é tão importante que os genes, egoístas ou não, são virtualmente irrelevantes para a compreensão da natureza humana. Outros discordariam. Tudo depende de que lado você está no debate sobre "natureza versus criação" como determinantes dos atributos humanos. Isto leva-me a segunda coisa que este livro não é: ele não é uma defesa de uma posição ou outra na controvérsia natureza/criação. Naturalmente tem-no minha opinião a respeito disto, mas não irei enunciá-la, exceto na medida em que ela está implícita na concepção de cultura que apresentarei no último capítulo. Se os genes realmente se mostrarem ser totalmente irrelevantes para a determinação do comportamento humano moderno, se nós realmente formos únicos com respeito a isto dentre os animais, ainda é, pelo menos, interessante indagar sobre a regra da qual tão recentemente nos tornamos a exceção. E se nossa espécie não for tão excepcional como poderemos querer acreditar, é ainda mais importante que estudemos a regra.
A terceira coisa que este livro não é, é um relatório descritivo do comportamento detalhado do homem ou de qualquer outra espécie animal em particular. Usarei detalhes factuais apenas como exemplos ilustrativos. Não direi: "se você olhar para o comportamento de babuínos verificará que é egoísta; portanto, é provável que o comportamento humano seja egoísta também". A lógica do meu argumento de "'gangster' de Chicago" é bastante diferente. É a seguinte: seres humanos e babuínos evoluíram por seleção natural. Se você examinar a maneira como a seleção natural funciona, parece resultar que qualquer coisa que tenha evoluído por seleção natural deva ser egoísta. Portanto, devemos esperar que quando de fato examinamos o comportamento de babuínos, seres humanos e todas as outras criaturas vivas, verificaremos que é egoísta. Se verificarmos que nossa expectativa está errada, se notarmos que o comportamento humano é realmente altruísta, então estaremos diante de uma coisa intrigante, uma coisa que precisa ser explicada.
Antes de prosseguir, precisamos de uma definição. Uma entidade, tal como um babuíno, é dita altruísta se ela se comporta de maneira a aumentar o bem-estar de outra entidade semelhante, às suas próprias custas. O comportamento egoísta tem exatamente o efeito contrário. "Bem-estar" é definido
como "possibilidades de sobrevivência", mesmo se o efeito sobre a expectativa real de vida e de morte for tão pequeno que pareça desprezível. Uma das conseqüências surpreendentes da versão moderna da teoria darwiniana é que influências mínimas aparentemente triviais sobre a probabilidade de sobrevivência podem ter um impacto importante na evolução. Isto deve-se ao imenso tempo disponível para que tais influências se façam sentir.
É importante entender que as definições acima de altruísmo e egoísmo são comportamentais , não subjetivas. Não estou preocupado aqui com a psicologia de motivos. Não discutirei se as pessoas que se comportam altruisticamente estão "realmente" fazendo-o por motivos egoístas secretos ou inconscientes. Talvez elas estejam e talvez elas não estejam, e talvez nunca possamos saber, mas de qualquer forma não é disto que este livro trata. Minha definição relaciona-se apenas com se o efeito de um ato é diminuir ou aumentar as expectativas de sobrevivência do suposto altruísta e as expectativas de sobre-vivência do suposto beneficiado.
É muito complicado demonstrar os efeitos do comportamento nas perceptivas de sobrevivência a longo prazo. Na prática, quando aplicamos a definição ao comportamento real, devemos nela introduzir uma ressalva com a palavra "aparentemente". Um ato aparentemente altruísta é aquele que parece, superficialmente, tender a aumentar (não importa quão ligeiramente) a probabilidade do altruísta morrer e do favorecido sobreviver. No exame mais detalhado verifica-se freqüentemente que atos de aparente altruísmo na realidade são egoísmo disfarçado. Novamente, não quero dizer que os motivos básicos são egoístas, mas que os efeitos reais do ato nas perspectivas de sobrevivência são o inverso daquilo que originalmente pensamos.
Darei alguns exemplos de comportamento aparentemente egoísta e aparentemente altruísta. É difícil suprimir hábitos subjetivos de pensamento quando lidamos com nossa própria espécie, de modo que escolherei, em vez disto, exemplos de outros animais. Em primeiro lugar alguns exemplos variados de comportamento egoísta de animais individuais.
Gaivotas de cabeça preta nidificam em grandes colônias, os ninhos estando separados de apenas poucos palmos. Quando os filhotes eclodem são pequenos, indefesos e fáceis de serem engolidos. É bastante comum uma gaivota esperar que um vizinho vire as costas, talvez enquanto ele está fora pescando, e então lançar-se sobre um de seus filhotes e engoli-lo inteiro. Ela, desta forma, obtém uma boa refeição nutritiva sem ter que se dar ao trabalho de capturar um peixe e sem ter que deixar seu próprio ninho desprotegido.
Mais bem conhecido é o canibalismo macabro das fêmeas do louva-a-deus. O louva-a-deus é um inseto carnívoro grande. Ele normalmente come insetos menores tais como moscas, mas ataca quase qualquer coisa que se mova. No acasalamento, o macho sobe cautelosamente na fêmea, monta-a e copula. Se a fêmea tiver a oportunidade, ela o comerá, começando por abocanhar sua cabeça, quando o macho está se aproximando, imediatamente após ele montar, ou após separarem- se. Pareceria mais sensato para ela esperar até que a cópula se complete antes de começar a comê-lo. Mas a perda da cabeça parece não desalentar o resto do corpo do macho em seu avanço sexual. De fato, como a cabeça do inseto é sede de alguns centros nervosos inibidores, é possível que a fêmea melhore o desempenho sexual do macho ao comer sua cabeça. Se assim for, este é um benefício adicional. O benefício primário é ela obter uma boa refeição.
A palavra "egoísta" talvez pareça muito branda para expressar casos extremos tais como canibalismo, embora estes encaixem-se bem em nossa definição. Talvez possamos ter simpatia mais diretamente para com o comportamento covarde descrito dos pingüins imperiais da Antártica. Eles têm sido vistos em pé à beira d'água, hesitando antes de mergulhar, devido ao perigo de serem comidos por focas. Se apenas um deles mergulhasse, os demais saberiam se havia uma foca ou não. Naturalmente nenhum deles quer ser a cobaia, de modo que eles esperam e algumas vezes até mesmo tentam se empurrar para a água.
Mais comumente, o comportamento egoísta consiste simplesmente em recusar a compartilhar algum recurso valioso, como alimento, território ou parceiros sexuais. Agora, alguns exemplos de comportamento aparentemente altruísta.
principalmente de grupos consistindo de indivíduos que se sacrificam a si próprios. Esta é a teoria da "seleção de grupo", há muito considerada verdadeira pelos biologistas não familiarizados com os detalhes da teoria da evolução, lançada em um livro famoso de V. C. Wynne-Edwards e popularizada por Robert Ardrey no livro The Social Contract. A alternativa ortodoxa é normalmente chamada "seleção individual", embora pessoalmente eu prefira falar em seleção de gene.
A resposta imediata dos adeptos da seleção individual ao argumento apresentado seria mais ou menos assim. Mesmo no grupo dos altruístas quase com certeza haverá uma minoria dissidente a qual se recusa a fazer qualquer sacrifício. Se houver apenas um rebelde egoísta, pronto a explorar o altruísmo dos demais, então ele, por definição, tem maior probabilidade do que os últimos de sobreviver e ter filhos. Cada um desses filhos tenderá a herdar suas características egoístas. Após várias gerações desta seleção natural, o "grupo altruísta" será sobrepujado pelos indivíduos egoístas e será indistinguível do grupo egoísta. Mesmo se assumirmos a existência casual inicial improvável de grupos altruístas puros sem rebeldes, é muito difícil imaginar o que impe-diria indivíduos egoístas de imigrar de grupos egoístas vizinhos e, por meio de cruzamentos mistos, de contaminar a pureza dos grupos altruístas.
O adepto da seleção individual admitiria que grupos realmente desaparecem e que o fato de um grupo extinguir-se ou não pode ser influenciado pelo comportamento dos indivíduos naquele grupo. Ele talvez até admita que se ao menos os indivíduos em um grupo tivessem o dom da previsão poderiam perceber que à longo prazo é de seu interesse refrear sua ganância egoísta para impedir a destruição do grupo todo. Quantas vezes isto já deve ter .ido dito, nos últimos anos, aos trabalhadores da Grã-Bretanha? Idas, a extinção de um grupo é um processo lento comparado com a luta rápida da competição individual. Mesmo enquanto o grupo declina vagarosa e inexoravelmente, indivíduos egoístas prosperam à curto prazo às custas dos altruístas. Os cidadãos da Grã-Bretanha podem ou não ter sido favorecidos com o dom da previsão, mas a evolução é cega para com o futuro.
Embora a teoria de seleção de grupo atualmente receba pouco suporte entre as fileiras daqueles biologistas profissionais que compreendem a evolução, ela de fato é muito atraente intuitivamente. Gerações sucessivas de estudantes de Zoologia admiram-se, quando entram na universidade provenientes da escola secundária, ao verificar que ela não constitui o ponto de vista ortodoxo. Dificilmente se poderia culpá-los por isto, pois no Nuffield Biology Teachers' Guide , um guia de ensino de Biologia escrito para professores de nível avançado da escola secundária na Grã- Bretanha, encontramos o seguinte: "Nos animais superiores o comportamento poderá assumir a forma de suicídio individual para assegurar a sobrevivência da espécie." O autor anônimo deste guia placidamente ignora o fato de que ele disse algo controvertido. A este respeito ele está em companhia de ganhadores do prêmio Nobel. Konrad Lorenz, em seu livro On Aggression , fala das funções "preservadoras da espécie" do comportamento agressivo, uma dessas funções sendo garantir que apenas os indivíduos mais bem adaptados possam procriar. Este é um belo argumento circular, mas o que estou alegando aqui é que a idéia de seleção de grupo é tão arraigada que Lorenz, assim como o autor do Nuffield Guide , evidentemente não percebeu que suas afirmações iam de encontro à teoria darwiniana ortodoxa.
Recentemente ouvi um lindo exemplo da mesma coisa em um programa de televisão, fora isto excelente, da B.B.C., sobre aranhas da Austrália. A "especialista" do programa mencionou que a grande maioria das aranhas jovens termina como presa de outras espécies. Ela, então, acrescentou: "Talvez este seja o propósito verdadeiro de sua existência já que é preciso apenas que algumas sobrevivam para que a espécie seja preservada"!
Robert Ardrey, no livro The Social Contract , usou a teoria de seleção de grupo para explicar toda a ordem social em geral. Ele claramente vê o homem como uma espécie que desviou-se do caminho da integridade animal. Ardrey, pelo menos, fez suas lições de casa. Sua decisão de discordar da teoria ortodoxa foi consciente e por isso ele merece consideração.
Talvez uma razão para a teoria de seleção de grupo ser tão atraente é que ela harmoniza-se inteiramente com os ideais morais e políticos que a maioria de nós compartilha. Podemos
freqüentemente nos comportar egoisticamente como indivíduos, mas em nossos momentos mais idealistas reverenciamos e admiramos aqueles que colocam em primeiro lugar o bem-estar dos outros. No entanto, ficamos um pouco confusos sobre quão amplamente que-remos interpretar a palavra "outros". freqüentemente altruísmo dentro de um grupo condiz com egoísmo entre grupos. Esta é uma base do sindicalismo. Em outro nível a nação é uma beneficiada importante de nosso auto-sacrifício altruísta e espera-se que os rapazes morram, como indivíduos, para maior glória de seu país como um todo. Além disto, eles são encorajados a matar outros indivíduos sobre os quais nada se sabe a não ser que pertencem a uma nação diferente. (Curiosamente, apelos em tempo de paz aos indivíduos para que façam algum sacrifício pequeno na taxa pela qual aumentam seu padrão de vida parecem ser menos eficazes do que apelos em tempo de guerra aos indivíduos para que sacrifiquem suas vidas.)
Recentemente tem havido uma reação contra racialismo e patriotismo e uma tendência a adotar toda a espécie humana como objeto de nossa simpatia. Este alargamento humanístico do alvo de nosso altruísmo possui um corolário interessante, o qual novamente parece apoiar a idéia do "bem da espécie" em evolução. Os politicamente liberais, os quais normalmente são os porta-vozes mais convencidos da ética da espécie, agora freqüentemente exibem grande escárnio por aqueles que foram um pouco além na ampliação de seu altruísmo, de forma a incluir outras espécies. Se eu disser que estou mais interessado em impedir o massacre de grandes baleias do que em melhorar as condições de habitação das pessoas, provavelmente chocarei alguns de meus amigos.
A sensação de que membros da própria espécie merecem consideração moral especial, em comparação com membros de outras espécies, é antiga e profunda. Matar pessoas sem se estar em guerra é considerado o crime mais sério normalmente cometido. A única coisa proibida mais energicamente por nossa cultura é comer pessoas (mesmo se elas já estiverem mortas). No entanto, apreciamos comer membros de outras espécies. Muitos de nós recuamos diante da execução judiciária até mesmo do mais horrendo criminoso humano, ao mesmo tempo que aprovamos alegremente que se atire sem julgamento em animais daninhos razoavelmente inofensivos. De fato, matamos membros de outras espécies inofensivas como meio de recreação e diversão. Um feto humano, não possuindo mais sentimento humano do que uma ameba, goza de respeito e proteção legal muito maiores do que aqueles dispensados a um chimpanzé adulto. No entanto, o chimpanzé sente, pensa e – segundo evidência experimental recente – talvez seja capaz até de aprender uma forma de linguagem humana. O feto pertence a nossa própria espécie e por causa disto imediatamente lhe são conferidos privilégios e direitos especiais. Se a ética do "especiecismo", para usar o termo de Richard Ryder, pode ser apoiado em um fundamento lógico mais sólido do que a ética do "racismo", eu não sei. O que sei é que ela não tem base adequada na biologia evolutiva.
A confusão na ética humana com relação ao nível no qual o altruísmo é desejável – família, nação, raça, espécie, ou todas as coisas vivas – está refletida numa confusão paralela na Biologia com relação ao nível no qual o altruísmo deve ser esperado segundo a teoria da evolução. Até mesmo o adepto da seleção de grupo não se admiraria de encontrar membros de grupos rivais sendo desagradáveis uns com os outros: desta forma, como membros de um sindicato ou soldados, eles estão favorecendo seu próprio grupo na luta por recursos limitados. Mas, então, vale à pena perguntar como o adepto da seleção de grupo decide qual nível é o importante. Se a seleção se dá entre grupos dentro de uma espécie e entre espécies, por que não deveria ela se dar também entre agrupamentos maiores? As espécies estão reunidas em gêneros, os gêneros em ordens e as ordens em classes. Os leões e os antílopes são ambos membros da classe Mammalia, assim como nós. Não deveríamos então esperar que leões se abstivessem de matar antílopes, "para o bem dos mamíferos"? Certamente eles deveriam, em vez disto, caçar pássaros ou répteis, a fim de evitar a extinção da classe. Mas, então, o que se diria da necessidade de perpetuar todo o filo dos vertebrados?
É fácil para mim argumentar pelo reductio ad absurdum e indicar as dificuldades da teoria de seleção de grupo, mas a existência aparente do altruísmo individual ainda tem que ser explicada. Ardrey chega a dizer que a seleção de grupo é a única explicação possível para um comportamento tal como o de "saltitamento" das gazelas Thomson. Este salto vigoroso e conspícuo em frente de um
Capítulo 2
No princípio era a simplicidade. Já é bastante difícil explicar até mesmo como um universo simples começou. Considero ponto pacífico que seria ainda mais difícil explicar o súbito surgimento, plenamente equipada, de uma ordem complexa – vida, ou um ser capaz de criá-la. A teoria da evolução por seleção natural de Darwin satisfaz porque mostra-nos uma maneira pela qual a simplicidade poder-se-ia transformar em complexidade, como átomos desordenados poderiam se agrupar em padrões cada vez mais complexos, até que terminassem por fabricar pessoas. Darwin fornece uma solução, a única plausível até agora sugerida, para o problema profundo de nossa existência. Tentarei explicar a grande teoria de maneira mais geral do que é costume, começando com a época antes que a própria evolução começasse.
A "sobrevivência do mais apto" de Darwin, na realidade, é um caso especial de uma lei mais geral da sobrevivência do estável. O universo está povoado por coisas estáveis. Uma coisa estável é uma coleção de átomos a qual é permanente ou suficientemente comum para merecer um nome. Ela poderá ser uma coleção particular de átomos, como o Matterhorn, o qual dura o suficiente para que valha a pena lhe dar um nome; ou ela poderá ser uma classe de entidades, tal como pingos de chuva, os quais formam-se a uma taxa suficientemente alta para merecer um nome coletivo, mesmo embora cada um deles tenha vida curta. As coisas que vemos ao nosso redor e que achamos que necessitam de explicação – rochas, galáxias, ondas do mar – são todas, em maior ou menor grau, padrões estáveis de átomos. As bolhas de sabão tendem a ser esféricas porque esta é uma configuração estável para estes filmes finos cheios de gás. Em uma espaçonave, a água também é estável em glóbulos esféricos, mas na Terra, onde há gravidade, a superfície estável da água em repouso é plana e horizontal. Os cristais de sal de cozinha tendem a ser cubos porque esta é uma maneira estável de empacotar juntamente íons de sódio e cloreto. No Sol, os átomos mais simples de todos, os de hidrogênio, unem-se for-mando átomos de hélio, porque nas condições aí reinantes a configuração do hélio é mais estável. Outros átomos ainda mais complexos estão sendo formados em estrelas por todo o universo e foram formados na "grande explosão" a qual, de acordo com a teoria dominante, deu início ao universo. É daí que os elementos de nosso mundo originalmente provieram.
Algumas vezes, quando os átomos se encontram, eles unem-se em uma reação química formando moléculas, as quais podem ser mais ou menos estáveis. Tais moléculas podem ser muito grandes. Um cristal como um diamante pode ser considerado uma única molécula, uma molécula proverbialmente estável neste caso, mas também muito simples, uma vez que sua estrutura atômica interna é repetida indefinidamente. Nos organismos vivos atuais há outras moléculas grandes que são altamente complexas, esta complexidade mostrando-se em vários níveis. A hemoglobina de nosso sangue é uma molécula de proteína típica. Ela é formada por cadeias de moléculas menores, os aminoácidos, cada qual contendo algumas dezenas de átomos arranjados em um padrão preciso. Na molécula de hemoglobina há 574 moléculas de aminoácidos. Estas estão arranjadas em quatro cadeias, as quais estão torcidas umas ao re-dor das outras, formando uma estrutura globular tridimensional de complexidade assombrosa. Um modelo de uma molécula de hemoglobina assemelha-se bastante a um espinheiro denso. Entretanto, diferentemente de um espinheiro real, a molécula não é um arranjo aproximado e casual, mas uma estrutura in-variável e definida, repetida de maneira idêntica, sem nenhum ramo ou torção fora de lugar, mais de seis mil trilhões de vezes em um corpo humano médio. A forma precisa de espinheiro de uma molécula de proteína como a hemoglobina, é estável no sentido de que duas cadeias consistindo nas mesmas seqüências de aminoácidos tenderão, como duas molas, a se imobilizar exatamente na mesma configuração espiralada tridimensional. Touceiras de hemoglobina estão se armando em sua forma preferencial em seu corpo a uma taxa de aproximadamente quatrocentos mil bilhões por segundo e outras estão sendo destruídas na mesma taxa.
A hemoglobina é uma molécula moderna, usada para ilustrar o princípio segundo o qual os átomos tendem a se ordenar em padrões estáveis. O que é relevante aqui é que antes do surgimento da vida na Terra, uma evolução rudimentar de moléculas poderia ter ocorrido através de processos usuais da Física e da Química. Não há necessidade de pensar em plano, propósito ou direção. Se um grupo de átomos, na presença de energia, se ordena em um padrão estável, este grupo de átomos tenderá a permanecer desta maneira. A primeira forma de seleção natural foi simplesmente uma seleção de formas estáveis e uma rejeição daquelas instáveis. Não há mistério a respeito disto. Por definição, tinha que acontecer.
Não se segue, evidentemente, que se possa explicar a existência de entidades tão complexas como o homem, apenas por meio de exatamente os mesmos princípios. Não adianta tomar o número certo de átomos, agitá-los juntamente com um pouco de energia externa até que calhem se ordenar no padrão certo, e então sai Adão! Você poderá fazer uma molécula consistindo de algumas dúzias de átomos dessa maneira, mas um homem consiste de mais de mil quatrilhões de átomos. Para tentar fazer um homem, você teria que trabalhar em seu misturador bioquímico por um período tão longo que toda a idade do universo pareceria um piscar de olhos e mesmo assim você não teria sucesso. É aqui que a teoria de Darwin, em sua forma mais geral, vem em socorro. A teoria de Darwin assume onde a história da construção vagarosa de moléculas termina.
A descrição da origem da vida que darei é necessariamente especulativa. Por definição, ninguém existia para ver o que aconteceu. Existem várias teorias rivais, mas todas elas têm certas características em comum. A descrição simplificada que darei provavelmente não está muito longe da verdade.
Não sabemos que matérias primas químicas eram abundantes na Terra antes do surgimento da vida, mas entre as possibilidades plausíveis estão água, dióxido de carbono, metano e amônia: todos eles compostos simples os quais, se sabe, estão presentes em pelo menos alguns dos outros planetas de nosso sistema solar. Os químicos têm tentado imitar as condições químicas da Terra jovem. Eles colocam essas substâncias simples em um frasco e fornecem uma fonte de energia como luz ultravioleta ou faíscas elétricas – uma simulação artificial dos relâmpagos primordiais. Após algumas semanas deste tratamento, algo interessante é geralmente encontrado dentro do vidro: um caldo marrom diluído contendo um grande número de moléculas mais complexas do que aquelas originalmente introduzidas. Aminoácidos, em particular, têm sido encontrados – os blocos de construção das proteínas, uma das duas grandes classes de moléculas biológicas. Antes desses experimentos terem sido feitos, aminoácidos que ocorrem naturalmente teriam sido considerados como indicadores da presença de vida. Se eles tivessem sido detectados, por exemplo em Marte, vida naquele planeta teria parecido quase certa. Hoje em dia, no entanto, sua existência implica apenas na presença de alguns gases simples na atmosfera e de alguns vulcões, luz solar ou tempestades. Mais recentemente, simulações em laboratório das condições químicas existentes na Terra antes do surgimento da vida têm produzido substâncias orgânicas chamadas purinas e pirimidinas. Estas substâncias são blocos de construção da molécula genética, o próprio DNA.
Processos análogos a esses devem ter dado origem ao "caldo primitivo" o qual, biólogos e químicos acreditam, constituiu os mares de cerca de três a quatro bilhões de anos atrás. As substâncias orgânicas concentraram-se localmente, talvez na espuma que secava nas praias ou em gotículas minúsculas suspensas. Sob a influência ulterior de energia, como luz ultravioleta proveniente do Sol, elas combinaram-se em moléculas maiores. Atualmente, moléculas orgânicas grandes não durariam o suficiente para serem notadas: seriam rapidamente absorvidas e degradadas por bactérias ou outros seres vivos. Mas as bactérias e o resto de nós são retardatários. Naqueles dias, moléculas orgânicas grandes podiam vaguear pelo caldo que se tornava mais denso, sem serem molestadas.
Num dado momento, uma molécula particularmente notável foi formada acidentalmente. Nós a chamaremos a Replicadora. Ela não precisa necessariamente ter sido a molécula maior ou a mais complexa existente, mas possuía a propriedade extraordinária de ser capaz de criar cópias de si mesma. Isto talvez pareça um tipo de acidente muito pouco provável de acontecer. E de fato foi. Foi
originais eram muito mais irregulares, mas, de qualquer forma, podemos ter certeza que erros foram feitos e eram cumulativos.
À medida que cópias errôneas foram feitas e propagadas, o caldo primitivo encheu-se de uma população não de réplicas idênticas, mas de diversas variedades de moléculas replicadoras. todas "descendentes" do mesmo ancestral. Teriam algumas variedades sido mais numerosas do que outras? Quase certamente sim. Algumas variedades seriam inerentemente mais estáveis do que outras. Algumas moléculas, uma vez formadas, teriam menos probabilidade de se quebrar novamente do que outras. Esses tipos se tornariam relativamente numerosos no caldo, não apenas como uma conseqüência lógica direta de sua "longevidade", mas também porque eles teriam maior tempo disponível para produzir cópias de si mesmos. Os replicadores de alta longevidade, portanto, tenderiam a se tomar mais numerosas e, outros fatores permanecendo iguais, teria havido uma "tendência evolutiva" em direção a uma maior longevidade na população de moléculas.
Mas, outros fatores provavelmente não permaneceram iguais e outra propriedade de uma variedade de replicador que deve ter tido importância ainda maior na sua disseminação pela população foi a velocidade de replicação ou "fecundidade". Se moléculas de replicador do tipo A fazem cópias de si em média uma vez por semana, enquanto aquelas do tipo B fazem cópias de si uma vez por hora, não é difícil ver que logo as moléculas do tipo A estarão em minoria, mesmo que elas "vivam" muito mais do que as moléculas B. Portanto, provavelmente teria havido uma "tendência evolutiva" em direção a uma maior "fecundidade" das moléculas no caldo. Uma terceira característica das moléculas de replicador que teria sido selecionada positivamente é precisão de replicação. Se moléculas do tipo X e do tipo Y duram o mesmo tempo e replicam-se na mesma taxa, mas X erra, em média, em cada décima replicação, enquanto que Y erra apenas em cada centésima replicação, Y obviamente se tornará mais abundante. O contingente X na população perde não apenas os próprios "filhos" incorretos, mas também todos os seus descendentes, reais ou potenciais.
Se você já sabe alguma coisa sobre evolução, talvez veja um pequeno paradoxo com relação ao último ponto. Podemos reconciliar a idéia de que erros de cópia são um requisito essencial para a evolução ocorrer, com a afirmação de que a seleção natural favorece a alta fidelidade de cópia? A resposta é que embora a evolução pareça, em um sentido vago, uma "coisa boa", especialmente porque somos o produto dela, nada, na verdade, "quer" evoluir. A evolução é alguma coisa que acontece, queira-se ou não, apesar de todos os esforços dos replicadores (e, hoje em dia, dos genes) em impedi-la de acontecer. Jacques Monod expressou isto muito bem em sua palestra Herbert Spencer, após comentar sarcasticamente: "Outro aspecto curioso da teoria da evolução é que todos pensam que a entendem!"
Voltando ao caldo primitivo, este deve ter sido povoado por variedades de moléculas, estáveis no sentido de que ou as moléculas individuais duravam um longo tempo, ou replicavam-se rapidamente, ou então replicavam-se de maneira precisa. Tendências evolutivas em direção a esses três tipos de estabilidade ocorreram no seguinte sentido: se você tivesse amostrado o caldo em duas épocas diferentes, a última amostra conteria uma proporção maior de variedades com alta longevidade/fecundidade/fidelidade de cópia. Isto é essencialmente o que um biólogo entende por evolução quando está falando de criaturas vivas e o mecanismo é o mesmo – seleção natural.
Deveríamos, então, chamar as moléculas de replicador originais de "vivas"? O que importa? Eu poderei lhe dizer "Darwin foi o maior homem que jamais existiu" e talvez você diga "Não, foi Newton", mas espero que não prolongássemos a discussão. O importante é que nenhuma conclusão fundamental seria afetada não importa de que maneira a discussão fosse resolvida. As realizações e os fatos ocorridos na vida de Newton e Darwin permanecem totalmente inalterados quer os chamemos de "grandes" ou não. Da mesma forma, a história das moléculas de replicador provavelmente ocorreu mais ou menos como estou contando-a, quer decidamos chamá-las de "vivas" ou não. Sofrimento humano tem sido causado porque muitos de nós não conseguem entender que as palavras são apenas instrumentos para nosso uso e que a mera presença no dicionário de uma palavra como "vivo" não significa que ela tenha, necessariamente, que se referir a
alguma coisa definida no mundo real. Quer chamemos os primeiros replicadores de vivos ou não, eles foram os ancestrais da vida, nossos antepassados.
A etapa seguinte importante no argumento, a qual foi enfatizada pelo próprio Darwin (embora ele estivesse falando de animais e plantas, não de moléculas), é competição. O caldo primitivo não era capaz de sustentar um número infinito de moléculas de replicador. Antes de mais nada, porque o tamanho da Terra é finito, mas outros fatores limitantes também devem ter sido importantes. Em nossa imagem do replicador funcionando como modelo ou molde o supusemos banhado em um caldo rico nas moléculas constitutivas pequenas necessárias para se fazer cópias. Mas, quando os replicadores se tornaram numerosos, os blocos de construção devem ter sido usados a uma taxa tal que passaram a ser um recurso escasso e precioso. Variedades ou cepas deferentes do replicador devem ter competido por eles. Consideramos os fatores que teriam aumentado o número dos tipos favorecidos do replicador. Podemos ver agora que as variedades menos favorecidas na realidade devem ter se tornado menos numerosas devido à competição e finalmente muitas de suas linhagens devem ter se extinguido. Houve luta pela sobrevivência entre as variedades de replicador. Elas não sabiam que estavam lutando, nem se preocupavam com isto. A luta foi conduzida sem quaisquer maus sentimentos, de fato, sem sentimentos de qualquer espécie. Mas elas estavam lutando, no sentido de que qualquer cópia errônea que resultasse em um novo nível de estabilidade mais alto, ou uma nova maneira de reduzir a estabilidade dos rivais, era automaticamente preservada e multiplicada. O processo de melhoramento era cumulativo. As maneiras de aumentar a estabilidade e de diminuir aquela dos rivais tornaram-se mais elaboradas e mais eficientes. Algumas variedades talvez até tenham "descoberto" como quebrar quimicamente as moléculas de linhagens rivais e utilizar os constituintes assim liberados para fazer suas próprias cópias. Estes proto-carnívoros simultaneamente obtinham alimento e removiam rivais competitivos. Outros replicadores talvez tenham descoberto como se proteger, quer quimicamente, quer construindo uma parede física de proteína ao redor de si. Talvez tenha sido assim que as primeiras células vivas apareceram. Os replicadores começaram não apenas a existir, mas a construir envoltórios para si, veículos para sua existência ininterrupta. Os replicadores que sobreviveram foram aqueles que construíram máquinas de sobrevivência para aí morarem. As primeiras máquinas de sobrevivência provavelmente consistiram em nada mais do que um revestimento protetor. Mas, viver tornou-se inexoravelmente mais difícil à medida que novos rivais surgiam com máquinas de sobrevivência melhores e mais eficientes. Estas se tornaram maiores e mais elaboradas, o processo sendo cumulativo e progressivo.
Haveria um fim pais o melhoramento gradual nas técnicas e artifícios utilizados pelos replicadores para garantir sua própria permanência no mundo? Haveria tempo suficiente para melhoramento. Que máquinas estranhas de auto-sobrevivência os milênios produziram? Quatro bilhões de anos mais tarde, qual seria o destino dos antigos replicadores? Eles não morreram, pois são antigos mestres das artes de sobrevivência. Mas, não os procure flutuando livremente no mar. Eles abandonaram esta liberdade nobre há muito tempo. Agora eles apinham-se em colônias imensas, em segurança dentro de robôs desajeitados gigantescos, murados do mundo exterior, comunicando-se com ele por meio de vias indiretas e tortuosas, manipulando-o por controle remoto. Eles estão em mim e em você. Eles nos criaram, corpo e mente. E sua preservação é a razão última de nossa existência. Transformaram-se muito, esses replicadores. Agora eles recebem o nome de genes e nós somos suas máquinas de sobrevivência.
os planos do arquiteto montam 46 volumes – em outras espécies o número é diferente. Os volumes são chamados de cromossomos. São visíveis sob o microscópio como longos fios e os genes estão enfileirados em ordem ao longo deles. Não é fácil e, de fato, talvez nem seja significativo. decidir onde um gene termina e o seguinte começa. Felizmente, como este capítulo mostrará, isto não tem importância para nossos propósitos.
Farei uso da metáfora dos planos do arquiteto, misturando livremente a linguagem da metáfora com a linguagem da situação real. “Volume” será usado como sinônimo de cromossomo. “Página” provisoriamente será usado como sinônimo de gene, embora a divisão .”Embora a divisão entre os genes seja menos distinta.” do que a divisão entre as páginas de um livro. Esta metáfora nos 1evará bastante longe. Quando ela finalmente falhar, introduzirei outras metáforas. A propósito, não há, é claro, nenhum “arquiteto”. As instruções do DNA foram montadas pela seleção natural.
As moléculas de DNA fazem duas coisas importantes. Em primeiro lugar, elas replicam-se, ou seja, fazem cópias de si mesmas. Isto tem continuado ininterruptamente desde o começo da vida e atualmente a: moléculas de DNA são capazes de fazê-lo muito bem. Como adulto você consiste de um milhão de bilhões de células, mas quando foi concebido inicialmente era apenas uma única célula, provida de uma versão original dos planos do arquiteto. Esta célula se dividiu em dois e cada uma das duas células recebeu sua própria cópia dos planos. Divisões sucessivas levaram o número a 4, 8, 16, 32 e assim por diante, até a casa dos bilhões. Em cada divisão os planos do DNA foram co- piados com fidelidade, praticamente sem erros.
É fácil falar da duplicação do DNA, mas se este é realmente um conjunto de planos para se construir um corpo, como esses planos são postos em prática? Como são eles traduzidos para a estrutura do corpo? Isto leva-me à segunda coisa importante que o DNA faz. Ele supervisiona indiretamente a manufatura de um tipo diferente de molécula – a proteína. A hemoglobina mencionada no último capítulo é exatamente um exemplo da enorme diversidade das moléculas de proteína. A mensagem codificada do D!AA, escrita no alfabeto de nucleotídeos de quatro letras, é traduzida para um outro alfabeto de uma maneira mecânica simples. Este é o alfabeto dos aminoácidos, o qual define as moléculas de proteína.
Fazer proteínas talvez pareça estar muito longe de fazer-se um corpo, mas é a primeira pequena etapa nesta direção. As proteínas não apenas constituem grande parte da estrutura do corpo, mas também exercem um controle sensível sobre todos os processos químicos dentro da célula, ligando-os e desligando-os seletivamente em momentos e lugares precisos. Exatamente como isto eventualmente leva ao desenvolvimento de um bebê é uma história cujo desvendamento pelos embriologistas levará décadas ou talvez séculos. Mas, o fato é que assim ocorre. Os genes de fato controlam indiretamente a fabricação de corpos e a influência é estritamente unidirecional: as características adquiridas não são herdadas. Não importa quanto conhecimento e sabedoria você adquira durante sua vida, absolutamente nada será transmitido para seus fá-los por meios genéticos. Cada geração nova começa da estaca zero. O corpo é a maneira dos genes preservarem-se inalterados.
A importância evolutiva do fato de que os genes controlam o desenvolvimento embrionário é o seguinte: significa que os genes são pelo menos parcialmente responsáveis pela sua própria sobrevivência no futuro, pois esta depende da eficiência dos corpos nos quais eles vivem e os quais eles ajudaram a construir. Antigamente a seleção natural consistia na sobrevivência diferencial de replicadores flutuando livremente no caldo primitivo. Hoje, a seleção natural favorece os replicadores que são bons em construir máquinas de sobrevivência, genes que são hábeis na arte de controlar o desenvolvimento embrionário. Os replicadores não têm mais consciência disto ou mais intencionalidade do que jamais tiveram. Os mesmos antigos processos de seleção automática entre moléculas rivais devido a longevidade, fecundidade e fidelidade de cópia ainda continuam tão cega e inevitavelmente quanto o fizeram em épocas re-motas. Os genes não têm a capacidade de previsão. Não fazem planos antecipadamente. Simplesmente são, alguns mais do que outros, e isto é tudo. Mas, as qualidades que determinam a longevidade e a fecundidade de um gene não são de forma alguma, tão simples como o foram.
Nos últimos anos – nos últimos seiscentos milhões ou perto disto – os replicadores conseguiram triunfos notáveis na tecnologia das máquinas de sobre-vivência, tais como o músculo, o coração e o olho (os quais evoluíram independentemente várias vezes). Antes disto, eles alteraram radicalmente características fundamentais de seu modo de vida como replicadores, o que deve ser compreendido se quisermos continuar com o argumento.
A primeira coisa a entender a respeito de um replicador moderno é que ele é altamente gregário. Uma máquina de sobrevivência é um veiculo contendo não apenas um gene mas muitos milhares deles. A fabricação de um corpo é um empreendimento conjunto de tal complexidade que é quase impossível desemaranhar a contribuição de um gene daquela de outro. Um determinado gene terá muitos efeitos diferentes sobre partes bastante distintas do corpo. Uma região específica deste último será influenciada por muitos genes e o efeito de qualquer um deles depende da interação com muitos outros genes. Alguns agem como dirigentes, controlando a operação de um grupo de outros genes. Em termos da analogia, qualquer página dada dos planos faz referência a muitas partes diferentes da construção e cada página tem sentido apenas em termos de referências cruzadas a numerosas outras páginas.
Esta interdependência intrincada dos genes talvez o faça perguntar-se porque, então, usamos a palavra “gene”. Por que não usar um substantivo coletivo como “complexo gênico”? A resposta é que para muitos propósitos esta é, de fato, uma boa idéia. Mas, se olharmos as coisas de outra maneira, também é possível considerar o complexo gênico como estando dividido em replicadores ou genes discretos. Isto devido ao fenômeno do sexo. A reprodução sexuada tem o efeito de misturar e baralhar os genes, o que significa que qualquer corpo individualmente é apenas um veículo temporário para uma combinação efêmera de genes. A combinação de genes que constitui um indivíduo qualquer poderá ser efêmera, mas os genes em si são, potencialmente, muito duradouros. Seus destinos constantemente se cruzam e recruzam ao longo das gerações. Um gene pode ser considerado como uma unidade que sobrevive por um grande número de corpos individuais sucessivos. Este é o argumento central que será desenvolvido neste capítulo. É um argumento com o qual alguns de meus mais respeitados colegas recusam-se obstinadamente a concordar, de modo que você deve perdoar-me se pareço pormenorizá-la demasiadamente! Em primeiro lugar devo explicar resumidamente o sexo.
Eu disse que os planos para a construção do corpo humano estão desenvolvidos em 46 volumes. Isto foi, de fato, uma simplificação excessiva. A verdade é um tanto bizarra. Os 46 cromossomos consistem de 23 pares de cromossomos. Poderíamos dizer que existem dois conjuntos alternativos de 23 volumes de planos arquivados no núcleo de cada célula. Chame-os Volume 1a e Volume 1b, Volume 2a e Volume 2b, etc., até o Volume 23a e o Volume 23b. Os números de identificação que utilizo para os volumes e, mais tarde, para as páginas, são, é claro, inteiramente arbitrários.
Recebemos cada cromossomo intacto de um de nossos dois pais, em cujo testículo ou ovário ele foi montado. Os volumes 1a, 2a, 3a,... vieram, digamos, do pai. Os volumes 1b, 2b, 3b,... vieram da mãe. É muito difícil na prática, mas teoricamente você poderia olhar com um microscópio os 46 cromossomos em qualquer uma de suas células e separar os 23 que vieram de seu pai e os 23 que vieram de sua mãe.
Os cromossomos pareados não passam toda sua vida fisicamente em contato uns com os outros, ou mesmo perto um do outro. Em que sentido, então, estão eles “pareados”? No sentido de que cada volume provindo originalmente do pai, pode ser considerado, página por página, como uma alternativa direta a um volume específico provindo originalmente da mãe. A Página 6 do Volume 13a e a Página 6 do Volume 13b, por exemplo, talvez “refiram-se” ambas à cor dos olhos. Talvez uma queira dizer “azul” e a outra “castanho”.
Algumas vezes as duas páginas alternativas são idênticas, mas, em outros casos, como em nosso exemplo da cor dos olhos, elas diferem. Se fazem “recomendações” contraditórias, o que o corpo faz? A resposta varia. Algumas vezes uma interpretação prevalece sobre a outra. No exemplo da cor dos olhos dado acima, a pessoa, na realidade, teria olhos castanhos: as instruções para fazer