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Nesta pesquisa tenho como finalidade trabalhar com o tema suicídio, por esse ser ainda algo pouco discutido e pesquisado dentro do Brasil, tendo como prioridade responder a seguinte questão: por que a morte voluntária se torna um incômodo às mediações sociais? Intuiu-se demonstrar como ao longo da história as ideias relacionadas sobre o assunto de pecado ou de loucura foram criadas e trabalhadas até hoje por estes mediadores, sendo eles a Religião, o Estado, a Família e a medicina, que acabam po
Tipologia: Notas de estudo
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Monografia apresentada à banca examinadora, como requisito necessário para obtenção do título de licenciado em História, pela Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Jussara, sob orientação do professor Dr. Deuzair José da Silva.
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a Deus por todas as conquistas adquiridas ao longo de minha vida, pois ele esteve sempre do meu lado, fortalecendo e me ajudando a realizar todos os meus objetivos, nos quais sempre esteve do meu lado me dando forças e me ensinando a nunca desistir diante das barreiras impostas pela vida. Agradeço ao meu professor orientador Deuzair, pela confiança, interesse e, sobretudo, por sua grande ajuda construtiva, pois sem dúvida nenhuma, o seu acompanhamento constante na realização desta pesquisa foi fundamental para o desenvolvimento deste trabalho monográfico. Devo minha gratidão aos meus pais, Nilson Soares da Silva e Maria do Carmo de Oliveira Silva, que sempre me apoiaram e me ajudaram em minhas decisões, não medindo esforços em prol da minha formação acadêmica. As minhas irmãs Mayra de Oliveira Silva e Monique de Oliveira Silva, pois a elas devo todos os incentivos e bons conselhos que me ajudaram a levar este trabalho a diante, mesmo nos momentos mais difíceis em que sempre que eu pensava em desistir lá estavam elas renovando minhas forças e alimentando todas as minhas expectativas. A minha namorada Jéssika Andrade, pela grande paciência de me ver dedicar apenas ao meu trabalho monográfico, respeitando e me apoiando em meu envolvimento com os meus estudos, pois devo agradecê-la por nunca, em nenhum momento, ter deixado a desejar em relação a sua compreensão, não consigo encontrar palavras o suficiente para agradecê-la por esta conquista. Ao meu grande amigo Pedro Henrique, a quem considero mais que um amigo mais sim um irmão, pois sempre esteve ao meu lado nos momentos de grande sufoco sempre me dando uma tremenda força dentro do possível e do impossível para isto. Ao meu companheiro Renato, a quem devo muito a produção deste trabalho principalmente pela paciência ao me dar conselhos de grande ajuda e me mostrar os melhores caminhos a serem seguidos para o enriquecimento desta monografia. Aos meus companheiros de sala, que dividem a mesma luta diária ao qual nos é imposta para a nossa formação docente do curso de História. E juntos nós rimos, reclamamos, apoiamos uns aos outros, para buscar forças e para conseguirmos vencer esta etapa tão importante em nossas vidas.
Obrigado especialmente aos meus amigos, Valdivino, Ray, Lidiane Adália e ambos os companheiros do curso de História do IV ano, pela convivência motivadora e pela alegria e descontração, capazes de tornar terríveis aulas destes quatro anos em grandes momentos especiais. Talvez lá no início do curso todos nos julgávamos quatro anos uma verdadeira eternidade, mas agora vejo que foram muito mais que apenas aulas e sim um tempo de aproximação e fortalecimento de amizades. Infelizmente, nossas diárias convivências encerram-se ainda este ano, mas acredito que mesmo assim a nossa amizade prevalecera. Sei que certamente ficaram uns tantos de fora! Desculpem-me.
Nesta pesquisa tenho como finalidade trabalhar com o tema suicídio, por esse ser ainda algo pouco discutido e pesquisado dentro do Brasil, tendo como prioridade responder a seguinte questão: por que a morte voluntária se torna um incômodo às mediações sociais? Intuiu-se demonstrar como ao longo da história as ideias relacionadas sobre o assunto de pecado ou de loucura foram criadas e trabalhadas até hoje por estes mediadores, sendo eles a Religião, o Estado, a Família e a medicina, que acabam possibilitando um silêncio dentro da sociedade em torno deste fato. Afinal, para se questionar tais argumentos é necessário primeiro entender suas origens e quais interesses por trás de sua formação, já que ao se falar sobre um suicida dentro de um grupo de indivíduos eles acabam relutando e evitando comentar sobre o acontecimento. Por isso a importância da historiografia brasileira, que a partir de grandes autores como Lopes, Berenchtein, Dias, Ferreira e Cassorla, os quais buscaram nas diversas fontes possíveis estabelecer um embasamento teórico sobre o assunto abrindo as portas para uma discussão até então fechada ou limitada dentro do país, principalmente nas últimas duas décadas. Aqui destaco a importância das cartas suicidas que estes pesquisadores trazem em seus trabalhos já que, através de uma carta ou bilhete, o indivíduo procura demonstrar seus principais motivos que o proporcionaram a tirar sua vida, o que possibilita termos outros olhares sobre este fato como, por exemplo, de liberdade, ou seja, será que a morte voluntária também não poderia ser vista como uma maneira de se libertar de algo que esteja o fazendo sofrer.
PALAVRAS-CHAVE : Suicídio. Mediações. Sociedade. Loucura. Pecado.
1.1 A verdadeira face das ideologias 15 1.2 A origem das ideologias suicidas 19 1.3 A importância da Religião e da Medicina para a preservação social contra o suicídio no Brasil. 22 1.4 Os pontos positivos e negativos dos meios de comunicação dentro da sociedade. 27 CAPÍTULO 02 UMA BREVE ANÁLISE SOBRE O ESTUDO HISTORIOGRÁFICO BRASILEIRO 35 2.1 Durkheim: um ponto de referência para a historiografia brasileira 35 2.2 As principais obras brasileiras sobre o suicídio 41 2.3 A dificuldade de se estudar o tema 46 CAPÍTULO 03 AS INFLUÊNCIAS DOS LIMITES ENCONTRADOS DENTRO DO CONTRATO SOCIAL AO SUICÍDIO.^51 3.1 As reflexões em torno do suicídio 51 3.2 O suicídio entre os sexos feminino e masculino 57 3.3 A morte voluntária como uma forma de se libertar de sua condição social 60 3.4 O suicídio como um ato de liberdade dentro do contrato social 64 3.5 A relação do sentido da vida com o suicídio 78 CONCLUSÃO 84 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS^87
tempo em que ela, ao publicar um caso de suicídio, acaba transmitindo suas ideias para o meio social, também se torna um instrumento das mediações sociais para combatê-lo. Argumentos contra o suicídio foram incorporados e aprimorados por diversos órgãos e instituições ao longo dos anos visando conter este problema. Vale destacar que a formação destas ideologias sobre tirar a própria vida não é de hoje, pois estas já vêm sendo construídas e aplicadas às concepções morais da sociedade há muito tempo, principalmente no século VI d. C, com os argumentos levantados por Santo Agostinho usando como pilar principal destas justificativas um dos 10 mandamentos – “não matarás” – como podemos acompanhar a seguir.
O assassinato de si mesmo só passa a ser considerado crime pela igreja católica a partir século VI d.C. quando a instituição estabelece leis que proíbem e condenam o suicídio. E santo Agostinho quem desenvolve os argumentos para a criação de tal lei, buscando uma solução contra a suicídomania que assolava os primeiros cristãos e que ate esse tempo, ainda tinha forte apelo entre os seus fieis, e o fez baseado no sexto mandamento; o “não mataras”, que passa a abranger o assassinato de si mesmo (BERENCHTEIN, 2007, p. 25-26). Além desta visão de pecado, a loucura também passa a fixar-se dentro do senso comum da sociedade como outro fator responsável pela morte voluntária, ou seja, para muitas pessoas quando um indivíduo se mata, ele estava louco, sem nenhuma consciência do que estava fazendo. Esta ideia ficou bem mais forte dentro do meio social a partir do Renascimento, período em que houve uma grande evolução de diversas ciências como, por exemplo, a médica, destacada por Berenchtein a seguir.
O crescente desenvolvimento dos conhecimentos da medicina, além dos elementos racionalistas do Iluminismo e uma forte necessidade de acabar com o confisco dos bens dos suicidas e as severas punições a seus cadáveres; que fizeram com que, de pecado mortal e crime capital, o suicídio passasse a ser responsabilidade da loucura. Esse argumento, posteriormente, com a consolidação da medicina como ciência autônoma (BERENCHTEIN, 2012, p. 296). No entanto, devemos colocar que dentro desta ideia de loucura existem vários fatores que podem levar uma pessoa a se matar, tais como as paixões existentes dentro da sociedade – amor, dinheiro, bebidas e jogos – das quais se usufruídas em poucas ou em muitas quantidades levam ao suicídio devido possibilitarem um enfraquecimento de sua razão. Por isso, de acordo com Lopes:
Se o homem se restringisse aos limites impostos pela razão não seria dominado pela impetuosidade do amor, não se entregaria sem freio a
satisfação de sua necessidade “natural” de amar. Assim o coração despedaçado pelo por um amor, principalmente o não correspondido, por não obedecer aos limites impostos pela razão, permitiria o predomínio de uma paixão que poderia, inclusive, conduzir ao suicídio. Em outras palavras, guiado pela razão, o homem estaria imune às paixões e, por consequência não se suicidaria (LOPES, 2008, p. 115). Lopes aponta em sua obra “Suicídio e Saber Médico”, quando esta visão do suicídio como um ato de loucura teria começado a se desenvolver com mais força em nosso país. Segundo suas palavras, foi a partir do momento que as primeiras instituições médicas surgiram no Brasil. A medicina acaba também evoluindo e formando seus primeiros estudos em torno da morte voluntária dentro de nosso meio social, partindo do princípio de que o suicídio era proporcionado por alterações nas faculdades mentais do ser humano, como destaca-se logo abaixo.
Para os médicos brasileiros os indivíduos que se matavam – os chamados “suicidas” – podiam ser alienados, loucos ou pessoas que não agiam de acordo com seu livre arbítrio. Em outras formulações se tratava-se de doentes sem necessariamente serem loucos ou alienados apresentavam algum tipo de alteração em suas faculdades mentais. Indivíduos sem instinto de conservação, doentes que sofriam de algum tipo de neurose, como a histeria ou algo semelhante (LOPES, 2008, p. 59-60). A partir destas teses médicas brasileiras que começaram a surgir em torno do suicídio uma maior relação entre Medicina e Governo, sendo tudo um jogo de interesses pelas duas partes: de um lado, a Medicina “ela precisava do Estado para realizar seu projeto de preservação das doenças da população, porque sem instrumento de poder próprio ela seria ineficaz e vã” (LOPES, 2008, p. 59-60); por outro lado, Micael Herschmann^2 acredita que esta articulação com a Medicina possibilitou ao Estado “o fim da autonomia da família e o incremento do controle social” (HERSCHMANN, 1996, apud LOPES, 2008, p. 39). O que poderemos observar ao longo deste primeiro capítulo é que tanto o argumento de pecado, quanto da loucura contribuíram bastante para uma melhor conservação da sociedade, que vive a partir de um contrato social entre governantes e governados, em que um precisa do outro para sobreviver visando que se o poder Soberano e os seus súditos estiverem unidos em um corpo só eles serão fortes, mas se acontece o contrário, isso poderá resultar na destruição deste corpo político. Isso Durkheim, em seu trabalho “Montesquieu e Rousseau: Pioneiros da Sociologia”, destaca abaixo.
(^2) HERSCHMANN, Micael e KROPF, Simone e NUNES, Clarice. Missionários do progresso : médicos, engenheiros e educadore s no Rio de Janeiro-1870-1937. Rio de janeiro: Diadorim, 1996.
discussão que até então estava fechada ou limitada dentro do contexto social no qual nos encontramos. Já no terceiro e último capítulo deste trabalho, que tem como título “as influências dos limites encontrados dentro do contrato social ao suicídio”, proponho responder como o suicídio se torna um verdadeiro inconveniente para as chamadas mediações sociais. Isso irá contribuir para uma reflexão sobre a morte voluntária poder ser ou não considerada um ato de libertação social, fazendo isso principalmente a partir dos depoimentos suicidas apresentados dentro das obras historiográficas. Como podemos observar no trecho abaixo, feito por um ex- penitenciário antes de se matar.
[...] chegou o fim da minha vida... Mas, tudo bem, gente, olhe! Só quero, só quero deixar bem claro pra vocês, que esse fim da minha vida que chegou aqui, foi pelo fato do governo, não, [SIC] foi pelo fato de que o governo não agir com pés..., ou melhor, não quero acusar ninguém, mas o governo ele merecia dar um apoio melhor pro sentenciado. O sentenciado, quando ele sai da cadeia, ele podia sair documentado, ele podia sair, ele podia sair da cadeia com a carta de trabalho (DIAS,1991, p.94). Nesta citação, conseguimos perceber uma crítica à estrutura social, mas diretamente ainda ao governo, que não dá o apoio necessário para que um ex-presidiário possa se inserir com sucesso dentro da sociedade, pois um emprego seria necessário para este começo de vida, o qual acaba sendo negado por causa de seu passado. Sendo então um modelo não só de crítica ao sistema, como também uma forma de dizer que ele não estava mais vendo motivos para continuar vivendo em um mundo que não lhe oferece recursos e condições para dar a volta por cima, sendo então obrigados a ter que voltar a roubar para sobreviver resultando em seu retorno para a cadeia. Em situações como estas que podemos encontrar no suicídio uma forma de fugir da realidade em que essas pessoas se encontram. Outro ponto que estará sendo levantado, principalmente neste capítulo, será o suicídio entre Homens e Mulheres existindo uma diferença enorme entre ambos os sexos, aos quais me basearei nos dados estatísticos das ultimas duas décadas existentes em nosso país. No entanto, existem autores, dentre eles Dias, que criticam estas fontes dizendo “que não é simples estimar quantas pessoas se matam ou tentam se matar anualmente, dados os infindáveis problemas das estatísticas com relação a registros deste tipo” (DIAS, 1991, p. 94), motivos estes também citados abaixo.
Esta imprecisão resulta de inúmeros fatores, destacando-se entre eles: os fatores religiosos – as fracas porcentagens dos suicídios em países latinos são influenciadas pela predominância do catolicismo; os fatores políticos – os dados estatísticos tendem a ser manipulados para defender interesses
econômicos e/ou políticos; e, finalmente fatores morais – autoridades médicas tendem a atribuir outra causa a morte para defender interesses de familiares e/ou autoridades (MARTINS, 2008, p. 47). É fácil perceber, segundo a fala de Martins, os diversos problemas para se determinar um número certo de casos suicidas, já que em muitas situações estes atos são escondidos e registrados como se fossem apenas acidentes, seja por um erro de pericia e investigação, ou até mesmo de forma proposital para esconder o suicídio do restante da sociedade, seja pelos familiares da vítima ou pelas próprias instituições governamentais. Sendo assim, espero em meu trabalho colaborar um pouco mais com esta discussão em torno do suicídio, com uma nova forma de se enxergar este fato, possibilitando então que eu também possa contribuir com o rompimento desta barreira social, pois para se romper com tal silêncio é preciso saber como o suicídio se torna um mal à sociedade. Tarefa esta que não será tão fácil, pois como já foi abordado anteriormente estas barreiras existentes dentro da estrutura social e dificultam bastante este processo. Isso não é diferente em meu caso, pois por me encontrar em uma cidade pequena, com cerca de 20.000 habitantes, os casos de suicídio aparecem, mas quando procuro os familiares, amigos e até mesmo evidências deixadas pela própria vítima, nada consigo pela própria dor da perda e também pela preservação dos familiares e amigos para com a vítima. Preferem ocultar as evidências, como cartas e bilhetes, a expor os reais motivos para o restante do mundo, por isso a grande importância da historiografia que, rompendo com este silêncio, possibilita um maior estudo sobre este fato.
ou loucura, conforme a autora Chauí, destaca em sua obra “O que é Ideologia^4 ”, se estas ideias estabelecidas sobre tal fato dentro do meio social não forem repensadas e criticadas, elas continuarão se mantendo dentro do cotidiano.
As ideias cotidianas dos homens representam a realidade de modo invertido e são conservadas nessa inversão, vindo a constituir os pilares para a construção da ideologia. Por tanto, enquanto não houver um conhecimento da história real, enquanto a teoria não mostrar o significado na prática imediata dos homens, enquanto a experiência comum de vida for mantida sem crítica e sem pensamento, a ideologia se manterá (CHAUI, 1984, p. 87). Uma das colocações, mas importantes que a autora destaca, se dá quando ela diz que as ideias dos homens representam uma realidade invertida que dão sustentação aos pilares das ideologias. Sendo assim, me pergunto o que afinal são as ideologias? Essa não é uma questão tão simples de responder, pois não se trata de uma conta de matemática que você vai chegar a um resultado concreto no final, já que essa requer um cuidado enorme para ser analisada e discutida, por isso, em meu ponto de vista, quem melhor se aproximou disso foi à própria Chauí^5.
A universalidade dessas ideias é abstrata, pois no concreto existem ideias particulares de cada classe. Por ser uma abstração, a ideologia constrói uma rede imaginária de ideias e de valores que possuem base real (a divisão social), mas de tal modo que essa base seja reconstruída de modo invertido e imaginário (CHAUI, 1984, p. 103-104). Esta citação demonstra que para Chauí, a ideologia não é um produto exclusivo de uma determinada classe social, mas de todas elas, principalmente quando diz que cada uma tem suas ideias particulares que possuem base no real. Sendo assim, a ideologia então seria um conjunto de ideias que buscam representar a realidade, entretanto ao se fazer isso elas criam essa realidade de maneira invertida, o que resulta, segundo a autora, em uma divisão social. Para entender melhor como se deu esta divisão, devo retornar aos primórdios do homem em seu estado natural.
Devemos, portanto, pensar no homem natural ‘vagando pela floresta, sem ocupação, sem palavras, sem domicílio, sem guerra e sem laços, sem
(^4) Esta obra apresenta a historia do termo a partir do inicio do século XIX , para entender qual sua origem? E principalmente quais seus mecanismos, seus fins e efeitos sociais, econômicos e políticos dentro do contexto social (CHAUI, 1984). 5 Só quero destacar, que dentro desse processo da criação ideológica na visão de Chauí, existem diversos ponto ricos a serem discutidos por requererem um cuidado muito grande a serem analisados, como por exemplo, a visão do real e do não real? No entanto, não estarei me aprofundando, pois estaria entrando em uma discussão que fugiria do assunto principal que e o suicídio.
precisar de seu semelhante e sem qualquer desejo de fazer-lhes mal, talvez sequer reconhecendo-os individualmente’ (DURKHEIM, 2008, p. 82). Pode-se observar que no período em que o homem ainda vivia em seu estado de natureza de uma forma isolada, podia fazer o que quisesse morando onde e como desejasse, sem se preocupar em submeter-se a um regime de condutas e leis. Entretanto, esse cenário se transforma a partir do momento em que passa a ocorrer um maior contato entre os homens surgindo então às primeiras sociedades.
‘Inundações, ressacas, erupções vulcânicas, terremotos, incêndios causados por raios que destruíam florestas, tudo o que pudesse assustar e despertar os habitantes selvagens de uma região os reunia em seguida para repara juntos os danos sofridos em comum’. - ‘as nascentes e rios, desigualmente distribuídos, eram outro ponto de encontro particularmente necessário, já que os homens podem menos abrir mão da água que do fogo’ (ensaio, IX). ‘desse primeiro contato, nasceu um princípio de linguagem. Imaginamos que entre homens assim aproximados e forçados a viver lado a lado deve ter se formado um idioma comum, mais do que entre aqueles que erravam livremente pelas florestas’(segundo discurso, parte II). Assim, uma primeira extensão de necessidades físicas cria uma ligeira tendência a formar grupos. Uma vez organizados esses grupos, eles, por sua vez, despertam inclinações sociais. E uma vez que os homens se acostumam a estar juntos, acham difícil viver sozinhos. ‘eles acostumaram a reunir-se. De tanto se verem, não podiam mais ficar sem se ver’. Isso deu origem a novas ideias a respeito das relações humanas, a necessidade da civilidade, o dever de respeitar obrigações contratuais (DURKHEIM, 2008, p. 87). Durkheim define bem como as primeiras sociedades teriam se formado a partir de suas necessidades naturais, saindo de um estado primitivo para um civilizado, estabelecendo entre eles um contrato não só de responsabilidade e de deveres, como também de respeito em que um respeitava os direitos e também as propriedades do outro, Rousseau o define como contrato social. No entanto, este respeito passa a ser quebrado quando a vontade de possuir, mais do que se tem passa por cima deste contrato, “pois o proprietário tem interesse em ampliar sua propriedade espoliando-os como se fossem coisas suas e não homens livres e independentes” (CHAUI, 1984, p. 43), surgindo a divisão de classes em que um pequeno grupo de pessoas passa a possuir mais riquezas e terras do que a grande maioria. Logo estes proprietários começaram a perceber que mais difícil que se chegar ao poder era se manter nele, procurando então uma forma de usufruírem da mão de obra dos não proprietários sem que esses se revelassem contra eles. Já que a “existência dos proprietários (da classe capitalista) depende da exploração dos não proprietários (trabalhadores assalariados)” (CHAUI, 1984, p. 74). Dentro desta busca eles observaram na ideologia a solução para os seus problemas, já que essa seria “um dos meios usados pelos dominantes
1.2 A origem das ideologias suicidas.
Com o fim do império romano e a entrada para Idade Média, a igreja católica passou a ser a maior detentora do saber apoiando seus argumentos e sermões a partir da chamada Patrística, que teve sua origem a partir dos primeiros padres, os quais buscaram conciliar a cultura Greco-romana com o Cristianismo e também um sentido de razão aos argumentos da religião cristã que possibilitaria um diálogo entre seguidores e não seguidores, segundo as palavras de Hoffmann dentro de seu trabalho “O Domínio Ideológico da Igreja Durante a Alta Idade Media Ocidental^6 ”, destacadas logo a seguir.
A patrística teve origem no trabalho exercido pelos primeiros Padres da Igreja que procuravam conciliar a cultura greco-romana com o Cristianismo, a religião cristã com o dualismo entre fé e razão. A patrística teve que buscar na filosofia greco-romana a sustentação filosófica que possibilitou a Igreja afirmar o seu domínio sobre a sociedade durante a Alta Idade Média Ocidental (HOFFMANN, 2010, p. 106). Hoffmann também destaca que este processo possibilitaria um maior domínio do cristianismo à sociedade, fator que aproximou ainda mais a nobreza e a igreja já que “Na busca pela conversão dos não crentes, em um período onde não havia nenhum Estado forte na Europa ocidental a Igreja aliou-se aos nobres, a classe de onde sairiam os seus membros”, (HOFFMANN, 2010, p. 107); Chauí coloca bem como este arranjo ideológico é importante aos chamados proprietários.
A divisão do trabalho, ao separar os homens em proprietários e não proprietários dá aos primeiros poder sobre os segundos. Estes são explorados economicamente e dominados politicamente. Estamos diante de classes sociais e dominação de uma classe por outra. Ora, a classe que explora economicamente só poderá manter seus privilégios se dominar politicamente e, portanto, se dispuser de instrumentos para essa dominação. Esses instrumentos são dois: o Estado e a ideologia (CHAUI, Apud HOFFMANN, 2010, p. 107).
(^6) Este trabalho analisa o domínio ideológico exercido pela Igreja Católica através da educação durante a Alta Idade Média Ocidental. Para poder mostrar a influência da Igreja sobre a população da Europa Ocidental Cristã, enquanto poder hegemônico e detentora do saber, o trabalho analisa a Patrística, as Escolas Monacais e a ação do Império Carolíngio na formação dos membros do clero para a função de intelectuais orgânicos (HOFFMANN, 2010).
Nilson Berenchtein reforça as palavras de Chauí sobre esta união benéfica para um domínio social daquele período castigado por doenças e miséria, vendo a cristandade junto com os senhores feudais, porque a única maneira de preservar a fonte de suas riquezas era o povo, por isso seria necessário que este perdesse então o direito de se dispor da própria vida, como podemos observar a seguir.
A perda desse ‘direito essencial de dispor da sua própria pessoa’, muito beneficia a igreja, ‘que dirige toda sua existência e retira a sua força do número de fieis’, mas também aos senhores, por ‘conservar e aumentar a mão-de-obra [sic] num mundo sub-povoado em que a fome e as epidemias acabam regularmente por comprometer a valorização dos seus domínios’ (BERENCHTEIN, 2012, P. 265). Berenchtein, vê na origem do primeiro argumento levantado pelo cristianismo no século VI d. C, contra o ato de se matar o resultado de uma união entre cristãos da igreja católica e os nobres donos de terras, pois em um período de várias doenças, pobrezas e explorações o número de suicídios possivelmente deveria alcançar uma média alta. Levando- se em conta que a população naquela época, principalmente na Europa, também não era tão vasta e se ocorressem muitos suicídios o prejuízo seria desastroso, pois os grandes proprietários de terras precisavam da mão de obra e a própria igreja também tirava sua força de seus fiéis. Tendo em vista que o suicídio atingia várias classes sociais daquele período.
Houve também uma diversidade nos motivos entre as categorias sociais e os objetivos que almejavam com seu ato, por exemplo, “[...] o camponês e o artesão enforcavam-se para escapar á miséria e ao sofrimento; o cavaleiro e o clérigo deixavam-se morrer para escapar à humilhação (BERENCHTEIN, 2012, p. 283). Conseguimos perceber que havia casos de suicídio em várias classes sociais daquela época, até entre os integrantes da própria igreja. Berenchtein demonstra este acontecimento como uma forma de escapar de algo como uma dívida ou humilhação, sendo assim, dentro deste contexto, a igreja resolve intervir deixando como responsável a isso um dos principais pensadores dentro da patrística: Santo Agustinho, que ficou a cargo de elaborar tal argumento que condenasse o ato de se matar. E assim ele o fez no século VI d. C, quando criou essas justificativas a partir do sexto mandamento de “não matarás”.
O assassinato de si mesmo só passa a ser considerado crime pela igreja católica a partir do século VI d. C, quando a instituição estabelece leis que proíbem e condenam o suicídio. É Santo Agostinho quem desenvolve os argumentos para a criação de tal lei, buscando uma solução contra a suicídomania que assolava os primeiros cristãos e que até esse tempo, ainda tinha forte apelo entre os seus fiéis, e o fez baseado no sexto mandamento; o