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Composto por textos reunidos por olga pombo, que surgem da curiosidade do autor. Aqui, encontramos reflexões sobre a medicina, a ciência e a filosofia, abordando temas variados como a história da ciência, a ética, a política da ciência e a formação médica. Os textos exploram a interrogação sobre a medicina, tanto em suas raízes biológicas, químicas e bioquímicas, quanto nas suas implicações éticas e políticas. Além disso, há uma paixão pela ciência como aventura de um conhecimento que cresce e triunfa sobre as tentações sedutoras do mito e das forças obscuras. Os textos destacam a importância de uma prática clínica capaz de proceder ao ajustamento do padrão médio ao caso concreto individual e da relação interpessoal entre o doente e o médico.
Tipologia: Provas
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Não perca as partes importantes!
“Todos os homens por natureza desejam conhecer” Aristóteles, Metafísica , 980a
Os textos reunidos neste volume são frutos da curiosidade. Gostaria de o dizer, declarar e repetir de forma enfática. De sublinhar o que nesta palavra há hoje de raro. As virtudes esquecidas que nela se abrigam. A inusitada verdade que nela se recolhe. A luminosidade que dela irradia. Capacidade de inquirição, abertura de espírito, atenção ao conhecido, interesse solto pelo desconhecido, vontade cristalina de aprender, movimento para o novo, disponibilidade para se deixar surpreender e de, dessa surpresa, retirar a força da interrogação - de tudo isto a curiosidade é feita e de tudo isto este volume é exemplo.
Claro está que -– como sempre acontece com a curiosidade -– quando ela é genuína, é dispersa. Aponta em direcções múltiplas, abre para campos discordantes, percorre caminhos divergentes.
É o que aqui acontece. À primeira vista, estamos perante um conjunto heterogéneo, heteróclito, extravagante mesmo. Das ervilhas de Mendel ao eterno feminino, da sífilis à filosofia cristã, da penicilina à Inquisição, da dupla hélice de Watson e Crick à pós-modernidade, das sulfamidas à teoria das formas de Platão. O leque das disciplinas abordadas não é menos variado: Medicina, Epistemologia, Química, Filosofia, Biologia, Política da Ciência, Bacteriologia, História da Ciência, Genética, História das Instituições, Bioquímica, Farmacologia, Ética. Porém, na sua polimorfia, o conjunto de textos que se reúnem neste volume é atravessado por duas paixões fundamentais.
Em primeiro lugar, aquela que se prende com a reflexão sobre a Medicina , tema que dá nome à primeira parte do volume. A Medicina é aqui interrogada
tanto nas suas raízes biológicas, químicas e bioquímicas, como nas suas implicações éticas e políticas, como ainda na atenção à história da profissão médica em Portugal. Interrogação que – sentimo-lo de imediato – é levada a cabo por um praticante. Estamos perante um clínico (como a si mesmo se define), atento e interessado nos progressos das diversas ciências com as quais a medicina se entrelaça. Um médico que acompanha o percurso tenaz de algumas doenças (sífilis, sida, tuberculose), que segue os turbulentos esforços feitos para encontrar os tratamentos adequados, os fármacos eficientes (penicilina, sulfamidas), e que vai intermediando essas narrativas com discretas pinceladas autobiográficas, com saborosas referências à situação portuguesa, com episódios retirados da sua própria experiência clínica. Tudo isso feito com uma aguda sensibilidade às circunstâncias históricas, às determinações institucionais, aos enjeux políticos, ao jogo dos interesses económicos que, por exemplo em farmacologia, melhor dito, na indústria farmacêutica, por vezes tornam ténue a “fronteira que separa o marketing da investigação” (p.87).
Neste âmbito, os textos intitulados “Acerca da Medicina baseada na evidência” (p. 54- 65) e “O efémero e o permanente” (p. 78-81), ocupam um lugar central. Aí se discutem, tanto as fragilidades e limites dos métodos utilizados para fabricar as chamadas “evidências”, como as virtudes da intervenção clínica. O que está em causa nestes textos não é obviamente contestar o valor das guidelines , dos protocolos, das “evidências” enquanto instrumentos da acção médica informada. Ainda que haja lugar para assinalar a eventual falta de rigor de alguns ensaios clínicos, a duvidosa validade de algumas meta-análises, os perigos de uma cada vez mais fragmentada formação médica, o que está em causa é o “elogio da clínica” (p. 60). Por outras palavras, o que o autor defende com vigor é uma prática clínica capaz de proceder ao ajustamento do padrão médio, abstracto e geral ao caso concreto individual. “Evidências? Venham elas desde que integradas numa actuação clínica baseada na experiência e em conhecimentos teóricos bem estruturados e fundamentados “ (p. 59). O que o autor não pode aceitar é o esquecimento dessa arte do face a face entre o doente e o seu médico, dessa
medicina do século XX: Leis de Mendel, insulina e ADN” (pp. 39-47), “Descobertas simultâneas na medicina do século XX: o caso da penicilina e das sulfamidas” (pp. 66-81) e “Descobertas simultâneas na medicina do século XX: os primeiros tuberculostáticos” (pp. 90-104) como também ao artigo intitulado “Da sífilis à sida” (pp. 10-19). Neste último, por exemplo, o autor descreve com grande clareza as atribuladas etapas que marcaram a história da investigação sobre o vírus da sida e o “triste episódio” (p.18), que está na base da conhecida polémica entre Luc Montagnier do Instituto Pasteur em Paris e o seu rival americano Robert Gallo em torno da precedência da descoberta do HIV. Da mesma maneira, no estudo sobre os tuberculostáticos, o autor oferece uma descrição, quase policial, dos percursos de uma investigação repleta de coincidências, na qual nada menos que três laboratórios estiveram envolvidos de forma independente mas paralela: “O Rimifon da Roche, a Nydrazida da Squibb e o Neoteben da Bayer eram marcas diferentes da mesma substância” (P. 103). E, em todos os casos, fica claro que o que está em jogo é muito mais do que a confluência de circunstancias externas, isto é, em cada caso, o autor tem a inteligência de mostrar de que modo as descobertas simultâneas são momentos exemplares da pujança dos factores internos, determinantes cognitivos do progresso do conhecimento científico. Como interpretar o interesse do nosso autor por esse esplendoroso fenómeno das descobertas simultâneas senão como uma marca da sua crença firme e confiante no valor da racionalidade científica? Não será essa crença que o leva a enfatizar a capacidade da ciência para “mudar o destino da humanidade” (p. 25) e para permitir que o homem se apodere de “atributos que eram pertença exclusiva das divindades” (p.37)?
Na introdução ao volume, o autor pergunta: “Será que se justifica a publicação destes textos produzidos no decurso da actividade escolar, subordinados a temas incluídos nos programas de ensino e cujo objectivo foi a avaliação curricular?” A resposta obviamente seria não, se o objectivo desses textos tivesse sido, de facto, a avaliação escolar. A verdade porém é que a leitura destes textos, no seu conjunto, mostra bem quanto o autor se engana
na interrogação que se coloca. Os textos aqui reunidos não são trabalhos escolares. São oportunidades que a universidade ofereceu – e que o autor aproveitou – para ir ao encontro dos seus próprios interesses. Pretextos que o autor se deu a si próprio para estudar aquilo que quis. E, como é admirável essa capacidade de perseguir a sua própria curiosidade!
Olga Pombo